The Queen's Path escrita por Diamond


Capítulo 14
Capítulo XIV - 23 de Maio de 1871




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A princesa de Odarin jamais foi uma pessoa habituada a levantar cedo pela manhã. Se não fosse pela insistência de Evangeline, ela dormiria tranquilamente até o horário do almoço, e levantaria tão somente para saciar sua fome. No entanto, desde que retornaram ao castelo para acompanhar a restauração de perto, a governanta tinha consciência do quanto a jovem vinha se empenhando, tudo para que a coroação de Allen fosse impecável e por isso vinha lhe concedendo alguns minutos extras de sono nos últimos dias. Além do mais, a princesa estava mais disciplinada quanto aos seus compromissos, colocando-os sempre à frente de suas distrações infantis. O que Evangeline desconhecia era a real motivação por trás de toda aquela produtividade.

Quase sempre Sarah aproveitava seus minutos extras de sono até o último momento, mas naquela manhã ela acordou de modo espontâneo e não conseguiu voltar a dormir. Na realidade, ela sequer desejava retornar ao sono, pois ultimamente a realidade andava muito melhor que os seus sonhos mais agradáveis. Abraçando um de seus muitos travesseiros, ela riu sozinha ao recordar-se da tarde anterior. Foi uma das raras ocasiões em que ela e Elliot passaram quase duas horas juntos, entre carícias tímidas e conversas infantis. Nos dias anteriores, eles quase não conseguiam se ver, ao menos não da forma como gostariam.

Sua animação murchou um pouco naquele momento. Apesar de estar vivendo um momento mágico em sua vida, intimamente ela gostaria que eles pudessem passar mais tempo juntos, algo além de uns poucos minutos fugidos. As pessoas em geral tinham muito apreço pelas situações proibidas, mas Sarah particularmente se sentia desconfortável com tudo aquilo. Ela gostaria de ser livre para sentir e amar sem restrições.

Um toque firme na porta de seu quarto despertou-a de seus sonhos acordados. Concedendo permissão para entrar, ela observou o momento em que Evangeline cruzou o cômodo, trazendo consigo uma bandeja farta para o desjejum da princesa.

— Já está acordada, que inesperado. — a governanta comentou enquanto colocava a bandeja em uma parte livre da cama. — Aconteceu alguma coisa?

— Não, está tudo bem. — Sarah comentou enquanto fisgava uma maçã da sua bandeja de café da manhã. A mais velha dirigiu-lhe um sorriso discreto, porém zeloso com a resposta. Enquanto comia, ambas conversavam trivialidades.

A jovem sentiu-se extremamente mal no dia em que teve de reprimir a companheira e até mesmo ameaçá-la. Ela não gostava de agir daquela maneira com ninguém, mas era inegável o quanto o humor de Evangeline havia melhorado depois do incidente. Era provável que a outra sequer tivesse consciência do modo grosseiro como vinha agindo. Internamente, a princesa estava aliviada que aqueles dias tivessem ficado para trás. Apesar de severa e nem sempre agradável em seus comentários, ela jamais negaria o quanto amava a mulher que dedicava seus dias inteiramente para cuidar de si.

— Diga, Evangeline, o que temos para hoje? — a jovem perguntou enquanto bebericava de seu chá.

— A biblioteca está simplesmente um desastre. Os livros estão todos fora de ordem e suspeito até que alguns exemplares tenham desaparecido. — a governanta comentou em um lamento enquanto levava a mão até a testa de modo dramático, arrancando uma risadinha da princesa. — Além do mais, acho que você deveria falar com o Anthony. Ouvi qualquer coisa na cozinha sobre ele precisar de alguns materiais extras.

— Eu vou falar com ele mais tarde e providenciar o que ele precisa, não se preocupe. — a jovem respondeu enquanto tomava um guardanapo de pano em mãos, limpando os cantos da boca.

Evangeline tratou de levar a bandeja com o restos de comida indesejados pela menina de volta para a cozinha e quando retornou passou a auxiliá-la na hora de vestir-se. Os dias estavam calmos e recheados de uma paz incomum. Se pudesse desejar tal coisa, a governanta pediria aos céus que jamais trouxessem Allen de volta para Odarin. Ela estava convicta de que seu retorno acabaria com todo e qualquer sossego daquela família.

