Minha vida em pequenas Escalas escrita por Iset


Capítulo 4
Cinquenta tons de rosa


Notas iniciais do capítulo

Mais um cap, mais levinho pra acalmar o coração! Beijos!



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Cinquenta tons de Rosa

Quando retornei ao apartamento as coisas pareciam menos ruins, Derek e eu conversamos durante um bom tempo e a noite fomos a um pub beber um drink, socialmente é claro,  ele me convidou pra morar com ele  em Roma, claro que descartei a ideia, afinal, toda a minha vida estava no Canadá e eu não poderia simplesmente largar tudo, colocar a Emma numa mochila e partir pra um país diferente.

No dia seguinte vamos até meu trabalho, apesar de não conseguir a tal licença, meu chefe foi solidário e adiantou minhas férias pra que eu pudesse acertar tudo em casa, antes de voltar a trabalhar

Na volta pra casa passamos em frente de uma loja para bebês, eu já estive ali algumas vezes com Carolina, juntos escolhemos diversas roupinhas minúsculas, a maior parte na cor azul ou verde,  decido entrar na loja e Derek me acompanha.

E era a primeira vez que eu que eu adentrava aquele mundo sem a Carolina, caminho um tanto desconfiado, meio perdido na verdade, olhando uma coisa alí outra aqui, até que finalmente uma vendedora se aproxima de nós com um sorriso simpático.

—No que posso ajudar rapazes?  

— Oi. Eu, bom a minha fiIha ela é uma menina, e deveria ser um garoto então tudo que tenho em casa é pra menino. Queria uma coisa rosa, um vestido, eu acho. - Falo meio gaguejante.

—E você refere rosa seco, rosa chá, rosa bebê, rosa pink, rosa choque,  rosa chiclete, rosa neon, rosa cereja?

— Eu só quero rosa, sabe rosa, rosa? entendeu?

Foi aí que constatei que vendedoras de loja infantis, não sabem que homens não tem a menor ideia de tonalidades, além do clássico, escuro ou claro. Dependendo da área de atuação, alguns até desenvolvem o dom de reconhecer mais cores, mas eu duvido você encontrar um ser hetero do sexo masculino que tenha ideia do que seja rosa vanilla. E desde quandi vanilla é cor?

O fato é que não fomos educados para lidar com o rosa, na verdade o mais perto que um garoto costuma chegar do rosa, é aquela camiseta gola polo que ganha de uma tia chata no natal, ou o lápis lilaz usado com muita moderação na caixa de lápis de cor,  e sim por mais que seja natural vestir uma menininha toda de azul, experimenta vestir um menino de rosa, ainda não estamos tão evoluídos pra isso… Ou seja rosa não é algo natural pra nós e eu estava me sentindo num mundo paralelo.

— Ah porque vocês não vem ver a seção feminina da loja? Por aqui venham.

— Fui engolido mundo dos cinquenta tons de ROSA!

Yma infinidade de araras devidamente organizadas, com vestidos , macacões, cueiros, pagãozinhos, boleros, calças jeans, saruel, legging, croppeds, fitas, laços, tiaras, prateleiras cobertas de sapatos em miniatura, tudo parece perfeito, em seu devido lugar, exceto eu! Quase sem querer estico o pescoço pro lado azul e marrom da loja, abrigos, camisetas, blusas de super heróis, parecia tão mais simples e familiar.

— Noah? Coisas de menina lembra? - Diz Derek voltando a minha atenção pro o oasis rosa.

— Coisas de menina? Ué não é você que segue a tendência sem gênero?

— Não para roupas, olha isso. - Diz segurando um vestido todo estampado de pequenos morangos.

— É vermelho. Ela já tem roupas vermelhas.

— Não, é rosa cereja.

— Rosa cereja? Derek, sério você precisa de uma namorada. - Digo franzindo a testa.

— Eu sou arquiteto esqueceu? Se eu não entender de palheta de cores, me enforco.

— Meu irmão, um arquiteto que sabe o que é rosa cereja, é por isso que a tal Vick prefere o Thomas… Eu duvido que ele saiba o que é rosa cereja.  E olha ali, aquela vendedora é uma gata, eu vou conseguir o telefone dela.

— Achei que estivesse de luto?

— Eu estou, mas você não. - Digo amarrando o cabelo. _ Olhe e aprenda maninho.

Vou até a vendedora e digo que meu nome é Derek, fazia muito tempo que eu não passava uma cantada em alguém, mas dito que consegui marcar um café, depois que ela saísse do trabalho, eu ainda entendia da magia. Volto pra perto dele com um papel com o telefone dela e coloco no bolso da jaqueta dele.

— Você tem um encontro às 15:30h

— Você é muito cara de pau, e eu vou voltar pra Roma hoje esqueceu?

— Não. Mas seu vôo sai as 20:30h, dá pra fazer muita coisa nesse intervalo de tempo, se é que me entende. Anh?? Pode me agradecer. - Ele balança a cabeça e coloca o papel de volta no meu bolso.

— Meu coração já tem dona.

— Que está apaixonada por outro cara e te vê como um irmão.

