Minha vida em pequenas Escalas escrita por Iset


Capítulo 21
Pai sem terno e gravata


Notas iniciais do capítulo

Um pouquinho de drama pro domingo de vocês!



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Pai sem terno e gravata

Sim, mesmo sem ter muita proximidade com meu pai adotivo, receber aquela notícia foi muito doloroso. Por sorte, Lacey estava alí, pode me amparar e me fazer pensar racionalmente, em tudo que eu precisava fazer, para ir ao encontro da minha mãe e me despedir do meu pai. Dois dias depois já estava tudo arranjado, Emma ficaria sob os cuidados de Derek e Vick, e eu pegaria o vôo para Toronto.

Depois de horas de viagem, finalmente desembarco no Canadá e sigo imediatamente para casa dos meus pais e sou recebido pela governanta, que me leva até o escritório onde minha mãe conversa com uma assistente. Fico alguns instantes parado na porta observando enquanto ela dá ordens para garota.

— Pegou meu vestido pro cerimonial e o outro pro funeral? E qual a porcentagem de confirmação pro cerimonial?

— Peguei sim senhora, 85% dos convites já foram confirmados. - Responde a jovem com uma prancheta.

— Enviou as fotos e os arquivos para Forbes e para Businessman?

— Sim, a businessman vai fazer uma matéria de capa para ele sra Johnson. - Responde a assistente apressada e eu dou duas batidas no marco da porta.

— Mãe… - Digo e ela volta o olhar para mim.

— Querido, ainda bem que veio. Achei que não chegaria a tempo do cerimonial de hoje a noite. E a Emma?

— Eu disse que não iria trazê - la mãe. - Digo e ela solta um suspiro.

— Okay. Que número de terno você usa?

— 40.

— Gabrielle, providencie um terno para ele, preto, nada extremamente formal mas também não muito moderno. - Ela diz a assistente, que anota tudo num caderninho. _ Corre! Anda, a cerimônia é daqui a algumas horas. - Ela diz a garota que sai apressada.

—É impressão minha ou tá transformando o funeral do meu pai num mega evento social? - Pergunto intrigado.

— Seu pai era um grande empresário, merece todas as honras nesse momento. - Ela diz visivelmente consternada, mas como sempre tentando se manter forte e altiva.

Me aproximo dela e a enredo num abraço apertado.

— Pode chorar mãe, não precisa ser forte o tempo todo. - Sussurro e ela se entrega as lágrimas enterrando a cabeça no meu ombro e em pouco tempo também estou chorando.

Minha relação com meu pai nunca foi “boa” e desde que ele me jogou na cara que eu era adotado, as coisas ficaram ainda piores. A última briga, por eu ter desistido de deixar Emma sob a tutela deles, causou ainda mais atrito e mágoas entre nós. Mesmo assim, ele foi minha referência de paternidade durante a maior parte da minha vida e embora fossem poucas, eu guardava boas lembranças dele, no meio de todo o caos da nossa relação.

Nos separamos depois de algum tempo e minha mãe enxugou o rosto e se recompôs. Conversamos sobre o acidente e demais coisas burocráticas até ela subir pro quarto pra se arrumar para o cerimonial, eu fico sentado no escritório durante um tempo, olhando fotos antigas e os recortes dos artigos de revistas que falavam da empresa ou dos meus pais. Mais tarde a governanta traz o meu terno, subo pro quarto de hóspedes, tomo um banho, amarro os cabelos e me visto devidamente. Meus pais nunca foram religiosos, se diziam protestantes pois era muito mais bem aceito ramo imobiliário, quando você quer vender casas num país onde  menos de 20% da população não tinha religião do que se intitular agnóstico e por isso, meu pai teria um funeral com um culto protestante. Mas antes, como era de costume havia uma cerimônia de despedida, onde amigos e parentes poderiam falar, relembrar bons momentos, comer e beber em honra do falecido, e não surtar no meio de tanta falsidade, seria meu desafio para noite.

Chegamos ao salão onde era realizado o cerimonial e depois de quase meia hora recebendo as condolências dos convidados, finalmente adentramos o salão. As pessoas já conversavam e bebiam sentadas às mesas dispostas alinhadamente a frente de um pequeno palco, onde havia um oratório com uma gigantesca coroa de flores e um quadro com uma foto do meu pai com um sorriso enorme no rosto.

