Back to Home escrita por Ana


Capítulo 15
Sopro de Esperança


Notas iniciais do capítulo

Música do capítulo: Sam Smith - Pray
Tenham uma boa leitura.
Perdoem os erros que passam despercebidos.



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— Achei que era só no George Washington University Hospital que todos ficavam afobados quando o ranking do Hipócrates estava prestes a sair. — Kristin falou enquanto guardava as suas coisas no seu armário.

            — O que? O George Washington é o hospital que está ocupando o primeiro lugar no ranking a mais tempo. — Ruby respondeu vestindo o jaleco. — Não tem nem mais graça.

            — Pois é, mas ele tem se mantido à base de muito suor e estresse dos médicos que desenvolvem os programas de pesquisa lá, a Emma Swan sabe bem como as coisas funciona por lá. Eu sei que estou só “emprestada” para cá por causa da licença da outra pediatra, mas se o conselho permitisse, eu adoraria permanecer aqui. O clima aqui é outro, vocês são mais receptivos, até a chefe do departamento, a qual me disseram que era com quem eu deveria pisar em ovos, se mostrou ser uma ótima pessoa.

            — As pessoas de fora e as que estão entrando no hospital costumam ter essa impressão sobre a Regina, mas ela realmente é ótima, ela trouxe um nosso gás para cá. Ela cobra quando é necessário, e fala alto, grosso e sério na maioria das vezes, mas isso não faz dela uma má pessoa, acho que foi a forma que ela achou para se fazer ser ouvida.

            — Ela não é mesmo má pessoa. — falou mais pra si do que para Ruby.

            — Vou indo, estou com alguns inter...

            Mas antes que a Dra. Lucca pudesse terminar a frase, o seu page e o de Kristin começaram a soar ensandecidamente, e em uma sincronia perfeita de quem já tinha feito aqui dezenas de vezes, as duas se olharam e saíram correndo em disparada em direção a entrada de emergência principal do hospital. Quando elas chegaram a entrada, Regina e Robin já estavam à postos, e mais internos vinham chegando com Neal.

            — Que bom que você está no hospital hoje. — Regina falou assim que viu Kristin.

            — O que aconteceu? — perguntou.

            — Um acidente, um ônibus escolar foi jogado para fora da pista por um caminhão, ele atravessou a mureta e desceu ribanceira abaixo. — falou alto o suficiente para que os demais que estavam chegando pudessem escutar — Então é o seguinte, doze ambulâncias estão vindo para cá, dois pacientes em cada uma, vinte e quatro pessoas no total, a maioria esmagadora são crianças, há alguns adultos, uma mulher grávida e o motorista, que segundo os paramédicos, teve um problema com os galhos de árvores que entraram no veículo. Liberem da emergência quem pode ser liberado, e se preparem.

            Quando as ambulâncias começaram a chegar, todas com as suas sirenes ligadas, houve uma comoção entre os médicos, enfermeiros, residente, internos e os paramédicos.

            — Vão! — Regina gritou se fazendo ser ouvida em meios as sirenes.

            Ela já presenciou e trabalhou em muitos casos de pacientes vindo de acidente assim, onde muitas pessoas haviam sido machucadas, acidentados de ônibus, carros cheios com famílias, mas era sempre mais difícil quando envolvia crianças.

            As primeiras ambulâncias trouxeram os casos mais graves, a mulher grávida, por quem Kristin prontamente se responsabilizou, quatro acrianças com membros fraturados, que Neal logo assumiu com um interno, e só então Regina entendeu quais os problemas que o motorista tinha tido com os galhos das árvores.

            — Ele está com hipotensão, Dra., e a pressão segue caindo, mas ele ainda está consciente. — o paramédico disse ao descer a maca da ambulância.

            — As crianças, onde estão as crianças? — o motorista perguntou tentado se mexer e se livrar das mãos dos paramédicos a todo custo.

            — Qual o seu nome? — Regina perguntou.

           — George, me chamam George. O caminhão, ele veio, e eu, eu...

           — George, George me escuta, as crianças estão sendo atendidas, mas agora precisamos cuidar de você.

            — Ao descer a ribanceira, o ônibus só parou quando começou a se chocar contra as árvores e os galhos lá em baixo, e um deles atravessou o para-brisa no lado do motorista, e o resultado foi esse. Tentamos o máximo possível não que mexer no gralho. — o paramédico explicou.

