Aconteceu escrita por Alanna Drumond


Capítulo 59
Capítulo 59




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E então aconteceu. Um barulho chamou a atenção de todos, alguém estava correndo e não éramos nós. André foi surpreendido assim como todos nós. E então eu me dei conta de quem estava correndo. Só faltava uma pessoa ali. Uma menina de 12 anos. Linda, carismática, cheia de vida. Cecília. Provavelmente ela se assustou com o barulho do tiro e estava vindo ver o que estava acontecendo.

Ela desceu as escadas tão rápido que mais pareceu um vulto. Mas não foi rápida o suficiente para desviar da bala que André disparou. Ela gritou e tropeçou nos últimos degraus e rolou escada abaixo, caindo estirada no chão. Minha mãe gritou e saiu correndo em direção a ela ignorando os gritos de André para que ficássemos todos parados. E então ele atirou de novo em direção a minha mãe, mas ela não foi acertada. Ela se jogou sob o corpo de Cecília que estava inconsciente e que foi acertada bem no peito. André, irado, se preparava para disparar de novo em minha mãe então eu me joguei em cima dele e a arma que estava engatilhada disparou antes de saltar da mão dele.

Eu lhe dei alguns socos e ele revidou. Ele era forte e eu estava tonto. Mas continuei batendo dele como se minha vida dependesse disso. Eu não ouvia nada, eu não via nada. A única coisa que existia era a minha raiva e o meu ódio por aquele homem que ameaçou as mulheres da minha vida. Rolamos pelo chão e eu sentia dores, mas isso não me fez parar. Eu só parei quando ele ficou inconsciente e foi ai que eu ouvi os gritos de minha mãe.

— Cecíliaaaa. Minha filha. Não meu amor. Não vai. – ela chorava e gritava. Ela ergueu o tronco de Cecília e a abraçava e a beijava incansavelmente. Mas o olhar dela estava parado, ela perdia muito sangue e não exalava mais tanta vida como sempre. Ela estava morta. Minha irmã caçula morta.

Eu cambaleei, e tirei os olhos de minha mãe e Cecília e eles foram parar em outro corpo. O corpo de Sabrina que estava caído no chão, com as duas mãos sob seu ventre. Eu corri até ela, mas antes mesmo que eu chegasse lá, já sabia o tinha acontecido. Ao me aproximar dela eu só tive a certeza que eu não queria ter. Quando eu ataquei André, a arma tinha disparado e eu estava tão possesso de raiva que nem olhei pra aonde a bala tinha acertado. Eu a encontrei no corpo de Sabrina caído no chão um pouco acima da sobrancelha direita de minha esposa morta.

André tinha razão. Eu havia tirado tudo dele. E movido por vingança, ele também tirou tudo de mim. Minha esposa, meu filho e minha irmã estavam mortos. E a culpa de tudo isso era minha.

 


— Por favor. Não atira. – disse Ana me trazendo de volta ao presente com as mãos pra cima em sinal de rendição.
— Calma bonitinha. Essas balas aqui são pra outra pessoa. Se você se comportar bem, eu prometo que não vai te acontecer nada – disse o homem.
— E pra quem é? – ele riu.
— Para aquele seu namorado. – Ana arregalou os olhos, olhou pra mim e voltou a olhar pro homem.
— Ele não tá em casa.
— Mentira. Estou vigiando vocês há tempo o suficiente pra saber que vocês não colocaram o pé pra fora de casa por dois dias. Onde ele está?
— Eu não sei. – Ana disse com a voz tremula. Segurei com mais força o cutelo em minhas mãos e Ana viu o meu gesto. Ela me lançou um olhar desesperado, como se soubesse exatamente o que eu faria e implorasse para eu não fazer. Mas eu precisava. Não poderia deixar nada acontecer com Ana. Não pude proteger Sabrina, mas protegeria Ana de qualquer forma, nem que eu tivesse que dar a minha vida para isso.
— Estou aqui. – eu disse e o homem se virou para mim.
— Olha se não é o homem que eu queria. – então ele virou a cabeça na direção de Ana – você mentiu pra mim. Estou um pouco bravo agora, o que eu faço com você?
— Nada – eu disse. – O seu problema é comigo. Deixa ela em paz.
— Eu não tenho problemas com você. Você é o problema.
— Por que? – Ana perguntou.
— Não me leve a mal gatinha, mas são ordens superiores. Não posso falar muito. – ele se virou pra mim – O que pensa que vai fazer com esse cutelo? Abaixa isso.
— Abaixa a arma – ele riu.
— Sem chance playboy. – Ana se aproximou do homem sem que ele visse, eu não sei o que ela pretendia, mas não estava com um pressentimento bom. – Fim de jogo pra você – e então ele atirou em mim.
— NÃO! – Ana gritou. Eu não vi muita coisa depois disso. Tudo ficou um pouco confuso e minha visão estava turva.