Me sento na mesa designada para mamãe e eu, enquanto ela se ocupa de apresentar um slideshow com fotos antigas, contando sobre a brilhante carreira de Paul Johnson, de corretor de imóveis a magnata do ramo imobiliário canadense, tio Jeffrey se aproxima com um sorriso falso.

— Noah, que bom ver você. Nossa deve estar sendo difícil, eu soube da sua esposa e agora o Paul, parece que não tem sido um ano bom para nossa família. - Ele fala se sentando.

— É parece que não. - Respondo apenas tentando cortar o assunto.

— E então, soube que está morando em Roma? Sua mãe vai precisar de alguém para ajudar ela nos negocios da familia. Pretende voltar ao país?

— Tio jefrey você sabe muito bem que nunca me interessei pelos negócios dos meus pais, não é porque o meu pai morreu que vou cair feito um abutre em cima da minha mãe. - Respondo voltando a atenção pro telão.

— Bom, você é filho único precisa se preocupar com o patrimônio da família, pois será seu um dia.

— Quando for,  eu me preocupo com o que fazer com ele, até lá como o pai me disse, a única coisa que é minha, é o que eu conseguir com meu trabalho. Com licença. - Digo me levantando.

Vou até a copa e pego uma bebida e depois de uma série de discursos falando de como o meu pai era uma pessoa incrível, solidária e amável eu estava a ponto de vomitar. Mas minha mãe decide me chamar ao palco para dizer umas palavras, de uma forma que não havia como eu me esquivar. Antes de subir o degrau até ela a assistente me entrega um papel mamãe me dá o lugar na bancada com microfone. Eu encaro a todos e olho pro papel e instintivamente comeco a ler.

— Paul Johnson foi um grande homem, um grande empresário, um marido e pai…. - Faço uma pausa e engulo a seco. Pai dedicado. Costumávamos, passar horas nos diver…  Ah! Droga eu não posso ler isso, desculpa mãe. Olha para vocês, metade de vocês está aqui porque devia dinheiro ao meu pai e a outra metade, veio apenas para confirmar se o sacana do ramo imobiliário está mesmo morto! - Falo e minha mãe me olha enraivecida, se aproxima e tenta me tirar o microfone. _ Não, eu quero falar. Ninguém de vocês conheceu o meu pai de verdade. Paul Johnson, o empresário do ano por seis anos consecutivos, era insuportável, ele era tremendamente egoísta, passava por cima de tudo e todos para conseguir o que queria, ele não tava nem aí se ia desabrigar metade de uma comunidade carente para construir um resort, ou se teria que fechar uma escola de mais de 100 anos para dar lugar a um arranha céu novo. Ele não se importava e por isso que ele ficou milionário. E eu cresci vendo todos admirar esse cara e eu não entendia o porquê. Eu ainda não admiro esse cara, mas por sorte eu tive o prazer de conhecer outro lado do Paul, o pai, não é porque ele morreu que eu vou dizer que ele foi o melhor pai do mundo, ele passou a vida ocupado demais para isso, mas nos momentos que ele era pai, sem terno, sem gravata eram incríveis. As melhores lembranças da minha infância foram nos jogos de beisebol, em que eu via ele na plateia com uma camisa velha e um boné enquanto eu jogava, quando nós treinávamos rebatidas no quintal, quando íamos ao campo de mini golfe. E desse cara que eu vou sentir saudade, e que vou lamentar pela minha filha não ter a chance de conhecê - lo, porque infelizmente ele não tem mais tempo, e noventa por cento das pessoas que o conheceram vão falar do empresário magnífico ou filho da puta que ele foi. E isso é realmente uma pena, porque ele era muito mais que isso. Com licença. - Digo sentindo meus olhos arderem e deixo o palco sob a atenção de todos.

Naquela noite voltamos para casa em silêncio, o velório e enterro se deram no dia seguinte, sem grandes acontecimentos. Depois da cerimônia, vou até o túmulo da Carolina com algumas rosas e vejo que não fui o único a lembrar dela, já que há um bouquet com flores frescas alí.  Me sento de joelhos em frente a lápide de mármore e volto a chorar.

