Aconteceu escrita por Alanna Drumond


Capítulo 3
Capítulo 3




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Gustavo e eu namoramos por quase dois anos. Eu achei que ele fosse o cara perfeito pra mim. A verdade é que nosso namoro só aconteceu por insistência de terceiros. Estudávamos juntos e várias amigas falavam que ele me olhava com cara de apaixonado e que formaríamos um lindo casal. E de fato, ele estava apaixonado, naquela época. Demorou mais de um ano para que eu finalmente desse um beijo nele e começamos o namoro imediatamente. Alice nunca gostou dele e eu devia ter escutado quando ela me disse que esse namoro não ia ser uma coisa boa pra mim. Até mamãe me avisou, mas a idiota, vulgo eu, não quis ouvir e insistiu nessa loucura.

Eu não posso dizer que foi um namoro ruim, mas também não posso dizer que era bom. Ele foi meu primeiro namorado (e até então único) e eu não tinha como comparar ou saber se o que rolava entre nós era mesmo especial. A verdade é que ele não fazia meu coração disparar, não ficava nervosa quando eu o via e nem ansiosa para vê-lo de novo. Mas ao invés de terminar, eu mantive o namoro, menti pra mim mesma, disse que aquilo bastava. Eu me acomodei. E então deixei rolar. Um ano, dez meses e vinte e dois dias para ser mais exata. E o que eu ganhei? Um belíssimo par de chifres.

Gustavo decidiu cursar Educação Física e passava o dia socado dentro de uma academia, só falava de Whey Protein, cálculo de IMC (índice de massa corporal) e um monte de bobagens que pra mim não eram interessantes. Nos afastamos e tudo ficou muito monótono. O sexo não era aquela maravilha e eu confesso que várias vezes eu fechava os olhos e imaginava o Ian Somerhalder comigo na cama.

Um belo dia ele disse que ia ficar na faculdade até mais tarde para estudar para as provas finais, e eu como a namorada idiota e ingênua que era, resolvi que ir pra casa dele cozinhar seu prato favorito como um meio de tentar melhorar as coisas entre nós. Eu tinha a chave reserva, mas não precisei usá-la. Quando cheguei à porta do apartamento pude ouvir os gemidos e tudo mais que eu não deveria ter ouvido. Fui embora, chorei horrores. Por mais que as coisas não estivessem boas eu não merecia ser traída, ninguém merece.

— Tudo bem eu não falo. – como se ela conseguisse. – Mas amiga, ele tá muito mal. Tá acabado, disse estar arrependido pelo que fez e te quer de volta.
— Vai ficar querendo. Nem se ele for o último homem da Terra eu vou me envolver com ele de novo.
— Tá certa. Traição não tem perdão.
— Vamos falar do que realmente importa?
— E o que seria?
— Desemprego. O Caio pagou um terço do meu salário, não dá pra ajudar muito nas despesas da casa, mas tá aqui – entreguei o dinheiro a ela.
— Não, de jeito nenhum. Você vai precisar de grana pra fazer entrevistas e para se manter até arrumar um emprego. Deixa que eu me viro com a casa.
— Não é justo Alice, eu tenho que ajudar.
— Você tem que deixar de ser chata. Eu dou conta. – Alice acabou sendo efetivada no escritório onde ela fez o estágio da faculdade e estava ganhando muito bem como advogada, mas isso não era motivo pra ela bancar tudo sozinha. – Não me olha assim, isso é pro seu bem e tem mais. Logo logo você vai conseguir um emprego. Um emprego bom. Tô pressentindo. Vai dar tudo certo.
— Tomara que esteja certa.
— Eu tô. Você vai ver. 

Parece que pela primeira vez na vida Alice errou. Já havia se passado um mês e nada. Ninguém nem me chamou para fazer entrevistas. Eu estava cansada e a ponto de desistir da vida. Me obriguei a sair de casa e fui à padaria do seu João. A grana estava curta, mas eu ainda podia me dar ao luxo de comprar um salgadinho. Eu estava na fila do caixa quando o seu João fixou um cartaz: “CONTRATA-SE AUXILIAR DE COZINHA, NÃO É NECESSÁRIO EXPERIÊNCIA”. Era perfeito. Era o que eu precisava. E não precisava de experiência. A sorte finalmente sorriu pra mim. O cara lá de cima parecia que gostava, afinal, de mim. Abandonei a fila e fui atrás de seu João. Se alguém iria conseguir esse emprego, esse alguém era eu.

— Seu João, isso é serio?
— O que minha filha?
— O emprego – disse impaciente e ansiosa.
— Ah sim querida. Infelizmente. A nossa Dara resolveu se aposentar e me abandonou aqui. Preciso de ajuda na cozinha.
— E qualquer um pode se candidatar? Não tem nenhum pré-requisito nem nada?
— Ora, eu não estou podendo escolher muito – e se pudesse com certeza não me escolheria.
— Eu quero me candidatar.
— Você? Tem certeza disso Ana?
— Absoluta.
— E por que uma moça como você iria querer trabalhar em uma cozinha velha?
— Não é uma questão de querer seu João. Eu realmente preciso.
— Bom, venha amanhã e converse com o padeiro. Ele provavelmente vai querer ver suas referências, mas não vejo motivo para não contratá-la. Com certeza minha cozinha ficará mais agradável com você lá. – Isso não me deixou feliz. Se pedissem minhas referências, Caio com certeza vai me detonar. Vai contar que confundi sal com açúcar e que manchei o vestido de uma dondoca. E isso ia acabar com todas as minhas chances. Talvez a sorte não fosse mesmo minha amiga. 

Voltei pra casa completamente murcha. Não dava mesmo para contar com a sorte. Quando cheguei em casa e peguei a correspondência, fiquei completamente desorientada. Como eu pude fazer tantas dividas? Como eu ia pagar tudo aquilo? Minha única opção era vender meu lindo fusca azul. Todo mundo odeia o meu carro, mas eu o amo. Me apaixonei logo que o vi pela primeira vez. Um amigo de mamãe estava se mudando para Portugal e resolveu vender todos os bens, dentre eles o fusca. Pagamos muito pouco por ele, e é verdade que ele tinha muitos problemas, mas ainda assim, era o meu carro. Que eu e mamãe compramos com muito sacrifício. Mas agora eu ia ter que me desfazer dele. Com certeza essa ia ser a pior coisa que eu ia fazer.


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