O Segundo Antes do Sol Voltar escrita por Eponine


Capítulo 6
Capítulo 06




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— Será que você pode, pelo amor de Cristo, calar a boca? — a sala de História da Magia ficou em absoluto silêncio após a voz autoritária de Lílian Evans ter ressonado pelo local. Os olhos verdes estavam muito bem focados nos olhos castanhos, mas ele demorou um pouco para notar que estavam falando com ele.

Remus estava sonolento com a aula tediosa, mas estava desperto para as anotações e também estava incomodado com o fator que fez Lily explodir: James estava falando há exatos trinta minutos durante a aula, atrapalhando de forma incontestável a atenção de todos os estudantes, inclusive Lílian.

— Está falando comigo? — questionou ele, com uma leve insolência. Mas, igualmente pedante, Lílian ergueu o queixo.

— Tem mais alguém atrapalhando a aula além de você? — retrucou, fazendo as amigas dela segurarem o riso, assim como os amigos de James. Porém,  o garoto estava pudico ao analisar a garota que discutia com ele. Remus tinha certeza absoluta que ele estava tentando lembrar o nome da garota com quem ele conviveu por três anos. Era incrível que ele não fazia ideia de quem eram certas pessoas a não ser que fosse do seu interesse.

— Sinto muito ter incomodado vossa senhoria. — debochou, dando um leve sorriso zombeteiro para a garota que ficava cada vez mais vermelha. Virou-se educadamente para o professor Binns, estático diante da sala. — Peço perdão pelo incomodo, senhor. Não vai se repetir.

Remus conseguia sentir o ódio de Lílian ao olhar James, sentada ao lado dele, para a infelicidade da mesma. Sirius brincava com um lápis na boca, achando graça da situação, sendo que era ele quem estava conversando tanto com James. Remus compreendia a raiva de Lily, minutos atrás ele estava atrapalhando descaradamente e então agia daquela forma instruída e pacífica.

De que adianta, daqui a pouco começa a infernizar novamente. — murmurou a garota, jogando-se na cadeira, cruzando os braços. James irritou-se de vez e virou-se totalmente para ela, atordoado.

— Desculpe?

— É isso mesmo! — Lílian também virou-se totalmente para ele. — Isso não é a extensão da sua casa! Você atrapalha toda santa aula com essa sua voz de gralha, se você não está interessado em aprender podia ter o mínimo de senso de sair da sala em vez de empatar a vida de todo mundo!

Então virou-se para frente, deixando James boquiaberto.

A aula recomeçou e o garoto virou-se lentamente para frente, completamente desconcertado.

No fim da aula, James não tinha soltado um pio sequer, nem mesmo para responder a chamada. Apenas levantou-se e conversou educadamente com o professor Binns, Remus julgou que ele provavelmente estava pedindo desculpas. O garoto tinha que admitir que gostava quando alguém dava um sermão em James, mas foi um pouco exagerada a reação de Lily, afinal, todos sabem que James é um aluno aplicado que preza muito uma boa aula. Entretanto, desde o inicio do terceiro ano, James além de ter perdido algumas aulas, ele tem prestado pouca atenção nelas, pois estava completamente obcecado em achar alguma forma de ajudar Remus em seu “probleminha peludo”, termo inventado pelo mesmo que era extremamente irritante para o Lupin.

Os três esperaram James finalmente sair da sala e ele ainda estava sério.

— Qual o nome daquela menina?

Que menina? — perguntou Peter.

— A ruiva, que gritou comigo. — Remus girou os olhos, não se surpreendendo.

— Cara, qual o seu problema, é Lílian Evans, a gente já falou mil vezes. — retrucou Sirius. — Ela é amiga do Ranhoso, como você não lembra dela?

James ficou em silêncio o resto do dia.

