Aconteceu escrita por Alanna Drumond


Capítulo 63
Capítulo 63




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Eu estava andando tão distraída que nem percebi que tinha entrado em uma capela. Eu nem sabia que tinha capela no hospital. Eu me sentei em um dos bancos e fiquei olhando as imagens de gesso que as pessoas tanto adoravam. Eu, particularmente, não acreditava em imagens. Eu acreditava em Deus, mas duvidava da existência de santos e achava que ele era o único que podia interceder aonde ninguém mais pode. Mas naquele momento, eu acreditei.

Já tinha um tempo que eu não rezava. No primeiro momento eu nem soube o que dizer ou como dizer. Eu só chorava. Mas conforme o tempo foi passando eu fui ficando mais calma, e pedi pela vida do meu amor. Pedi para que a cirurgia fosse bem sucedida e que ele ficasse bem. Eu rezei como há muito tempo não rezava. Foi uma prece que veio do fundo do coração, e só me restava acreditar que eu seria atendida.

Eu voltei para a sala de espera e enfermeira ficava me olhando como se tivesse com dó de mim. Eu odiava quando as pessoas sentiam pena de mim. Eu sentei, e fiquei olhando o noticiário só para ter o que fazer. E então o médico veio.

— Senhora Duarte – ele disse e eu quase olhei em volta pra me certificar se Camila, mãe de Rafael, estava ali. Me lembrei da mentira, endireitei os ombros e tentei passar a imagens de uma esposa.
— Como ele está?
— A cirurgia acabou. Foi um pouco mais complicada que o previsto. Ele teve duas paradas cardíacas... – eu o interrompi.
— O quê? Ele tá vivo? Diz que tá, por favor. – de esposa delicada passei a esposa desesperada.
— Conseguimos reanima-lo, ele passa bem agora. Felizmente a bala não causou maiores problemas ao intestino dele, mas tivemos que retirar o apêndice dele.
— Ah graças á Deus. – e o médico fez uma cara tipo “graças a mim” – obrigada doutor, mas o senhor podia ter falado o final primeiro. Eu posso vê-lo?
— Ele está sedado, mas pode sim. Não poderá ficar muito tempo, pois ele está na sala de emergência porque quero observar como ele vai reagir nessas primeiras horas, mas se tudo ocorrer bem, no início da tarde, ele vai para o quarto. Eu te acompanho até lá.

Eu entrei na sala de emergência tremendo. Ele não estava sozinho no quarto. Tinha mais três mulheres internadas ali. Ele estava no último leito e assim que o vi sai correndo até estar do seu lado. Ele estava bem. Parecia sereno como se estivesse tendo o sono dos deuses. Ele estava sem camisa, o que fazia com que a paciente da maca da frente o devorasse com os olhos. Tinha vários fios ligados a seu peitoral definido com pelos macios. O lençol estava dobrado em sua cintura, mas pude ver exatamente o corte onde foi feita a cirurgia.    

— Ele é forte. Venceu três paradas cardíacas e perdeu muito sangue. A sorte dele foi que a ambulância não demorou a chegar até vocês e logo foram feitos os primeiros socorros. Vou deixa-la a sós com seu marido. A senhora tem cinco minutos e depois terá que sair.
— Obrigada.

Meu marido... Rafael provavelmente vai me achar uma boba por contar essa mentira. Mas que alternativa eu tinha? Eles não iam me deixar ficar perto dele. Contaria mais cinquenta mil mentiras, se preciso fosse.