— Estou com tanta saudade de Allen que você sequer imagina. — a jovem comentou enquanto sua companheira penteava-lhe os cabelos. A mais velha agradeceu mentalmente o fato da princesa encontrar-se de costas, pois só assim não iria reparar na expressão de desgosto que fez. — Também sinto muito a falta de Beatrice, tem tantas coisas que eu gostaria de conversar com ela. Até mesmo Edgar me faz falta às vezes, sua companhia me divertia bastante. Acho que acabei me habituando a viver rodeada de pessoas.

— Lady Beatrice é realmente uma companhia muitíssimo agradável, uma ótima pessoa para se ter por perto. Já o Sir Edgar aparenta ser polido, mas no fundo não passa de uma criança festeira. — a mulher comentou com sinceridade, o que arrancou uma risada da jovem.

— E apesar disso, ainda existem ao menos duas dúzias de damas interessadas em serem desposadas por ele. Engraçado isso, não?

— Será que essa dama com quem falo agora não deseja a mesma coisa? — a governanta perguntou em tom de brincadeira, mesmo já imaginando qual seria a reação da jovem.

— Quem, eu? Não seja boba, Evangeline. É verdade que eu aprecio muito a companhia de Edgar, mas ele é apenas um bom amigo e eu gostaria de manter as coisas dessa maneira. — a princesa comentou de modo decidido e aquilo encerrou a conversa das duas.

Elas logo seguiram para a biblioteca e passaram a tratar da arrumação dos livros. As serventes haviam limpado todo o ambiente, não havendo mais aquele excesso de poeira ou teias de aranha. A princesa não pôde deixar de rir ao se recordar do cervo que havia transformado o cômodo cheio de prateleiras em sua nova morada. Sarah ajudou a governanta nas primeiras horas, mas logo se entediou daquela tarefa. Organizar os livros lhe parecia tão enfadonho quanto lê-los.

Já Evangeline estava tão compenetrada em reorganizar os livros da biblioteca que sequer prestou atenção quando a jovem avisou que iria inspecionar os reparos nos fundos do castelo. Ela não mentira quando informou que iria ver como Anthony havia progredido com aquela parte da obra. No entanto, saber que Elliot estava auxiliando-o naquele dia específico a instigou a verificar aquela área em detrimento de qualquer outra.

Sarah ouviu prontamente todos os pedidos de Anthony em relação aos materiais que seriam necessários para finalizar aquela área e prometeu providenciá-los o quanto antes. Enquanto ouvia, ela olhava para os lados, sem enxergar o rapaz em local algum. Talvez estivesse no depósito, ou mesmo nos estábulos. Encerrada sua conversa, ela partiu de modo apressado, focada tão apenas naquele que desejava encontrar no momento. Para sua felicidade, encontrou-o no depósito, procurando alguma coisa em uma prateleira aos fundos do local.

Antigamente, Sarah não perderia a oportunidade de entrar de mansinho para então assustá-lo com um grito quando estivesse bem atrás dele. No entanto, naquele momento a possibilidade sequer cruzou sua mente. Incapaz de conter sua própria euforia, ela correu para abraçá-lo, ainda que pelas costas.

Elliot riu baixinho ao sentir os braços magros da princesa contornando sua cintura. Para quem estava habituado a xingamentos e bofetadas, eles pareciam agir como outras pessoas que não eles mesmos. No entanto, a única mudança visível era que agora ambos estavam bastante conscientes daquilo que sentiam.

— O que está fazendo? — Sarah questionou tão logo soltou-se das costas do rapaz.

— Nada demais, Anthony me pediu para guardar estas ferramentas antes de sair. — ele respondeu ainda sem tornar o rosto para ela. A princesa costumava ser previsível em seus questionamentos e ele bem sabia qual pergunta surgiria ali.

— Vai a algum lugar? — a princesa perguntou cheia de curiosidade, tal qual a criança que um dia havia sido. Aquilo fez com que o rapaz soltasse um suspiro pesado, o qual ela não compreendeu inicialmente.

— Tenho que ir até a cidade. Maria juntou algumas sobras de comida e eu vou levá-las para as crianças. Marco estava encarregado de fazer isso, mas hoje ele tem outras coisas para resolver aqui no castelo. — a resposta fez com que a jovem desse um passo para trás afastando-se dele, enquanto o encarava com seriedade. — Não me olhe dessa forma. É humanamente impossível para uma única pessoa trabalhar e conseguir sustentar a si mesma e mais três crianças.

