The Queen's Path escrita por Diamond


Capítulo 5
Capítulo V - 24 de Outubro de 1866


Notas iniciais do capítulo

Olá caros leitores, tudo bem? Espero que estejam gostando de "The Queen's Path". Eu particularmente estou adorando ouvir os comentários de vocês, principalmente quando compartilham comigo suas teorias, mostra que estão bem envolvidos na trama, haha!

Não costumo escrever neste espaço, mas neste ponto acho importante deixar um aviso. Repararam como o ano mencionado no título do capítulo mudou? Este será o primeiro Time Skip pelo qual a história passará. Faço questão de deixar claro para que a narrativa não fique confusa para vocês. Sem mais demoras, desejo a todos uma ótima leitura! :D



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/739237/chapter/5

O outono havia chegado de modo discreto naquele ano em Hallbridge. A temperatura estava alta considerando-se a estação em questão, cuja as únicas mudanças desde a passagem do verão eram as folhas caídas e o vento mais forte e ameno. “Acho que não teremos neve este ano no inverno”, divagou a princesa enquanto dava o toque final sua obra de arte. Dispondo uma última pétala sobre o gramado, ela observou seu trabalho com bastante orgulho.

Quando ainda morava em Odarin, Jacques havia lhe ensinado um modo de não desperdiçar as flores e folhas que caiam com a aproximação do inverno. Primeiro, coletava tantas quantas espécies conseguisse (sempre do chão, nunca arrancando aquelas capazes de persistir às baixas temperaturas). Depois, ela às dispunha em alguma parte do jardim onde o gramado estivesse limpo e então começava a organizar as folhas por tonalidade, elaborando desenhos que posteriormente enfeitaria com as pétalas coloridas.

Já tinha três anos desde que tinham abandonado o castelo por conta da revolução. Atualmente morava com seu irmão e Evangeline na casa dos Avelar, uma antiga família aliada dos Miglidori, que os havia concedido abrigo. Ulteriormente, espalhou-se a informação de que a revolta armada havia se originado dentro do próprio exército e que contou com o apoio da população, por razões que lhe eram desconhecidas. Allen era extraoficialmente o atual governante de Odarin, ainda que estivesse proibido de pisar no território que era seu por direito. Por esta razão, acabava tendo que delegar funções a outras famílias que habitavam o reino de Odarin no intuito de manter a soberania, ao passo que buscava restaurar certas alianças e fortalecer outras, para que pudessem retomar o trono e, finalmente, volta para casa. Naquele dia específico, estavam um passo mais próximo de atingir esse objetivo.

Absorta em seus pensamentos, a princesa encostou-se debaixo de uma árvore, aproveitando da brisa fraca e da sombra proporcionada pelos galhos ainda volumosos. Seu desenho continha a imagem de uma dama e ela gostaria de imaginar aquele poderia ser um retrato de sua mãe, como aquele que havia ficado para trás no dia da fuga. “Sinto tanto sua falta, mamãe. Agora que estamos longe de casa, mais do que nunca”. Estava quase cochilando e, por isso, não ouviu os passos apressados que se aproximavam.

— Não posso acreditar nisso, estamos à poucas horas do casamento e você veio dormir no jardim? Inacreditável Sarah! — Evangeline ralhou enquanto se aproximava. A menina despertou num salto assustado, mas suavizou a expressão quando percebem quem se tratava. — Levante-se do chão imediatamente, vai acabar sujando seu vestido. Você não quer entrar na igreja com manchas de lama, não é mesmo? Seu irmão ficaria muito aborrecido.