— Meu amor, parece que você ainda tem admiradores, digo tocando as flores que já estavam alí. A Emma tá bem, ela é linda e teimosa igual a você. Eu ia pedir para você tentar convencer o meu pai a me perdoar, mas eu duvido que eles tenham mandado ele pro mesmo lugar que você, então… Eu ainda amo você… E ainda sinto sua falta, todos os dias… Eu..

— Noah? - Sou interrompido por uma voz doce e quando me viro, me deparo com Amber.

— Amber? - Digo levantando. _ Que faz aqui?

— Desculpa, vi no jornal que seu pai seria enterrado hoje, eu não quis te incomodar durante o enterro, eu só vim trazer as minhas condolências.

— Ah muito obrigado, não precisava se incomodar.

— Sinto muito, mas como está a Emma? Nossa sinto falta daquela baixinha. - Ela fala com um sorriso tímido.

— Está grande, muito esperta e continua chorona e insone. - Digo e ela sorri. _ Bom eu, tenho de ir…. A minha mãe vai fazer uma recepção íntima, agora em casa, quer ir lá com a gente?

— Ah não, eu não quero incomodar, é um momento para família.

— Na verdade o intimo da minha mãe é umas quarenta pessoas, e eu não vou conhecer metade delas e a outra metade eu provavelmente não gosto. Seria bom ter alguém para conversar. É claro se você não tiver nada para fazer.  

— Eu adoraria, to com o carro do meu pai, posso te seguir.

— Eu vim com a mae e o motorista eu vou só avisar ela e você me dá uma carona pode ser?

— Claro. - Ela responde com um sorriso.

Aviso minha mãe e entro na minivan da Amber, poderia ser apenas coisa da minha cabeça, mas até o modo preocupado com que ela dirigia era parecido com o da Carol. Minha noiva nunca foi uma boa motorista, e embora não admitisse, sabia disso e toda a vez que eu a obrigava a dirigir, ela ficava nervosinha, olhando para todos os lados a todo o tempo, como Amber fazia agora, solto um sorriso bobo ao perceber aquilo. Chegamos a casa dos meus pais e vejo que ela fica um tanto incomodada ao estacionar o modesto automóvel entre os modelos caríssimos dos outros convidados.

— Talvez seja melhor eu ir para casa, eu não sei se estou vestida adequadamente. - Ela fala enrubescida.

— O anfitrião  homenageado da reunião tá morto, ele não vai se incomodar com o seu jeans. Vem. - Digo estendendo a mão a ela, que dá um sorriso amarelo e pega na minha mão.

Adentramos a casa e depois de conversar inevitavelmente com algumas pessoas, recebo uma mensagem de Derek, uma foto da Emma dormindo tranquilamente com seu unicórnio cor de rosa.  Mostro para Amber e ela solta um suspiro feliz e comenta sobre como ela está fofinha. A levo até a cozinha, onde podemos beliscar os canapés e sanduichinhos sem ter de me preocupar em trocar palavras com aquelas pessoas, que me olhavam desconfiadas depois do meu surto de sinceridade no cerimonial. No fim eles sabiam que eu estava certo, mas para fins comerciais os únicos comentários aceitáveis eram sobre o desequilíbrio emocional ou a possível recaída nas drogas do filho dos Johnson.

— Você tá bem com tudo isso? A morte do seu pai, é que… Você parece estranhamente bem.  - Ela fala meio hesitante.

— Meu pai e eu não éramos muito ligados, eu o amava, claro… Mas… É como se morresse um tio sabe? Doi, mas nem tanto. Ou talvez eu só seja um ingrato insensível… - Digo.

— Insensível você? Difícil. - Ela fala.  Amber me conheceu um mês e alguns dias depois de eu perder a Carolina, e embora tenha cuidado da Emma por poucas semanas, ela presenciou muito do meu luto e das minhas primeiras aventuras como pai de primeira viagem.

— Quer conhecer a minha mãe? Aquele dia no hospital, não tive cabeça para apresentar vocês. - Digo.

— Claro.

Vamos até a sala, depois ao escritório, onde minha mãe conversa com tio Jeffrey.

