Minha vida em pequenas Escalas escrita por Iset


Capítulo 33
Eu não sou esse cara


Notas iniciais do capítulo

Oi gente. Espero que curtam a leitura.



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Eu não sou esse cara

De todas as maneiras que eu imaginei que um dia poderia ser preso, sequestrar a minha própria filha, com certeza não estava entre o top 100. Depois de todo o processo de ser fichado, sou encaminhado à uma das celas, onde permaneço por cerca de uma hora até finalmente ser chamado a uma sala de interrogatório,  onde Victória e Derek já me aguardam com olhares apreensivos.

— Vick, você precisa parar a minha mãe, ela enlouqueceu! Nós discutimos e ela deve ter pago essa gente para tirar a minha filha de mim.  — Exclamo assim que a vejo.

— Noah, eu falei com a  assistente social e as cópias dos documentos que ela tem… Bom, ao que parece você entregou a tutela da Emma para sua mãe.— Ela diz e eu entendo tudo.

— Os documentos do carro — suspiro — Desgraçada!  Como ela pode ter feito isso comigo? Droga! — Exclamo irritado e bato os punhos contra a mesa.

— Noah, ficar nervoso não vai ajudar em nada agora — Fala Derek colocando a mão sobre meu ombro — E antes de qualquer coisa, temos que arranjar uma forma de te tirar daqui.

— Como assim? Eu não vou sair agora?

— Noah, desculpe mas aqui você já tem registro de  briga e agressão contra um deficiente mental e agora desacatou um policial, sequestrou um bebê e agrediu uma agente social… — Fala Vick e eu a interrompo.

— Foi só uma briguinha de família e aquele cara pegou o meu bebê de dentro de casa sem minha autorização eu lá ia saber que ele era retardado?!  Os policiais, eles vieram para cima da gente, nem se quer mostraram um documento e agressão? Foi só um empurrãozinho! Se fosse você faria a mesma coisa — me defendo.

— Talvez sim, mas isso não torna certo. O fato é que não é sua primeira passagem e não vão te liberar sem uma audiência de fiança. E por favor, não fale retardado no tribunal, é pessoa com necessidades especiais certo? — Ela me repreende.

— E quanto tempo isso leva?

— Mais ou menos uma semana — Ela responde.

— Uma semana?! — grito — E a Emma? Vick você não pode deixar a minha mãe a levar pro Canadá, porque lá, todos a conhecem… Eu vou acabar com uma ordem de restrição se tiver de enfrentar um tribunal de lá, por favor… Não deixa a minha mãe tirar a Emma da Itália… Eu vou perder a minha filha para sempre…— Digo desesperado

— Noah, se acalma. Eu vou entrar com um recurso assim que sair daqui, mas precisa me ajudar. De agora em diante tenta fazer tudo que mandarem, não se meta em confusão.  Sua mãe já tem muita coisa contra você, então não piore tudo certo?

— Tudo bem, e a Lacey?  Não quero que ela seja prejudicada por minha causa, ela não sabia, na verdade nem eu sabia. A Susan armou isso, ela me deixou sair do Canadá com a Emma só para me prenderem, droga! Que tipo de mãe faz isso?! Porra! — Esbravejo tentando não me deixar vencer pelo nó que se formou em minha garganta e as lágrimas que ardiam dentro dos meus olhos.

— Hey… respira fundo tá. Vamos resolver isso, irmão. As pessoas podem falar um monte de coisas sobre você, mas não podem dizer que você não é um bom pai para Emma. E tem um monte de gente para confirmar isso. Agora precisa ficar firme, certo? Pela Emma. — Diz Derek me enredando num Abraço apertado — Vamos dar um jeito nisso okay?

— Tá,  será que você pode ir ver a Emma? Se tão cuidando bem dela? — digo entre soluços — E a Lacey?

— A Lacey vai ser liberada nas próximas horas, bom a gente tem que ir encaminhar tudo. — Fala Vick alisando a barriga que parecia prestes a explodir.

Passo a noite na delegacia em claro, não consegui comer nada nem se quer beber água. Aquele misto de sentimentos de raiva, tristeza, decepção e abandono não me faziam ter qualquer outra vontade, senão de mergulhar mais e mais neles. Por mais difícil que fosse a minha relação com meus pais, sempre achei que com minha mãe era “menos pior”, por mais brigas que tivemos, diferente do meu pai, eu nunca havia duvidado do amor de mãe que ela sentia por mim e do meu de filho por ela. No entanto agora, tudo que eu conseguia sentir era raiva, asco. Mais uma vez, eu me via como um brinquedo quebrado que já não interessava mais a ela, e aquilo conseguia doer ainda mais agora do que quando era um garoto.