De imediato a menina se levantou, verificando se já não havia arruinado seu vestido de festa. Felizmente, havia apenas algumas poucas folhas grudadas em sua saia, que ela retirou uma a uma. O torso do vestido era da cor de marfim, enquanto que a saia tinha um tom de verde oliva. As vestes não tinham mangas, visto que o clima de Hallbridge raramente permitia roupas que acobertassem os braços, pois o calor seria insuportável. No lugar deles, um fino véu caído aos ombros prevenia que o vestido escorregasse e fosse ao chão. Não havendo mais o que esperar, Evangeline tomou a menina pela mão e seguiram de volta à mansão dos Avelar. Não poderia ser considerado um palácio, pois não havia proporções suficientes para tal. Entretanto, a casa era verdadeiramente grande, com muitos empregados e mobílias caras.

— Eu gostaria de ver o Allen agora. — a menina proferiu enquanto adentravam no casarão.

— Ele está se arrumando neste momento. Não acho que seja uma boa ideia interrompê-lo. — respondeu a governanta, de modo incerto. Evitava ao máximo ficar na companhia do príncipe e tinha excelentes motivos para isso.

— Eu não vou demorar, prometo. — Sarah retrucou, soltando a mão de Evangeline e pondo-se a correr até chegar ao quarto do mais velho.

Ela deu leves batidas na porta e quando obteve permissão para adentrar, empurrou-a com força. O príncipe já imaginava que seria a pequena, as batidas em sua porta eram inconfundíveis. Assim que ela adentrou no quarto, ele ajoelhou-se ao chão, no intuito de ficar da mesma altura da menina, erguendo-a em seus braços em seguida.

— Logo não serei mais capaz de erguê-la. Você está comendo demais, não acha? — o jovem perguntou em tom jocoso e alegre. Aquilo arrancou uma risada da princesa, acompanhada de um leve e meramente simbólico tapa em seu ombro.

— Allen! Não se diz esse tipo de coisa a uma dama, sabia disso? — ela repreendeu, embora estivesse rindo ao fazê-lo.

— Eu sei, perdoe minha grosseria e falta de modos, princesa. — o jovem devolveu um gracejo, depositando um beijo em sua testa e colocando-a de volta ao chão. — Você está radiante nesse vestido.

A menina agradeceu de modo envergonhado. Com um meio sorriso no rosto, o príncipe tornou a olhar-se no espelho, terminando de abotoar os botões de seu casaco. Sarah jamais admitiria em voz alta, mas gostaria de ser ela a poder se casar com Allen. Era um príncipe tal qual nos contos de fadas, bonito, elegante e da fala polida. No entanto, diante da impossibilidade, ela apenas mantinha-se próxima o máximo que conseguia.

— Como é mesmo o nome da sua noiva? Eu nunca me lembro, é muito estranho. Bernalise, é isso? — ela questionou com uma careta, levando o jovem a soltar uma risada baixa.

— Beatrice, e não Bernalise. — ele comentou rindo fracamente. — Não faça essa cara feia, ela é uma princesa que nem você, sabia disso?

Sarah deu os ombros, aquela informação não fazia diferença alguma. Tinham tido uma pequena discussão dias antes, ela não aceitava o fato de seu irmão se casar com uma completa desconhecida. Ele argumentou que não se tratava de uma desconhecida (haviam se encontrado em duas ocasiões, quando acompanhou seu pai em visitas ao reino de Mivre), além do fato de ser uma importante figura política. Era a herdeira de um dos maiores reinos do continente, certamente o tipo de aliança que Odarin necessitava. Apenas mais um casamento com motivações políticas para a vasta lista da realeza.

— Não importa se é princesa, rainha ou imperatriz. Vocês mal se conhecem, não é mesmo? Como pode amar uma pessoa a quem acabou de conhecer? — questionou a menina, sem conseguir disfarçar sua irritação.

— As coisas não funcionam bem assim. — ele respondeu tornando a se agachar e fazendo um leve carinho na bochecha de sua irmã mal-humorada. — Esse é um dos fardos de fazer parte da realeza. Temos muitos privilégios, mas casar com aqueles a quem amamos não é um deles. — ele comentou de modo entristecido.