— Você vai precisar de alguém te apoiando, para tocar os negócios. Eu posso ser essa pessoa. - Ele fala com a voz melodiosa.

— Jeffrey, Paul e eu podemos não ter sido o casal do ano, mas como sócios, éramos imbatíveis e não havia segredos entre nós. Ele teve bons motivos para nunca te dar um cargo de confiança e eu sei de todos eles. Aliás, por mim, nem um emprego você teria. Então por favor, não tente subestimar minha inteligência. - Fala minha mãe com aquele ar de “dona da porra toda” que ela sempre teve.

Tio Jeffrey se levanta com cara de pouco gosto e sai em passos firmes, dou um sorriso e um aceno quando ele cruza por nós pela porta, antes de adentrar o escritório.  

— Filho, onde se meteu? Estava te procurando… E essa é? - Ela fala fitando Amber da cabeça aos pés.

— A Amber? Lembra dela? Era a babá da Emma.

— Amber, é claro. Noah já disse que você é muito parecida com a noiva falecida dele? - Ela diz sem cerimônia.

— Mãe!. - Falo em tom de repreensão.

— Desculpa querido, só uma constatação inegável. Então vai contratá-la novamente?

— Não, ela só veio nos dar as condolências. Eu moro em Roma esqueceu?

— Eu sinto muito sra Johnson, e no que eu puder ajudar… - Fala Amber com simpatia.

— Obrigada querida, mas Noah eu pensei que fosse voltar a morar aqui, seu pai morreu e só temos um ao outro agora… - Ela diz naquele tom de ordem.

— Bom eu acho que, eu vou… no banheiro… - Diz Amber se retirando.

— Mãe já tínhamos conversado sobre isso, eu não vou voltar. Quero ficar perto do meu irmão. - Protesto.

— Ah Noah por favor, eu sou sua mãe! Preciso de você aqui. Você não disse que seu irmão vai ter um filho, ele nem vai se importar com você depois que esta criança nascer…

— Mãe… Não é só pelo Derek, eu não te falei nada, não queria te estressar mais, mas é que tem Joseph… - Digo, eu não havia dito absolutamente nada para minha mãe, sobre o dna e os O’Connor, primeiro porque ela tava tentando tirar a Emma de mim e depois não queria encher a cabeça dela, que já estava a mil com a morte do papai. Ela fica paralisada me olhando e solta um suspiro.

— Joseph?... Noah você é gay? Querido, porquê nunca me falou nada? - Ela fala em choque.

— Não! O Joseph é meu pai biológico, ele nos procurou a algumas semanas e nós fizemos um Dna. Ele é meu pai, se mudou para Roma por uns meses para gente ficar junto e tenho um meio irmão. São uma família bacana...

— Você não me falou nada Noah, como pode encontrar seu pai biológico, fazer um Dna e nem sequer avisar a sua mãe!

— Eu sou maior de idade e você tá me processando mãe. E o Joseph ele...

— Precisa ficar longe desse homem. Vamos voar até Roma e trazer a sua filha e vocês dois vão morar aqui e ponto final!  - Ela ordena.

— Não, eu não vou mãe. Não sou um menino! Eu vou ficar em Roma, Joseph é um cara legal e eu to adorando finalmente fazer parte de uma família de verdade! - Grito irritado.

— Família de verdade? Joseph O’Connor  estou certa? - Ela diz se voltando a mesa e começando a vasculhar as gavetas até virar uma pasta e estender a mim.

— Você conhece ele? - Questiono sem entender.

— Não, mas eu já vi esse nome. Abre, olha. Esses são os seus documentos, sua certidão e declaração de nascido vivo, antes de fazermos seus novos documentos. Leia!

Abro a pasta e a primeira folha é a declaração de nascido vivo, a marca de um pézinho de bebê, anotações médicas, meu nome que até então era Jeremy Noah Burth, o  nome da minha mãe, o pai como desconhecido, a declaração de gêmeo marcada e no fim uma assinatura, do acompanhante na hora da alta.

Joseph O’Connor.


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Notas finais do capítulo

Quem se disponibiliza a dar um colinho pro Noah?
Quem ainda não tá no grupo do face?
Corre la:
https://www.facebook.com/groups/1942357412670130/