Minha vida em pequenas Escalas escrita por Iset


Capítulo 35
Manual de como não sobreviver a um parto


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoas, Saudades?
Bom Vick finalmente vai parir!!!
Queria dizer que estou com um bug e quando tento responder os comentários não vai, eu escrevo e quando aperto enviar horas vai e horas não tem jeito! Então desculpa se não respondi ainda...
Bom espero que gostem do capítulo, ele é dedicado a Linda Cajuela que deixou a primeira recomendação dessa história que me deixou nas nuvens de tão feliz!



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Manual de como não sobreviver a um parto

 

Nos abraçamos durante um tempo e senti as lágrimas rolarem de meus olhos. Quando nos afastamos contemplei aquele olhar de amor e esperança,  que vi nos olhos da Carol, quando recostaram a nossa pequena Emma em seu rosto. Foram os melhores segundos da minha vida.

Voltamos a realidade ao ouvir a buzina impaciente do automóvel, juntamos rapidamente todas as coisas que Vick pediu e voltamos ao carro.

— O que vocês dois estão fazendo? Porque demoraram tanto para pegar uma bolsa?  — Questiona Vick já alterada no banco de trás.

— Calma, foi você que quis vir buscar a mala — digo em nossa defesa — Vamos Derek, dá a chave que eu dirijo.  

— Acho melhor o Derek dirigir, você dirige feito um maluco, perigo o bebê nascer numa freada  repentina —protesta a Vick.

— Mas se eu dirigir, ele vai ter que cuidar de você até chegarmos no hospital — fala Derek nervoso.

— Ótimo, eu sou o mais experiente aqui com gestação e partos — falo com ares de sabedoria e os dois trocam um olhar temeroso — Que foi, menti?

— Não leva mal não,  mas a sua grávida morreu, não sei se isso conta como experiência positiva — diz Derek.

— Derek! Sou que faço essas observações desnecessariamente cruéis e não você. Gêmeo bom — aponto para ele — Gêmeo mau — atenha-se ao seu papel!

— Dá para vocês se decidirem logo! Eu tô tendo um bebê! — Ela grita se contorcendo de dor.

— Você dirige — fala Derek enfiando a chave na minha mão.  

Tomo posição ao volante, naquele carro ecologicamente correto, com câmbio automático, sensor de poluição e gasto de combustível do Derek e piso fundo no acelerador. Vick se concentra em tentar respirar como lhe ensinaram nas aulas de parto, mas leva menos de cinco minutos para descobrir que morder o braço do Derek a cada contração, é muito mais reconfortante que isso. Enquanto respiro aliviado por estar ao volante e vejo a cara de dor do Derek com as mordidas de Vick, sou incapaz de controlar um sorriso.

— Isso que eu chamo de participar ativamente do parto — falo olhando os dois pelo retrovisor e vejo meu calmo e educado irmão fazer um sinal ofensivo com o dedo.

Quando estamos prestes a deixar o bairro, há um imenso caminhão de entregas de bebidas bloqueando totalmente a rua, buzino uma, duas, três vezes na quarta, Derek decide sair do carro, ele caminha até o caminhão balançando o braço dolorido e conversa durante algum tempo com o motorista. Balanço a cabeça ao ver ele pedindo gentilmente para que ele nos dê espaço, o cara parece concordar e ele retorna o carro com um sorriso triunfante. Cerca de dez minutos depois, ainda estamos presos pelo caminhão.

— Desse jeito a bebê vai nascer no carro. — falo impaciente batendo o dedo indicador sobre o volante.

— Eu acho que estou sangrando — fala a Vick com uma cara de espanto.

— Isso é normal,  não é?—questiona meu irmão inquieto.

E eu fico apreensivo e buzino várias vezes, sangue nunca é bom sinal de nada — penso interiormente — Derek percebe a tensão que se formou em sai do carro, retira o blazer que usava e vai caminhando a passos largos e firmes em direção ao caminhoneiro.

— Olha aqui seu imbecil, eu tô sendo mordido por uma mulher em trabalho de parto, depois de tirar meu irmão da cadeia e ver minha sobrinha num maldito abrigo,  então é melhor você tirar essa porcaria desse caminhão na frente porque senão vamos ter que adicionar assassinato a lista do meu dia! — Ele grita pegando o homem que rabiscava uma prancheta pelo colarinho e empurrando contra o caminhão. Vick e eu nos entreolhamos e ficamos em silêncio quando em ele retorna ao carro e vemos o caminhão começar a se mover.

Dirijo o mais rápido e “seguro” que o carro politicamente correto do Derek me possibilita. Chegamos a frente do hospital e corro até a recepção para pedir ajuda. No mesmo instante uma enfermeira traz uma cadeira de rodas onde colocam a Vick e nós a seguimos pelo corredor até nos mandarem aguardar.