— Não é bem assim… - Diz ele com um sorriso malicioso.

— Opa.. Opa… Alguém me omitiu os fatos é? Desembucha! Mandaram ver não foi?

— Não, foi só um beijo okay? Agora será que podemos voltar pras roupas da sua filha?

— Hum… Sei… Ontem não era nada, hoje foi um beijo, amanhã vou acabar acordando com um sobrinho...

— Deixa de ser besta. - Fala ele, lançando o vestido no meu rosto.

Depois de escolher quatro vestidos, dois macacões, calças, casaquinhos e um par de sapatos, tudo rosa! E até tinha alguns modelos de outras cores, tímidos entre os cinquenta tons de rosa, mas de fato, o rosa era o ROSA! E tudo parecia mais bonito e fofinho nele.

Vamos ao hospital e vejo  a enfermeira dar banho e vestir a minha mini Carolina, de fato não herdou o gosto que os brasileiros tem por banhos, pois berrava como se tivesse sendo fervida em água quente, enquanto a enfermeira a esfregava na água. E a briga seguiu na hora de vestir, até finalmente se acalmar com uma mamadeira. E se entregar a um sono profundo.

Mais tarde já em casa abro o computador e pra minha surpresa, ele ainda está logado ainda no perfil da Carolina, entre muitas mensagens de descanse em paz, encontro a sua última postagem.

Uma foto nossa, com um filtro do snap que faz as bocas e olhos parecerem enormes, eu estou com uma cara assustada olhando pra barriga, que tem um smiley desenhado e ela beija a minha bochecha, com as mãos na barriga. Meus  olhos lacrimejarem ao ler a legenda.

Quando o amor é grande demais, de dois se fazem três. Mamãe e papai não vêem a hora de te ter nos braços.

Derek sai do banheiro secando os cabelos e eu tento disfarçar minha cara de choro.

— Você devia ir pra Roma com a Emma, minha casa é grande, tenho até um quintal. Vai por ela brincar onde? Na sacada? Aliás, precisa pôr redes nas janelas - Ele diz se dirigindo a bancada da cozinha.

— Eu gosto daqui e tem o meu emprego, que não é dos piores pra alguém que acabou de se formar. - Digo.

— Eu sei, mas na europa também tem muito emprego na sua área, mesmo com a crise. Pensa, não seria legal morarmos no mesmo país uma vez na vida fora do útero? - Ele fala pegando um saco de pão e fazendo um sanduíche.

— Seria, mas eu não quero deixar esse apartamento. A Carolina e eu trabalhamos muito pra comprar e cada coisa aqui tem uma recordação, tipo essa bancada aí,  eu acho que foi aí que fizemos a Emma.

— Ah Noah! Que droga, não precisava falar isso. - Ele diz franzindo o rosto e desistindo do pão e vindo na minha direção até a sala onde se senta numa poltrona.

— O que foi? Éramos um casal jovem, bonito e cheio de energia, nós transavamos, e muito… Ah essa cadeira. - Digo com um ar de malícia, só pra ver a reação dele.

— Noah! - Reclama se levantando rapidamente e eu começo a rir.

— Eu só ia dizer que compramos numa venda de garagem, por cinco pratas e nós mesmos reformamos.

— Você é terrível. Eu preciso me arrumar pra ir pro aeroporto.

— Tem mesmo que ir?

— Tenho, mas eu volto quando tiver umas férias, pra ver como o papai fresco vai se sair e também para conhecer a minha terra natal, aí você me apresenta as coisas legais daqui.

— Aqui é o Canadá, se você não gosta de escalar ou esquiar, não sobra muita coisa pra fazer. Mas vai ser legal, e obrigado por ter vindo, eu precisava disso.

— Não tem que me agradecer, somos irmãos lembra? Temos que cuidar um do outro.

— Tem razão, sabe o que a gente devia fazer? Eu poderia ir anonimamente para Roma aí matava o tal de Thomas e você teria um álibi e se livraria do rival, seria o crime perfeito. Nem consta nos nossos registros que somos gêmeos. Aliás a gente devia, sei lá, acertar essas coisas burocráticas, vai que você mata alguém e me prendem no seu lugar. Sou muito bonito pra ir pra cadeia.

— É você quem tá falando em matar alguém, mas tem razão temos de acertar as coisas. Mas sabe que isso pode complicar a vida dos nossos pais adotivos, porque nossas doações não foram, digamos legais.

— Eles compraram crianças, nos compraram Derek, como se fossemos bichinhos de pelúcia, e eu sei muito bem que seus pais adotivos não foram melhores que os meus. Então temos o direito de complicar a vida deles.

— Mal ou bem foram os pais que conhecemos. Você teve notícias dela?

— Você diz, da nossa chocadeira?

— É.

— Eu liguei pro presídio a uns quatro meses, ela não é muito de conversa.

— Tipo, quando eu voltar, nós podíamos ir até lá. Não?

— Não, olha Derek nós não precisamos, e se você quiser, vai, mas eu não vou. Eu já tenho a Susan pra me lembrar como é péssimo ser minha mãe, não preciso de outra.

