Hearts Of Sapphire escrita por Emmy Alden


Capítulo 9
¨e i g h t¨


Notas iniciais do capítulo

Aqui vai mais um capítulo ♥ não se esqueçam de comentar o que estão achando ♥



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/738717/chapter/9

Toda Excelsior acordara cedo naquele dia.

O clima de expectativa—para não dizer tensão— estava impregnado até no perfume natural das pessoas.

As Casas Centrais de todos os dez vilarejos humanos se preparavam para anunciar ao meio dia os dois Escolhidos de cada um deles para aquele Sacrifício fora de época. O Pronunciamento aconteceria pouco depois do anúncio.

Mattia tentava organizar as crianças naquele dia. Como a mais velha do abrigo de órfãos, ela era responsável por ajeitá-los quando as senhoras que cuidavam do lugar simplesmente decidiam que não estavam dispostas a fazer o trabalho do dia. Todas se dispersavam no mesmo dia. Sempre no dia da Escolha do Sacrifício.

A menina compreendia que algumas delas eram mães que queriam passar, o que poderiam ser, as últimas horas com seus filhos, mas todas as outras —que não eram mães— também se aproveitavam daquilo.

O trabalho naquele período era extremamente cansativo. As crianças estavam agitadas demais, algumas delas haviam participado de sua primeira Audição e ainda repassavam o trauma em suas mentes, outras estavam desesperançadas já que grande parte dos processos de adoção era cancelada pelos próprios "futuros pais".

Ninguém queria se apegar a uma criança apenas para tê-la tirada de si dias depois.

Todos participavam do processo de seleção tendo família ou não.

Mattia tivera sua adoção cancelada duas vezes durante todos os anos que passara no abrigo. Uma quando a menina tinha dez anos e outra quando tinha doze. Ambas três dias antes das Audições começarem.

A garota não se importava com isso. Não de verdade. Não se importava se seria escolhida ou não. De uma maneira ou de outra, acabaria miserável. Ou com a morte para diversão dos deorum ou com a desgraça de morar nas ruas quando fizesse vinte anos e o abrigo a expulsasse de lá.

Não se importava, a jovem repetia consigo mesma.

Nunca desejou uma vida longa, de qualquer forma.

Sua mãe já havia repetido a mesma reza antiga umas cinco vezes antes que Conall saísse pela porta.

Os irmãos esperavam-no do lado de fora com sorrisos bobos nos rostos, prontos para provocá-lo quanto àquilo. Porém, nem aqueles sorrisos poderiam esconder a temerosidade que estava encravada dentro de cada um dos olhos.

O rapaz era o mais novo na família e —poderia dizer— era o mais querido por todos.

Seus irmãos não tinham mais idade para participar do Sacrifício e dar preocupação à mãe, mas o caçula ainda tinha mais um ano pela frente. Cada vez que sua mãe precisava pará-lo antes de sair para fazer suas orações de proteção —num idioma que ele não entendia muito bem—, o jovem se odiava um pouco mais.

—Já pedindo aos Céus para que te escolham de uma vez e você não precise acordar cedo para ir às minas, Nallie?— o irmão mais velho provocou dando dois tapinhas fortes demais no ombro do mais novo.

Conall apenas sorriu, apesar do apelido ridículo que odiava.

—Se estivéssemos lá dentro, nossa mãe iria te dar uma surra pela brincadeira de mal gosto e você iria ter que lamber suas próprias feridas para se curar.— foi o irmão do meio que se pronunciou e os três riram.

A mãe, que observava da porta, repetiu novamente a oração que lhe fora ensinada há muito tempo. E esperou que ainda surtisse o mesmo efeito que a pessoa que lhe ensinara disse que faria.

Tabbris, aparentemente, não tinha muita pressa ao trotar para a Praça dos Anúncios.

Corinna encontrou seu pai dormindo no sofá rodeado de livros quando acordara pela manhã. A menina não tinha dúvidas que o homem passara a noite procurando uma solução para o pequeno problema dela.

As carroças já passavam a todo pique pela moça. As pessoas também. Faltavam apenas alguns minutos para o Sol se posicionar forte e glorioso no meio do céu.