— E eu terei que fazer isso também? — Sarah questionou transbordando em preocupação. Casar com alguém a quem ela jamais seria capaz de amar parecia-lhe um destino terrível.

— Você tem apenas treze anos Sarah, não tem idade para se preocupar com esse tipo de coisa. — ele afagou-lhe os cabelos com um sorriso encorajador. — Não vamos pensar nisso agora, tudo bem?

A menina assentiu tristemente e aquele gesto encerrou o assunto. Naquele mesmo instante, ouviram batidas na porta e novamente Allen concedeu permissão para que entrassem. Era apenas Evangeline, no final das contas. Ela fez uma reverência logo que se seus olhos cruzaram-se com os do rapaz.

— Perdoe-me a interrupção, príncipe Allen. Acredito que esteja bastante ocupado, portanto peço permissão para levar a princesa Sarah até a Catedral. O casamento não tardará a começar, creio eu. — Evangeline proferiu do modo mais polido de pôde entoar. Era sempre muito profissional, mas fazia questão de enfatizar a relação de respeito que havia entre eles.

— Muito bem colocado, Evangeline. — ele respondeu no mesmo tom respeitoso. — Nos encontramos na igreja Sarah. Quero você sentada bem na frente, certo?

A menina confirmou o desejo do mais velho e seguiu saltitante em direção a porta. A governanta estava prestes a segui-la, quando fora interrompida por um chamado. Teve de suspirar longamente, a fim de disfarçar seus tremores sempre que se encontrava na presença do príncipe. Jamais seria capaz de se acostumar com aqueles calafrios.

— Evangeline, é impressão minha ou você não está totalmente confortável? Há alguma coisa que a preocupa? — o jovem questionou, com um tom de voz levemente alterado. Agora que a princesa estava ausente do quarto, sua voz transbordava em ironia. — Qualquer coisa que eu possa fazer por você?

— Minhas preocupações estão sempre voltadas para o bem estar de Sarah. — ela alfinetou o jovem, mesmo sabendo que ele era imune a qualquer tipo de indiretas. Na verdade, até mesmo se divertia vendo o estado de alteração que a empregada ficava na sua presença, pois lhe dava a sensação de poder. — Se me dá licença.

Evangeline fez mais uma de suas reverências polidas e, sem aguardar por uma resposta saiu porta afora. Ela suspirou longamente. Seu fardo aumentava a cada dia, mas ela resistia com orgulho. “As coisas que não faço por você, Katherine”, pensou e pôs-se a procurar a menina que, como de costume, havia desaparecido dentre os corredores.

Diferentemente das demais vezes em que sumia sem aviso, aquela em específico não havia sido de modo proposital. Sarah saiu correndo do quarto de seu irmão e não reparou que a governanta não a seguia. Quando olhou para trás é que percebeu estar sozinha no meio de um salão vazio. Certamente levaria uma bronca por isso, não que já não estivesse habituada. Apesar de residir naquela casa há três anos, alguns corredores não lhes eram tão familiares quanto outros e ela se viu levemente perdida e sem ter a quem pedir ajuda. No entanto, um som ao longe se aproximava e ela imaginou que pudesse ser sua salvação. Correu em direção a ele, tão somente para esbarrar em uma jovem alta.

— Já está a correr novamente pelos corredores? Não consegue andar como uma pessoa normal? — a dama ralhou enquanto ocupava-se em tentar desamassar a saia de seu vestido.

Sarah ergueu os olhos e assustou-se mais do que nunca. A jovem trajava um vestido preto como a noite, com rendas igualmente escuras cobrindo-lhe os braços. As mãos estavam ocultas em luvas de veludo da mesma cor e, sobre os fios ruivos como a chama de uma vela, um véu. Esta última peça, no entanto, não cumpria seu papel em esconder os olhos inchados e as bochechas vermelhas, características de um choro agoniado.