            O homem fora atravessado por um galho grosso de árvore, ele entrava por a região umbilical e atravessava em diagonal, saindo na região ilíaca direita posterior. Regina tinha fortes suspeitas de que o estômago havia sido perfurado.

            — Rápido, levem ele para o centro cirúrgico, se o ácido gástrico estiver saído do estômago, teremos problemas ainda maiores.

        — O meu bebê está bem? — a mãe perguntou aos prantos, enquanto Kristin fazia a ultrassom e uma residente cuidava dos machucados superficiais que ela tinha no rosto.

            — Estamos checando isso, mas você precisa se manter calma.

          — Meu Deus, os meus alunos, tantas crianças... Como elas estão? Estão bem?

            — Você realmente precisa se acalmar.

            — Dra. Bauer, preciso de você. — uma interna que tratava uma garota mais a frente chamou — Ela está convulsionando.

            — Aí meu Deus, Anne! Anne! — a professora começou a gritar, e de repente o monitor de batimento cardíacos fetal começou a alarmar.

         — Cuide para que ela não se engasgue — gritou para outra interna. — Os batimentos do bebê estão caindo.

            — Eles já desaceleraram antes, mas nunca tanto assim. — disse a residente que estava acompanhando.

            — Nós vamos ter que fazer o parto agora!

           — O que? Não! Não dá! Não está na hora ainda. — a professora falou.

            — Ele vai ter muito mais chances em uma incubadora do que se continuar dentro de você, eu posso te garantir. Sala de cirurgia agora!

            — As luvas. — Emma pediu ao entrar na sala de cirurgia.

            — Mas o que você está fazendo aqui? — Regina perguntou incrédula.

            — Te ajudando a salvar essa vida.

            — Fora Emma, você não faz parte do quadro médico do hospital.

            — O conselho me ligou e contou da lotação do hospital, não pude deixar de vir. — era sua folga e Emma havia acabado de chegar, tinha deixado as meninas na escola, quando o seu celular tocou, era Gold, um dos médicos aposentados e acionistas que faziam parte do conselho do Boston Hospital Center. — Isso é trabalho para mais de uma cirurgiã, Regina, você não vai resolver isso só com dois enfermeiros, e o hospital está sem traumatologista, e sei que podemos trabalhar juntas.

            Respirando fundo, Regina apenas assentiu com a cabeça, seu dever era com e para o paciente.

          — A serra — Emma pediu — Quando eu serrar, você retira o galho.

            — Espera, ainda não, ele pode ter uma hemorragia.

            — Ele vai ter de toda forma, mas se continuar com o galho, a probabilidade de infecção generalizada será ainda maior.

            — Vamos começar a trabalhar em volta do galho, depois que estabilizarmos os órgãos ao redor, você vai poder serrar.

               — Tudo bem, então vamos começar.

            Ao observar as lesões, Regina viu que o estômago dele não estava como esperava que estivesse, o que não tornava a situação melhor, já que outros órgãos estavam lacerados.

            — O rim está perdido, não dá para salvar.

            — Se concentra em manter a artéria renal sob controle, que eu vou lidar com essa hemorragia. — Regina disse a Emma.

            — Temos bastante sangue disponível? — Emma perguntou ao enfermeiro.

            — Sim Dra.

          — Chamem o Dr. Cassid, há costelas quebradas. — Regina mandou e o enfermeiro saiu correndo em busca de Neal.

            — Me deem espaço, vou travar o fixador interno. — Neal disse ao chegar e avaliar a condição do paciente, e então, pós as mãos à obra.

            Emma e Regina trabalhavam juntas em um ritmo frenético que era só delas, como se ontem mesmo tivessem operado juntas, quando na verdade há muito tempo não faziam.

            A última vez em que tinham trabalhado juntas em uma cirurgia, foi semanas antes de se separarem, um carro com quatro pessoas havia literalmente entrado debaixo de um caminhão. No dia em questão quase todos os médicos do staff estavam de folga, e Regina e Emma como residentes concluintes na época, Emma no trauma e Regina na cirurgia geral, assumiram o paciente de pior estado, o motorista.