No dia seguinte, James sentou-se ao lado de Lílian no café da manhã, a olhando, convidativo. A garota o olhou, desconfiada, afastando-se um pouco no banco. Peter, Sirius e Remus se entreolharam, também se sentando perto de Lílian. Remus sabia que James tinha um pouco de dificuldade de ser rejeitado, por exemplo, ele detestava quando o Capitão da Grifinória ignorava suas perguntas constantes sobre abertura dos testes para Apanhador e ficava perseguindo o cara pela escola, tentando aproximar-se quase a força. Entretanto, para Remus, aquilo também podia ser um caso de groupie: James tinha a tendência a aproximar-se de quem ele achava inteligente ou influente em algo, talvez ele tenha notado que Lílian é literalmente a melhor aluna em Poções.

— Bom dia. — sorriu ele, arrumando os óculos. A garota murmurou uma resposta, visivelmente desconfortável ao lado do mesmo. Inclinou-se e procurou com os olhos lugares vagos distantes de James, e tentou virar seu corpo totalmente em direção das amigas. — Pronta para a aula de Tratos?

— Aham. — ela aumentou os olhos para sua salada de frutas, virando o rosto.

— Você gosta de...

— Olha, de verdade, sem querer ser mal educada, mas você já devia ter notado que não sou sua fã, então se puder conversar com seus amigos e fingir que não estou aqui... — ela não terminou de falar, simplesmente voltou a seu livro, pegando mais uma garfada de morangos. James analisou a garota ruiva, sem entender nada e Sirius sorriu lentamente, parecendo apaixonado pela cena diante dele.

— Eu te fiz algo?

Lílian virou-se bruscamente e conseguiu deixar não apenas James como Peter, Remus e Sirius constrangidos:

Você me fez várias coisas! Você perturba meu melhor amigo desde que pisamos nesse Castelo. Você não deixa minhas amigas em paz. Você não me deixa assistir uma aula sem ouvir sua voz insuportável e por último e mais importante, você existe. — ela tinha os olhos mais frios que James já vira direcionarem para ele. — Então sim, você já me fez algo. Agora eu te pergunto se vai ter o mínimo de senso de ir para outro lugar da mesa ou eu vou ter que sair porque estou tentando tomar café e você me dá náuseas.

Diante do silêncio, a própria Lílian levantou-se e saiu.

Caralho, ela acabou com a sua raça! — gargalhou Sirius enquanto Peter cobria a boca, em completo choque. Remus não sabia se ria ou consolava James, que sequer piscava de tão estático.

— Que dia glorioso! — sorriu Marlene McKinnon. Não muito longe dali, acenando, mostrando que havia ouvido tudo.

Remus segurou-se monstruosamente para não rir do amigo, que pareceu magoado o suficiente para também manter-se em silêncio naquele dia, e um pouco no dia seguinte, melhorando só no fim da semana. Daquele dia em diante, James não era mais o mesmo. Agora ele sabia quem era Lílian Evans, ele prestava atenção em suas perguntas, quando ela passava, com quem ela falava, o que ela dizia, com quem ela andava... O rosto dela, na multidão de rostos ignorados, tomara importância.

— Por que ela não gosta de mim? — sussurrou na biblioteca, a observando em outra mesa, concentrada em sua lição. Sirius gemeu de tédio e levou uma bronca de bibliotecária, arrumando-se na cadeira com o susto. Peter descansou sua pena e estralou o pescoço, também cansado.

— Porque não, James, bem-vindo à vida. — explicou Pete. — Tem pessoas que vão gostar de você e outras não.

— Eu sei, mas eu não fiz nada! Digo, não diretamente. — sussurrou.

— James, você não é a pessoa mais querida do mundo, você precisa saber disso. — explicou Sirius. — Esquece isso, até pouco tempo você nem sabia quem ela era.

