Obsessão escrita por Lucy Devens


Capítulo 9
Flashback




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As cordas estavam deixando meus pulsos com marcas e minha pele estava queimada de tanto eu me mexer. Eu estava começando a ficar paranoica. Não tinha a menor noção do tempo, tudo o que eu tinha para me indicar as horas, talvez, era a minha fome. O homem aparecia de vez em quando e ficava horas comigo no quarto, apenas me observando, sem dizer nenhuma palavra. Eu tentava decifrar seus pensamentos através de suas expressões. Parecia haver confusão, raiva, medo e as vezes até desejo... Depois de ficar um tempão comigo ele desaparecia e eu não tinha a menor ideia de quando voltaria. Não sabia o que era pior, se era ficar totalmente sozinha ou com ele, que tinha um comportamento indecifrável. Aprendi que eu não deveria respondê-lo, que não deveria ser mesquinha, que essas coisas só me traria mais angústia.

Naquele momento eu estava sozinha, faminta e desesperada, pensando que ele podia ter me deixado ali para morrer de vez. Eu estava sentada no chão próxima ao pé da cama. Fiquei horas mordendo a corda, tentando afrouxá-las para que eu pudesse escapar. Assim que elas começaram a se afrouxar eu não pude evitar em rir um pouco. Me veio a mente que, definitivamente, eu estava ficando louca, mas não conseguia reprimir a felicidade de ter adquirido uma esperança de sair de lá. Só que não durou muito. Pude ouvir alguém entrando na casa, o ruído da porta abrindo e fechando, seguido de um barulho alto da porta batendo, o que me fez tremer. Ouvi seus passos até o quarto em que eu estava.

— Trouxe o seu almoço - Ele disse assim que abriu a porta.

Almoço. Então deveria ser depois do meio dia, mas de que dia?

— O que é isso? - Ele se aproximou rapidamente e puxou a corda que me amarrava ao pé da cama com violência, o que fez com que eu fosse puxada também - Está tentando escapar? - Ele riu.

Eu não disse nada, fiquei imóvel. Ele se sentou na cama e acendeu um cigarro, depois ficou me encarando. Eu não olhei de volta. Estava encarando a sacola de papelão que ele trouxe e deixou perto da porta, eu não tinha como alcançá-la.

— Estava tentando fugir, é? - Ele disse e eu tremi ao ouvir sua voz, mas não respondi - Por que você não olha para mim?

Continuei quieta, apenas encarando a sacola de papelão que tinha a minha comida. Eu podia sentir o cheiro que vinha dela, parecia se espalhar violentamente pelo quarto, ou talvez a minha fome fosse tanta que toda a minha concentração foi parar ali. Ele saiu da cama e se agachou na minha frente. Ele pousou o cigarro nos lábios e segurou meu cabelo com força, sacudindo a minha cabeça. Lutei para não olhar em seus olhos, apesar dele estar se aproximando cada vez mais, fazendo com que meus olhos e narinas ardessem por conta da fumaça do cigarro. Ele tirou o isqueiro do bolso e acendeu o fogo perto do meu rosto.

— Você é tão bonita - Ele disse, sorrindo - Seria uma pena se algo acontecesse com a sua pele, com o seu cabelo... - O homem guardou o isqueiro no bolso e acariciou o meu rosto. Tentei me desvencilhar dele, mas ele continuava me segurando firme, com um sorriso malicioso no rosto - Se não fosse tão oferecida, não estaria aqui.

Uma lágrima caiu de um olho meu e eu me odiei por isso. Me odiei por estar naquela situação e pensei nos mil cenários que eu poderia estar, se eu realmente não tivesse me colocado ali.

O rapaz me empurrou no chão e montou encima de mim, livrando-se da jaqueta que usava. Nessa hora o desespero tomou conta e mil coisas terríveis se passaram pela minha cabeça.

—Por favor - Eu disse, tentando não choramingar - Não faça isso.

— Sh, sh - Ele levantou a minha blusa e acariciou minha barriga. - Você fica melhor quando está quietinha.