— Que roupa horrível! Aonde pensa que vai vestida desse jeito Charlotte? A um velório? — a menina questionou, sem medir suas palavras e esquecendo-se completamente das boas maneiras. Na realidade, ela jamais seria capaz de lembrar-se das boas maneiras sempre que Charlotte era sua interlocutora.

— Estou indo a um casamento de Allen em que eu não sou a noiva! Sim, é claro que se trata de um velório. O velório do meu amor. — ela respondeu de modo irritadiço, sendo algumas vezes interrompida por soluços. — Ora, sua criaturinha insuportável, não venha tirar minha paciência. Eu já perdi meu coração hoje, não há espaço para outras perdas neste dia fúnebre.

Sarah revirou os olhos, o que sempre lhe esgotava a paciência eram os dramas de Charlotte. Com aquilo, a jovem saiu apressadamente do recinto, ainda aos prantos. A menina não fez a menor questão de segui-la. Dentre os filhos do Conde Klaus Avelar, a ruiva certamente seria a mais odiosa. Estava sempre de destratando sem que as outras pessoas tivessem conhecimento, viviam para dramatizar seus próprios problemas e, o pior de tudo, estava sempre grudada em Allen aonde quer que o rapaz fosse. Não havia nada que a princesa detestasse mais em sua estadia na casa dos Avelar do que a presença da jovem dama. “Allen teria de estar longe de suas faculdades mentais para casar com uma dramática como você”, pensou a menina. Ela pôs a caminhar no corredor de onde Charlotte havia saído. Certamente haveria de encontrar-se com alguém em algum momento.



— Eu deveria estar sentada ao lado de Allen, e não nesta cadeira a quilômetros de distância dele. — Sarah resmungou, sendo imediatamente repreendida por um olhar duro de Evangeline.

O Salão de Festas estava abarrotado de nobres de todos os níveis hierárquicos. Ela mal conseguia lembrar o nome de meia dúzia deles, para ser sincera. Não bastasse o ambiente inóspito, cada vez que alguém se aproximava para felicitar os noivos pelo casamento, a empurravam para longe. Em pouco tempo, a princesa já estava praticamente do outro lado do salão, aborrecida e profundamente entediada. Como ela gostaria que Elliot estivesse ali naquele momento.

Evangeline estava de pé, ao lado da poltrona em que a pequena estava sentada (ou quase deitada, para falar a verdade) como um verdadeiro cão de guarda. Ao vislumbrar qualquer aristocrata que merecesse um adendo, ela aproximava-se para cochichar algumas informações que pudessem ser pertinentes num futuro próximo. No entanto, Sarah não estava interessada em nenhum deles.

— Você deveria prestar atenção no que eu digo. — proferiu a governanta. — Nunca se sabe quando um desses cavalheiros virá até você para trocar algumas perguntas. Têm de estar preparada para qualquer assunto.

— Evangeline, eles sequer lembram que eu existo. — a menina bufou de modo aborrecido. — Eu nem mesmo posso ir dançar com as outras pessoas!

— É claro que não. Você é pequena demais, é mais provável que acabe se machucando. — Evangeline apontou, e só então pôde perceber como a menina estava sem opções. — Se eu lhe trouxer uma fatia generosa do bolo de casamento, promete melhorar um pouco essa sua expressão de descontento?

— Verei o que posso fazer por você. — a princesa respondeu de modo entediado.

Evangeline afastou, indo em direção a longa fila de pessoas que aguardavam para experimentar do formidável bolo de casamento. A cerimônia da catedral havia ocorrido sem maiores problemas. Ela e Evangeline sentaram-se na primeira fileira, junto aos pais da princesa de Mivre. Atrás de si, estavam o Conde Klaus e seus três filhos: Edgar, Gilbert e a odiosa Charlotte. Apesar da posição em que estava, ela pôde perceber que no momento em que o Bispo questionou se alguém sustentava algum motivo para que aquela união não se firmasse, a ruiva fez menção de erguer o braço, mas foi impedida Gilbert, que segurou sua mão junto ao banco de madeira, para que ela se mantivesse quieta. Sarah não pôde deixar de rir daquela cena.