Remus olhou para Sirius e o mesmo piscou, lhe dando um sorrisinho. Após o terrível dia fatídico em que os três descobriram a identidade de Remus, ele teve certeza que a rejeição seria certa. Entretanto, Sirius fora o primeiro a erguer a mão em redenção, pedindo desculpas com toda sua sinceridade e arrependimento, dizendo que ele fora mais cruel que seria necessário. Teve que contar sua história a eles, e não sentiu olhar de pena sob ele, mas de compreensão, curiosidade... Aceitação. James fora o que digeriu mais lentamente, ele não conseguia entender a palavra “incurável” ou “não há nada a fazer”. Ele insistia em conseguir “permissão” de Remus para contar a seu pai, assim ele poderia financiar uma pesquisa sobre a cura ou algo do gênero.

Peter lhe dava doces diariamente, como se fosse um pedido de desculpas. Sirius lhe contava casos e casos terríveis de doenças em sua família, como se fosse fazer Remus se sentir melhor em saber que haviam casos piores. Ele gostava do apoio dos amigos, mas gostaria que parassem. Principalmente James e sua busca incessante pelo nada, já que dificilmente um garoto de treze anos ia achar algo que bruxos de oitenta e noventa anos não acharam.

— Para de reclamar. — James continuou esfregando o chão, colocando a escova no balde e se levantando. Olhou Filch os vigiando e suspirou, desistindo de pegar a varinha no bolso. — Foi por uma boa causa.

Boa causa? — repetiu Sirius, largando o esfregão. — Boa ca... Eu estou cumprindo detenção à meia noite de uma SEXTA porque você queria ver o que tinha na seção reservada da biblioteca sem permissão.

 Remus esfregou o chão mais sonoramente na esperança de abafar as vozes de James e Sirius. Peter gemeu e sentou-se, mexendo a escova com o pé, encostando-se na parede, sonolento.

— Estamos aqui porque ambos são teimosos. — Remus esfregou com mais força. — E eu sou idiota.

James estava obcecado em ler absolutamente tudo sobre lobisomens, até mesmo Remus descobrira coisas sobre o assunto em que ele não fazia nem ideia de que existiam. Detenção, algo que era pontual no primeiro ano, começou a tornar-se uma rotina no segundo e terceiro porque James sempre aparecia com um “preciso de uma Poção na cabine do Slughorn” ou um “precisamos escalar alguma torre, tocar flauta para o vento e roubar um hipogrifo”.

Quando contou a Dumbledore, ele parecia já saber. Perguntou se Remus queria que os amigos esquecessem o que descobriram e o garoto implorou que não apagasse a memória dos mesmos. Parecia que haviam tirado Hogwarts inteira de suas costas, ele sentia-se mais leve, mais solto sem precisar mentir o tempo inteiro, fingir, pensar, talhar sua mente ao redor daquelas mentiras mais furadas que seus sapatos. Ser quem ele era e ser aceito era um presente que ele não poderia negar. Agora mais do que nunca ele sentia que sua amizade com os garotos era algo real, e não falso e incompleto, seu sono parecia até mais leve.

Os quatro estavam indo rumo a mais um dia de pesquisa na biblioteca quando avistaram uma garota chorosa perto da porta do gabinete de Filch. Ela pareceu chamar atenção de James, mesmo sendo uma sonserina.

Je déteste cette école! — a garota bateu o pé, cruzando os braços. — Argh!

Est-ce que tout va bien avec vous? — Sirius arregalou os olhos quando James de repente começou a falar francês. Os olhos aguados foram para James, iluminados por ter ouvido uma resposta em francês. Peter e Remus se entreolharam, também chocados.

Enfin quelqu'un qui parle ma langue! Rien est juste, cet avortement imbécile confisque juste ma carte! — choramingou ela, batendo o pé mais uma vez. James tocou o ombro da garota compreensivo e Sirius fez uma careta, perdido. Os dois estavam ignorando os três tão fortemente que chegava a ser incômodo.