— Isso não é problema seu. — ela comentou em um tom de voz baixo, ainda que mórbido. Estava além de sua compreensão o fascínio que Elliot nutria por três crianças que sequer faziam parte de sua família.

— Sarah, alguma vez você já passou fome na vida? Não falo de atrasar uma refeição por algumas horas. Estou falando de passar dias sem ter absolutamente nada dentro de uma despensa. — ele questionou enquanto finalmente tornava o rosto para ela. Estava tão sério quanto no dia em que discutiram. Houve um minuto de silêncio, uma vez que não era necessário responder o óbvio. — Porque eu já e é a pior coisa que pode acontecer a alguém. Nenhuma pessoa, principalmente uma criança, deveria ser obrigada a passar por uma situação dessas. Jacques costuma dizer que uma pessoa que não está apta para servir também não está apta para viver. O que eu puder fazer para aliviar o sofrimento daquelas crianças eu o farei, goste você ou não.

Ele não estava exaltado em momento algum de seu discurso. Na realidade, sua esperança de que a jovem princesa compreendesse melhor a realidade em que ele se encontrava no fato de que nenhum dos dois poderia se exaltar. Se aquilo acontecesse, os ouvidos se fechariam para qualquer pensamento e eles passariam a atacar um ao outro num nível pessoal, tal qual havia acontecido da última vez. Elliot sequer gostava de lembrar daquele dia em questão e da forma como se sentiu afetado pelas palavras duras da menina.

Sarah o encarava sem saber ao certo o que dizer. Aquela reflexão jamais passou por sua mente e ela estaria mentindo se dissesse que não sentiu o impacto daquelas palavras. O silêncio reinou por alguns instantes, enquanto a princesa tentava digerir aquelas informações. Ela não tinha razões reais para desconfiar do rapaz, mas a sensação de insegurança era constante. E o que lhe irritava mais naquela situação era o fato de não conseguir controlar aquele turbilhão de emoções.

— Já que é assim, eu gostaria de pedir uma coisa. — ela mencionou com um tom de voz baixo, quase um sussurro, enquanto aproximava-se novamente do rapaz, passando a segurar uma das mãos dele. — Será que eu posso ir com você?

O pedido foi feito de modo infantil e surpreendeu a Elliot, que não esperava por nada do gênero. Diferentemente do que ele poderia pensar, Sarah não estava incomodada com o fato do rapaz cuidar daquelas crianças como se suas fossem. A realidade é que já era suficientemente difícil eles se verem estando ambos dentro da circuncisão do castelo. Se ele fosse constantemente à cidade, seus encontros iriam se tornar ainda mais escassos.

O jovem tratador de cavalos sorriu de modo bobo ao perceber aquilo. A resposta para aquela pergunta não veio em palavras. Ao invés disso, ele levou ambas as mãos até a bochecha da princesa, fazendo-a inclinar o rosto levemente para trás, o que lhe permitiu ter amplo acesso àqueles lábios. O beijo foi casto e não durou muito, apenas o suficiente para que ela tivesse certeza uma coisa: ele estava lá e não pretendia ir a lugar algum sem ela.

— Vamos? — ele perguntou tão logo afastou-se dela. Sarah sorria com os olhos quando meneou a cabeça positivamente, colocando-se na ponta dos pés para dar-lhe mais um beijo antes de seguirem para o centro de Odarin.



A brisa marítima balançou os cachos de Beatrice, obrigando-a a segurar seu chapéu de verão caso não quisesse que este se fosse voando junto ao vento. Em Hallbridge, o frescor do território litorâneo era a única coisa que lhe confortava, pois a região era demasiadamente quente durante todo o ano, mal sendo afetada pelas mudanças de estação. Acostumada ao clima temperado de Mivre, lhe parecia bastante aborrecido ter que andar sempre com um leque à mão e um chapéu para proteger-se do sol implacável. Ela tornou para o lado um instante, apenas para invejar o sono profundo de Margot. A gatinha (que àquela altura já estava enorme) ronronava baixinho e parecia relaxar cada vez mais sempre que sentia a brisa um pouco mais forte balançando-lhe os pêlos cinzentos.