Senti o cutelo sair de minha mão e cair no chão enquanto eu também caia. Levei a mão as costas e tirei a faca da cintura e simplesmente a lancei em direção ao homem, mas ela não passou nem perto dele. Eu cai no chão, sentindo uma dor alucinante na barriga, mas tive tempo de ouvir alguma coisa se quebrando.

— Sua vagabunda, quem você pensa que é? – abri bem os olhos a ponto de ver o homem dar uma bofetada na cara de Ana e ela cair no chão perto de mim, eu estiquei a mão pra ela, mas ela estava longe demais pra alcançar. Ele ergueu a arma e mirou na direção de Ana, mas eu fiquei confuso, pois de repente ele saiu correndo. Eu não conseguia mais focar minha visão em nada. Tudo era um borrão.

De repente eu me lembrei da conversa que tive com meu pai. Eu não teria tempo de dizer a ele que o amava, e nem de dar o abraço que ele queria ganhar.  Eu senti na hora que nossa conversa tinha tom de despedida, e agora eu entendia, porque era de fato a nossa despedida. Eu só lamentava o fato dele ter desligado a ligação antes de me ouvir dizer que o amava.

Mesmo que inconsciente Ana também havia se despedido de mim. E saber que fui amado por ela foi uma das grandes bênçãos que recebi na vida. Eu sempre estaria com ela e ela sempre estaria comigo. Independentemente do que acontecesse, uma promessa de amor eterno havia sido feita há muito tempo. E eu faria de tudo pra cumpri-la.

Eu senti duas mãos em meu rosto e abri os olhos que nem havia percebido que estavam fechados. Eu sabia que era Ana que me tocava, mas eu não conseguia ouvi-la e nem ver seu rosto. Estava tudo embaçado. Fiz o máximo que pude pra me concentrar e com muito esforço pude ver seu rosto. Eu não devia ter feito isso. Ver seu rosto vermelho e inchado por chorar, por minha causa, me deixou devastado. Ela falava alguma coisa e tentei fazer uma leitura labial, mas eu não consegui. Então eu me concentrei de novo e enfim consegui ouvi-la.

— Você vai ficar bem. Só fica de olhos bem abertos e respira. – ela fungou. Eu vi que seu rosto estava vermelho não só por causa do choro, mas o lado esquerdo estava bem mais vermelho por causa do tapa que ela levou. Tentei levar a minha mão até lá para acaricia-la, mas eu não tinha forças. Felizmente Ana viu o meu esforço e me ajudou, pegando minha mão e levando até lá.
— Você es...tá be...eem? – eu tentei manter a voz estável, mas não consegui.
— Por que tá se preocupando comigo? Você levou um tiro! Eu é que devia perguntar como você está.
— Eu estou bem. – disse com dificuldades – estou com vo...cê. – ela riu, mas então tudo começou a rodar e eu fiquei tonto. De repente tive uma vontade enorme de vomitar e fechei os olhos novamente.
— Não. Rafael abre os olhos, meu amor. Fica comigo. – então eu abri, mesmo tendo perdido o foco, eu abri só pra deixa-la feliz. Mas a verdade é que eu não conseguia ver nada. – se você tiver vendo uma luz ignore-a. Fica comigo, foca em mim, não vai embora, por favor. – ela chorava sem controle e eu ri. A única luz da minha vida era ela, eu queria dizer isso, mas não conseguia.
— Eu... Ana. – engoli seco. Eu sentia tanta dor que respirar estava se tornando uma tarefa arduamente difícil
— Não. Não fala. Vai ficar tudo bem. – eu consegui focar a visão por mais alguns segundos a tempo de vê-la levantar a cabeça e falar com alguém – ele precisa de uma ambulância agora. Tá perdendo muito sangue. – na verdade o que eu estava perdendo era a consciência, mas eu não podia apagar, não podia ir embora sem dizer a ela que a amava.
— E... eu amo vo...você – ela sorriu e eu sabia que ela ia responder, mas eu não tive tempo de ver isso acontecer.

Eu não sabia o que estava acontecendo, mas eu fui perdendo os sentidos e de repente eu não estava mais lá. Não restava mais nada. Mais ninguém. Eu perdi a consciência e foi como se eu tivesse entrado em sono profundo. A diferença é que dessa vez, eu não sabia se eu ia acordar.


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Notas finais do capítulo

Fim da Parte II



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