— O que ela disse? — perguntou Sirius. James o ignorou e Sirius quase que avançou na menina, gesticulando. — BOUNJOUR, FALAR INGLÊS, VOCÊ ESTÁ NA INGLATERRA!

Vous voulez une carte? — James cruzou os braços.

Pour me trouver! Cet endroit est un labyrinthe, se perd toujours! Il est une carte que le professeur Dumbledore m'a donné au début des cours, mais cet avortement imbécile ne comprend pas ce que je dis... — ela parecia irritada e James compreensivo, sempre assentindo. Ela começou a dar alguns passos para trás. — Excusez-moi, j'essaie de parler au directeur. avortements maudites, devraient tous mourir!

— Ela falou algo sobre Dumbledore. — afirmou Peter, como se tivesse traduzindo algo. Sirius o olhou, colocando a touca da capa.

Parabéns, Peter.

Attendez, quel est votre nom? — falou James quando ela estava no meio do corredor. A garota virou-se e deu lhe um sorriso.

— Svetlana Robintchasky Zulawsj! — gritou. Os três estavam tão perdidos que tudo que lhe restavam era olhar James, que sorria enormemente.

Вы русский? — Peter até mesmo ofegou quando James começou a falar russo.

Да! Но я всю жизнь прожил в Париже ... Как тебя зовут?

— James Potter! — sorriu ele.

Jusqu'à ce qu'un jour, James!

Os três viraram-se lentamente para James, que ria bobamente. Ele notou o olhar dos amigos e deu de ombros.

— Eu... Eu viajei bastante durante a infância.

— Cara, que porra foi isso? Você sabe falar francês e russo? O que mais você falar? — questionou Sirius, abismado.

— Um pouco de espanhol... E alemão. — disse ele.

Os três ficaram em silêncio tempo o suficiente para James sentir desconforto.

— Enfim, precisamos entrar no gabinete do Filch.

Pra que? — perguntou Remus, extremamente confuso.

— Svetlana perdeu um mapa que Dumbledore deu a ela, Filch confiscou. Ela conseguia saber onde estava cada lugar de Hogwarts com o mapa.

SveO QUE? — esganiçou Sirius.

— Vamos chamá-la de Robin, foi a única parte que eu entendi. — disse Peter.

— Por que vamos pegar o mapa para ela? — perguntou Remus, não entendendo a motivação de James. O garoto sorriu, arrumando os óculos.

Quem disse que é para ela?

 

Chuck Berry – You Can Never Tell

 

Remus tinha que confessar a si mesmo que ele gostava de se aventurar com seus amigos.

Claro que ele passava toda uma película de “é só dessa vez” ou “é por uma boa causa”, mas grande parte das vezes não era por uma boa causa coisa nenhuma e quase sempre ele quase enfartava de tanto correr e se esconder ou porque eles achavam coisas bizarras pelo Castelo, sempre os colocando perto o suficiente da morte para Peter chorar de desespero, como a vez que ele quase caiu da Torre de Astronomia e Sirius não conseguia parar de rir enquanto tentava reunir forças para ajudar Remus e James a puxar o amigo.

Ele notava, é claro que notava, a manipulação sutil de James enquanto arquitetava um plano, que sempre se alterava no original com um pouco da lógica de Remus, os detalhes de Peter e a forma de execução de Sirius. O arrependimento vinha quando sua mão ficava dolorida de tanto escrever a mesma frase durante a madrugada inteira em alguma detenção, mas sempre ia embora e a memória do que eles fizeram ficava. Às vezes engraçada, ou traumática, mas na maioria das vezes engraçada.

A forma como Sirius sempre acabava rindo demais quando estava nervoso e se tornava quase inútil por não conseguir parar de rir em vez de correr, ou como os planos de James sempre davam errado e ele tinha sempre a mesma expressão de pânico quando notava que tudo ia desabar. O gemido de Peter era o momento certo da aventura em que eles sabiam que tudo ia dar errado dali em diante, pois era o momento em que ele pressentira o perigo e já estava se arrependendo.