Tornou a olhar para o vasto salão. Uma valsa se encerrava e as pessoas batiam palmas para a orquestra. Alguns participantes se dissiparam logo que outra música se iniciou, muito embora a grande maioria permanecesse à postos para dançar mais. Era necessário aproveitar, não era sempre podiam presenciar casamentos daquele porte e de tamanha importância.

Dentre aqueles que se afastaram, ela pôde observar que Edgar saia de perto da orquestra e caminhava calmamente em sua direção. Tomando a poltrona que estava bem ao lado da sua, ele jogou-se sobre ela, visivelmente cansado. A menina já tinha reparado, havia pelo menos uma dúzia de jovens damas que faziam questão de dançar com o rapaz e o mesmo não teve descanso até satisfazer o desejo de todas elas.

— Entediada? — ele perguntou enquanto tentava retirar os fios dourados de sua franja que costumeiramente obstruiam sua visão.

— Não, imagine. — ela respondeu com ironia. — É demasiadamente divertido observar adultos conversando sobre assuntos que não entendendo e dançando valsas que não consigo acompanhar.

O jovem soltou uma gargalhada com a resposta. Qualquer outra pessoa não teria dúvidas em julgar a princesa como uma pessoa livre de quaisquer modos. Mas Edgar já estava habituado à personalidade peculiar de Sarah e até mesmo se divertia com suas respostas irônicas. Oportunamente, um Sommelier passou pelas poltronas onde se encontravam e o rapaz requisitou que lhe servissem uma generosa taça de vinho.

— Você está bebendo demais, não acha? — a menina questionou com uma sobrancelha arqueada.

— Não seja boba, é minha primeira taça de vinho do dia. — ele respondeu sem olhar para a pequena.

— Mentira! Essa é pelo menos sexta desde que saímos da Catedral e viemos para cá. Nem mesmo o Sommelier aguenta mais servi-lo. Não percebeu como ele revirou os olhos quando você o chamou?

— Você é mesmo uma criança muito atenta. — ele comentou, encarando-a com misto de espanto e curiosidade.

— Talvez porque eu não seja mais uma criança! — Sarah respondeu aborrecida. Odiava que lhe chamassem de criança.

— É claro. — o jovem riu baixinho enquanto degustava de sua taça de vinho. A medida que o líquido descia por sua garganta, era como se sentisse o corpo tornar-se mais leve e a mente esvaziar aos poucos. Era exatamente daquilo que precisava. — Você quer experimentar?

— O que? O vinho? — a princesa questionou espantada. Evangeline jamais deixaria que ela experimentasse qualquer bebida alcoólica. Diria que não era próprio de uma dama beber em eventos como aquele. — Somente se você não contar à Evangeline.

O rapaz deu com os ombros estendeu a taça para a pequena. Aquela seria uma cena engraçada de se ver. Sarah encarou a taça por uns segundos, levemente incerta. Então, subitamente, ela verteu o conteúdo de uma vez, tomando mais da metade do líquido. Imediatamente, seu olhos se arregalaram, seu rosto se contorceu em uma careta e ela balançava a cabeça como se assim pudesse se livrar do amargo em sua boca. Edgar não pôde se conter diante de reações são verdadeiras e pôs-se a gargalhar sem qualquer educação. Aquele era, sem sombra de dúvidas, o momento mais divertido de toda a cerimônia e ele rezaria para que não o esquecesse na manhã seguinte por conta da ressaca. Definitivamente era algo que valia a pena ser lembrado.

— Edgar Avelar, pelos deuses, diga-me que isto que acabou de dar para a princesa não é vinho. — Evangeline chegou bem na hora em que a menina devolvia a taça de modo desperado, querendo afastar-se daquele líquido o quanto antes.

