Capítulo Um: Começo

Ela caminhava com o queixo erguido pelos corredores da empresa, como de costume sempre que terminava algum trabalho. Lily Evans segurava uma pilha de papéis à frente do peito e usava suas delicadas mãos para dar suporte à base. Os seus sapatos sociais de salto denunciavam o seu caminhar conforme fazia aquele conhecido barulho ao tocarem a superfície do chão de mármore. Sua postura reta bem como o seus cabelos ruivos presos com firmeza em um coque elegante mostravam a excelência da mulher em seu trabalho tal qual como os arquivos que carregava. Todos organizados uniformemente.

Em seus plenos 24 anos de idade, Lily esbanjava profissionalismo e autoconfiança. Dedicava-se por completo ao trabalho, seja em uma hora propícia para aquilo ou em seu tempo livre. Tal obstinação a fazia cair nas graças de seu chefe. Lily era o braço direito de Edward Colin há anos. Começou a trabalhar na plataforma da BBC, em Londres, assim que terminou o colegial. Seu pai tinha alguns conhecidos dentro da empresa e, devido a essa pequena vantagem, foi fácil para ela mostrar o seu talento e ingressar naquele trabalho. Desde então tem apenas crescido na renomada empresa por puro mérito. Era uma excelente profissional, por isso não encontrou problema algum em preparar com demasiada antecedência os relatórios que seu chefe a incumbiu de realizar.

Com os papéis em mãos, parou enfrente a porta de Edward Colin e bateu três vezes. Ouviu a voz rouca e máscula do homem calvo murmurar um “entre” e Lily o fez. Ao adentrar a sala espaçosa e bem organizada de seu chefe o encontrou sentado em sua mesa de ofício, com o semblante concentrado na tela de seu notebook que emitia um reflexo branco em seu rosto envelhecido. Edward desviou os olhos do monitor e assim que soube de quem se tratava, sorriu.

— Ora se não é a mais bem sucedida funcionária da BBC? – cumprimentou com o tom de voz descontraído.

Lily sorriu de forma educada para ele e se aproximou para depositar a pilha de arquivos no canto de sua mesa polida e lustrosa. Ao fazê-lo ela postou as duas mãos à frente do corpo e informou convicta:

— Esses são os relatórios que o senhor me pediu sobre as estatísticas dos dados de acessibilidade na nossa plataforma na internet e também a demanda de serviços sugeridos por nossos acompanhantes.

O homem encarou os papéis alinhados com perfeição à sua diagonal e não pode deixar de sorrir nem um pouco surpreso.

— Terminou a tarefa que lhe pedi para daqui a duas semanas? – era sempre assim. Tudo o que pedia para ser feito por Lily Evans era realizado por ela com o máximo de antecedência possível. Adorava e ao mesmo tempo preocupava-se com tamanha precisão por parte da menina (já que a diferença de idade entre eles era gritante), afinal, quando foi a última vez que ela tirou férias?

Ao escutá-lo, Lily relaxou a expressão do rosto e deixou escapar um pequeno riso.

— Eu estava com o tempo livre. – tentou soar convincente e depois de Edward levantar uma sobrancelha, acrescentou: - Sr Colin eu juro que estou tentando melhorar esse meu vício em trabalho.

Edward sorriu mais ainda fechando a tela de seu notebook para dar atenção aos arquivos de Lily e também para pegar algo na primeira gaveta de sua mesa.

— Sei que está e eu vou ajudá-la com isso. – disse enfim pegando um pequeno envelope preto e o deslizando por sobre a superfície de vidro.

Lily encarou o envelope com o cenho enrugado e alternou seu olhar entre ele e Edward. O homem fez um sinal com a cabeça para que ela pegasse em mãos e o abrisse. Hesitante, Lily trouxe o envelope para perto e seus dedos finos o abriram.

Dentro havia duas passagens (ida e volta) partindo da estação de King’s Cross até Gare du Nord em Paris. Em anexo, um ticket do Hotel em que aparentemente ela estava hospedada bem como seu endereço.

Lily ficou longos segundos analisando o conteúdo em suas mãos para tentar acreditar que aquilo era real. Seu cérebro trabalhava a todo vapor para assimilar as informações recentes e compreender que era bem possível que seu chefe acabara de lhe entregar passagens para viajar.

— Uma semana. – a voz de Edward fez-se presente no silêncio do recinto. – Já está tudo pago menos, é claro, suas despesas pessoais.

Limpando a garganta para encontrar algum som em suas cordas vocais, ela murmurou:

— Sr Colin, o que exatamente é isso?

— Um adiantamento de suas férias. – Edward levantou-se de sua cadeira dando o indício de que começaria um pequeno discurso. Ele gostava muito de andar enquanto falava. – Srta Evans, há tempos que você vem dispensando suas férias em troca de algum outro benefício quando na verdade eu sei muito bem que a Srta quer continuar trabalhando. Isso é ótimo, seu profissionalismo para com a empresa é excepcional, mas entenda, eu não quero ser denunciado por explorar demais meus funcionários e acredite em mim, é isso que está parecendo. – finalizou rindo pelo nariz.