            A sincronia a qual trabalhavam não era interrompida por nada, aparelhos apitavam, pessoas entravam e saiam da salinha de observação, Neal consertava ossos, enfermeiros se olhavam tensos a cada corte, a tensão estava no ar, mas nada tirava a concentração delas. Emma e Regina não precisavam se palavras, a comunicação por olhares era o suficiente para saberem onde se fazia necessário a cauterização ou uma sutura, ou se precisavam de ajuda. Cada movimento, cada ação, eram de uma precisão pontuada, não havia espaço para questões pessoais, não havia espaço para erros.

            — Acho que agora podemos. — Regina falou ao terminar a sua última sutura.

            — Há alguém para se despedir? — Emma perguntou.

         — Vi alguém procurando por o esposo no saguão, acho que deveria ser a esposa dele.

            — Dr. Cassid, quero que comprima o fígado, por favor. — Regina pediu.

            — Só um instante... Assim?

            — Isso.

            — Pode serra quando estiver pronta.

            — Vou serrar essa porção maior, assim podemos tirar ele por partes.

            Ao ser ligada, o barulho da serra encheu o centro cirúrgico, e com o sinal de Regina indicando que estava pronta, Emma começou a serrar o galho na parte da frente, para que Regina pudesse puxá-lo por trás, pois a ponta que estava voltado para a porção anterior do corpo, o galho se ramificava em outros galhos mais finos e com muito mais folhas. Emma serrou a “copa” do galho, e antes que a serra chegasse ao final da madeira, os enfermeiros já estavam prontos para pegá-lo, após a retirada da “copa”, Emma serrou mais um pedaço e Regina retirou o restante.

            — A artéria hepática... — Regina começou a dizer.

            — Vou cuidar dela.

            — Ele está perdendo muito sangue. Mais compressa. — Neal pediu.

            Terminado a cirurgia, poças de sangue se espalhavam pelo chão, a tensão havia dado lugar a exaustam, como um trem descarrilhando dos trilhos prestes a se chocar contra um muro de pedras, tudo que Regina precisou deixar de lado horas antes, a atingiu. Tirando a roupa cirúrgica de supetão, Regina deixou o centro cirúrgico a passos apressados.

            — Regina... — Emma tentou chama-la, mas ela já tinha desaparecido no mar de corredores.

Pray ♪

            O hospital estava lotado, não só pelos pacientes, mas por seus familiares, pais, avós e tios, todos ansiando por notícias, temendo o pior, mas sempre esperando pelo melhor, esperando ver as suas crianças correrem e brincarem como crianças novamente. A capela do hospital também tinha sido ocupada, quando as coisas fogem do nosso alcance e controle, muitos clamam para algo ou alguém que nos escute, que seja maior que nós, e que tenha o poder de intervir. A esperança é uma das maiores forças humana, se não a maior, e ninguém pode culpa-los por tê-la.

            Todos no hospital ficaram sobrecarregados, inclusive Emma que permaneceu no hospital atendendo no trauma e dando suporte a todos que precisavam. Médicos corriam entre cirurgias com os residentes, internos faziam curativos na emergência que pareciam não acabar mais, crianças choravam chamando por seus pais, pais desesperados tentando encontrar os seus filhos... Toda a movimentação no hospital só começou a cessar depois da meia noite, quando os pacientes com machucados superficiais tinha sido liberados, quando os acompanhantes já estavam nos quartos com os seus entes, quando as cirurgias tinha acabado.

            A primeira etapa havia sido concluída, agora viria os pós-operatórios, uma fase ainda mais decisiva do que a própria cirurgia, era onde eles realmente descobririam se tinham acertado ou errado, e por esse motivo Regina continuo no hospital, passaria a noite lá, acompanhando de perto a evolução do quadro clínico dos seus pacientes.

            Depois de fazer uma ronda no hospital, vendo se estava tudo bem e se faltava material, vagando por os corredores, decidiu que iria tentar descansar um pouco.

            O quarto de descanso estava cheio, Neal e Robin conversavam baixo e distraídos sentandos em uma cama, Ruby estava deitada na parte de baixo de um beliche, talvez estivesse dormindo, tinha alguém no beliche de cima que Regina não conseguiu identificar por que estava de costas, e sentada em uma poltrona com os cotovelos apoiados nos joelhos e a cabaça apoiada nas mãos, estava Emma, o que fez com que imediatamente Regina desistisse de ficar ali, então saiu antes que percebessem a sua presença.