Recosto as costas na parede úmida e vejo os raios de sol atravessarem as grades da pequena janela. Um policial, me trás o café da manhã e mais tarde recebo a visita de Lacey e Joseph. Para minha surpresa e total “desarmamento”(pois já tinha preparado minha defesa onde o culpado seria Joseph por ter permitido que eu crescesse com a doida da Susan) eu não levei bronca alguma dele, pelo contrário, recebi um abraço apertado e algumas palavras de apoio. E depois que Lacey e eu ficamos a sós, um beijo apaixonado que terminou num abraço demorado, o qual eu não queria soltar.

— Noah, pode me soltar agora.

—Eu posso, mas não quero, porque as coisas tem que ser tão complicadas. E tem certeza que não tá furiosa?

— Porque? Só por ter engravidado uma garota, assinado papéis sem ler ou por me botar na cadeia? Eu ainda vou escrever um livro sobre a gente que vai vender mais que cinquenta tons de cinza — ela fala irônica — Mas sério, um relacionamento precisa de emoção pra manter a chama acesa. Mas com você a chama é tipo um incêndio numa papelaria.

— Fazer o que? É o meu dom...— falo com um sorriso fraco.

— Sorte sua, não é? Além do mais acho que você já tem problemas suficientes… Mas meu Deus, Noah! Como você assina papéis sem ler?! Seu idiota cabeçudo!

— Você leria o que sua mãe manda assinar depois dela ter te dado um carro?

— Leria, se minha mãe tivesse movendo um processo internacional contra mim e fosse a inspiração da Regina George.

—Eu costumava sempre esperar o pior deles, mas a Carol ela me fez parar de ver as coisas assim e depois que a Emma nasceu, eu quero realmente acreditar que a gente ainda pode confiar nas pessoas. Principalmente naquelas que nós amamos. Mas talvez eu só tivesse sendo burro. — falo.

— Não, você não está. — Ela diz e me abraça apertado, até um policial dizer que acabou o tempo.

Depois de 48hrs na delegacia, sou encaminhado à um presídio aonde passo por uma das situações mais constrangedoras da minha vida.

— Tira a cueca também é esses brincos da orelha.

— O que eu poderia esconder aqui? E acha que eu vou matar alguém com um piercing?

— Você se impressionaria com os lugares onde encontramos celulares, armas e drogas.  E o que os seus novos amiguinhos poderão fazer com esses seus brinquinhos. Então tira e vai para aquela área ali. — Insiste o policial.

— Isso não vai contra algum direito humano não?  — Retruco e vejo o polícia revirar os olhos.

— Agora! E não tente bancar o ativista aqui não rapaz.

Obedeço resmungando e termino o processo de entrada com um macacão cinza escuro, sapatos pretos (muito desconfortáveis), um jogo de lençóis e um cobertor caminhando por um corredor escuro repleto de grades e caras mal encarados que batiam com copos de plástico as grades.

— Carne nova no pedaço — grita um.

— Deixa o playboyzinho aqui — fala outro.

Tento ignorar até chegar a cela onde o carcereiro para é abre a porta. Recuo um passo para trás quando vejo um cara enorme lá dentro.

— Eu não vou ficar sozinho?

— Isso aqui não é um hotel garoto. Agora entra aí.

Caminho para dentro da cela, e já imagino aquele cara quebrando todos os meus ossos, se eu falar alguma besteira, então decido fazer amizade.

— Oi — Falo me dirigindo a cama que parecia vaga.

— Essa cama é minha — Ele fala e e eu levanto e vou para a outra.

— Essa cama também é minha.

— Não pode ficar com as duas!

—  E quem vai me impedir? Ele diz dando alguns passos na minha direção.

— O chão tá ótimo.  

— Foi o que eu pensei.

Passo o resto do dia na cela, para minha sorte ou azar, ainda não sei. A única hora do dia que saíamos dela era durante uma hora para tomar sol, fazer exercícios e tomar banho.

A cela era simples e fria e nem nos meses que passei no reformatório na adolescência, fiquei tão mal acomodado. Depois de quase vomitar ao ouvir e sentir o cheiro inquietante do meu colega de quarto, enquanto ele fazia as suas necessidades na privada no canto da cela, fiquei pensando que se tivessem me colocado num lugar assim a primeira vez que me pegaram com drogas, certamente teria ficado bem longe delas.