A garota segurava a rédias da égua com uma mão e com a outra mexia no bolso de seu vestido. Lá dentro, Corinna materializava e desmaterializava a caneta. Sentia-se uma criança tola que acabara de receber seu mais novo brinquedo, contudo não conseguia parar. Era viciante e, de certa forma, mais calmante do que roer suas unhas com a ansiedade para a Escolha.

Quando uma jovem imaginaria que ela, humana, poderia realizar qualquer coisa perto de se relacionar à magia?

Era um segredo que Corinna gostava que fosse só seu. Seu e de seu pai.

As duas pessoas em quem mais confiava no mundo.

A menina mal notou que o barulho costumeiro do centro do vilarejo havia sido substituído por um silêncio enervante. Desceu da sela sem pressa e prendeu Tabbris a uma árvore mais próxima de uma fonte.

As poucas pessoas que ainda não estavam no centro do formigueiro humano que se tornava a Praças dos Anúncios mal reparavam na garota que colocava uma das mãos sobre os olhos e observava o céu.

Só mais alguns minutos e então…

Um grito seguido por um choramingo que foi seguido por outro grito.

Os nomes haviam sido divulgados.

Mattia não fora para a Praça dos Anúncios de Amara— seu vilarejo— com as outras crianças.

Uma hora antes, um novo ataque de dor de cabeça havia lhe atingido. Já era um costume.

As febres, as dores de cabeça e o sono perturbado. Desde a primeira vez que ocorrera os sintomas, não passava um dia sem que ela sentisse um deles.

Talvez a garota estivesse doente. Talvez a morte estivesse mais próxima do que ela imaginara. Talvez tivesse sorte uma vez na vida.

A menina se observava no espelho. Os olhos, que eram de um castanho avermelhado, não pareciam tão cansados quanto esperava. Os cabelos cor de vermelho sangue na altura do queixo não pareciam tão opacos como deveriam estar se estivesse seriamente doente.

Não era adotada porque passara da idade desejada pelas famílias, porém também não servia para ajudante, visto que as mulher temiam a possibilidade de perder seus maridos.

Como se algum deles fosse escolher uma pessoa que foi a vida toda uma sem-teto, órfã, uma qualquer que não tinha nenhum recurso.

A moça não reclamava, entretanto, havia aceitado que a única pessoa que se dignara a ser boa em sua vida, fora uma senhora—já falecida— que a ensinara o básico da leitura e da escrita. Um presente que a menina nunca poderia retribuir, mas que pelo menos lhe dava algum escape daquela vida confinada naquele ambiente minúsculo. O acervo de livros do abrigo era precário, mas dava para o gasto.

Mattia alisava seu vestido surrado quando uma das crianças entrou correndo porta adentro com uma senhora mal humorada em seu encalço. O garotinho tinha lágrimas nos olhos quando segurou a saia do vestido da garota.

Ela se preparou para o pior.

—Tia, escreveram seu nome na Praça dos Anúncios.

Naquele momento, até a a dor de cabeça parou.

Não conseguia acreditar em seus ouvidos, então apenas ficou paralisada no lugar até que a senhora disse:

—Você é uma das Escolhidas, Mattia, estão pedindo que você se apresente.

Algo se acendeu dentro da moça, entretanto não pendia nem para tristeza, muito menos para felicidade.

Era algo bem mais selvagem.

O trabalho das minas foi suspendido uma hora antes da Escolha.

A mãe de Conall já estava na Praça dos Anúncios de Nix desde quando o menino e os irmãos saíram para o trabalho. O tio deles acompanhava a viúva por questões de saúde. Conall era bem mais parecido com o homem —tanto no físico como nos trejeitos— do que com qualquer pessoa em sua casa.

Quando o jovem chegara no local pessoas já se abraçavam e algumas choravam. Era certo que ele e os irmãos não chegariam a tempo para o anúncio, contudo algo naquelas demonstrações fez seu coração apertar. Estava acelerado no peito quando abriram espaço para que o rapaz passasse. No fim do corredor humano, o caçula pode ver seu tio primeiro, que tinha um olhar que o menino vira poucas vezes e não era capaz de interpretar.