No corredor, Derek anda para lá e para cá constantemente e eu tento fingir que estou calmo para não deixá-lo ainda mais nervoso.

—Acha que devíamos avisar o Thomas? — Ele me questiona pensativo.

— Acho que não, ninguém convida o doador de esperma pro nascimento do bebê.

— Mas o Thomas não é apenas um doador de esperma,  infelizmente.

— O cara largou a namorada grávida depois dela passar mal dentro de um hospital em outro país. Um doador de esperma é mais digno para ser convidado pro nascimento.

— Mas não é uma decisão minha e acho que a Vick ia querer que ele estivesse aqui. Liga para ele.

— Eu? Eu nem tenho o número!  

— A Giulia deve ter, liga para ela e pede para ela ligar para ele— fala penteando os cabelos para trás com os dedos e no mesmo instante a enfermeira chama o acompanhante da Vick para entrar no centro obstétrico.

Ligo para Giulia e ela chega em cerca de quinze minutos, trocamos algumas palavras e volto a me sentar, fico olhando pra fotos que tirei de Emma durante a visita e mesmo que eu tente, é inevitável lembrar do nascimento dela. Que conseguiu ser o melhor e o pior momento da minha vida ao mesmo tempo.

Continuo batendo o pé, até ver o “tuc tuc” do sapato lustroso de Thomas adentrar o corredor e caminha até Giulia e eu permaneço no meu lugar, revirando os olhos com cada pergunta aparentemente preocupada dele. Ele passa pela minha frente, sem nem me olhar e começa a bater a porta do centro de obstetrícia, conversa com uma enfermeira com um ar galante e diz que quer acompanhar o parto. A enfermeira se recusa a deixar ele entrar dizendo que Vick já tinha um acompanhante, e isso o faz se alterar e usar leis e artigos para defender seu direito de assistir ao parto.

Eu respiro fundo e tento lembrar de um daqueles mantras que a Carolina me obrigava a escutar quando eu tinha crises de “ansiedade”. Como minha mãe chamava minhas crises de abstinência porque ela jamais admitiria em público que o filho dela tinha sérios problemas com drogas. Mas isso era passado, afinal, no processo que ela estava movendo contra mim, fez questão de anexar todos os relatórios médicos e custos que teve com minhas internações. Balanço a cabeça e tento voltar ao foco.

Minutos depois, Derek sai pela porta, Giulia e e eu o enchemos de perguntas e e ele nos conta que Vick está com uma hemorragia e por conta disso o médico decidiu fazer uma cesariana, mas que ela está bem, sendo preparada para as cirurgia.

Fico meio aéreo quando ele diz a palavra “hemorragia”, embora Carol tenha falecido por conta da pré- eclampsia que causou a falência de seus rins, foi uma hemorragia decorrente que a fez fechar os olhos depois de ter sorrido para nossa filha, pela primeira e última vez.

Sinto uma pressão no peito e uma sensação de falta de ar e me afasto um pouco. Não queria que Derek percebesse meu mau estar, ele já estava nervoso o suficientemente. Tento respirar fundo  e nesse instante Thomas se aproxima com aquele ar de protagonista de livro de soft porno. Com barba bem feira,  sorriso de conquistador, blazer  social caro e bem alinhado na largura dos ombros.

— Eu vou acompanhar o parto — ele fala em tom imperativo.

— Não,  eu sou o acompanhante da Vick e ela não me falou nada sobre te querer lá.— protesta o meu irmão, encarando - o firmemente.

— Eu sou o pai do bebê.

— Ah eu sou arquiteto, mas não significa que eu tenho direito de morar nos projetos que minha firma construiu — retruca o Derek e eu fico impressionado em como um parto deixava a língua dele afiada.

— Rapazes, nesse momento é melhor a presença de uma mulher — se intromete Giulia.

E continuam os três a discutir sobre o olhar assustado da enfermeira.

— Chega!— exclamo— Será que não é mais fácil perguntar para Vick, porra?! — E eles voltam o olhar para mim por uns segundos aparentemente pensativos.

— Eu sou o pai, eu tenho o direito legal garantido por lei — fala o Thomas voltando-se ao Derek novamente.

— Uma ova que tem direito, eu tô cuidando dela desde que você deu no pé, seu sacana! — Derek intervém.

— Se for por cuidar, eu tenho cuidado mais dela do que qualquer um de vocês, é a mim que ela vem quando tem que reclamar de vocês dois brigando feito garotos do colegial! — Giulia grita.