Forro o chão com o cobertor e me cubro com o lençol, e mais uma vez passo a noite acordado. Olhando para cama vazia que meu colega não me permitiu usar. No dia seguinte desperto todo dolorido, e exausto.

— O que você fez para vir parar aqui? E quanto tempo pegou? — questiona o cara enquanto eu escovo os dentes na pia minúscula e suja. Eu penso de deveria dizer que fiz algo assustador, para mantê-lo longe de mim, mas decido falar a verdade.

— Aparentemente eu sequestrei a minha própria filha. Ainda não houve julgamento.

— Que imbecil.

— É. E você?

— Um cara me devia uma grana aí eu amassei o carro dele com uma retroescavadeira. Peguei 15 anos.

— Nossa, 15 anos por amassar um carro? Que exagero!

— É que eu esqueci de tirar o cara de dentro — ele fala tranquilamente — Me chamo Fernando Albugeri e você?

— Noah… Noah Johnson.

— Que nome de bichinha — ele fala se recostando a parede.

Sim, em algumas horas com Fernando aprendi a fechar a minha boca grande, na verdade prefiro o termo controlar minha sinceridade desmedida, mas o fato é que toda vez que eu ousava abrir a minha boca, ele vinha com algum tipo de intimidação, mesmo quando era ele a puxar assunto.

— Então você não é daqui é?

— Sou canadense.

— Ah aqueles yankees malditos! — Ele fala parafraseando alguns filmes antigos de faroeste. — Sempre quis dizer isso.

— Você vem à minha casa e nem me traz um café? Ao menos beije meu anel. — Falo carregando um sotaque italiano ruim e gesticulando com as mãos. Como o poderoso chefão e ele sorri.

— Pode ficar com a cama, qualquer cara que saiba frases de o poderoso chefão tem meu respeito.

— Ah obrigada.  — Digo juntando o cobertor e colocando sobre a cama. Enquanto ajeito o lençol vejo a foto de uma garota de short pregada a parede.

— Uau, que g. — falo e sou fulminado pelo olhar dele — Que foi?

— É minha filha, seu imbecil. — Ele diz e aponta pro canto no chão novamente.

Eu e minha boca grande, retiramos os forros da cama e voltamos pro canto da cela, onde passo mais uma noite.

No dia seguinte recebo a visita se Samuel, que trás alguns quilates do Branch e café fresco. Passo o tempo da visita, reclamando de tudo e Sam, diz para mim tentar ver pelo lado bom, afinal eu ainda estava inteiro e com os fundos intactos. O que me faz fazer uma anotação mental sobre dar uns tapas na cara dele quando saísse dali, pela piada sem graça. Volto para cela e Fernando confisca toda a minha comida e o meu café, penso em protestar, mas na melhor das hipóteses a briga acabaria com eu todo arrebentado indo para solitária e recebendo um sonoro não na audiência de fiança, então aprendo a dura lição da resiliência.

No quarto dia, minhas costas pareciam que iam quebrar ao meio, Derek veio me visitar e trouxe uma foto da Emma, disse que a viu no abrigo e que estava sendo bem cuidada. Também contou que minha mãe já estava na cidade, mas que devido ao processo que Vick  havia movido, ela não poderia tirar Emma do abrigo até uma decisão do juiz de Roma. Fiquei feliz e triste ao mesmo tempo. Não queria que minha mãe levasse Emma de volta para o Canadá, mas ao mesmo tempo, me partia o coração saber que ela estava sozinha com pessoas estranhas enquanto poderia estar com a avó recebendo todo o amor e carinho que eu não podia negar que minha mãe sentia por ela.

Volto para minha cela e sento no canto com a foto da Emma em minhas mãos, a saudade doía mais que qualquer coisa. Sentia falta dos seus gritinhos, sorrisos, Beijos babados e até mesmo da bagunça de toda vez que eu ia trocar suas fraldas e ela escapava gatinhando ou rolando, espalhando cocô e talco pela cama.

Sem perceber sinto uma lágrima quente escorrer pelos meus olhos e aperto a foto contra meu peito.

— Tá chorando porque oh idiota?— Ouço a voz do Fernando ressoar na escuridão da cela.

—Nada. — Digo enxugando o rosto com as mangas e ele se levanta e vem na minha direção.

— Deixa eu ver o que tem aí.

— É só uma foto cara, me deixa. — Falo e imediatamente ele me levanta pelo colarinho e me segura contra a parede. Tirando a foto da minha mão em seguida.

— Sua filha? — Ele fala me soltando e olhando para foto.

