Virando do avesso escrita por calivillas


Capítulo 9
Vivendo por situações diferentes




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/739337/chapter/9

Ricardo acordou Júlia, com um beijo, ela sorriu se espreguiçando, ainda sonolenta, querendo dormir mais um pouco, percebeu que ele já estava vestido.

— Tenho que ir agora, Júlia.

— Vocês têm apresentação hoje?

— Não. O público durante a semana é muito fraco, só vale a pena no fim de semana. Mas, eu quero conversar com o meu irmão.

— Ele não sabe sobre você e Magda?

— Não. E não sei como ele vai reagir quando souber, estou preocupado.

Júlia passou a mão, carinhosamente, pelos cabelos cacheados de Ricardo.

— Vai dar certo! Tem que dar, você não pode continuar refém dessa situação, quanto mais tempo passar, poderá ficar pior.

— Eu sei

— Então, me dê notícias, assim que puder. Estarei aqui torcendo por você.

Ele deu outro beijo nela, agora, um pouco mais demorado.

— Tenho que ir antes que perca a coragem e eu mude de ideia.

Ela o viu sair pela porta do quarto, em seguida, ouviu o barulho do motor da moto ficando cada vez mais distante.

Aquela conversa com Ricardo havia sido muito importante também para ela, jogando uma luz nas suas dúvidas, emoções e pensamentos obscuro emergiram, ficaram mais claros e definidos. Estavam vivendo por situações diferentes, mas, ao mesmo tempo, iguais nas suas vidas, serem usados por pessoas que acreditavam que os amassem, e que lhes cobravam um alto preço em troca. Assim, Júlia saiu da cama e indo direto para o telefone.

— Leandro!

— Júlia, por Deus! Onde você está? Estamos todos aflitos com esse seu sumiço.

— Eu estou bem, passando uns dias na casa de amigos. Leandro, precisamos conversar.

— Sobre o que aconteceu? Eu já pedi desculpas, não sei mais o que fazer para mudar isso.

 - Não, eu andei pensando muito sobre nós dois, nesses últimos dias.

— Então, Júlia. Chegou a alguma decisão. Você sabe que eu a amo e quero me casar com você.

— Sim, eu decidi que não quero esse casamento que você quer.

— Como assim, Júlia? Você tem certeza do que quer jogar tudo que temos fora, por causa desse meu ato impensado? Até que tome uma decisão definitiva, precisamos conversar, pessoalmente.

— Ainda não estou pronta para essa conversa cara a cara com você, ainda.

— Então, você não tem certeza do que está falando? Posso ter alguma esperança? Não se pode terminar um casamento por telefone, Júlia. Não sem antes conversamos sobre isso pessoalmente.

— Eu tenho certeza da decisão que tomei, mas falaremos sobre isso depois, quando estiver pronta. Até mais, Leandro

— Tenho esperança que você mudará de ideia, então estarei esperando, Júlia. Não vou cancelar o nosso casamento, por enquanto.

Ao desligar o telefone, Júlia sentiu um aperto no peito, como o seu coração fosse esmagado, as lágrimas desceram, sem controle, os soluços fortes sacudiam seu corpo. Assim, ela chorou até seus olhos doerem, quando sentiu que não havia mais lágrimas para sair, foi até o banheiro e lavou o rosto inchado e vermelho. Depois colocou seus óculos escuros e saiu para sua caminhada diária, aquilo fazia bem a ela, sentir o sol, respirar o ar puro, ouvir os pássaros.

Naquela manhã, o sol já estava quente, sem nenhuma brisa para refrescar, Júlia caminho a passos largos, apesar da sua cabeça doer de tanto chorar, tinha muita sede, a garganta queimava e arranhava, algum tempo depois, ficou um tanto zonza, não havia comido nada, precisava de um pouco de água, urgentemente, tinha medo de desmaiar antes de chegar em casa. Passou na frente da casa do homem que estava sempre cuidando do jardim, mas ele não estava lá dessa vez, mesmo assim resolveu arriscar, gritou e bateu palmas no portão para chamar a atenção. A cabeça do homem apareceu na fresta da porta, espantado.

— Desculpe incomodar, mas poderia me dar um copo d’água? Não me sinto muito bem. 

Ele veio até o portão e o abriu.

— Claro! Entre! Está muito quente aí fora e você está pálida, é melhor vir para sombra.

Mesmo meio desconfiada, mas vencida pela sua necessidade, Júlia aceitou o convite e entrou.

— Obrigada, mas não quero atrapalhar.

— Você não está atrapalhando em nada. Não estou fazendo nada de importante. Aliás, nunca faço mesmo nada nesse lugar.

Para ela, aquilo soou como uma espécie de queixa.

O interior da casa dele era um oásis, não podia se dizer que sua decoração tivesse um estilo definido, era uma mistura harmoniosa de peças de todo mundo, onde tapetes orientais se misturavam com máscaras africanas, cerâmicas italianas e estatuetas de índios americanos e de deuses indianos, Júlia não esperava por isso.

— Sente-se e descanse um pouco!