Mais lágrimas, mas dessa vez o instinto falou mais alto e eu tentei me livrar dele, fazendo o máximo de esforço possível, tentando lutar, mas era inútil. Ele havia me prendido como um cachorro maltratado no quintal. Segurava a corda que prendia meus pulsos, a única coisa que eu conseguia mexer eram as minhas pernas e meu tronco, mas não havia saída daquilo e ele parecia se divertir enquanto via meu desespero.

— Por favor - Eu implorei - Por favor, não toque em mim. Tudo menos isso.

Ele levantou ainda mais a minha blusa e apagou o cigarro na minha barriga. Eu gritei de dor e ele saiu de cima de mim. Assim que ele o fez, eu me encolhi e fiquei em posição fetal, com uma mão cobrindo a ferida que ele havia feito. Ele jogou a sacola de papelão do meu lado.

— Coma - Disse ele - Você está ficando magra demais. Assim ninguém vai te querer - Ele foi embora, mas logo sussurrou - Eu mesmo já não sei se quero.

O homem saiu e fechou a porta. Consegui ouvir os barulho de chaves e a porta se trancando. Eu sabia que mesmo se me livrasse da corda, ainda estaria presa. Me encolhi ainda mais e chorei em silêncio até o cheiro de comida esvair-se do quarto por completo.

 

Acordei com o barulho de uma porta se abrindo e me levantei rapidamente, ficando de pé. Meus músculos pareciam responder antes de qualquer outro órgão do meu corpo, pois eu ainda estava tentando decifrar onde eu estava. Eu tinha que mostrar que estava atenta, tinha mostrar que estava preparada...

Ally entrou pela porta da frente e logo que me viu, arregalou os olhos, claramente confusa.

— O que foi? - Disse uma voz grave e sonolenta atrás de mim.

Eu levei um susto e me virei rapidamente. Cameron estava deitado no sofá, coçando os olhos. E foi assim que eu me lembrei da noite anterior, da bebedeira, da festa. A adrenalina estava tão forte no meu sangue que eu mal sentia os efeitos do excesso de álcool.

— É meio triste ver vocês na sala totalmente vestidos - Disse Ally em tom de brincadeira.

Ela deixou aquilo no ar e foi para o seu quarto. Eu a acompanhei com os olhos, ainda muito tensa, tentando apagar aquela memória que havia aparecido no sonho. Eu tinha um nó na garganta que me impedia de dizer qualquer coisa. Sentia todos os músculos do meu corpo rígidos, como se eu eu estivesse pronta para fugir se precisasse. Cameron olhou para mim e pude perceber que ele logo despertou. Então ele se levantou e chegou perto de mim.

— Está tudo bem? - Ele perguntou, preocupado.

Não pude evitar e me abracei. Rapidamente me passou pela cabeça a lembrança do dia em que ele me conheceu. Eu me abraçava com medo e não conseguia dizer nada, exatamente como eu estava agora.

Cameron se aproximou e apertou meu braço de leve. O simples contato de sua mão no meu braço fez com que eu relaxasse um pouco.

— Eu estou bem - Finalmente disse, vencendo o nó na garganta - É só que... - Não encontrei palavras. O que eu iria dizer? Não tinha a menor ideia. Não queria compartilhar minha memória. Era como se falar sobre ela fizesse com que ela se tornasse ainda mais real.

— Tudo bem - Ele disse e sorriu gentilmente.

Eu sorri de volta e tentei mudar de assunto.

— Desculpa ter feito você dormir no sofá - Eu disse.

— Na verdade eu dormi muito bem - Ele riu, eu notei que ele percebeu como eu mudei de assunto do nada e eu fiquei grata por ele simplesmente entrar no jogo, sem me pressionar e perguntar mil coisas - O sofá é bem confortável e foi bom não ter dormido sozinho.

— Eu pensei que vocês iriam dormir nus, ou algo do tipo - Ally apareceu na porta do seu quarto.

Cameron riu e eu também.

— Tchau, Ally - Eu disse e ela sorriu, voltando para o quarto.

— Bom, eu tenho que ir - Disse ele - Posso te ligar depois?

Meu coração palpitou e dessa vez foi de um jeito bom. Fiz que sim com a cabeça e sorri. Levei-o até a porta, onde ele me deu um beijo carinhoso na testa.

— Te vejo depois - Disse ele.

— Com certeza - Respondi, sem me preocupar em esconder o entusiasmo.


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