Soundtrack escrita por Mia Lehoi


Capítulo 8
Track 7: New Perspective


Notas iniciais do capítulo

New Perspective é uma canção da banda Panic! At The Disco (https://www.youtube.com/watch?v=aL2GY3YXsMw)



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It's not fair, just let me perfect it
(Não é justo, apenas me deixe aperfeiçoar isto)
Don't wanna live a life that was comprehensive
(Não quero viver uma vida que foi compreensiva)
'Cause seeing clear would be a bad idea
(Porque ver as coisas claramente seria uma má ideia)
Now catch me up on getting out of here
(Agora me alcance, estou saindo daqui)
So catch me up I'm getting out of here
(Me alcance, estou saindo daqui)

Carmem podia jurar que aquele dia havia começado bem. Agora, com a cabeça girando, a garganta fechada pelo choro que queria sair, ela não conseguia raciocinar direito, mas sabia que precisava ir embora dali o mais rápido possível.

Por mais distante que pudesse parecer, no início aquele era só mais um dia como qualquer outro. Havia o jogo, a turma toda vestida com camisetas e adereços adornados com as cores verde e preto e o emblema do time da Universidade do Limoeiro, as arquibancadas cheias, os torcedores da universidade adversária com roupas azuis. Tudo isso ainda estava ali, fresco na memória.

Ela precisava pensar. Precisava de uma reação rápida. Então se concentrou em revisitar tudo o que acontecera e tentar entender como chegara naquela situação desastrosa que estava agora.

Denise aparecera em sua casa pouco antes do almoço. As duas comeram juntas e depois seguiram ao quarto da loira para se arrumar. Vestiram shorts curtos, a camiseta do time, arrumaram os cabelos e se maquiaram. O motorista as levou até o ginásio, onde elas encontraram uma boa parte da turma. Cascuda sorriu nervosamente e comentou que Cascão estava muito ansioso para aquele jogo, mas Aninha a tranquilizou dizendo que tudo ficaria bem. Magali, Quinzinho e Mônica foram comprar refrigerantes e os outros foram guardar bons lugares nas arquibancadas.

O jogo demorou um pouco para começar. Dava para sentir o clima de ansiedade e apreensão que tomava conta de todo aquele lado da torcida. Era a primeira vez em cinco anos que o time do Limoeiro havia chegado tão longe em algum torneio nacional. Se vencessem iriam para o mata-mata das quartas de final e teriam grandes chances de disputar a grande final no Rio de Janeiro, alguns meses depois. O time era bastante tradicional da universidade e apesar de há um bom tempo estar bem apagado, já tinha tido seus dias de glória em alguns anos anteriores. Aqueles meninos eram a esperança de reviver esses momentos.

Enquanto esperavam, as meninas fizeram pequenos desenhos nos rostos umas nas outras com a tinta verde que Marina trouxera. Do Contra chegou poucos minutos antes do apito inicial e riu do coração meio torto que Nimbus desenhou na bochecha de Aninha. Como sempre ele era um pontinho vestido de preto no meio da multidão colorida, mas usava um boné do time para trás e parecia animado a ponto de aceitar quando Marina se ofereceu para desenhar algo no rosto dele também.

A arquibancada toda gritou quando um locutor anunciou que os jogadores estavam prestes a entrar. Primeiro o time adversário, dono do ginásio, com suas camisetas azul e branco. E logo depois um a um, o time do Limoeiro foi entrando e arrancando comemorações e assobios da multidão verde. Cascão, com uma braçadeira de capitão com o emblema do Corinthians (ele se recusava a jogar todo de verde sem ter nada do seu time do coração para equilibrar), Titi, Jeremias, dois garotos da universidade que Carmem não conhecia muito bem e, finalmente, Cebola. Quando ele entrou, a loira já não prestou mais atenção nos outros porque o mundo todo era só ele.

O garoto tinha amadurecido um pouco nesse ano que se passara depois do colégio. Estava um pouco mais alto e forte, mas ainda tinha o mesmo sorriso de menino que a fizera se apaixonar por ele sabe-se lá desde quando. Naquele dia ele estava irradiando confiança, como se soubesse que nada poderia dar errado, distribuindo sorrisos para a arquibancada, bem onde a turma estava. Carmem se permitiu sonhar que um daqueles sorrisos era somente dela.