— Você não parece muito feliz de estar partindo de Hallbridge. — Gilbert comentou enquanto aproximava-se da jovem princesa, permanecendo de pé ao lado dela, em um dos muitos bancos dispostos no jardim de sua morada.

— Engano seu, mal posso esperar para chegar em Odarin. — ela respondeu enquanto se abanava com um pouco mais de vigor que o normal. — Dizem que o ar é gélido e que em todos os lados que se olhe existem árvores centenárias, tornando o clima muito mais ameno que o daqui.

— Depois de tantos anos, como é possível que não tenha se adaptado ao clima? — ele questionou enquanto erguia uma das sobrancelhas, encarando-a de modo curioso.

— Não há como se adaptar a esse sol escaldante, é simplesmente insuportável. Devo estar toda queimada do sol, inclusive. — ela comentou enquanto apalpava as próprias bochechas com a palma da mão, sentindo a pele quente debaixo dos dedos.

Gilbert não pôde deixar de achar o gesto adorável. Ele não compreendia como as pessoas tomavam a princesa de Mivre como alguém desinteressante. Ela tinha uma personalidade única que por vezes ficava oculta debaixo de camadas de polidez e educação. Isso não significava que ela, em sua essência, não estivesse lá, pronta para ser explorada. O ar distraído e a postura sempre impecável formavam um conjunto delicado e raro naquela região. O filho mais novo do Conde Avelar sempre havia considerado as mulheres de Hallbridge rudes demais para o seu gosto e a própria noiva de seu irmão era a comprovação perfeita daquele fato infeliz.

— Tenho certeza de que quando chegar lá você vai implorar para retornar… — ele comentou de maneira vaga, enquanto utilizava as costas do dedo indicador para acariciar-lhe a face. De imediato, a princesa afastou a mão com o cabo do leque que usava, encarando-o bastante estupefata.

— Já lhe disse dezenas de vezes para que não faça esse tipo de coisa. — Beatrice ralhou no mesmo instante em que afastava sua mão. Não era a primeira ou a segunda vez que ela passava por aquele tipo de situação. — Preciso lhe lembrar, mais uma vez, que sou casada.

— Você acha que Allen não faz a mesma coisa? Tenho certeza que não, é mais inteligente que isso, Beatrice. — ele respondeu enquanto cruzava os braços, sentindo-se intrigado com a fidelidade cega da princesa. Charlotte jamais tentou ocultar seu relacionamento espúrio e o fazia com muito orgulho de si mesma. Se Gilbert estivesse na pele na princesa de Mivre, faria questão de revidar cada noite de traição.

— Isso não é relevante. — ela respondeu enquanto tomava Margot em seus braços. A gata acordou levemente assustada, mas logo se aninhou no colo de sua dona para dormir novamente. — É o tipo de falha pessoal que eu não pretendo cometer.

Dito aquilo, Beatrice levantou-se de onde estava e retirou-se do jardim sem pensar duas vezes. Suas respostas em relação às investidas do rapaz eram sempre decididas naquele sentido, mas ao invés de desencorajá-lo, os reiterados “nãos” pareciam atiçar a curiosidade e o desejo de Gilbert ainda mais. Quando não estava importunando-a ele conseguia ser uma companhia bastante agradável. Para sua infelicidade, as conversas amigáveis quase sempre terminavam daquela maneira.

Da janela de seu próprio quarto, Allen observava a cena enquanto degustava algumas drágeas de chocolate, dispostas dentro de uma taça de vidro. Nada passava despercebido pelos olhos e ouvidos do príncipe de Odarin. Há tempos já era de seu conhecimento que Beatrice vinha sendo cortejada pelo jovem Gilbert e a situação por si só lhe parecia irrelevante demais para tomar qualquer atitude. No entanto, o que lhe intrigava profundamente eram as negativas constantes de sua esposa. Ele não sabia precisar se ela não estava interessada no filho mais jovem da família Avelar ou se era consciente da onipresença de Allen. “Para o seu bem, é bom que seja a última opção”, ele pensava enquanto levava a última drágea à boca, repousando a taça sobre uma mesa.

— Ainda não acredito que você vai embora dessa maneira. — as palavras foram proferidas por uma voz feminina, entoadas de forma pesarosa. O protesto foi acompanhado de um par de mãos delicadas e sorrateiras que subiram pelo peitoral do príncipe enquanto era abraçado por trás.