Sua mãe desabou em lágrimas no momento em que pôs os olhos nele. Conall queria lamentar, como os irmãos que o abraçavam sem nenhuma tentativa de esconder as lágrimas. O garoto procurou profundamente aquele sentimento de tristeza dentro de si, porém não encontrou nada além de resignação.

Havia sido escolhido, e daí?

Era como as coisas deveriam ser.

O nome era bem claro no papel. Entretanto, ele releu diversas vezes tentando assimilar a gravidade daquilo. A realidade daquilo.

Kallien virou-se e encontro mais da metade da cidade o observando. Uma outra família se desesperava logo ao lado da sua.

O garoto franzino que tinha sido escolhido além dele estava praticamente se desidratando de tanto chorar.

Steros, é claro, procurava uma única pessoa que realmente queria ver naquele mar de gente. O que ela acharia de ele ter sido escolhido e ela não?

Por um lado, o rapaz se sentia aliviado. Mil vezes iria no lugar dela para não ter que saber que a menina participaria daquilo.

Corinna estava afastada do aglomerado olhando para o céu como se ele fosse poupar-lhe o trabalho de caminhar no meio das pessoas para descobrir o resultado da Escolha e colocaria os nomes entre as nuvens.

Os pés do menino movimentaram-se antes que pudesse comandá-los para que o fizessem. Chegou ao mesmo tempo que o senhor Lestat se colocava ao lado da moça.

O amigo não precisou dizer nada para que Corinna lesse o que estava em seus olhos.

Ela apenas se jogou nos braços dele.

Era para ser diferente.

Kallien havia sido escolhido. Iria para o Sacrifício. Iria para o Setor Superior. Lutar pela própria vida.

Corinna simplesmente esperava que a ficha caísse rápido. De preferência antes que saísse do abraço do rapaz.

Não foi o que aconteceu.

Já tinham se abraçado e se separado umas três vezes e nos intervalos eles apenas se encaravam sem dizer nada.

O zunido dos únicos três alto falantes antigos localizados nos postes centrais da Praça dos Anúncios tiraram ambos do transe. Os choros também pararam. Todos sabiam o que aquilo significava.

Uma voz bonita — que Corinna reconheceu como a de Laeni— ecoou.

Os Escolhidos devem estar preparados para o Pronunciamento entre o fim da tarde alta e o começo da tarde baixa. Qualquer resistência será punida com ações previstas nas Novas Leis. Boa tarde.

Aquilo queria dizer que Kallien seria oficializado como Escolhido do vilarejo de Fortuna — junto com o menino que ainda soluçava baixinho — aproximadamente às quatro da tarde.

A ausência do som poderia muito bem se tornar uma pessoa de carne e osso naquele momento. Era de conhecimento geral o que os deorum consideravam resistência tão bem quanto o que consideravam punição.

Foram poucos minutos para que a comoção e a multidão começasse a se dispersar, voltando para sua rotina diária. Pela primeira vez, a família de Kallien não fazia parte das que caminhavam aliviadas regressando para casa ou para o trabalho.

As pessoas mal tinham dado cinco passo para longe da Praça quando outro zumbido soou.

O coração de Corinna deu um salto.

Aquilo não era nada bom.

A voz que soou pelo aparelho não era a de Laeni.

Por favor, permaneçam todos na Praça. Atividade rebelde foi detectada.

 

Uma lágrima de Callandrea parou no meio do caminho quando encarou o irmão sendo envolvido por Ailani. Kallien, por sua vez, encarou com o cenho franzido Corinna que olhava para seu pai.

Tinha uma centelha de surpresa no olhar do homem, porém a filha sentia que algo não estava nos conformes. Evian Lestat não era do tipo que ficava calado ou quieto numa situação daquelas.

Além do mais, a não ser que o senhor tivesse saído de casa logo após a garota, como havia chegado ali tão rápido?

A porta da Casa Central foi aberta com um estampido.

