Aconteceu escrita por Alanna Drumond


Capítulo 29
Capítulo 29




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— Não, continuo sendo quem eu sempre fui, infelizmente. Seu chefe, que está com fome e você, minha funcionária, que estendeu o expediente para me acompanhar e nada mais justo que eu recompensá-la com um jantar. Mas se você não quiser, tudo bem.
— Eu tô com fome então você pode me levar pra jantar. Você paga. – ele tentou ocultar o sorriso, mas sem sucesso. – Já que continuamos com a relação chefe-funcionária – infelizmente a única que existe – acho que eu deveria te informar que embarcamos amanhã para a Holanda.
— Ah, ótimo.
— Vou reservar o hotel amanhã, hoje eu não tive tempo porque... bem, você sabe o porque.
— Sei? – disse desviando os olhos do transito para mim.
— Graças a você eu tive que lidar com vários clientes e advogados não muito educados que ficaram furiosos por ter que reagendar os compromissos. E eu acho que devia te cobrar por ter aturado aqueles americanos estúpidos. – ele sorria – quer parar de sorrir e olhar pra frente? Ou quer me deixar no escuro definitivamente me matando?
— Você tá muito nervosa, será que um chocolate melhora esse seu humor?
— Talvez.
— Aproveitando que ainda temos uma boa relação chefe-funcionária, você vai me contar o que houve com a Juliana ou eu vou ter que ameaçar demitir as duas?
— Não, Rafael! Isso não é justo – me agitei.
— Então me conta.
— Eu não sei o que tá acontecendo.
— Jura?
— Juro! Ela tá estranha comigo a dias. Me trata diferente. Não entendo. Nunca fomos amigas, mas pelo menos nos respeitávamos como colegas de trabalho. Ela começou a falar e me acusar de umas coisas sem pé nem cabeça.
— Que coisas? – já tinha falado demais, ele não precisava saber de tudo.
— Rafael não importa. O que importa é que o que aconteceu hoje não vai mais se repetir.
— Você não respondeu minha pergunta. Que coisas? – fiquei calada. – Ana, me fala, é sério. Eu preciso saber o que está acontecendo.
— Não é nada demais.
— É sim. Então pode abrir essa boquinha linda e falar. – boquinha linda? Desde quando ele usava o diminutivo? E isso foi um elogio? – Facilita as coisas para mim.
— Eu estou sob pena de demissão?
— Para de falar isso. Eu não vou te demitir.
— Então eu prefiro ficar na minha.
— Ok, você é quem sabe. Mas fique sabendo que eu vou descobrir. Ninguém esconde nada de mim por muito tempo. – uma vez Juliana falou algo parecido com isso, obviamente a situação era outra.

Depois disso um silêncio incômodo se instalou. Teve um acidente na estrada o que fez o trânsito ficar totalmente congestionado, consequentemente, eu fiquei impaciente e Rafael irritado. Trânsito sempre irritava Rafael. Ele tamborilava os dedos no volante, abria e fechava o vidro da janela cinco vezes por minuto, trocava a estação de rádio a cada música que terminava e ficava passando a mão pelo cabelo bagunçando-o de um jeito sexy. De um jeito despojado quero dizer.

— Por um momento eu pensei que ela pudesse ser da sua família.
— Ela quem?
— Senhora Siqueira. – por que raios voltamos a falar dessa peituda?
— O que? Por que?
— Vocês têm o mesmo sobrenome. – disse como se fosse obvio, e como esta noite eu estava super desatenta e desinteressada, de fato não prestei atenção nesse detalhe.
— Isso não quer dizer nada. Existem milhões de pessoas por ai com o sobrenome igual e isso não significa que são da mesma família.
— Tem razão. Desculpe.
— Tá se desculpando pelo que exatamente?
— Por não saber como manter uma conversa com você.
— Você estava usando a senhora ‘oi eu tenho silicone’ para puxar assunto?
— Eu não sou muito bom nisso.
— Primeiro você não responde o meu “Bom dia” por meses, depois me promove a sua nova melhor amiga, em seguida você me beija e diz que tá apaixonado por mim e ai resolve me ignorar e não quer falar sobre o assunto, e por fim resolve puxar assunto falando de uma mulher que estava dando em cima de você. Será que eu esqueci alguma coisa?
— Não, acho que não. Desse jeito parece que eu sou o protagonista de uma novela mexicana que não sabe o quer.
— E você sabe?
— Sei, mais é complicado, eu já te expliquei.
— “É complicado” deveria ser o nome da novela.
— Eu já te falei que eu sou peri... – não me segurei e tive que interromper.
— Ah, é. Essa é a parte que eu esqueci. O protagonista não tem nada de herói, na verdade ele é o vilão super, ultra, mega perigoso e eu, obviamente, sou uma pobre moça indefesa que usa um chapéu vermelho. Mas sabe, eu não se se já mencionei isso antes, mas eu não tenho vocação para ser chapeuzinho vermelho e você muito menos para lobo mal.
— Chegamos. – saiu do carro e rapidamente abriu a porta para mim e deu a chave do carro para o manobrista.

O restaurante era bem luxuoso com mesas dispostas de forma harmônica e clientes bem requintados. Fomos para uma mesa afastada de onde dava para ver todo o ambiente e acompanhar a música clássica que era tocada ao vivo. O garçom chegou e Rafael pediu um vinho que custava quase um terço do meu salário. E naquele momento eu vi o quanto éramos incompatíveis. As nossas diferenças eram enormes em momentos como aquele. Eu realmente não me sentia digna de sua presença e duvidava se iria me sentir bem de fato num ambiente ou numa vida com tanto luxo.

Rafael parecia a vontade, mas é claro. Ele tinha tudo sob controle, entendia cada nota da música que era tocada, apreciava o aroma do vinho com experiência e se encaixava perfeitamente naquele lugar. Talvez ele também soubesse das nossas diferenças e talvez por isso fosse tão complicado. Provavelmente ele sentiria vergonha de estar acompanhado de uma mulher que não era tão linda nem tão fina como aquelas outras que estavam acompanhando os grã-finos, mas que culpa eu tenho? Aquela não era a minha realidade e nunca seria.


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