— Tudo bem, já que insiste eu não direi que é vinho. — ele respondeu com um sorriso zombeteiro no rosto, recebendo a taça de volta das mãos agoniadas de Sarah.

Evangeline deu-lhe um olhar duro, que em nada resultou. Ela entregou o prato de porcelana com uma generosa fatia de bolo para a menina, que pôs-se a comê-lo desesperadamente, no intuito de que o açúcar da guloseima lhe livrasse daquela experiência desagradável.

— Já é demasiadamente trabalhoso ter de educá-la Sir Edgar. Eu ficaria bastante agradecida se você não desfizesse aquilo que tenho tanto empenho em fazer. — ela o repreendeu com veemência. Apesar de ser o filho mais velho, portando vinte e três anos de idade, por diversas vezes a governanta havia o flagrado agindo tal qual uma criança mal-criada.

— Com todo o respeito Evangeline… — ele proferiu enquanto erguia sua taça de vinho, como se fizesse um brinde à governanta. — … servir de bom exemplo para a princesa é um trabalho seu, e não meu.

Com aquelas palavras ele verteu o restante do conteúdo de sua taça, abandonando-a ao lado de um vaso que havia próximo às poltronas. Naquela ocasião, o príncipe Allen se aproximou, sendo recebido com um largo sorriso de sua irmã mais nova.

— Está se divertindo? — ele perguntou à pequena que meneou a cabeça positivamente. Era uma mentira óbvia e felizmente Allen já estava preparado para aquilo. — Tenho alguns assuntos para resolver agora. Beatrice está na mesa de jantar, sozinha. Você disse que queria conhecê-la, não é mesmo? Por que não vai até lá lhe fazer companhia?

Sarah olhou para a direção em que seu irmão apontava. Beatrice estava sentada na mesa de jantar, meio isolada das demais pessoas. A princesa de Mivre encarava a mesa com uma expressão vazia. Muito embora a menina não quisesse admitir, ela tinha uma beleza ímpar, com olhos amendoados e o cachos dourados adornando o rosto como uma cascata. Sabia que agora teria de dividir a atenção de Allen com ela então, melhor seria se pudessem ser amigas. Com aquele pensamento em mente, ela concordou em ir até lá, sendo prontamente seguida por Evangeline.

— Alguns fidalgos gostariam de se reunir agora para discutir a situação atual de Odarin. Seu pai também participará da reunião, no entanto, eu me sentiria mais confortável se você me acompanhasse. — comentou o príncipe para Edgar. Desde que chegara à casa dos Avelar, haviam se tornado amigos e estavam sempre a fazer tratados um com o outro, beneficiando-se sempre que possível. Partilhavam de tudo: dinheiro, bebidas, mulheres e, principalmente, segredos.

— Agora? Estamos no meio de uma celebração! — Edgar protestou, tomando um copo de conhaque de um empregado que passava distraidamente ao seu lado.

Allen dirigiu-lhe um olhar severo e muito conhecido à seu amigo. A pergunta era meramente retórica. Sua presença era requisitada em prol da manutenção de alguns acordos que já haviam feito. Ele suspirou, sentindo-se vencido naquela discussão muda. Verteu o conteúdo do copo de uma só vez, abandonando-o ao lado da taça de vinho. Erguendo-se da poltrona, eles seguiram juntos até uma sala reservada, onde os demais participantes os aguardavam para que pudessem dar início às discussões.



— Você é a Beatrice Roux, certo?

Sarah praticamente brotou ao lado da noiva e não tardou em ocupar o assento vazio ao seu lado. A princesa de Mivre virou o rosto lentamente em sua direção, como se despertasse de um transe. Ela ensaiou um sorriso tímido em sua direção.