Dez guardas saíram de lá de mãos vazias e Corinna sabia muito bem o porquê. Aqueles homens não precisavam de muito além de suas próprias mãos para fazer um estrago. Os deorum fardados com túnicas cinzas, que pareciam refinadas, mas não dificultavam a mobilidade, posicionaram-se em cada saída e extremidade do local.

Kallien foi com Callandrea e Ailani em seu encalço para o lado da mãe que parecia prestes a desmaiar.

Corinna e seu pai caminharam em direção a Tabbris que estava temerosa com um dos imponentes guardas bem ao seu lado.

A garota se aproximou da égua e consequentemente do homem que tinha—como todos os outros— o rosto coberto por uma espécie de máscara de ferro. Ela era capaz apenas de visualizar seus olhos, com o costumeiro aro colorido ao redor da pupila.

—Fique aqui. Vou tentar descobrir o que está acontecendo.— A moça não teve tempo nem de rebater a ordem de seu pai que já se afastava entre as pessoas.

Que droga. Queria descobrir o que estava acontecendo também, contudo não deixaria Tabbris sozinha com aquele deorum que podia muito bem matar o seu animal só por diversão.

Corinna apenas se apoiou na sela para ver o centro da Praça com mais clareza. Foi então que vira ao fundo o que seria um sinal para o que tinha acontecido.

O cheiro de queimado tinha a atingindo logo quando pôs os pés ali, por isso olhava para o céu com tanto afinco quando os nomes foram anunciados.

—Alguns dos equipamentos pertencentes ao Setor Superior acabaram de ser encontrados danificados por um incêndio não natural.— a mesma segunda voz que soara a poucos instantes no alto falante agora falava em alto e bom tom do meio da Praça.

Era um dos Examinadores carrancudos.

Apenas a ponta da cabeça lustrosa era visível para menina de onde ela se apoiava para enxergar melhor. Naquele momento, já era possível ver, como plano de fundo, a fumaça que subia logo atrás da Casa Central.

O deorum continuou:

—Permitiremos que o responsável ou os responsáveis se entreguem voluntariamente agora, com a promessa de que não faremos mal nenhum à sua família. Contudo, como previsto nas Novas Leis, mais dois cidadãos deste vilarejo se juntarão aos Escolhidos Oficiais do Sacrifício. Se não se entregarem, nós o encontraremos e nenhuma misericórdia, além da que já está sendo concedida a vocês, será aplicada.

Ninguém ousava abrir a boca sequer para respirar.

Corinna sentiu o cheiro no mesmo momento em que viu o pai virar o rosto para encará-la.

Como num sonho, a jovem se viu no Estúdio que pertencia a ela e ao homem, com no máximo uns doze anos. O pai cantarolava o nome e para quê servia dos produtos dentro das garrafas que ficavam bem guardadas ali. A maioria dos rótulos, a criança esquecera rapidamente, porém ainda lembrava-se do cheiro pungente que acompanhava um deles.

Queima instantânea.

"Acho mais da metade de nós nunca vai saber que isso aqui existe" lembrava do pai dizendo." Além de queimar rapidamente, elimina em no máximo cinco minutos qualquer coisa até que vire pó."

Não, não, não...— Corinna apenas conseguia formar as palavras sem emitir nenhum som dos seus lábios.

Não poderia ser. Alguém mais tinha que possuir algo do tipo. Não seu pai.

Quando a mão de Evian se ergueu no ar indicando culpa, os minutos se tornaram segundos enquanto o homem foi arrastado brutalmente até um poste central.

Teve sua camiseta arrancada, ao mesmo tempo que um dos guardas já testava o chicote na mão.

Ninguém ousou falar nada. Ainda assim, todos pareciam se dedicar a encará-la.

A primeira chicotada rompeu uma parte fundamental dentro da menina.

  ❖ ❖ ❖


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Agradecimento: Caramelo que comentou na história! Espero que esteja gostando ♥

hey, pessoal!

como vocês estão? o que acharam do capítulo?

deixem seu comentários, opiniões etc...

não se esqueçam de votar/favoritar e indicar para os amigos.

me sigam no twitter: @whodat_emmz

até mais

xx



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Hearts Of Sapphire" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.