Quando o juiz apitou o início da partida, ela pensou que os próximos 45 minutos durariam uma eternidade. Não que ela não gostasse de futebol. Para dizer a verdade, depois de todos aqueles anos acompanhando seus amigos, ela começara a gostar de verdade. Talvez um pouco na esperança de que saber muito sobre os assuntos que interessavam Cebola a fizesse se aproximar um pouco dele, talvez apenas para fazer parte daqueles momentos. Ela não sabia bem o porquê, mas gostava. Ainda assim, sentiu que aquele jogo se estenderia longamente. As duas equipes queriam de todo jeito a chance de continuar no torneio e iriam lutar bravamente para isso. Cada lance parecia decisivo.

No entanto, ao contrário do que havia previsto, o primeiro tempo passou num piscar de olhos. A bola corria no campo, os garotos sorriam, a todo momento a plateia gritava e se exaltava, mas quando começou o intervalo o placar continuava totalmente zerado.

Os times desceram para o vestiário, a torcida esperou, cada uma cantando os hinos de sua universidade e tentando soar mais alto que a outra. Uma adrenalina permanente pairava no ar, um sentimento de que toda aquela metade do ginásio estava ali por uma única causa e nada poderia acabar com isso. Carmem normalmente amava aquela sensação, mas naquele instante foi tomada por um pressentimento repentino de que algo não acabaria bem. Torcendo para estar errada, ela olhou em volta. Todos pareciam apreensivos, mas animados. Denise a puxou para uma selfie junto com as outras meninas, ela sorriu como se estivesse ótima e tentou não dar ouvidos aos próprios pensamentos. Arriscou um olhar para o banco atrás do delas e viu Nimbus e Quinzinho comentando uma jogada de um dos adversários, parecendo surpresos com a habilidade deles. Do Contra observava os dois com a testa franzida, mas notou o olhar da loira e lhe dirigiu um sorrisinho amistoso, como quem pede calma. Foi tão rápido que ninguém mais percebeu, mas ela viu e se concentrou em pensar positivo.

O segundo tempo começou já com um gol da outra universidade. Os meninos se desconcentraram e logo tomaram um segundo, deixando o sonho da classificação um pouco mais distante. Carmem apertou as unhas contra as mãos e a torcida engrossou o canto do hino da Atlética Limonada, procurando incentivar. Longos minutos se passaram até eles conseguirem estrear na partida, com um gol de Titi. A defesa da outra atlética se fortaleceu, disposta a manter o placar, mas não teve jeito. Depois de quinze longos minutos de bate e volta, Cascão fez o segundo.

Porém, segundo a tabela de pontos, um empate ainda garantiria a classificação dos adversários. Os lances se tornaram mais agressivos, à medida que a outra atlética voltou a usar táticas mais ofensivas. Os ânimos se exaltaram e faltando apenas dois minutos para o fim do jogo, Jeremias foi derrubado na grande área.

Só pelo jeito com que as pessoas na arquibancada se levantaram, exaltadas, a loira soube que era algo sério. Aninha xingava todos os palavrões que conhecia, extremamente enraivecida. O jogo parou e não demorou muito até o juiz anunciar o pênalti e os garotos se reunirem rapidamente em um semicírculo, tentando chegar a um consenso. Mais tarde eles contariam que foi o próprio Jeremias que decidiu que Cebola deveria cobrar. Ele estava fazendo uma temporada muito boa, e apesar de não ter feito nenhum gol naquela partida, havia sido o segundo jogador em número de pontos dentro do time. O garoto era bom de raciocínio rápido e isso seria uma grande vantagem em um pênalti decisivo como aquele.

Quando o juiz colocou a bola no local da marcação, Cebola já não parecia mais irradiar a mesma confiança de antes. Visivelmente nervoso ele arriscou uma olhada para a arquibancada. Carmem assistiu de perto o sorriso encorajador que Mônica lançou a ele, o jeito com que ela gritou seu nome. A cena ficou em câmera lenta enquanto ele chutou, forte e preciso, e a garota fechou os olhos, rezando para que seu pressentimento ruim não se tornasse real. Quando os abriu novamente toda a torcida já berrava novamente o hino do Limoeiro e os meninos comemoravam, abraçando um Cebola que parecia não acreditar no que havia acabado de fazer.