— Sim, e você deve ser a Sarah, não é mesmo? Seu irmão fala tanto de você. — ela respondeu com gentileza. A informação não era verídica, mas ela achou ser o caminho mais seguro a seguir com a pequena.

— Bom, eu não posso dizer o mesmo. — a menina confessou sem qualquer constrangimento. — Sabe, no começo eu estava muito revoltada com o fato do Allen estar se casando com uma pessoa que ele mal conhece. Mas você não parece ser tão má assim, no final das contas.

— Meu Deus! — Beatrice proferiu em meio a algumas risadas discretas. — O que a fez achar que eu poderia ser uma má pessoa?

— Bom, é que apesar de ser meu irmão, Allen mais age como um pai para mim. Então, imaginei que você fosse servir como uma madrasta. — Sarah arriscou dizer, sem pensar como aquilo poderia ser interpretado. Felizmente, a jovem noiva era uma moça espirituosa e não se incomodava com a sinceridade da menina.

— Oh não, não tenho a menor intenção de agir como uma madrasta. Não acha que seria muito melhor se fossemos amigas?

O rosto da infanta tornou-se rubro diante de tal proposta. No fundo, ela sentia um misto de felicidade e culpa. Tinha julgado a princesa de Mivre tão mal e agora ela se mostrava uma pessoa de excelente coração. Propunha-lhe uma amizade, algo que a pequena sentia tanta falta, principalmente após a fuga de Odarin. Levemente comovida, ela meneou a cabeça positivamente de modo enfático e involuntariamente soltou um bocejo. Já estava ficando tarde, mas a comemoração não dava sinais de acabar.

As duas princesas conversaram por mais alguns momentos, a maior parte do tempo sobre trivialidades, até que a mais nova não suportasse mais o próprio cansaço e adormecesse apoiada sobre a mesa. Beatrice apenas observou a cena de modo saudoso. Era a filha mais velha do rei de Mivre, mas tivera meia dúzia de irmãos mais novos e estava mais do que habituada a cuidar de todos eles. Não sendo capaz de conter a força do hábito, ela tomou a menina nos braços, sussurrando-lhe uma melodia sem letra enquanto acariciava o cabelo castanho da princesa de Odarin. Apesar de atrevida, tinha achado a pequena absolutamente adorável.

Evangeline observava tudo de longe, também estava sentada à mesa de jantar, mas levemente afastada as duas, pois gostaria de dar-lhes um pouco de privacidade. Era seu primeiro contato uma com a outra e naturalidade haveria de ser um fator importante. Ao ver Beatrice tomar a menina nos braços, ela não pôde conter um sorriso. Era quase como estar vendo sua amada Katherine segurando Sarah quando ainda era recém nascida. O sorriso tenro, o entoar de canções de ninar e a leveza das carícias, era como ver uma versão mais jovem de sua milady. A princesa de Mivre certamente faria bem à menina, não tinha dúvidas quanto a isso.

A governanta distraiu-se por um momento e quando retornou a si, já havia passado muito tempo. Os lordes e nobres haviam dado fim à reunião e o príncipe Allen dirigia-se à mesa de jantar. Seguiu em direção em noiva e, não trocando mais que algumas palavras com ela, tomou a menina nos braços e saiu do salão de festas. Evangeline imediatamente correu até onde Beatrice e Edgar trocavam gracejos e felicitações.

— Onde o príncipe Allen vai com a princesa? — ela perguntou de modo angustiado.

— Foi levá-la para o quarto, disse que já passava muito de sua hora de dormir. — respondeu Beatrice, alheia às preocupações da governanta. — Achei muito gentil da parte dele fazê-lo pessoalmente.

— Não tenha dúvidas. Allen pode ter aquela expressão meio carrancuda, mas é cuidadoso com Sarah. Eu não tive esse zelo todo com nenhum dos meus irmãos. — Edgar comentou em meio a uma risada, que fora interrompida ao perceber uma taça de champanhe abandonada à mesa. Rapidamente apropriou-se do copo, seria um crime desperdiçar uma bebida daquelas.