E Remus, bem, segundo os garotos ele costumava dar uns passos para trás, já olhando por onde pode fugir quando as coisas começam a ficar estranhas.

Entretanto, agora que eles tinham a capa invisível do pai de James, tudo ficava relativamente mais fácil. Relativamente:

Peter, se você puder parar de fungar na minha nuca... — estrilou James, encurvado. Estava tão quente debaixo da capa que Remus ficava suspirando o tempo inteiro, impaciente, o que estava irritando Sirius, que volta e meia dava uma cotovelada no amigo, também irritado.

Andem mais rápido! — resmungou Peter, sempre tropeçando nos pés de James.

Calma, porra! — retrucou Sirius. — Que saco, vai mais pra lá, Moony, você está me encoxando!

Não tem pra onde ir! — respondeu Remus, empurrando as costas de Sirius.

Pelo amor de Merlin, isso aqui não é a prova de som, calem a boca! — sibilou James.

Peter foi deixado no corredor mais próximo de onde Filch ficava fazendo ronda aquela hora da noite. Eles foram pegos fora da cama tantas vezes que quase tinham o cronograma do inspetor. Sirius foi deixado no começo do corredor do gabinete enquanto James e Remus seguiram juntos até o local, onde Lupin fora deixado do lado de fora, enquanto James abria a porta trancada com facilidade em um simples feitiço, algo que Filch aparentemente era ruim.

Remus era sempre deixado mais próximo do perigo pois segundo James ele podia simplesmente fingir um desmaio ou dar uns gemidos enquanto se faz de desentendido, pois todos sabem que ele é doente.

Ele olhou para os corredores escuros, um pouco nervoso. No fim do corredor de frente para o gabinete, Sirius acenou no escuro, acendendo a varinha rapidamente para que Remus pudesse ver seu sorriso enquanto ele dava um “jóia”. Remus retribuiu, mas ainda estava nervoso. Ele morria de medo de Dumbledore anunciar sua expulsão após tantas detenções, James insistia em dizer que nem mesmo Grindelwald teria coragem de fazer algo a Remus, imagine Dumbledore.

Limpou o suor em sua testa, com a boca seca, abrindo a porta lentamente para chamar James. O garoto estava sentado na mesinha de Filch, lendo uma apostila. Remus arregalou os olhos, não acreditando na tranquilidade do amigo.

James! — sibilou, irritado, dando um tapinha na porta.

O garoto virou-se lentamente, parecendo estarrecido entre choque e graça:

— Filch é um aborto. Agora faz sentido o que Robin disse... Ele é um aborto! — sorriu, largando a apostila. Pegou um pergaminho gigante e outros papéis, passando a varinha neles, duplicando. Saiu tranquilamente do gabinete, como se tivesse descoberto que podia voar. Apagou a luz e saiu, cobrindo-se com a capa.

— Como você sabe disso? — perguntou Remus, já debaixo da capa.

— Um cara da minha rua vivia lendo aquela apostila, ele é um aborto. — James deu um risinho. — Promete ensinar feitiços práticos para abortos, mas nada funciona. É uma farsa.

Remus sentiu-se profundamente mal por Filch, queria devolver o mapa, mas James parecia quase revigorado. Sirius enfiou-se debaixo da capa e James sussurrou a história enquanto eles iam em direção da escadaria. Tiveram que refazer o caminho pois esqueceram Peter em um dos corredores. Quando finalmente chegaram na Sala Comunal, eles sentaram-se ao redor da mesa, com James abrindo o mapa comentado por Robin.

O garoto surpreendeu-se em como Hogwarts era enorme, e melhor, tinha lugares que foram apagados do mapa, como se tivessem passado a borracha.

— São passagens secretas. — disse Sirius, passando a mão.