— Oi meu amor – passei a mão pelo rosto dele. A barba estava começando a crescer e pinicava a minha mão. Mas era uma boa sensação. – Você está bem. Deu tudo certo. Foi só um susto, mas vai ficar tudo bem agora. – eu continuava fazendo carinho no rosto dele com uma mão enquanto segurava a mão dele com a outra. – Eu fiquei com tanto medo, mas tanto medo de te perder. – eu já estava chorando sem perceber e eu senti um aperto em minha mão.
— Você nunca vai me perder. – Rafael disse com a voz tão baixa que mal parecia um sussurro.
— Rafael – eu disse com a voz igualmente baixa. Ele abriu os olhos e o verde que apareceu neles era tão vivo, mas tão vivo, quase tão vivo quanto o dono deles. – eu te amo. Eu te amo, eu não consegui falar naquela hora, mas eu prometo que vou falar isso sempre que eu tiver oportunidade. – eu lhe dei um selinho com cuidado
— Eu sei. Eu também te amo. – disse apertando minha mão de novo. Ele olhou pra frente e viu a mulher que o devorava com os olhos, franziu o cenho e olhou em volta. – Por que a gente tá no hospital?
— Você não lembra?
— Eu não lembro muita coisa. A Mere estava demorando com o jantar e... entrou alguém em casa. – ele tentou se sentar – Ai!
— Não! Fica quietinho ai. Você passou por uma cirurgia. Um homem entrou em casa e te deu um tiro. Você perdeu o apêndice.
— Estou me lembrando. Ele... ele te bateu. Você tá bem? Aquele maldito te acertou também?
— Não. Eu estou bem. Ele tá preso agora. Não vai nos fazer nenhum mal.
— Pelo menos isso. Vou ficar muito feliz em garantir que ele não saia da cadeia nunca mais.
— Não é hora de pensar nisso. Eu não posso ficar muito tempo aqui dentro. Você não devia nem estar acordado. É melhor você dormir de novo.
— Eu tenho que ir pra casa. Tenho que ver o meu pai. Sabe se ele está bem?
— Ele já fez a cirurgia. Ocorreu tudo bem, o Dan disse que ele tá no CTI, mas que é só pra controlar o pós-operatório.
— Você falou com alguém sobre o que aconteceu com a gente?
— Só com o Dan e com a Alice, eles estão vindo pra cá. Eu ia ligar pra sua irmã, mas o Dan achou melhor esperarmos pra ver como você ia reagir, estão todos muito preocupados com o seu pai. – ele fez bico – desculpa meu amor, mas eu estava sozinha aqui, não sabia a quem recorrer. Você quase morreu três vezes nas ultimas horas, eu achei que nunca mais fosse te ver.
— Quase morri?
— Você teve três paradas cardíacas. Duas na cirurgia e uma na minha frente, em casa, enquanto recebia os primeiros socorros.
— Você não tinha que ter visto isso. Eu sinto muito Ana.
— Você tá aqui agora. Isso que importa. – o médico apareceu na porta e vinha em nossa direção. – eu tive que contar uma mentirinha pro hospital. Não iam me deixar ficar com você porque eu não sou da sua família e eu, obviamente não ia te deixar aqui sozinho, então eu disse que era sua mulher. Então se perguntarem, somos recém-casados em lua de mel, ok?! – ele abriu um sorriso.
— Ok Senhora Duarte.
— Senhora Duarte, hora de ir. – disse o médico se aproximando.
— Não – disse Rafael – deixe-a ficar mais um pouco.
— Não, você precisa descansar.
— Eu preciso é ir embora daqui. - Rafael retrucou
— Você tomou um tiro meu rapaz. Você é forte, mas não tanto. Você precisa é dormir.  – ele chamou a enfermeira que começou a preparar uma medicação.
— Não preciso de remédio pra isso. Já estou com sono.
— Vamos dar assim mesmo, não custa nada dar um empurrãozinho né. Terá a vida toda para conversar com sua esposa – disse o médico e ele se virou pra mim. – é hora de se despedir de seu marido, Senhora Duarte. – vi que Rafael mordeu o lábio inferior para evitar o riso.
— Eu vou ficar lá fora.
— Não, vai pra casa. Pede o James pra te levar.
— Ele não está aqui. Está cuidando da Mere.
— Então pega um táxi.
— Não sei se consigo ficar naquela casa. – ele me deu um sorriso compreensivo.
— Vai pra um hotel então.
— Não vou te deixar sozinho.
— Teimosa.
— Eu te amo – lhe dei um beijo rápido – até mais tarde.
— Também te amo. – eu me virei para sair e a enfermeira se juntou a eles, aplicando uma injeção no soro de Rafael.
— Você quase matou sua mulher de susto meu rapaz – ouvi o médico dizer enquanto eu andava até a saída da sala de emergências. – essa ai te ama mesmo.
— Eu sei. Eu sou maluco por ela. – cheguei na sala de espera com um sorriso bobo no rosto.


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