Dragões do Norte escrita por Snowfall


Capítulo 11
Parente




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Jon observava, da colina, os homens treinando uma formação de batalha. Levara dez anos mas, finalmente, ele tinha um exército. Só os deuses sabem o trabalho que deu. Tentar organizar doze mil guerreiros do Povo livre para a guerra, foi a tarefa mais difícil que Jon já teve. E ele treinava três dragões.
Mas sentia que agora, depois de uma década, enfim chegara a algum lugar. Doze mil homens e mulheres. Uma armada da qual se orgulhava. Mesmo que agora lutassem de forma mais organizada, não perderam nada da sua ferocidade. O Povo Livre tinha uma sede de batalha que um dia, seria decisiva para sua sobrevivência.
Os Thenns haviam mantido sua palavra. Seus homens tinham o melhor armamento que este lado da Muralha podia oferecer. Na verdade, tinha mais de três mil Thenns no seu acampamento nesse momento.
Sigorn veio para as montanhas no segundo ano. O pai não ficou muito contente, mas mandou uma centena de guerreiros com ele. Ao longo dos anos, esse número ultrapassou três milhares. Os Thenns eram os melhores guerreiros que tinham, embora ainda fossem alvo de muita desconfiança.
—Diga aos homens da Infantaria que estão muito afastado uns dos outros. Quanto menor for o espaço entre eles maior a chance de manterem sua formação.
Toregg, que liderava sua Infantaria, se afastou para repassar a ordem à seus homens.
— Você vai treinar os arqueiros daqui de cima- disse ao líder dos arqueiros, que estava ao seu lado- para acertarem alvos lá em baixo. Depois passará para um lugar mais alto. Quero que consigam acertar de uma altura em que os alvos, não pareçam mais que formigas.
—Pretende construir um castelo de gelo para defendermos?- perguntou Sigorn, bem-humorado.
—Estava pensando mais em uma muralha.
—Vai fazer uma muralha?
—Não. Falo da que já está feita.
—Ora. E que visão não seria essa. O Povo Livre lutando para defender aquilo que tentamos derrubar à milhares de anos- o tom de Sigorn era descontraído mas Jon percebeu que ele tentava pescar alguma informação sobre seus planos.
—Ainda é a nossa melhor chance, não é mesmo?
Sigorn apenas ergueu uma sobrancelha. Ele havia se tornado um amigo, por incrível que pareça. Era um dos seus comandantes, assim como Toregg e Tormund. Era inteligente e era bem perceptivo quando queria.
—Vou reunir os arqueiros e fazer como mandou- falou quando percebeu que ele não diria mais nada.
Jon se afastou com Fantasma ao seu lado. O lobo chegava a altura das suas costelas. Tinha o tamanho da mãe quando foi morta. Com o passar dos anos ficaram ligados de um jeito, que ás vezes o assustava. Enquanto Bahuk e os dragões podiam sentir quando alguma coisa o perturbava, Fantasma parecia prever de ante-mão quando alguma coisa ia acontecer com ele. Em alguns momentos não sabia dizer onde o homem terminava e o lobo começava.
Seus olhos se dirigiram as montanhas, aos picos tão altos que eram cobertos de nuvens. Sua visão, então, recaiu sobre as moradias, encrostada nas partes planas dos montes. O seu povo. Era o grupo mais diversos que se podia pensar. Gigantes, Thenns e Hornfoots, caminhavam de um lado para o outro, tão diferentes mas com histórias tão parecidas. Todos tinham, com certeza, um semblante melhor do que quando chegaram.
Vieram dos lugares mais longínquos, fugindo do mesmo inimigo. Com a esperança de encontrar um lugar seguro. Estavam lá atrás da proteção que ele podia oferecer. Ou melhor, da proteção que seus dragões podiam oferecer. A cada dia que se passava o peso que carregava ficava maior.
Pensava nisso enquanto descia a montanha e chegava ao local que costumava caçar. Nos últimos três dias, havia encontrado suas armadilhas disparadas mas vazias, sem um animal sequer. No começo pensou em coincidência mas depois da terceira vez, começou a ter suspeitas.
Terminou de checar suas armadilhas, e seu desapontamento não podia ser maior. De novo suas estavam vazias. Quanto mais pensava sobre o assunto mais confuso ficava. Pensou que, talvez, um predador estivesse devorando sua caça, mas essa opção foi logo descartada. Se fosse isso, haveria algum sinal, algum rastro.