— Vamos nesses lugares ver como é. — respondeu James, pegando uma pena e circulando os lugares vazios. — Aqui, os corredores que Filch costuma ficar.

Não notaram que ficaram a madrugada inteira circulando lugares onde não só o inspetor ficava como os Monitores, locais a serem explorados... De manhã, eles não conseguiam parar de falar sobre o mapa, de pensar em como melhorá-lo, pensando até mesmo em passar para outro pergaminho, enfeitiça-lo para não ser roubado por alguém, para que apenas eles tivessem acesso... Eles estavam tão empolgados que Lílian Evans desistiu de bufar ao lado deles e sentou-se no último banco da última fileira, vermelha de tão irritada.

Agora eles tinham duas tarefas extracurriculares, sem contar as três matérias eletivas do terceiro ano. Remus arrependeu-se de ter pego Trato de Criaturas Mágicas pois algumas meninas tinham medo dele “contaminar” os filhotes de hipogrifo com sua doença. Ele foi paciente em explicar que não era contagioso, mas após uns meses desistiu, ignorando os comentários, mesmo com o professor Kettleburn cortando as garotas que olhavam para o hipogrifo no colo de Remus com dó.

Durante suas aulas de Aritmância, James, Sirius e Peter estavam tendo Adivinhação, então seu par nas aulas matemáticas era Lílian, que era muito boa em matemática. Em Runas Antigas ele tinha James, já que Sirius e Peter preferiram Estudo dos Trouxas, e Remus lamentava ter que se separar de Lily nas aulas, já que ela não suportava ficar um segundo sequer perto de James, mesmo ele sendo extremamente aplicado e sério naquela matéria.

Remus ficava tão exausto com aquela rotina que até suas transformações estavam mais tranquilas, parecia que o monstro dentro de si também estava cansado.

Porém, para a felicidade de Charlie, agora eles estavam liberados para visitar a Vila de Hogsmeade durante alguns fins de semana pontuais. O primeiro passeio não fora muito proveitoso pois os cinco se empolgaram tanto na hora de comer na Dedosdemel que acabaram passando mal, deitados nos bancos da praça, exaustos. Ele observava a “Casa dos Gritos” ao longe, absorvendo o gelado do banco de concreto, pensando em como seria caso descobrissem que o fantasma que rondava a casa “amaldiçoada” era ele.

No passeio após o recesso, fora em fevereiro, no dia dos namorados.

Remus não queria sair de jeito nenhum, mas James insistiu que precisava comprar uma pena de faisão dourada e preta. Sirius estressou-se tanto que jogou o jornal na cara do amigo, resmungando, trocando de roupa violentamente enquanto James se animava, contando seus galeões. Os três mal-humorados seguiram o garoto de óculos, animado, descrevendo as qualidades da pena que compraria, que era praticamente inquebrável além de ter um milhão de funções (inúteis, na opinião de Remus).

— Vai para a Vila? — perguntou James, parando bruscamente no caminho ao ver Lily, pouco antes da entrada do vilarejo, perto de alguns arbustos maltratados pelo sol. Ela parecia nervosa de vestido, passando toda hora as mãos nas madeixas ruivas, por mais que já estivesse bonito. Remus notou que ela provavelmente ia em um encontro, mas James não parecia ter percebido.

— Sim. — respondeu ela, não acreditando que ele tinha parado para falar com ela. Olhou para os lados, esperando que ele se tocasse. Sirius bufou sonoramente e cruzou os braços, esperando James recomeçar a andar.

— Está indo sozinha? Quer ir conosco? Vou comprar uma...

Não, não estou sozinha! — cortou ela, irritada.

— Ué, não tem ninguém aqui além de você... — riu ele.

— James, vamos! — chamou Peter com as mãos no bolso do casaco, sonolento.

— Pode ir, por favor, só vai! — pediu Lílian, começando a ficar mais nervosa ainda, olhando para trás.