Seguiram-se os dois minutos finais, já em clima de comemoração daquele lado do ginásio. Todos gritaram, cantaram, fizeram um estardalhaço digno de uma final. Podia não ser para tanto, mas eles se sentiam como se fosse. Quando o juiz apitou o fim do jogo, eles eram invencíveis.

Em questão de segundos muitas pessoas começaram a descer as escadas, rumando ao time. Aninha abraçou Jeremias animadamente e parabenizou a todos pelo jogo, Titi tirou a camiseta e a jogou para Denise, que abriu um sorrisinho que fez Xaveco ficar um tanto aborrecido. A loira desceu para se juntar a eles, e abraçou um menino do time chamado Rafael com quem ela ficara numa festa meses antes, só para não deixar tão na cara que estava ali por Cebola. Quando arriscou finalmente olhar para ele, já tomando coragem para lhe dar um abraço como se não fosse nada importante, viu Mônica correndo em sua direção. Os dois estavam perto o suficiente para que a loira o ouvisse dizer a ela que não teria feito o gol se não fosse o olhar que trocaram. A morena sorriu, tomada pela adrenalina e pela emoção do momento e o beijou intensamente, numa cena digna de filme americano. Ele a abraçou pela cintura e a levantou no ar, fazendo seus pés não tocarem mais o chão. Os amigos em volta gritaram animadamente e embora para eles o clima tenha se tornado mais festivo ainda, para Carmem aquilo fora como perder o chão abaixo de seus pés.

Ainda ficou lá por alguns minutos, cumprimentando os outros e atuando como fizera na vida toda, mas assim que conseguiu se misturar ao emaranhado de gente, se apressou para sair dali.

Pela segunda vez naquela tarde, cruzou olhares com Do Contra, que era uma das únicas pessoas que ainda estavam sentadas na arquibancada. Novamente não durou mais do que uma fração de segundo e passou despercebido por todas as outras pessoas no recinto, mas ela soube que tinha dito tudo o que sentia só naquele olhar.

Era assim que ela tinha ido parar ali, no estacionamento do ginásio. Respirou fundo, calculando. Se ligasse para o motorista, quanto tempo ele levaria para chegar até ali? Talvez, se fosse embora bem rápido, ninguém prestaria atenção suficiente em sua ausência. Talvez não tivesse que se explicar depois. Tinha certeza que ninguém tinha visto sua saída, o que lhe dava alguns minutos de vantagem. Quer dizer, Do Contra tinha notado, mas ele não iria atrás dela, iria? E se fosse, como ela faria para se esconder dele?

Assustada, Carmem decidiu que tomaria iria para o último lugar onde algum de seus amigos a procuraria. Seguiu, com passos firmes e sem olhar para trás, para o ponto de ônibus. Esperou alguns minutos até que a linha que queria chegasse, entrou e se sentou no banco do fundo.

Ali, onde não havia ninguém conhecido, ninguém que sabia que ela era uma Frufru, linda, perfeita e popular, ela se permitiu chorar. O bairro foi passando através das janelas e ela chorou, baixo e soluçando, sem medo nenhum, completamente sozinha.

Por mais que ela soubesse que Mônica e Cebola continuavam gostando um do outro, nunca era fácil vê-los juntos e ser lembrada de que suas chances com ele existiam só na imaginação. 


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Notas finais do capítulo

Faaaaaala galerina do bem e galerinha do mal! ♥
Bom, eu acho que esse é o meu capítulo favorito da história até o momento. Era uma parte da história que eu estava imaginando desde quando comecei a escrever e foi ótimo finalmente colocar em palavras. Tanto que escrevi tudo de uma vez só e só fui parar pra pensar e revisar depois! hahaha
A música desse capítulo é de uma banda que eu amo e acho que combinou muito com o momento, principalmente porque o clímax dela é dramático como esse momento foi na cabeça da Carmem.
Por enquanto é isso. Obrigada pelos comentários, vocês são incríveis ♥
Beijão da tia Mia!



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