Dragões do Norte escrita por Snowfall


Capítulo 2
A Ilha dos Ursos




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Os dias que se seguiram passaram divagar, principalmente para Jon, que ficou recluso em seu quarto por causa de algo que não era sua culpa. Mas já estava acostumado, era comum à um bastardo sofrer pelas ações de outras pessoas.
Depois do incidente, Lady Catelyn foi aconselhada a guardar leito, o que livrou o menino de várias situações desagradáveis. Mas no final sabia que o assunto lhe traria algo mais que ser trancado.
Dava para ouvir os criados cochichando enquanto passavam. Tudo o que conseguia ouvir era pedaços aleatórios de conversas. Mas esses fiapos de informação eram suficientes para ele perceber a situação em que o castelo se encontrava. E o que ouvia era muito preocupante.
As conversas, sempre sussurradas, pareciam ser sobre ele.
“...se parece mesmo com o pai...”
“...como pode ofendê-la assim...”
“... Só vai piorar à medida que cresce...”
“...não pode ficar aqui...”
Então esperou as más notícias. Quando Miestre Lwin entrou em seu quarto com uma expressão reservada soube que havia chegado a hora.
—O que está fazendo?-perguntou o senhor notando o papel que o menino tinha nas mãos.
Se acomodou em sua cama e olhou o garoto sentado junto a sua pequena mesa. Jon tentou manter sua face o mais neutra possível.
—Um desenho.
—Deixa ver.
O garoto estendeu a folha de papel. O miestre a avaliou por instante e depois sorriu.
— Para que serve esse sistema de polias?
—Para mover uma pedra de amolar usando um moinho. É para Mikken. Está ficando velho, não pode mais ficar girando aquela roda.
—É um desenho muito bom.
Miestre Lwin se calou novamente. E se concentrou no desenho mais do que deveria, pelo menos foi o que pareceu a Jon.
—Pode falar Miestre Lwin. Nada bom, não é?
—Não- suspirou o velho cansado.
—Como está Lady Stark?
— Bem. Precisa de muito repouso até a chegada do bebê, mas bem.
—Lord Umber...
—É um bom homem e leal acima de tudo, mas costuma falar o que não deve quando está sob o efeito de vinho dornês. Teve o bom senso de se desculpar pelo que disse, o seu pai o perdoou de imediato tal como Lady Catelyn assim que se recuperou o suficiente. Não se pode dizer o mesmo de alguns convidados sulistas. Ele deve ficar mais cauteloso na próxima vez que beber.
—Já se passou dias desde o banquete e continuo confinado aqui.
—Sim, não podemos arriscar ainda mais a saúde da senhora.Além disso sua presença pode ofender os lordes de Correrrio, o que causaria uma situação difícil para o seu pai.
—Porque veio então?
O senhor pareceu procurar palavras.
—Sempre foi objetivo demais para alguém de sua idade.
—E o senhor sempre disse que não se deve prolongar conversas com comentários desnecessários.
Jon queria que dissesse tudo logo de uma vez. Sabia que o pior ainda estava por vir.
—Não devia ouvir tudo o que digo Jon.-o miestre sorria mas tinha uma sombra nos olhos. O menino nunca gostou quando tentavam aliviar algo ruim para ele, só porque era criança.
—Está fazendo de novo miestre Lwin.
—O senhor seu pai deseja lhe falar-algo no estômago de Jon afundou, deixando um buraco frio no lugar.
—Sobre o quê?-esperou que a voz não deixasse transparecer a sensação ruim que sentia.
—Cabe a ele lhe dizer.
—Nada bom.
— Jon, tem que entender que nesse momento a prioridade é a saúde de Lady Stark e do bebê.
—Assim como aplacar a ira de seus parentes que vieram do sul. Eu entendo.
O que Jon entendia também, era que sempre que Lorde Stark o chamava para conversar, ele sempre acabava com uma restrição a mais. Ainda não havia se esquecido da última vez, Jon tinha apenas quatro anos. Encontrou Lorde e Lady Stark junto ao represeiro,não se lembra do motivo de estar ali mas foi a primeira vez que entendeu que não era como os outros filhos para Lorde Eddard.
“-Você não pode me chamar de pai quando estivermos na companhia de outras pessoas,Jon- o tom era de alguém que parecia falar com algo grudado no céu da boca e fazia força força engolir.
—Não é certo que você se refira ao seu senhor dessa maneira-disse Lady Catelyn.
Em sua pequena cabeça, Jon não conseguia entender o que lhe diziam. Até que sua mente de menino de quatro anos chegou a uma conclusão aterrorizante.
—O senhor não é meu pai?-perguntou espantado.
A expressão de Lorde Stark foi de surpresa e depois de vergonha, olhou o garoto procurando palavras mas como se explica a um garotinho coisas tão complexas.
—Você é muito pequeno para compreender as circunstâncias de seu nascimento mas entenderá ,no futuro, porque não posso agir com você como com as outras crianças.
Jon aprendia rápido, logo chegou a outra questão.
—Isso que significa bastardo? Significa que o senhor não pode ser meu pai?