— E o que mais você esperava? Que eu ficasse aqui para sempre? — Allen respondeu de modo seco como de costume. Ainda assim, ele cobriu as mãos que o acariciavam com as suas, a única forma que tinha de retribuir aquele pequeno gesto. — Eu ainda tenho meu próprio reino para governar.

— Você bem que poderia deixar sua irmãzinha lá para sempre. Surpreendentemente, ouvi dizer que ela está fazendo um ótimo trabalho. — Charlotte sugeriu, enquanto repousava a bochecha sobre as costas do rapaz. Como resposta, ela recebeu um olhar duro sobre o ombro, que dispensava maiores comentários.

— Eu já me afastei por tempo demais. — ele comentou enquanto retirava as possessivas mãos de cima de si. — Mais do que isso e logo comecarei a perder a credibilidade e o respeito.

— Eles não seriam loucos de fazer isso. — ela comentou enquanto observava seu amante tornar o rosto para si. Para sua surpresa, Allen levou uma das mãos até seu rosto, afagando-o com uma delicadeza rara entre eles.

Gestos como aquele não faziam parte da rotina dos dois, o envolvimento deles estava um nível acima. O tempo era escasso e nenhum dos dois fazia questão de maiores romantismos. O desejo quase sempre falava mais alto. Além disso, havia um mudo acordo entre eles de que cortejos e sentimentalismos eram absolutamente desnecessários.

Ainda assim, a ruiva não desperdiçaria aquilo e fechou os olhos para poder apreciar melhor a carícia. Ao perceber a guarda baixa, o príncipe levou o rosto em direção ao pescoço desnudo da jovem, distribuindo ali algumas leves mordidas, fazendo Charlotte soltar suspiros baixos. Com a mão livre ele massageou a cintura por alguns segundos, até subir a mão para um dos seios dela.

— Eu vou morrer de saudades. — ela comentou com a voz levemente chorosa, enquanto passava os braços ao redor de seu pescoço, tentando desesperadamente manter-se de pé.

— Neste caso, é melhor que tenhamos uma despedida apropriada. — ele respondeu em meio a um sorriso, que foi ocultado ao tomar os lábios dela entre os seus.



Dimitri, Gregory e Rosetta estavam sentados em círculo, muito compenetrados em sua própria brincadeira, que envolvia alguns galhos de árvores e muitas pedras cinzentas e roliças. Apesar disso, eles mantinham atenção constante na movimentação da rua, sempre alertas para quem quer que se aproximasse de sua casa. Eles logo repararam quando a antiga carroça de Elliot começou a se aproximar, pois o som do trote de Petruchio e Pipo era inconfundível.

Os meninos fizeram uma enorme algazarra em volta dos cavalos tão logo eles pararam de caminhar. Dimitri vivia questionando quando os rapazes iriam ensiná-lo a cavalgar e apesar de já conhecer a resposta, ele ainda irritava-se todas as vezes que lhe diziam ser pequeno demais para montar em animais daquele porte. Como se já não se sentisse humilhado o bastante, Marco ainda dizia que lhe traria um pônei tão logo encontrasse algum perdido por aí.

Assim que desceu da antiga carroça, Elliot estendeu a mão para ajudar a princesa a descer do veículo. Por um instante ela se recordou de todas as vezes que Edgar lhe estendia a mão, mesmo sabendo que a gentileza seria bruscamente declinada. Não pretendia fazer o mesmo com o jovem tratador e aceitou a ajuda de bom grado.

Os meninos o cumprimentaram de modo eufórico e o rapaz percebeu quando a pequena Rosetta correu para os fundos da casa, provavelmente para avisar Delia de sua chegada. Ele não pretendia perder muito tempo ali, afinal, não gostaria de estragar o bom humor de Sarah delongando-se mais que o necessário. Além do mais, havia ainda uma porção de coisas a serem entregues para Anthony antes do entardecer.

A moça ruiva logo apareceu na porta de casa, sorrindo-lhe de modo gentil. O cabelo estava bastante desarrumado, indicando que o que quer que estivesse fazendo, demandava-lhe muito esforço. Os dois trocaram poucas palavras antes de Elliot levar os caixotes de comida para dentro da casa. Não passou despercebido dos olhos de Delia a presença da princesa, que mantinha-se ao lado dos cavalos.