Evangeline por outro lado entrava em pânico com aquela situação. Levou às mãos aos cabelos da cor de trigo, não importando-se em bagunçar seu penteado ao fazê-lo. “Essa não, o que farei agora? Se ele ficar à sós com ela, sabe-se lá o que pode acontecer. Preciso fazer algo, vamos Evangeline, pense!”. Requisitou a licença dos nobres de modo apressado e sequer esperou suas respostas antes de sair correndo salão afora. Mentalmente, ela amaldiçoou o Conde Avelar por ter uma casa tão grande. Já havia cruzado muitos corredores e subido dois longos lances de escada, que levavam aos quartos de hóspedes no último andar. Finalmente chegando ao quarto destinado à princesa de Odarin, ela entrou sem nenhuma cerimônia, batendo a porta na parede com força.

Felizmente, o baque da porta não foi capaz de acordar Sarah. Seu sono era profundo, e ela encontrava-se deitada na cama de modo desajeitado. Allen estava sentado ao seu lado, concentrado na tarefa de desamarrar os laços que prendiam a sapatilha da menina em seu tornozelo. Ele sequer levantou o olhar para encarar a governanta, já esperava ser seguindo assim que saiu do salão com a irmã aos braços.

— Previsível como sempre, Evangeline. — ele comentou sem dirigir-lhe o olhar. — E muito eficiente também.

A empregada ofegava com força e dificuldade, em parte pela corrida que havia dado para chegar ao quarto, em parte pelo vestido esverdeado e apertado que comprimia-lhe os pulmões. “Ele não tentará nada em minha presença. A não ser que queira um escândalo com todos os nobres de reinos próximos presentes”.

Após terminar de retirar os sapatos da menina, Allen cobriu-lhe com um lençol fino, apropriado para o clima de Hallbridge. Terminado o trabalho, ele afastou, caminhando à passos calmos em direção à Evangeline.

— É realmente admirável toda a atenção que você dá a Sarah, sabia? É quase como se cuidasse dela com devoção.

— Não faço nada além de minhas obrigações. — a governanta respondeu de modo contido. Cerrava os dentes com força para que o jovem monarca não notasse o quanto tremia.

— Muito pelo contrário. Você vai muito além de suas obrigações, sempre. Ouso dizer que só não é mais devota à ela do que o que era a minha mãe. — Allen tocava em seu ponto fraco com consciência, divertindo-se as expressões sofridas e dolorosas da empregada. — Era uma devoção um tanto quanto doentia, você não acha?

Evangeline não respondeu aquela afronta. Ela jamais admitiria que alguém maculasse a imagem de sua adorada milady, mas que poderia fazer se seu interlocutor era o próprio filho da rainha? O príncipe aproximou-se ainda mais, ficando a um passo de distância da governanta. Tomou-lhe o queixo entre os dedos, mas ela não abaixou a cabeça. Pelo contrário, ergueu ainda mais a cabeça, desafiando-o com o olhar.

— Quer saber a minha opinião? Falta-lhe um homem que a coloque em seu lugar e lhe mostre algo que seja realmente digno de devoção.

— Nada nem ninguém será capaz de ocupar o espaço de Katherine. — ela proferiu de modo pausado, muito certa de suas palavras.

Rapidamente, Evangeline esquivou-se das mãos do jovem e tomou as sapatilhas da menina do chão, indo guardá-las em seu devido local. Allen não demonstrava mais quaisquer sinais de divertimento. Encarava a empregada de modo sério. Gostaria de dar fim à toda aquela confiança e orgulho. Possivelmente o faria, mas não naquela noite. Certo de que não encontraria mais entretenimento às custas da governanta, saiu do quarto da princesa e seguiu em direção ao seu próprio. Era chegada a hora de desfrutar de sua noite de núpcias.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "The Queen's Path" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.