Jon se restringiu a duas possibilidades. Ou os animais aprenderam a se livrar das armadilhas ou estava sendo roubado.
Essa pessoa era esperta o suficiente para apagar seus rastros, assim a alternativa de rastreá-lo não existia. A melhor plano agora era esperar que o ladrão viesse novamente. No dia seguinte faria uma armadilha e ,dessa vez, sua presa não seria um animal selvagem.
....
Jon estava deitado em uma posição desconfortável mas só assim não seria visto.Do seu esconderijo não podia ver nada, mas não precisava. Fantasma sentiria alguém se aproximando a distância. Em breve teria o ladrão bem na sua mira .
Colocou uma lebre em uma armadilha e esperou escondido na neve, a menos de vinte metros de distância, com o arco na mão. Escondeu Fantasma, como reforço, atrás de umas árvores próximas. Queria garantir que sua caça não tivesse para onde fugir. Tinha recebido algumas notícias noite passada e tinha uma ideia de quem podia ser o ladrão e pretendia arrancar algumas explicações dele.
Sentiu seu cheiro antes de vê-lo. Ergueu um pouco a cabeça e o homem entrou em seu campo de visão. Não pode ver seu rosto por causa do capuz que o outro usava. A única coisa que deu para perceber foi que era baixo e magro. Jon disparou uma flecha de aviso que caiu a centímetros dos pés do ladrão.
— Pare bem aí mesmo- quando o homem fez um movimento para pegar o próprio arco- ou a próxima será na sua cabeça.
Não queria matá-lo. Pelo menos não imediatamente. Tinha suspeita que se tratava de um espião e queria algumas respostas. O homem olhou ao seu redor para avaliar as alternativas de fulga mas Fantasma pulou sobre ele e o prendeu ao chão antes mesmo que pensasse em alguma coisa.
Assim que chegou perto o suficiente para apontar a espada para seu pescoço, percebeu o cabelo ruivo e cumprido, e viu que não se tratava de homem coisa nenhuma.
—Se fosse você pensaria duas vezes- disse quando a viu puxar uma faca.
Ela sorriu, embainhou a arma e ergueu os braços em um gesto de rendição. Para sua surpresa, ela não parecia nem um pouco afetada pelo fato de ter sido pega.
—Quem é você?- perguntou Jon.
— Você é aquele que chamam de Lobo Branco?- perguntou ela, por sua vez.
Se tinha uma coisa que odiava era quando respondiam uma pergunta sua, com outra pergunta.
— Recomendo, para o seu bem, que me responda. Não está em posição de fazer perguntas aqui- a paciência de Jon estava acabando.
—Calma, garoto bonito. Meu nome é Ygritte. Venho lá de Rio Haste.
Mentirosa. Sabia muito bem de onde ela vinha, mas preferiu não comentar. Queria saber qual era o objetivo dela ali.
—O que faz aqui?
—Só estava de passagem...
—Então resolveu parar para me roubar- interrompeu.
—Vim caçar. Mas pra quê ter trabalho, se posso simplesmente pegar de você.
Estava rindo dele. Mas era um sorriso nervoso. A tentativa de piada foi mal recebida por Fantasma, que rosnou a centímetros do rosto da garota. O sorriso dela desapareceu.
— Achou que roubar de um desconhecido, em uma terra estranha era uma boa ideia?
—Eu viajo com a minha família. A mãe tá muito doente e preciso dá um jeito de alimentar meus irmãos. São só crianças. Tenho que fazer o que for preciso.
Jon não ficou nem um pouco convencido com essa história triste, que ela contava. Depois de um momento, estendeu a mão para a mulher e a ergueu.
— Pegue a lebre e vá embora. Procure sua caça em outro lugar, não perdoarei uma segunda vez.
—Vai me deixar ir?- ela parecia surpresa.
—Sim.Vai logo, antes que me arrependa.
Se suas suspeitas estivessem certas em breve veria Ygritte novamente.
.....
No dia seguinte, acordou cedo para treinar com os gigantes. Ele mesmo fazia questão de supervisionar todos os embates. Jon, mesmo agora, se encarregava do treinamento dos Kortan. Não permitiria que seu povo fosse massacrado, muito menos extinto. Afinal, antes de tudo, ele era Magnar Mag.