— É acho que tem razão. Bom, vai me deixar dirigir seu carro até o aeroporto ou não.

— Tá doido? É um Corvette 67, todo restaurado por essas mãozinhas aqui, okay quase todo restaurado, mas mesmo assim, era mais fácil eu te deixar beijar a minha mulher do que tocar no volante daquele carro. - Digo e logo sinto o peso de me dar conta que eu não tenho mais uma mulher e perco a graça. Derek percebe meu desânimo e me dá um abraço.

— Se dê tempo irmãozinho, o tempo vai curar essa dor. Logo a Emma vai estar aqui e tudo vai ficar bem cor de rosa por aqui.

— Carolina seria a melhor mãe do mundo, ela queria muito uma menina antes de sabermos ou pensarmos que era o Davin, isso é tão injusto. Não devia ser assim.

— Não devia, mas eu tenho certeza que a Emma não poderia ter pai melhor. Vai dar tudo certo e eu preciso ser o primeiro a te dizer isso.

— Isso o que?

— Carolina era linda e você tem uma filha que é uma gracinha, vai preparando o arsenal, entrando numa academia, pra daqui há 12, 13 anos estar preparado. E se eu fosse você, arranjava um quintal pra enterrar os corpos. - Ele diz tentando aliviar o tom da conversa.

— Melhor a gente continuar com os documentos de não gêmeo pra dar álibi, um pro outro. - Respondo forçando um sorriso.

Levo meu irmão até o aeroporto, nos despedimos e no dia seguinte sou acordado por uma ligação.

— Noah Johnson?

— Sim.

— Aqui é Alana Dawson do serviço social, sua mãe entrou em contato conosco, disse que você tem o interesse de entregar a menor, pré registrada como recém- nascida de Carolina Smith para o programa de adoção. Confere?

— Não, creio que haja um engano. Minha filha se chama Emma Carolina Smith Johnson e ela já tem uma família.

— Que bom senhor Johnson, mesmo assim levando em consideração que a mãe da criança faleceu e é claro sua ficha criminal, o estado não tem certeza de que a menor estará segura sob sua tutela.

— O que? Peraí tá dizendo que porque eu fiz besteiras quando era adolescente eu não sou apto para cuidar da minha filha? É sério?

— Eu não disse isso senhor Johnson, apenas queremos assegurar o bem estar da menor. O estado lhe assegura o direito de criar sua filha, desde que tenha condições financeiras e emocionais para isso. Para garantir a segurança da criança faremos um acompanhamento durante algum tempo. Só para ver se isso vai funcionar certo?

— Eu tenho escolha?

— Não. Se não aceitar, a menor será colocada sob tutela do estado.

— Não podem fazer isso.

— Sim nós podemos. Eu vou marcar uma reunião na sexta, às três pode ser?

— Fazer o que não é? - Respondo já irritado.

— Okay. Obrigado pela atenção e tenha um bom dia.

Vou pro chuveiro enraivecido, por mais que as intenções fossem boas, minha mãe não tinha o direito de ligar pro serviço social e dizer que eu não queria a minha filha. Deixo a água quente percorrer e acalmar meu corpo, decidi não ligar pra minha mãe, pois acabaria piorando as coisas. Me visto e pego a mala de maternidade que a Carolina, já vinha preparando há meses. Troco algumas peças pelas roupas novas e cor de rosa que comprei e vou pro hospital. Quando chego na maternidade espio pelo vidro e Emma não está no berço. Sinto um nó se formar na minha garganta e bato apressado na porta que imediatamente é aberta pela pediatra.

— Oi. A sua cópia não veio hoje? - Pergunta com um sorriso.

— Cadê a Emma?

— Ela está bem, estão trocando as fraldas. Ah e ela já está oficialmente de alta.

— O que? Agora? - pergunto assustado.

— Sim, já pode levar a sua menina pra casa. Acha que está pronto? - Diz ela e eu engulo a seco, sim eu sabia que essa hora chegaria, mas o frio no estômago foi inevitável.

Segundo o a civilização, o pai tem em relação ao nascimento dos filhos, basicamente duas funções: fecundar o óvulo,  e prover as necessidades materiais da família. Confesso que apesar de me considerar um cara moderno, mente aberta e vir me preparando pra ter que trocar aLgumas fraldas, Ievantar algumas vezes a noite  e dar uma mamadeira ou outra, nunca em minha mente imaginei que teria que fazer tudo sozinho. E isso me deixava apavorado. Como eu posso ser responsável por um ser humano indefeso, ainda mais considerando que comecei a cozinhar e limpar (mais ou menos) as coisas sozinho há poucos anos? No momento, eu sou alguém que minha filha pode admirar? acho que não. Afinal ainda não me considero um adulto maduro e estável. O que vai acontecer quando eu for trocar as fraldas e ficar com cocô nas mãos? Santo Deus, o que eu vou fazer quando ela chorar? Respiro fundo e olho pra pediatra.

— Estou pronto. - Digo sentindo minhas pernas tremerem.





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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado! Deixa seu review aí!