Olho para enfermeira e sinalizo com a mão se posso entrar, ela faz o mesmo mandando eu a seguir enquanto o trio continua a discutir. Adentro a obstetrícia e recebo uma roupa verde, máscara e touca. Depois de vestido me levam até a sala do parto, Vick está sendo preparada para receber a anestesia.

— Por favor faz logo essa anestesia, eu quero anestesia, por favor me dá anestesia — súplica Vick com o rosto bem pálido. — Derek, graças a Deus — eu puxo a máscara e ela me encara confusa — Noah?

— O Derek, Thomas e Giulia estão lá fora, brigando para saber quem vai te acompanhar, eu decidi vir aqui te perguntar quem que você quer que venha, porque eles não parecem que vão chegar a um acordo antes da katherine estar entrando na faculdade. — digo e ela solta um suspiro aliviado quando o médico aplica anestesia.

— Ahh... isso é melhor que orgasmo — Ela fala ao sentir o efeito da anestesia acabando com a sua dor.

— Quem você quer que venha? — questiono.

— Fica você — ela diz enquanto os enfermeiros a ajeitam na cama.

— Eu? Eu não, não. .. Não... — Digo entrando em pânico ao ver aqueles médicos e aparelhos — Você não vai me querer aqui eu dou azar para essas coisas.

— Noah,  relaxa. — Ela diz meio grogue.

—  Vick eu não posso. O pai do seu bebê,  seu namorado e sua melhor amiga estão lá fora se engalfinhando para ver quem vai estar aqui. Eu só sou o cunhado indesejado.

— Eu quero que fique, você foi o único que se preocupou em saber o que eu queria, que não tá pensando no próprio ego nesse momento que é só meu e da Katherine,  quero que fique. — Ela diz.

—  Mas, Vick… — penso em protestar, mas vejo o olhar dela e desisto. Era o momento mais importante da vida dela, e ela decidiu que eu devia participar.  Eu sou não era o seu melhor amigo ou a pessoa mais apropriada, mesmo assim, eu fui sua escolha e pensando estar prestes a me borrar nas calças de tanto medo por aquela situação, eu segurei a mão dela e assenti com as cabeça.

— Vai ficar tudo bem. — Digo com a confiança que eu não sentia.

Minutos depois vi o médico fazer a incisão e retirar o bebê segurando pelos pés. Vick sorria e chorava ao mesmo tempo e um misto de sentimentos e memórias tomou posse do meu ser.  Diferente da Emma, Katherine nasceu chorando a plenos pulmões,  a colocarem sobre a mesa, limparam rapidamente e finalmente sobre o peito da Vick. Ela beijava a cabecinha suja da criança, sorria e chorava com aquela expressão de ter o mundo em seus braços. Uma sensação tão grandiosa que só pode ser sentida por um pai ou mãe que ama aquele pedacinho de gente, mais do que a si mesmo, mais do que se é possível amar.

Tento não me emocionar, mas as lágrimas rolam sozinhas e se chocam com a máscara. Depois de um tempo as duas são separadas e a bebê levada pros atendimentos, continuo com Vick até o médico dizer que está tudo bem e ela falar para mim seguir os atendimentos bebê antes que alguém a roube.

Sorrio e faço o que ela me pediu, não tive tempo de pensar nisso quando Emma nasceu, mas todos os pais acham que alguma enfermeira louca vai roubar o seu filho, ou alguém vai trocá-lo por outro, porque afinal, não existe criança, mais bonita e perfeita que a sua. E não importa!  Seu filho pode parecer uma cruza um buldogue francês com aqueles gatos pelados,  de tão enrugado e esquisitinho, mas  para você não vai existir algo mais belo nesse mundo.

Vou ao berçário e vejo a pequena katherine ser "etiquetada", tomar banho, receber vacinas, ser vestida, e finalmente colocada nos meus braços. Seguro seus dedinhos minúsculos, e sinto um pesar por não estar com a Emma nos seus primeiros momentos, mas basta a pequenina abrir os olhos para mim esquecer daquela sensação ruim e me derreter todo por aquela trouxinha cor de rosa. Levanto o olhar pro vidro do berçário depois de ter cheirado o pescoço dela e vejo Giulia, Derek e Thomas me olhando com seriedade, percebo que roubei aquele momento deles e que nem se quer tirei uma foto para registrar.

Nem quando usava cocaina havia pensado em que cor gostaria que usassem no forro do meu caixão, mas naquele momento achei que um forro vermelho em contraste com o tradicional terno preto com as minhas melenas negras soltas iriam dar um belo susto se alguém tentasse profanar minha tumba.  Dou um sorriso amarelo pego a mãozinha da bebê, seguro seus definhos e monto um gesto obsceno na direção deles. Sempre gostei de viver intensamente cada momento mesmo.


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Notas finais do capítulo

E aí gente? Que acharam?