Quando percebeu que os gigantes não seriam bons com espadas, resolveu partir para as alternativas. Muitos usavam machados e martelos, outros uma ceifadeira, que Jon projetara especialmente para eles. Todos treinavam com o arco e sabiam usar o escudo. Fez de tudo para prepará-los. Contava com cerca de dois mil e trezentos gigantes prontos para a guerra. Pelo menos o mais prontos que podiam ficar.
Enquanto pensava nisso,Tormund se aproximou com um sorriso que Jon passou a associar com problemas. O homem parecia se divertir em vê-lo se contorcer com desprazeres de sua posição.
— Temos oito gigantas grávidas, sabia?
—Não, mas é uma boa notícia- respondeu cauteloso. Tinha certeza que o homem ainda não havia acabado.
—É. E todos os bebês se chamarão Jon.
—Hum- foi sua resposta.
—Sim, até as meninas. Acham que é um nome abençoado, que trás sorte. Quem precisa de cabelo ruivo quando se é Jon Snow, não é mesmo?
Se absteve de comentar. Tormund gostava de ressaltar o modo como alguns o tratavam. De um jeito que o homem sabia que deixava Jon desconfortável. Não queria esse tipo devoção, isso só aumentava seu medo de falhar.
— Não faça essa cara, rapaz. Devia tá feliz.
— E por quê seria isso?
—Conseguiu o que queria. Pôs todos nós enfileirados como patinhos. Não era essa a sua intenção,nos transformar num exército sulista?
—Minha intenção era nos dar a melhor chance de sobreviver.
—Que seja. O ponto é que conseguiu. Devia comemorar. Devia achar uma boa mulher para fazer alguns garotinhos carrancudos como você.
—Ficarei feliz quando o Rei de Noite estiver morto e Longa Noite tiver acabado. Aí então, falaremos de mulheres- respondeu. Não traria um filho para esse mundo, só para perdê-lo no próximo inverno. Não era uma boa época para ser pequeno e indefeso.
—Jon?-alguém chamou.
Se virou e viu Kena se aproximando. O Warg tinha quase quinze anos agora. Era um bom garoto, sempre pronto para ajudar.
— O que foi?
— Um bando, subindo as montanhas. Estarão aqui antes do meio dia.
—Quantos?
— Uma dúzia. Não parece que tem reforços mas continuo procurando. São aqueles que vi rondando a área na semana passada.
Kena tinha oito corvos e duas corujas, que ele espalhara pela região por ordem sua. O garoto era um Warg muito bom. Melhor até que Jon. Agora tinham olhos em todos os lugares.
— Prepare tudo para recebê-los.
Logo no primeiro ano nas montanhas, Jon mandou construir um salão, maior que aquele em Solar Ruivo. Colocou duas mesas de dez metros de cada lado e bancos para todos sentarem. Preferia discutir com homens sentados. Homens em pé são mais propícios a falar do que ouvir.
Esperou pelas visitas em seu cadeirão, que ficava em uma posição na qual podia ver todos no recinto. Quando os visitantes entraram, o encontraram acompanhado de seus melhores homens. Não ficou surpreso quando avistou uma cabeleira vermelha entre eles. O único barulho que se ouvia era Win Tun, que amolava sua ceifadeira em um canto. A arma tinha mais de um metro de envergadura, e cortaria uma pessoa em duas como se fosse feita de manteiga.
O homem que liderava o grupo deu um passo a frente. Jon nunca o tinha visto, mas soube quem era no momento que entrou. A reputação de Camisa de Chocalho o precedia.
— Você é o Lobo Branco- afirmou o outro enquanto ele e seus homens se sentavam.
Lobo Branco. Muitos o chamavam assim. Olhou para Fantasma deitado aos seus pés. Achava um nome apropriado.Bem melhor que muitos que ouvira.
—O que quer aqui, Senhor dos Ossos?- perguntou logo. O Povo Livre não era dado a cortesias desnecessárias.
— O Rei quer falar com você.
Então chegara a hora. Sabia que mais cedo ou mais tarde Mance Rayder se atentaria para ele. O Rei-pra-Lá-da-Muralha vinha recrutando tribos do Povo Livre há anos e era só questão de tempo que viessem atrás dele. Jon liderava vinte mil pessoas.