— Mas eu re-

— E eu também concordo que você está precisando de alguns dias de folga, então, por favor, aceite esse envelope que não é nada mais nada menos do que o seu trabalho convertido em um pouco de, digamos, diversão merecida.

Todos os argumentos de Lily tornaram-se insignificantes depois daquela afirmação de seu chefe e, por mais que quisesse, ela não teve como resistir. A ideia de finalmente ir à Paris, cidade a qual ela jamais havia conhecido antes e relaxar um pouco era irrefutável e muito tentadora.

— O senhor não vai aceitar um não como resposta, vai? – ela ergueu os olhos para encará-lo tentando esconder um semblante divertido.

— Receio que não. – e dizendo isso ele retomou o caminho de volta para a sua mesa. – Sete dias de folga e depois você poderá voltar as suas atividades normais. Como você pôde ver o seu trem parte hoje às 14 horas, sugiro que vá para casa e arrume as malas.

Lily, em um súbito, olhou as horas em seu relógio de pulso e constatou ser 10h30min. Ela teria de correr se quisesse tudo pronto até a hora de embarcar na locomotiva que a levaria até Paris.

Ainda meio desnorteada, rumou para a porta de saída, mas antes de deixar a sala de Edward Colin, perguntou:

— Senhor, porque Paris?

— Ora é a cidade-luz, ville d'amour et de merveilles, quem não gostaria de ir? – retorquiu com perfeito sotaque em francês. – Além disso, a Srta trabalha comigo um tempo suficientemente longo para eu saber que nunca esteve lá.

Lily queria rir com tudo aquilo. Ela tinha muita consideração por aquele bondoso homem e, foi pensando nisso que proferiu com ternura antes de deixar a sala:

— Obrigada por tudo, senhor Colin.

~*~

Assim que colocou os pés dentro de seu apartamento, Lily fechou a porta atrás de si e ficou segundos a fio tentando organizar seus pensamentos para aquela viagem tão repentina. Ela iria para Paris nessa tarde, assim de uma hora para outra. Não conseguia acreditar na sua sorte. Sé que podia chamar aquilo de sorte.

Rindo perante todo o ocorrido da manhã, Lily foi até seu quarto para preparar sua mala e seus pertences. Passaria sete dias em Paris, indo a todos os lugares que desejasse e ao máximo deles que pudesse e também que o seu dinheiro permitisse.  O clima na cidade não estava nem quente nem frio o que contribuía para que o número de turistas se elevasse naquela época do ano.

Pegou uma mala de porte médio, onde colocou as roupas que julgou estarem inclusas no “padrão francês”, no geral as mulheres de lá se vestiam com bastante elegância, e então Lily percebeu que suas roupas, embora bonitas, não eram dignas de se andar pelas ruas da cidade.

— Hum, preciso renovar o meu armário – disse consigo mesma enquanto caminhava do seu guarda-roupa até a cama jogando todas as peças em cima da mesma para ter uma visão mais ampla das combinações que poderia fazer e de que trajes usar.

Dados exatos vinte minutos ela conseguiu terminar de arrumar sua mala. Pegou uma bolsa de viagem e depositou ali todos os perfumes, joias e materiais de sua higiene pessoal. Escolheu as roupa e foi tomar um relaxante banho.

Não tinha um roteiro planejado, não conhecia os pontos turísticos de Paris senão a Torre Eiffel e não tinha nenhum conhecido por lá. Aquela viagem realmente seria uma loucura. Bem, não que Lily se lembrasse de algum rosto conhecido que morasse em Paris. Quer dizer, a única pessoa que ela recordava ter se mudado para lá depois de terminar o colegial, era James Charlus Potter.

Lily sorriu ao pensar nele. Eram grandes amigos em tempos de escola e ela gostava muito do rapaz na época. O sentimento parecia ser recíproco, porém ela jamais teve a certeza concreta. No entanto, desde que ele resolvera cursar Jornalismo na cidade-luz, nunca mais tornaram a se ver e Lily acabou por perder o contato que tinha com ele. Nem sabia se James continuava lá, céus já fazia tantos anos. Nem sabia se James ainda se lembrava dela. Por isso, considerar essa possibilidade estava fora de cogitação e a ruiva realmente não tinha nenhum conhecido em Paris.

Estava por sua conta e risco.

Terminou o banho e se arrumou com agilidade já que não queria se atrasar para pegar o trem. Depois de vestir-se com trajes elegantes de viagem e ajeitar seu cabelo e rosto de modo comportado, Lily pegou suas coisas e ligou para um número de táxi.

Paris que me aguarde.