Outra vez Lorde Eddard ficou sem ter o que dizer e se pois a observar o garoto.Olhos cinzas encaravam olhos iguais aos seus e percebeu que o filho o avaliava e não sabia que impressão estava causando, só pôde supor que não era uma boa. Lady Stark tomou a palavra.
—O importante é que deve se referir a ele como meu lorde ou senhor.
Jon deitou um olhar sobre o homem que até então acreditava ser seu pai, este parecia triste mas não disse nada.Mais tarde entendeu que a presença dele em Winterfell era uma ofensa tanto para Lady Catelyn como para a honra de Lorde Stark. No entanto naquele instante ele não entendia. Então disse a única coisa que pôde.
—Sim, meu Lorde.
O senhor de Winterfell o olhou por mais um instante e depois disse:
—Você já pode ir.
Jon fez uma reverência desajeitada e se afastou.”
Depois desse dia Jon nunca mais chamou Ned Stark de pai, em parte porque nunca se viam a sós e também porque não sabia se pai era a palavra certa para defini-lo.
Só o via de relance, nunca trocaram mais que algumas palavras.Estas eram sempre alguma ordem que o garoto tinha que cumprir.Na maioria das vezes para que ele não incomodasse ninguém. E esse tempo que ele passou fora lutando contra os Greyjoys só serviu para distanciar os dois. Para Jon, o homem que voltou da guerra era quase um desconhecido.
Agora, enquanto se dirigia com miestre Lwin aos aposentos do pai.O garoto não podia deixar de sentir um mau agouro. O miestre agarrou sua mão.
— Eu sei o caminho- insistiu .
— Eu sei que sabe- o miestre apenas segurou sua mão mais forte.
Quando chegaram. O senhor de Winterfell estava sentado atrás de sua mesa e lia uma carta com as feições estoicas de sempre.
—Sente-se Jon.
O garoto se sentou e deu uma olhadela para trás para ver se Miestre Lwin ainda estava lá. A presença dele lhe dava mais coragem.
— Você partirá para a Ilha dos Ursos amanhã. Lady Mormont aceitou recebê-lo por algum tempo. Até tudo se acertar por aqui.
Jon ficou calado enquanto assimilava as palavras.
Ele está me mandando embora— pensou desamparado
Lorde Eddard percebendo a expressão no rosto do menino. Se apressou em continuar.
— Será muito bem tratado.Os Mormont são amigos, nunca tratariam mal um filho meu.
Não é meu pai— Jon teria dito isso em voz alta se tivesse encontrado sua voz.
— Vai ser por pouco tempo. Só até o bebê nascer.
Está tentando se convencer-pensou Jon. Até ele sabia que se fosse embora nunca mais voltaria, Lady Stark se certificaria disso.
—Não faria isso se não fosse necessário. E não vai ser para sempre. Vou mandar buscá-lo, meu filho.
Não é meu pai! E eu não vou voltar aqui nunca mais, fujo mas não volto. Dessa vez Jon não se pronunciou porque o tom de Lorde Stark era quase desesperado. E também não se deve prolongar conversas com comentários desnecessários.
— Sim, meu Lorde- olhava esse homem a sua frente e viu que não o conhecia. Era mesmo um desconhecido. Sempre ouvia que devia ser grato porque o pai o tinha acolhido, que outros não tinham a mesma sorte. E ele pensou, até agora, que mesmo ninguém o querendo ali, o pai queria. E mesmo que fosse a distância, o protegia e acolhia. Acreditava que quase não tinham contato porque isso ofenderia a senhora, pelo menos era isso o que lhe diziam.
Jon percebeu, então, que só estava ali porque Lorde Eddard sentia algum tipo de obrigação para com ele. E agora se apegava a primeira oportunidade de mandá-lo para longe. Não é meu pai, é um desconhecido.
O menino deduziu algo. Não tinha pai nem mãe.Era órfão. Estava só.
—Você parte amanhã a primeira hora. Mandarei guardas que te acompanharão até o porto. Um navio já estará esperando para levá-lo à Ilha dos Ursos.
— Sim senhor.
— Entende porque tenho que fazer isso,não é Jon? Não há outra escolha-Lorde Stark agora já demonstrava uma certa angústia na voz. Mas Jon era uma criança e crianças não são conhecidas por serem compreensivas. Por isso procurou a resposta que o tiraria dali mais rápido possível. Sentia um nó na garganta e não choraria na frente daquele homem.
— Entendo- as pessoas esperavam que ele entendesse coisas demais.
—É melhor que eu vá me preparar para a viagem- disse numa voz tão calma que surpreendeu os dois homens na sala.
—Sim, você já pode ir.
Já havia disparado para a porta quando uma voz pesada o chamou.
—Jon,vou te trazer de volta para casa, é uma promessa.
O garoto o olhou . Não respondeu. Palavras são vento. Mas ficou parado tentando gravar aquele rosto na memória.Não o veria por muito tempo.
Os dois ficaram se encarando até Miestre Lwin pegar o garoto pela mão e o levar para longe dali. Nevava em Winterfell e Jon Snow, enquanto se deixava guiar pelos corredores, jurava para si mesmo que nunca mais voltaria a morar naquele lugar. Não era sua casa e aquela não era sua família.


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Notas finais do capítulo

E agora uma jornada começa.