— Sobre o quê?
— Isso é pra ele te dizer. Mance só mandou que fosse levado até ele.
—O que quer dizer com mandou- perguntou Toregg- Seu rei não manda em nada aqui, Camisa de Chocalho.
O ar no salão mudou. A tensão fez Fantasma erguer a cabeça.
— Seu bando vem rondando a região há dias. Só agora tomaram coragem para vir até mim. Por quê?
—A garota disse que era seguro. Que podíamos confiar.
Os olhos de Jon recaíram sobre Ygritte. Ela sustentou seu olhar, desafiante.
—Então nada de irmãos famintos, não é?
Ela apenas sorriu.
— Por quê eu iria até Mance Rayder?-perguntou se voltando para o Senhor dos Ossos.
— Porque ele tem o que quer.
—E o que seria?
— Ele sabe onde encontrar Vidro de Dragão.
Todos os seus homens se remexeram. Após uma década de busca, ainda não tinha encontrado nem sinal de Obsidiana.
— Se for vê-lo,Mance promete te contar o local que os Filhos da Floresta conseguiam Vidro de Dragão.
A cabeça de Jon começou a girar com todas as coisas que isso podia implicar.
—Pensarei na sua oferta. Serão nossos hóspedes até que tome minha decisão.
Camisa de Chocalho apenas soltou um barulho do fundo da garganta e se retirou com seus homens.
Jon ficou em silêncio por algum tempo. A possibilidade de conseguir Vidro de Dragão era tentadora mas não podia deixar de pensar, que tudo isso podia ser um truque de Mance Rayder, para fazê-lo descer as montanhas. Não tinha motivo nenhum para acreditar que o Rei-pra-Lá-da-Muralha nutria alguma estima por ele.
— Sabe o que isso significa, não sabe. O que Rayder quer- perguntou Varla.
—Que nos juntemos a ele. Que lutemos por sua causa.
— Ele tem quase cem tribos guerreiras com ele- informou Toregg.
— Do que adianta isso. Ter guerreiros não significa ter um exército- comentou Sigorn- meu pai diz que Mance vai guiar o Povo Livre para o outro lado. O velho não vê que o problema não está em ultrapassar a Muralha, mas sim em sobreviver no Sul.
—Tem razão- concordou Toregg- São desorganizados. Serão cortados em pedaços pelo Stark, como aconteceu dezenas de vezes no passado. Ultrapassar a Muralha é só o começo do problema.
Jon sentiu orgulho de seus comandantes. Viu que fez escolha certa. Eles começavam a pensar como jogadores. E o jogo que teriam pela frente era o mais perigoso de todos. E que os deuses tivessem misericórdia, se perdessem.
— Não é novidade nenhuma, que nossas melhores chances estão daquele lado da Muralha. Mas se esperamos ter sucesso onde tantos falharam, temos que criar uma estratégia perfeita.
—Então o que fazemos?- perguntou Tormund.
—Vou até Mance Rayder. Depois que conhecê-lo decidirei se nos juntamos a ele ou seguimos nosso próprio caminho.
Jon jantou com os visitantes naquela noite, eram seus hóspedes no final das contas. Por isso teve que aguentar horas sem fim da companhia desagradável do Senhor dos Ossos e dos olhares mal disfarçados de Ygritte, que não passaram despercebidos por Tormund. Mas um dos recém-chegados cantava muito bem, então a noite não foi de todo perdida.
Depois de comerem se dirigiram ao lado de fora. Enquanto andavam, Camisa de Chocalho provocava Tormund.
—Nunca pensei que você escolheria seguir um moleque invés de um homem, Tormund. Quando ouvi que tinha subido as montanhas seguindo um menino montado num mamute, quase não acreditei.
— Todos nós fizemos uma aposta, Senhor dos Ossos. Vamos saber, em breve, quem fez a escolha certa.
Nesse momento uma rajada de vento os atingiu. Seus hóspedes foram ao chão quando Morghon pousou na frente deles. Tormund soltou uma gargalhada.
— Tenho a leve impressão que foi eu- disse enquanto o outro se levantava.
Enquanto os homens se recuperavam, Jon avançou para o dragão. Morghon já era grande o suficiente para engolir um mamute em uma mordida só. Seus espinhos prateados reluziam e os olhos verdes contrastavam com as escamas brancas. Ele era uma visão e tanto, mesmo na pouca luz.