            Regina continuou caminhando distraída por os corredores e só parou quando alguém falou chamando a sua atenção: — Tá em transe?

            — Ah, Bauer. — disse ao se virar e ver quem era.

            Kristin estava sentada em uma maca largada em um corredor estreito.

            — Kristin. — falou indicando que aquela formalidade não se fazia necessária.

            — Kristin.

            — Não quer sentar? — perguntou se afastando um pouco, não que o espaço remanescente não coubesse Regina, era mais como uma ênfase para o convite.

            — Obrigado. — respondeu cansada e se sentou na maca.

            Devido a altura da maca, seus pés ficaram suspensos do chão, os quais lentamente ela começou a balançar.

            — Hoje foi um dia bastante agitado. — Kristin disse.

            — E como foi!

            — Como está o cara da árvore?

            — Ele sobreviveu, está intubado, mas está vivo.

            — E o homem do caminhão, o que causou o acidente?

            — Só sofreu alguns arranhões superficiais, ele estava bêbado como um gambá. E a professora grávida?

            — Eu precisei fazer o parto, mas ela está bem, está em observação, e o bebê está na incubadora, é um prematuro extremo.

            Ficaram caladas por um tempo até que Kristin quebrou o silêncio: — Isso não é justo, ele bebe, causa um acidente e só tem leves escoriações. Uma criança morreu, você sabia? E tem outras duas que só um milagre mesmo para quem crer neles, e uma outra criança que o Locksley operou que tem 70% chances de ficar paraplégica, e acredite, essa é a melhor chance dela. Acho que independente dos anos que eu tenha nessa profissão, e quantos anos mais eu possa ter, eu nunca vou me acostumar com isso.

            — E não deve, quando a gente se acostuma com isso, com coisas hediondas, a gente perde a nossa humanidade, e quanto a isso de não ser justo, a vida não é justa — disse se encostando na parede, e de olhos fechado continuou — Só que mais cedo ou mais tarde a gente descobre que é possível seguir em frente, mesmo que isso pareça impossível, e que a dor diminui, talvez ela não suma por completo...

            Emma que quase cochilava em uma posição nada confortável, foi desperta por o soar do seu page, quando tudo começou a se acalmar no hospital, Ruby lhe der um para que ela pudesse acompanhar os pós-operatórias das crianças que ela tinha atendido, e era por isso que ele tocava naquele momento, alguém tinha acordado. Rapidamente ela saiu do quarto de descanso para não incomodar o demais que descansavam no pouco tempo que tinham. Caminhando por um corredor, ela pôde ouvir algumas vozes baixas mais a frente, mas não podia ver de quem eram, porque um armário que estava encostado na parede impedia a sua visão. Depois de passar por ele, ela pôde ver bem quem eram, e o que viu fez com que borboletas nervosas despertassem em seu estômago. Emma voltou à passos largos por o mesmo corredor em que veio.

            Kristin ouvia com atenção o que Regina dizia, e prestava ainda mais atenção a como a sua boca se movia, dando ênfase nas palavras e soltando cada uma com o peso real que tinham, enquanto torcia para que Regina não abrisse os olhos e a visse ali, hipnotizada.

            — ... Mas com o tempo, ela, a dor, deixa de ser esmagadora.


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Notas finais do capítulo

Kristin + Regina= Kristina (?), podemos chamar assim?

"A vida não é justa. Mas também aprendi que é possível seguir em frente, não importa quanto pareça impossível. Com o tempo, a dor… diminui. Pode ser que não desapareça completamente, mas depois de um tempo não é esmagadora."
Nicholas Sparks , Dear John. London: Hachette UK, 2010.
Não sou fã, mas parafraseei Nicholas Sparks, e para depois não surgir mimi, tô aqui referenciando.

Bjão e até a próxima.

EDIT.: SE DEPOIS DE LER ESSE CAPÍTULO VOCÊ PENSAR EM COMENTAR "REGINA E KRISTIN NÃO, SÓ AMIGAS", POR FAVOR, JUSTIFICAR A SUA RESPOSTA