— Sim, dá para me devolver?

— Como se pede?

— Por favor. — Falo em tom quase inaudível.

— O que disse?

— Por favor. — Repito.

— Agora sim, qual o nome dela.

— Emma Carolina.

— Que diabo de nome feio, coitada.

— Eu gosto. Agora me devolve a foto. — falo e e ele me e eles tende a foto e quando vou pegar ele punha de volta.

—Qual é o seu problema cara? Isso é meu!

— Qual é? Vai chamar a mamãe é? Se ainda não percebeu, ninguém vai fazer as suas vontades aqui moleque. — fala empurrando meu ombro. — Eu vou ficar com isso, até você aprender a se comportar.

— Vai se ferrar! — Avanço sobre ele tentando pegar a foto e sinto um soco forte na minha cara que me faz apagar na hora.

Acordo no outro dia na enfermaria ainda mais dolorido, abro os olhos com muita dificuldade pois estão muito inchados e vejo minha mãe recostada a uma cadeira ao meu lado.

—  Ah querido graças a Deus! — Ela fala ao me ver acordar.

—  Não encosta em mim, a culpada disso é você.

— Eu não queria que te machucassem Noah,  eu só ia usar aqueles documentos para te manter no Canadá, mas você surtou e disse aquelas coisas horríveis.  Eu… Olha, vamos voltar para casa. Eu, você, a Emma. Terá o dinheiro para abrir seu negócio, cuidaremos dela juntos e desse outro filho que vai ter também. — Ela diz com aquela voz macia. — É só você parar de teimosia.

— Se eu fizer, se eu voltar pro Canadá, vai me devolver a Emma?

— Claro querido, eu só quero o melhor para vocês dois. Ah, pensa vai poder trabalhar com o que gosta, ter seu carro, uma casa confortável, Emma terá uma boa educação.

— Eu não te entendo mãe, se eu te peço ajuda, você diz que eu preciso crescer que não passo de um moleque mimado que acha que pode fazer tudo… E eu até te entendo, eu não sou nenhum exemplo. Mas você não se importa que eu continue sendo um garoto, desde que esteja embaixo dos seus olhos, desde que você possa continuar sendo necessária. Se  acha que eu não posso cuidar da Emma porque sou mimado, instável e egoísta, bom se é por isso nenhum de nós é bom para ela.

— Não é isso filho, eu só não acho que você esteja pronto.

— Você estava quando me colocaram no seu colo? — Questiono e vejo os olhos dela se encherem de lágrimas.— Bom, eu tremi as pernas quando disseram que ela estava de alta e por Deus mãe, tem muitos dias que tudo que eu queria era sair correndo, votar para minha vida antes. Onde a minha maior preocupação era não ultrapassar o limite do cartão com games games e outras coisas inúteis, mas eu simplesmente não consigo. Porque ela é toda a minha vida agora mãe e nada mais é tão bom, gostoso ou divertido como quando eu tô com ela.

— Noah,  criar uma criança vai muito além do amor. Você acha tudo maravilhoso agora que ela é um bebê,  mas ela vai crescer e cada vez vai ficar mais difícil, o que vai fazer quando ela passar a te confrontar? Vai gritar e sair pela porta como você sempre faz?  Dizer que o problema da sua vida é ela, como você sempre fez comigo e com o seu pai e algumas vezes até com a Carolina?

—Não fala da Carolina! —Esbravejo e tento me levantar quando sinto o puxão da algema no meu punho. — Eu posso não ser um cara perfeito e talvez você esteja certa e eu venha fazer muita merda, talvez a Emma cresça e me ache só um idiota de cabelo grande que fala besteira e talvez ela até tenha vergonha de mim... mas eu vou amá-la e me orgulhar dela, se ela dirigir uma empresa ou se vender cordões na praia.  E você  pode tirar ela de mim, pode me fazer ser um maldito pai de final de semana, mas diferente de mim, ela vai crescer inteira sabendo que ela é amada e que tem um cara que pode não ser o mais inteligente ou educado, mas que morreria por ela...  Eu não vou fazer o que você quer, porque eu sei como vai terminar e eu não quero ser o cara que você acha que eu devo ser.

— Bom, eu tenho que ir. Pense na minha proposta. De qualquer jeito eu vou levar a Emma pro Canadá, e se se importa com a sua filha manda aquela advogadazinha parar de inventar recursos. A única coisa que ela vai conseguir é manter a sua filha mais tempo num abrigo imundo. — Ela fala limpando as lágrimas.



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