—Volto logo-disse enquanto se afastava.
Montava os dragões desde de que ficaram grandes o suficiente,e era de se esperar que, depois de tantos anos,tivesse se acostumado. Mas ainda sentia um frio no estômago toda vez.
Morghon deixou o chão e a sensação de voar o assaltou. Nunca experimentara nada como isso. Não havia liberdade maior. Deslizou de seu corpo e passou a ver tudo pelos olhos do dragão. Mesmo à noite, a visão era perfeita. As cores mais vivas do que o normal. Ver tudo de cima com certeza abria novas perspectivas.
Jon podia sentir Valkius voando ali perto e Gaothrax deixando sua caverna gelada. Sentir os três de uma vez era exaustivo. Troca-peles quase nunca controlavam mais de um animal por vez, e sua tarefa se complicava mais por se tratarem de dragões. De maneira nenhuma eram dóceis. Controlá-los tinha mais a ver com pedir educadamente, do que dá ordens.
Os dragões sabiam que era hora de comer.Jon os ensinara a procurar alimento sozinhos e nunca aceitarem ser alimentados. Voavam sempre à noite, dessa maneira era mais fácil evitar que fossem vistos. Quase todos desse lado da Muralha sabiam dos seus dragões, isso não significava que queria que todos soubessem onde iam e quando.
Quando Gaothrax e Valkius se juntaram à ele, procurou um lugar adequado para caçar. Sempre procurava um local diferente, para evitar que acabassem com os animais de um lugar ou que seus movimentos fossem previstos.
Os dragões preferiam o mar. Puxavam peixes enormes da água com uma facilidade impressionante. Gaothrax conseguiu uma pequena baleia uma vez. Infelizmente não podia ir tão longe essa noite. Partiria bem cedo amanhã, então um rebanho de renas teria que servir.
.....
Pela amanhã, partiu com uma centena de homens e uma dúzia de gigantes. Levou um dos corvos de Kena, para mandar alguma mensagem, se fosse preciso. E deixou Tormund tomando conta de tudo.
O caminho era terrível e a caminhada era lenta, mesmo em cima dos mamutes. Assim que entraram na Floresta Assombrada, todos ficaram mais alertas. A ameaça dos Outros era mais forte ali.
Quando acamparam na terceira noite, o cantor tocou músicas sobre os Filhos da Floresta. As canções eram tristes e deixaram o ar ainda mais pesado.
O sono custou a chegar naquela noite. Só percebeu que dormira quando se viu na pele de Fantasma. O lobo caçava ali perto, totalmente confortável naquele ambiente.
De repente foi assaltado com um cheiro horrível.Seus pelos se arrepiaram e um rosnado saiu da sua boca. Suas patas se cravaram no chão como se fosse um inimigo.
Depois que se recuperou e conseguiu se acalmar, começou a seguir seu faro. Precisava saber o local exato onde os mortos estavam. Seguia o cheiro de morte quando uma pequena fogueira ali perto, o fez se desviar do rastro dos Outros.
Mais de perto conseguiu ver cinco vultos vestidos de negro. Homens da Guarda da Noite. Os Outros se aproximavam e o Patrulheiro que fazia a vigia não percebia nada. O cheiro era quase insuportável para ele mas os homens na pequena clareira não sentiam coisa alguma.
A temperatura baixou consideravelmente e Jon voltou ao seu corpo.
—Acordem! De pé, agora!
Levou apenas uns instantes para Toregg entender a situação e tocar o corno de guerra .Seus homens se puseram em ação imediatamente. Tochas foram acesas e os arqueiros se armaram de flechas incendiárias. Os escudos foram erguidos.
Os homens de Mance Rayder pareciam confusos.
—Estão quinhentos metros ao sul. Vão atacar um grupo de Corvos- informou Jon.
— O que está fazendo, moleque?- a confusão de Camisa de Chocalho durou pouco- Se os Outros estão desse lado, devemos correr no sentido oposto.
—Não posso perder essa oportunidade.
—Oportunidade de quê? De morrer?
Jon não tinha tempo para discutir nem se explicar nesse momento. Então foi objetivo.
— Temos algo para fazer. Fique á vontade para nos acompanhar se quiser.
Viu o Senhor dos Ossos trocar um olhar com o tal cantor e depois pegar sua clava.