— Ah... — James sorriu lentamente, cruzando os braços. — Você vai a um encontro?

Lílian ofegou e passou a mão no cabelo rapidamente de novo quando Amos Diggory aproximou-se com Marlene e Emmeline o acompanhando. James ergueu as sobrancelhas quando o garoto beijou a bochecha de Lily, sorridente, e a garota ficou tão vermelha que parecia ter fundido o rosto com o cabelo. Marlene mascou seu chiclete sonoramente ao ultrapassá-los, e empurrar Sirius com o ombro para fora de seu caminho.

Você é cega? — xingou Sirius, acariciando o ombro. Emms deu um breve sorrisinho a Remus antes de seguir a amiga.

— Tudo bem, Potter? — cumprimentou Diggory, de braços dados com Lílian, fazendo o caminho para o vilarejo. James virou-se lentamente, observando o casal risonho rumo a Vila, parecendo confuso. Ele começou a fazer o caminho também, em silêncio. Nem mesmo comprar a pena tão desejada o animou e Sirius começou a ficar preocupado.

Decidiram parar no Três Vassouras para tomar uma cerveja amanteigada e Sirius os quatro ficaram distraídos com o peculiar decote da Madame Rosmerta, principalmente na... Movimentação entre eles quando Sirius fazia algum comentário engraçado, quase viciado em fazê-la rir. Era ela rir para as quatro rirem mais alto ainda, como se fosse a piada mais fenomenal do planeta. O Potter suspirou após um grande gole em sua cerveja.

— O que vocês acham de Lílian Evans?

Sirius espreguiçou-se na cadeira, pedindo mais uma cerveja em um aceno.

— Chata. Por quê?

— Ela não é chata... — defendeu James, parecendo incomodado.

O quê? — esganiçou Sirius, rindo. — Evans é o ser mais insuportável que pisou no planeta terra. — ele começou a pontuar com os dedos. — Ela é chata pra cacete, é uma CDF quase pior que você e Remus juntos, e além de tudo é amiga do Ranhoso. Sem contar que ela nem é tão bonita assim.

— Quem é bonita pra você? — questionou Remus, curioso. Sirius pareceu pensar por alguns segundos, voltando a encostar-se na cadeira.

— Hum... Emmeline Vance é bonita.

Peter riu, cobrindo o rosto.

— Não acredito nisso, vocês têm sérios problemas de auto-estima. — criticou Pettigrew. — Você quer uma garota que te quer morto e você tem interesse na melhor amiga de Marlene McKinnon, também conhecida como a garota que fez a Sala Comunal inteira rir da sua cara quando você caiu da poltrona.

Sirius socou o braço de Peter, fazendo Remus rir.

— Eu não quero a Evans, eu só fiz um comentário. — justificou James. — E devo dizer que ela sequer é do meu interesse. Eu só tenho curiosidade, digo, ela é um pouco peculiar... É estranho ela falar com alguém como o Ranhoso e... Puta que pariu!

— Olá rapazes, sempre soube que vocês namoravam entre si. — Charlie apareceu sorridente, de braços dados com Mary MacDonald. James o olhou com o mais puro olhar de deboche mesclado com tédio. Mary acenou rapidamente para Remus, que sorriu ao retribuir.

— Ei, Mary, quanto Charlie te pagou pra você acompanha-lo hoje? — sorriu Sirius.

— Cala a boca. — retrucou a garota, fazendo os quatro rirem e Sirius desviar o olhar, suspirando, controlando sua irritação.

— Bem, tenham uma boa tarde, fracassados. — sorriu Charlie, saindo do Café com Mary.

Você sabe que não teremos! — retrucou James, irritado. — Fala sério como alguém tem coragem de sair com...

