Seraphiel estreitou os olhos e achou estranha a sensação de ter a testa enrugada. A pele esticava e depois retraia, parecia assombroso ter que lidar com aquilo algumas horas atrás, mas agora ele conseguia compreender melhor a dinâmica do corpo humano. Não era totalmente humano, ele era um anjo, mas sua aparência e as sensações eram humanas. Viver na Terra não estava em seus planos, embora achasse a obra do Senhor magnífica.
Eles eram tão frágeis e ao mesmo tempo tão egoístas e se sentiam superiores. Não conseguia compreender como os humanos se achavam poderosos e no minuto seguinte estavam tendo uma crise de ansiedade ou sofrendo de depressão. Talvez fosse pelos excessos, pelas respostas não ditas, pelo pouco tempo de vida, afinal de contas há estrelas no universo muito mais velhas do que essas formas de vida.
Voltando a sua indignação anterior, ele estreitou novamente os olhos quando se recordou de onde estava. A loja de conveniência estava aberta durante toda a noite e ele parou ali para se alimentar. Sentia um vazio incômodo dentro de sim, mas o pior mesmo era a garganta seca e arranhando. Seraphiel precisava ingerir líquidos, já que o corpo humano era composto por esse elemento.
Eles não vivem muito tempo sem água, ou comida, mas conseguiam viver com a violência.
O anjo olhava para a prateleira com diversos tipos de garrafas feitas de vários materiais, vidro, plástico, reciclado, alumínio, aço inoxidável. As cores também variavam, eram transparentes, amareladas, azuladas e até mesmo com rodelas de pepino dentro. Também existia diferenças em seus componentes, como a água salobra de tom salgado e a termal que possuía mais iônicos dissolvidos. A água mineral magnesiana tinha uma alta taxa de magnésio e a sulfurosa possuía substâncias a base de enxofre.
O anjo não sabia qual escolher e por qual motivo havia tantas opções para a única utilidade que a água teria, aliviar a sede e manter o corpo saudável. Bastava uma nascente de rio e um pouco de boa vontade para que todos pudessem se refrescar. O planeta possuía tantas fontes de água, embora a maioria estivessem dentro de territórios de companhias privadas, o que prejudica o acesso das demais pessoas. Fora que, uma grande parte dessas fontes estavam sendo sumariamente destruídas pela poluição.
Seraphiel esfregou as pontas dos dedos nos olhos cansados, fazia algumas horas que estava acordado e ainda não havia conseguido compreender muito bem a dinâmica do sono. Ele esticou a mão e pegou um galão de água de um litro e depois enfiou dentro do cesto de compras.
Ele se dirigiu para o balcão, analisando a interação de outros humanos.
— Esse não é o preço registrado lá na prateleira. — Disse a mulher, batendo a mão no balcão.