A formação que usaram era bem simples. Os homens com escudos formaram uma parede para proteger os arqueiros e esses guardavam Jon e Sigorn que tinham flechas de Obsidiana. Os gigantes se alinharam na retaguarda.
Das cinco flechas de Vidro de dragão que tinha, apenas uma estava com Jon. As outras distribuíra entre seus melhores arqueiros. Três deles ficaram nas montanhas, então agora tudo dependia dele e Sigorn.
Os homens do Rei fitavam as árvores apreensivos. Teve orgulho de ver apenas determinação nos rostos dos seus. Esse momento provaria se uma década de esforço e treinamento, serviu de alguma coisa.
Quando ouviram o barulho de luta, os arqueiros se prepararam. Seus homens avançaram em linha. Os arqueiros começaram a disparar assim que as criaturas entraram no campo de visão. Apenas a voz de Jon era ouvida.
Preparar, apontar, disparar. Novamente, preparar, apontar, disparar. Aos poucos chegaram no meio da clareira.
Os homens da patrulha estavam desorientados. Pelo menos, os dois que ainda estavam vivos. Um deles sangrava ferozmente.
Havia no máximo oitenta criaturas, e isso o preocupava. Eram poucos demais e ainda não tinha visto nenhum Vagante Branco.
Seus temores se mostraram justificáveis, quando mais criaturas apareceram e com elas, um Outro.
Jon disparou a flecha antes mesmo que ele ficasse totalmente visível mas para sua surpresa, as criaturas não caíram com seu mestre. Isso só podia significar uma coisa.
—Sigorn, são dois!
Jon ouviu um grito quando um dos patrulheiros foi agarrado e jogado no chão, por três mortos. Jon saiu da formação e correu para ajudar, ignorando o bom senso.
Puxou uma das criaturas de cima do homem e Fantasma, outra. Quando partiu para terceira viu o segundo Outro praticamente em cima deles, já baixando a lança. Conseguiu erguer a espada no momento certo mas isso não adiantou muito. A arma do Vagante quebrou a espada de Otto em dezenas de pedaços. Só teve tempo para mover o corpo um pouco para a esquerda, quando o golpe caiu sobre ele.
O Outro já preparava o segundo golpe quando foi atravessado por uma flecha e se desfez. Sigorn baixou o arco ao mesmo tempo em que os mortos caíram no chão.
Jon se pôs de pé para ver o resultado. Seus homens estavam inteiros e ainda em formação.Como foi treinado, esperavam seu comando.
—Recolham os corpos. Vamos queimar todos imediatamente.
Pouco depois a pilha de criaturas ardia. Os homens se movimentavam fazendo um perímetro de segurança, caso houvesse um novo ataque.Os dois patrulheiros sobreviventes, foram amarrados em árvores. Pareciam tão assustados como alguém que acabara de ser atacado por mortos, devia estar.
—O que fazemos com os Corvos?- perguntou Toregg.
Jon observou mais de perto, o homem que estava menos ferido. Não dava para ver muito por causa do sangue mas o cabelo negro e os olhos cinzas fizeram algo se remexer em sua memória. Sua mente fazia força para se lembrar de algo, que parecia importante.
O homem tentava enxergar através do sangue que escorria de sua testa. Quando conseguiu focar, Jon viu reconhecimento nos olhos dele.
—Ned?
Jon se virou rapidamente para esconder seu rosto, e se dirigiu a Toregg.
—O homem está delirando. Vamos interrogá-lo pela manhã, quando estiver são.
Quando a luz do dia chegou. Sigorn começou o interrogatório. Em outras circunstâncias Jon teria feito isso. Mas estava muito perturbado no momento, e tinha certeza que isso transpareceria em sua voz. Além do mais não queria chamar atenção do interrogado.
—O que tá fazendo tão longe do seu poleiro, Corvo?- perguntou Sigorn.
Ninguém respondeu de imediato. O homem mais velho estava consciente mas terrivelmente pálido. Não sangrava, mas tampouco parecia apto para falar. E o mais novo parecia está muito ocupado analisando seus captores.
— Considerando que acabamos de salvar seus traseiros gordos da morte. O mínimo que podem fazer, é nos dá algumas respostas- o tom de Sigorn era leve enquanto brincava com uma adaga entre os dedos.