James calou-se, parecendo ter sido iluminado. Ele olhou ao redor e Remus decidiu copiá-lo. O bar estava bem cheio de casais. Sirius recebeu sua caneca e sorriu docilmente para Madame Rosmerta, entretido com sua bebida. O Lupin assistiu um garoto tocar de forma receosa a mão de uma menina indiana e sorriu brevemente, perdido em pensamentos.

— Nós nem notamos que hoje era dia dos namorados. — disse James, olhando ao redor como se tivesse acabado de ser remessado àquele planeta.

— E...? — questionou Peter.

— E aí que... O que estamos fazendo de tão importante que não estamos namorando ninguém? — perguntou com uma voz profunda, olhando os três amigos.

Sirius continuou brincando com a tampa de uma garrafa, parecendo ponderar o que James dissera. Pete assentiu lentamente, mas Remus franziu o cenho, quase engasgado de tanta vontade de falar: Eu me transformo em um monstro todo mês, você não para de nos meter em detenções, agora temos mais três matérias para se preocupar, nosso professor de DCAT é um lixo, as garotas da turma de TCM acham que eu tenho alguma espécie de doença bubônica, minha cara é toda arranhada, eu tenho mais dores que um velho 97 anos, minhas notas em Astronomia estão descendo ladeira abaixo, Elliott ronca feito uma britadeira e ele dorme bem do meu lado, eu não tenho dinheiro nem para comprar uma meia, que espécie de garota vai olhar para...

Remus tomou mais um gole de sua bebida, percebendo mais um problema em sua vida. Claro que eles não eram celibatos, Peter não admitia, mas ele tinha uma quedinha por uma garota do 4º ano da Lufa Lufa e houve a vez que James intrometeu-se em uma brincadeira de verdade ou desafio na Sala Comunal onde Charity Burbage teve que beijá-lo, no 2º ano. Ele sorriu, brincou, divertiu-se a noite inteira, mas admitiu no dormitório que odiou a língua de outra pessoa dentro de sua boca e não recomendava a ninguém. Sirius insistia em achar todas as garotas um bando de chatas e choronas, e o efeito de tédio que as meninas causavam em Sirius parecia causar empolgação nelas. Se ele passasse uma semana sem receber algum bilhetinho de “Fulana gosta de você!” ou algum poema sobre como os cachos dele pareciam as curvas das nuvens, seria um milagre.

O garoto sequer tinha pudor em ler o bilhete e jogar no lixo na mesma aula em que recebera, voltando a dormir em seguida.

Entretanto, o Lupin vivia se esquivando ali e aqui de qualquer coisa do gênero. Primeiro que ele sempre perdia momentos propícios de fofoca por estar na Ala Hospitalar, na Biblioteca ou brigando com sua coruja preguiçosa que sumia com as cartas que tentava enviar à seus pais. Segundo que ele simplesmente não conseguia agir com a naturalidade que os garotos agiam quando o assunto era aquele. Remus tinha a horrível tendência a pensar demais sobre tudo, ele analisava cada detalhe e planejava mil cenários para cada tipo de possibilidade. Se alguma garota lhe olhasse torto ele se dividira em como agir caso ela quisesse beijá-lo ou matá-lo.

Como ia namorar uma garota sendo quem ele era? E outra, que garota ia olhá-lo? Tudo aquilo soava absurdo e utópico demais.

Passaram na Zonko’s para ver se conseguiam animar um pouco o dia e Remus notou Dorcas ao longe enquanto eles esperavam na fila para pagar o que compraram.

Jackson C. Frank – Milk and Honey

 

Ela olhava alguns artefatos, admirada, visivelmente sozinha.

Sentiu vontade de ir falar com ela, mas nunca sabia o que deveria dizer, ou como iniciar uma conversa. Já passou tempo demais desde o primeiro ano, ela provavelmente nem se lembrava mais dele. Pensou se alguém namoraria Dorcas, sabendo de sua identidade, ali, escancarada e crua.

Admirou os olhos claros antes de voltar a olhar para frente na fila, confuso.


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