— É bom vê-la novamente, Sarah. — a camponesa mencionou enquanto se aproximava com um sorriso amável no rosto.

— Delia… — a jovem não sabia bem o que dizer. Tudo que lhe vinha à mente era a forma rude como havia deixado aquela residência da última vez em que estivera lá. — Perdoe-me pelo outro dia. Eu não deveria ter saído daquela maneira.

— Bobagem, não se incomode com isso. — a ruiva balançou as mãos, demonstrando não estar nenhum pouco preocupada com aquilo. E de fato não estava. Ela já havia convivido com nobres o suficiente para perceber que seu estado de espírito atual sempre falava mais alto que qualquer regra de etiqueta. — Imagino que já não nos veremos mais com frequência, deve ter muitas coisas a se fazer no castelo.

— Sim, ainda há muito a ser feito. A coroação será daqui algumas semanas. Confesso que estou ansiosa, sinto muito a falta de meu irmão e sua esposa, Beatrice. Ela é adorável, prometo trazê-la aqui para apresentar seus vestidos!

— Espero que ela se empolgue com eles tanto quanto você. — Delia respondeu em meio a uma risada. Era um alívio ver que as coisas estavam bem entre elas, a princesa não era como as demais pessoas de sua classe social. Ela tinha o espírito mais humano que muitos à sua volta. — Certamente haverá um baile para celebrar o retorno de sua família, não é mesmo? Eu já estive em um baile uma vez, é uma festa mágica.

— Mais ou menos. É um pouco enfadonho quando se vai a tantos deles. — Sarah riu ao confessar que não se sentia à vontade em situações como aquela. Então, um estalo lhe veio a mente e ela se perguntou como não havia pensado naquilo antes. — Inclusive, haverá uma orquestra tocando para todos no dia do baile. O tenor é muito amigo de meu irmão, tenho certeza de que ele poderia lhe introduzir a ele.

— O quê? — a camponesa questionou num salto, sendo pega de surpresa com aquela proposta. — Será que você perdeu o juízo? Eu, sendo apresentada a um tenor? Vão me expulsar do castelo com uma vassoura, isso sim.

— Não diga bobagens nem se faça de desentendida, Delia! Já vi você tocar flauta várias vezes, você é uma artista, merece estar junto a uma grande orquestra e não tocando nas ruas por uns trocados. — a princesa comentou de modo eufórico, já bastante empolgada com a possibilidade de ter uma amiga para lhe fazer companhia durante o baile da coroação.

— Sarah, a proposta é incrível, mas eu sequer tenho roupa para um evento desses. Tenho certeza de que vou passar vergonha.

— Faça um vestido! O mais elegante que puder. Eu prometo pagar pelo tecido depois, e então poderá ficar com ele. Mas não jogue esta oportunidade fora, você merece mais do que isso.

— Eu não sei… prometo pensar no assunto, tudo bem? — a ruiva propôs ao ver que Elliot saia de dentro da casa, ao terminar de armazenar as caixas de sobras que havia levado.

Logo eles se despediram, deixando a camponesa sozinha com suas crianças e seus pensamentos conflituosos. Delia estaria mentindo se dissesse que não se sentia balançada pela proposta. Música era sua maior paixão e fazia parte de seu sonho pessoal ingressar em alguma orquestra. Claro que a perspectiva foi se tornando distante cada vez que ela tirava uma criança das ruas e a levava para dentro de sua própria casa. No entanto, ali estava uma oportunidade que jamais iria se repetir, acenando-lhe de modo sedutor.

É só um baile, Delia. Você já esteve em um antes, não deveria se sentir tão insegura com isso”, ela pensou enquanto entrava em casa. Logo seus olhos fitaram a flauta prateada sobre a mesinha de centro de sua sala. “Não é como se eu fosse passar a noite inteira entre os nobres. Eu só quero falar com o tenor, apenas isso”.

Com aquilo em mente, ela logo seguiu para o quarto onde guardava os tecidos e seus utensílios de costura. Sem que se desse conta, ela logo passou a divagar sobre qual tecido e qual modelo seriam mais adequados para um baile real. Enquanto pensava, a ruiva cantarolava uma melodia baixinho, uma mania que trazia consigo desde criança. A princesa estava disposta a arcar com os custos do tecido, então não teria muito com o que se preocupar.

Afinal de contas, era só um baile. O que poderia dar errado?


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