— Viemos a procura de Waymar Roice. Ele está desaparecido.
—Se desapareceu significa que, ou morreu ou foi capturado. Vocês acharam que vir atrás dele, com apenas cinco homens, era sensato?- falou Jon sem conseguir se controlar.
Sigorn riu e o Patrulheiro se voltou para ele. Maldição.
— Obviamente, foi uma ideia estúpida- disse o homem, lhe lançando um olhar suspeito- e quem é você?
Jon ficou sem saber como responder. Não sabia se seria o reconhecido, esperava sinceramente que não. Era um problema que não precisava.
—Ele é o motivo de você ainda está vivo- respondeu Sigorn- é tudo que precisa saber.
—Vamos matá-los e acabar logo com isso- se meteu o Senhor dos Ossos, já erguendo sua clava.
—Para trás, Camisa de Chocalho. Não toma decisões aqui- objetou Toregg.
— Vocês vão na frente. Farei o que é preciso e encontro vocês mais tarde- ordenou Jon. Só Toregg e Sigorn ficaram com ele.
Quando o grupo se afastou o suficiente, Jon puxou a adaga e desfez as amarras dos dois homens e os pôs em pé.
— Sigam o lobo- disse- Fantasma vai levá-los para a Muralha e vai ajudá-los a evitar os Vagantes Brancos. Sugiro que sejam rápidos e aproveitem máximo de luz do dia que puderem.
— Por quê está nos libertando?
—Para você avisá-los. Diga a todos o que viu aqui. Fale que a Longa Noite está chegando. Tem que avisar o Sul, que os mortos caminham de novo.
—Quem é você?- perguntou o homem de novo. Jon quase podia ouvir seu cérebro começando a fazer associações.
—Vá de uma vez. Fantasma vai mostrar o caminho.
Quando os dois homens desapareceram entre as árvores, Jon soltou a respiração que estava segurando. Se voltou para Toregg e Sigorn, que o olhavam com carrancas.
—Por quê libertou os Corvos?- perguntou Toregg.
— Não pense que eles não teriam te matado, se a situação fosse invertida- disse Sigorn.
Jon se virou e olhou para o lugar onde tinham sumido. Se lembrou do homem que vinha vê-lo quando ia até Winterfell, sempre cheio de histórias de suas patrulhas. E que história teria ele para contar agora.
— Meu parente- admitiu baixinho.
—O quê?- Toregg não entendeu.
—O Corvo mais jovem é meu parente- elaborou.
— Tem certeza?
— Sim. Benjen Stark é meu tio.
— Se parece mesmo com ele, agora que paro pra pensar- comentou Sigorn- Ás vezes me esqueço que tem sangue Stark.
Esse foi o fim dos questionamentos. Os amigos sabiam que nunca seria Assassino de Parentes. As leis antigas eram supremas naquele lugar.
Quando alcançaram o grupo, Ygritte veio recepciná-los. A Esposa de Lanças nunca ficava longe, sempre pronta para brindá-los com comentários cáusticos.
— Então- começou ela- vocês matam Outros. Como?
— Com Vidro de Dragão.
— Por isso que procura tanto. Pretende lutar contra os Vagantes.
— Todos nós lutaremos, mais cedo ou mais tarde.
— Você talvez, eu não. Enquanto estiver aqui lutando contra cadáveres, eu estarei do outro lado daquela monstruosidade de gelo.
— E como pretende fazer isso, exatamente?
— Mance vai encontrar o Berrante de Joramum. Ele vai derrubar a Muralha e todos nós marcharemos sobre os escombros.
— E com a Muralha no chão, o que impedirá que os Outros marchem sobre os mesmos escombros e te mate do lado de lá?
Ygritte abriu a boca rosada em um O perfeito,o que quase fez Jon rir.
— O plano do seu Rei não parece muito bom, não é?
— Cala a boca- gritou ela- Você não sabe de nada, Jon Snow. Mance comanda quase cem mil homens. Você só está vivo hoje, porque ele permitiu.Ele pode acabar com você a hora que quiser.
O peito dela subia e descia de raiva. Mas Jon estava se divertindo.
—É mesmo? E onde estão os seus Cem mil guerreiros agora, Mance- perguntou ao cantor a sua esquerda.
Surpresa passou pelo semblante do homem até ser substituído por um sorriso.
— Quando soube?- perguntou o rei.