Ele apontou para um sofá confortável, cheio de almofadas, onde ela se sentou, tirando os óculos escuros, jogando a cabeça dolorida contra o encosto.

Ele retornou com um copo d’água fria e entregou a ela, fixando o olhar no seu rosto, ainda inchado pelo choro. Júlia notou as mãos deles manchadas de tinta.

— Está muito quente hoje, por isso nem cuidei do jardim pela manhã.

A água fresca era uma dádiva para Júlia, que a fez se sentir melhor, encostou o copo gelado na testa.

— Obrigada. Esqueci de me apresentar. Meu nome é Júlia.

— O meu é Mauro. Quer mais água? – Apontou para o copo vazio na mão dela

— Não, obrigada. Sua casa é muito legal, Mauro.

— Esse é uma espécie de refúgio, onde mantenho e faço o que gosto. Cuido do jardim e da horta e pinto meus quadros.

E mostrou as mãos respigadas de tinta para ela.

— Obrigada, mais uma vez. Mas não quero tomar mais seu tempo.

Ela lhe entregou copo

— Não se preocupe, não tenho compromisso nenhum aqui. Sem horas marcadas.

— Esse quadro é seu? – Júlia mostrou a bela pintura de cores fortes e brilhante, pendurada na parede em frente ao sofá. Ele riu, sacudindo a cabeça em negação

— Não. Esse ganhei de um amigo, há muito tempo. Ele é um excelente pintor. Não sou tão bom assim.

— Obrigada pela água, mas tenho que ir. Até a próxima, Mauro – disse dirigindo-se para a saída.

— Até a próxima, Júlia.

Já havia passado um bom tempo após o anoitecer e nada de Ricardo voltar, Júlia considerou ir até o circo para constatar se estava tudo bem, então escutou o som da moto se aproximando. Aliviada, ela correu para porta, querendo saber das novidades, se ele conversou com o seu irmão e qual foi a sua reação. O rapaz desceu da moto e andou até ela, ainda usando o capacete, ficou espantada, no momento, que ele o retirou, pois, sua boca estava cortada e um dos olhos inchado e roxo.

— O que aconteceu?!

— Briguei com o meu irmão Ele ficou puto comigo! Me chamou de idiota! – disse, aborrecido, entrando na casa, jogou o capacete em uma poltrona e atirou-se no sofá, de ombros caídos e cabeça baixa, olhou para Júlia.

— Então, ele está muito aborrecido com você?

Ricardo assentiu com a cabeça

— Bastante, então, me deu um soco e eu revidei, nós acabamos rolando no chão!

— E agora? Você e seu irmão cortaram relações por causa daquela mulher?

— Não! Você não entendeu nada, Júlia! – Ela o interrogou com os olhos. – Rodolfo ficou zangado, porque não confiei nele! Nunca contei para ele. Está tudo bem entre nós dois.

— Mas, vocês brigaram! Olhe sua cara!

Ricardo riu, depois fez uma careta de dor por causa da boca cortada.

— Isso é coisa de irmãos! Nós sempre resolvemos nossos problemas na porrada, depois fica tudo bem.

Vencida, ela se levantou.

— Vou pegar algo para você, por aí.

Em seguida, ela retornou com gelo, enrolado em uma toalha e entregou a Ricardo, que colocou sobre a boca.

— E afinal, vocês conversaram e resolveram contar tudo para o pai de vocês?

— Rodolfo acha que é melhor assim. Ele nunca gostou de Magda, sempre acho que ela não prestava, quer se livrar dela.

— Ela vive com seu pai há muito tempo?

— Ela trabalha no circo, há tempo. Mas, depois que minha mãe morreu, ela foi se chegando no meu pai, até ficarem juntos. Ele devia se sentir muito sozinho, aí, teve o acidente de moto.

— No globo?

Ele balançou a cabeça confirmando.

— Ele quebrou umas vértebras da coluna, não podia mais fazer o número porque sentia muita dor. Por isso, comecei a treinar para ficar no lugar dele.

— Mas, você era muito jovem.

— Sempre fui grande, ninguém perguntava minha idade. E nunca ficávamos muito tempo em um lugar para alguém perceber. – Deu de ombros.

— Foi aí que sua madrasta resolve que você também tinha que pegar o lugar do seu pai na cama dela? Essa mulher tinha que ser presa! Ela é uma bandida, uma criminosa! – Júlia realmente estava zangada.

— Rodolfo falou para conversarmos com o pai, mas eu tenho medo da reação dele. E se ele ficar com raiva de mim e perdoar ela?  Se ele me expulsar do circo? Eu não tenho nada, só aquilo, lá é o meu lar, a minha família.

— Quando vocês conversarão com o seu pai?

— Rodolfo achou melhor amanhã de manhã, quando ele estiver longe de Magda. Mas, estou com medo, Júlia – Ricardo confessou.

— Vai dar tudo certo, Ricardo – disse, sem tem certeza, ela o puxou com carinho, deu um leve beijo nos seus lábios e ele reclamou por causa do corte.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Virando do avesso" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.