—Vi quando o Senhor dos Ossos pediu instruções a você ontem à noite. Achei seu disfarce bem interessante, devo dizer. Um cantor, quem suspeitaria?
—Obrigado. Mas não foi muito eficiente, se fui tão facilmente desmascarado. E o que acontece agora?
Percebeu uma certa apreensão na voz dele. Mance sabia que nunca sairia dessa floresta vivo, se Jon desse a ordem.
— Falou a verdade sobre o Vidro de Dragão?
— Falei.
—Então continuamos nosso caminho- quando o homem fez menção de se afastar, continuou- só quero que se lembre de uma coisa.
—E o que seria?
— Você vive hoje só porque eu permito- imitou as palavras de Ygritte- Da próxima vez que tentar me enganar, terei sua cabeça adornando uma estaca. Acredite, seus cem mil homens não serão de muita ajuda para você.

.....
Benjen achava que nunca mais ficaria aquecido de novo. Agora, mesmo em frente da lareira do Lorde Comandante, sentia frio como naquela noite na floresta.
— Temos que mandar corvos- disse Lorde Mormont, enquanto dava voltas pelo aposento- Todos os corvos. Os lordes tem que saber dessa ameaça antes que seja tarde de mais.
— Não podemos esperar que nos levem a sério. Infelizmente, acreditar em lendas e contos é próprio das crianças. A mente adulta é muito mais restrita e não temos nenhuma prova para apresentar- disse Miestre Aemon.
— Não apresentei nenhuma prova à vocês, mesmo assim acreditaram em mim- argumentou Ben.
Mas entendia o que o Miestre queria dizer. Até mesmo em Castelo Negro, havia muitos que não acreditavam nele. Muitos dos seus irmãos achavam que tudo não passava de um truque dos selvagens.
— Sim, mas não podemos esperar que a sua palavra e a do pobre Jafer, convença muitos mais- comentou o Miestre- A palavra de um homem é moeda pouco valorizada hoje em dia. Principalmente ao sul do Gargalo.
Ben lembrou dos seus homens com pesar. Três deles foram mortos e depois queimados pelos selvagens. Ele conseguira arrastar Jafer Flowers até ali vivo, mas ele ainda estava sob os cuidados do Miestre. Não falara nada desde que foram atacados pelos mortos. Não que Benjen o culpasse, ele mesmo resistia a vontade de achar um lugar em que se encolher. Não podia deixar que a mortes de seus irmãos fossem em vão. Iria encontrar alguém que acreditasse.Tinha que encontrar.
— Você disse que os selvagens conseguiram matar os Outros. Como fizeram isso?- perguntou o Lorde Comandante.
— Usaram fogo contra os mortos. Não sei como mataram o Outro.
—Como assim? Não viu as armas deles?
O Velho Urso estava mais impaciente a cada dia. Desde de que Benjen voltou contando sua história sobre Outros, selvagens e lobos gigantes albinos, Jeor Mormont pareceu ter envelhecido dez anos.
—Atingiram os Vagantes com flechas mas não sei como funcionaram. As flechas que Flowers disparou foram inúteis.
— Obter esse conhecimento deve se tornar nossa prioridade, se quisermos sobreviver ao próximo inverno- disse o Miestre.
O Inverno Está Para Chegar. Será que já existiu uma verdade tão sombria.
—Precisamos decidir qual nosso próximo passo- comentou Benjen, tentando afastar os pensamentos do que estava por vir.
—Lorde Stark foi nomeado Mão do Rei recentemente. Tenho certeza que ele escutaria o irmão- comentou o comandante.
—E o rei escutaria Ned- completou.
Pensar no irmão, fez Ben se lembrar que precisava mandar uma carta para ele. Ned precisava saber que ele encontrara mais que Vagantes Brancos do outro lado da Muralha.
—Há muito o que Ned precisa saber- falou mais para si mesmo.
—Tem certeza?- perguntou o Lorde Comandante, finalmente se sentando -Você pode ter se confundido.
Era mesmo difícil de acreditar. Chegou até pensar, por um instante, que podia ter se enganado. Mas teve suas suspeitas confirmadas quando percebeu que o rapaz também o reconhecera.
—Tenho certeza. Prepare um corvo, Miestre Aemon. Preciso escrever ao meu irmão e dizer que encontrei o filho dele.


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