RICH

Sempre fui centrado, organizado, dedicado. Minha família é tradicionalmente tradicional. Daquele tipo unido, que está sempre próxima, sempre unida, sempre presente, e que cobra um comportamento adequado de seus membros. E até pouco tempo eu acreditei que ser desse jeito era o melhor. Que era isso o que eu queria para mim. Mas, quando Brenda, uma animadora de torcida, que exibia longos cabelos loiros luminosos, corpo esguio e rosto de anjo, me pediu para ajudá-la com álgebra e nós passamos a conviver, realmente minhas estruturas se perderam.

Foram por água abaixo.

Não estava preparado para o que Brenda provocou em mim. Para como ela me fez me sentir. Não estava preparado para me apaixonar de forma enlouquecedora por ela. E querer estar com ela por todo o tempo possível. Mesmo tendo a namorada que eu, e minha família, julgava perfeita. Elizabeth Gillies seria a escolha correta para alguém que pretendia ter uma vida sossegada e programada. Sem surpresas ou grandes emoções. Nós realmente combinávamos. E portanto seríamos perfeitos juntos.

Grande erro de julgamento. Pois todas essas certezas ruíram ao me deparar com sentimentos que desconhecia.

Nem se pode dizer que a Brenda teve alguma culpa nesse incidente. O caso é que a medida que a conhecia mais e mais, percebi que ela tinha muito mais do que um belo corpo e um rosto perfeito. Percebi que ser animadora não era um plano dela, e sim da mãe dela que também foi animadora. Entendi as pressões pelas quais passava diante do grupo de amigas e me encantei com cada detalhe da personalidade especial dessa garota. A ponto de praticamente esquecer que um dia me imaginei casando com Lízzie.

Não notei que ao mesmo tempo em que me apegava a Brenda, me afastava mais e mais de Lízzie. Ela já não representava para mim aquilo que almejava como amor futuro. Como companheira futura. Eu precisava, eu necessitava, sentir aquele afoito desejo de estar com alguém. Um desejo que Liz nunca me despertou, nem mesmo no começo do nosso namoro. E acabei cometendo muitos erros em nome dessa paixão sem sentido, como minha mãe fala.

“Como você pode trocar a Lízzie por essa garota?

Ela nunca o acompanhará como Lízzie faria.

Ela será um ponto negativo na sua vida acadêmica.

Você deixou de pensar com racionalidade.”

E a lista seguia, até meus avós começaram a perguntar por Lízzie. Insistir que a chamasse para um jantar, para um chá, para um passeio. Eles gostam dela, e eu sei que Liz também gosta deles. Já com Brenda foi tudo mais complicado, e ela percebeu que minha família a rejeitou. Mas isso não a incomodou de imediato. Só que eu não consegui reverter a situação que praticamente se tornou insustentável. E nossa relação decaiu. Ela me cobrou atitudes que simplesmente não posso tomar.

Como enfrentar minha família por ela? Como reverter tudo o que eles planejaram para mim por ela? Como deixar tudo para trás por ela enquanto Liz está ali e é tudo o que eu preciso? Tudo o que minha família aceita. Sem brigas ou recriminações. Sem problemas no futuro. Sem sobressaltos ou... desejos desenfreados...

Um dilema que tem ocupado meu tempo e me obrigado a atitudes que não costumo tomar.

Brenda diz que me ama. Até acho que pode ser verdade. Por que outro motivo ela estaria comigo? Por que se submeteria a falta de empatia com que é tratada na minha casa? Há muitos outros garotos populares no sentido exato da palavra, com quem ela poderia se relacionar e ter menos problemas.

As únicas pessoas que me apoiam nessa relação são meus amigos mais próximos, Pitt e Tony, mas acho que é porque consideram Brenda uma gata daquelas de tirar o fôlego. E consideram que estou aproveitando com ela meu último ano na escola.

Não posso negar, ainda estou apaixonado por ela e o período em que estamos juntos é o melhor momento do dia. Sinto sua falta e todos as manhãs quando chego a escola, é por ela que busco. Mas acabei por pedir um tempo. Não por mim, mas por toda essa situação que nos envolve. Brenda está infeliz. Nunca quis que ela fosse infeliz.

E o outro lado da moeda é Elizabeth.

Também fui em busca dela. Minha ex colocaria minhas estruturas no lugar novamente. Só que nesse aspecto há um problema. Liz está ficando com Frederic, um jogador de hóquei retardado. Metido a valentão e ignorante. Ela só pode estar fazendo isso para me provocar, ela o odiava, sempre o odiou. E agora, de repente decide ficar com ele? Não bate! E a prova disso estava nas entrelinhas das nossas conversas rápidas quando a chamei para visitar meus avôs. Durante o tempo em que estivemos na casa deles. E depois, no estacionamento, quando a toquei. Minha ex ainda guarda os mesmos sentimentos por mim.

Seria necessário apenas um empurrão a mais, um carinho a mais, talvez um beijo e um pedido de desculpas e ela voltaria comigo. Minha família ficaria satisfeita. Os problemas teriam fim. Nós seríamos novamente o que todos acham que deve ser um casal perfeito.

Mas...

Eu não estaria completamente feliz. Estou mesmo apaixonado pela Brenda. Perdido, loucamente apaixonado por ela. Só não tenho a coragem suficiente para seguir em frente. Para enfrentar a todos.

E para completar a situação, me deparei com outro problema.

O valentão veio tomar satisfação sobre minha aproximação de Lízzie. Com que direito ele fez isso? Ele acha que Liz está realmente com ele? Será que é tão burro que não percebe que está sendo usado? Tive vontade de dizer na cara dele que a “namorada” dele voltaria comigo no momento em que eu estalasse os dedos.

Me manter afastado sob ameaça não vai surtir efeito. Mas, como todo esportista burro, Frederic acredita que vai fazer com ela e comigo o que faz com a escola. Ele tem boas notas, mas eu sei porque. Os pais dele pagam por isso. Pagam para que ele se mantenha com média e assim evitam incômodos. O capitão do time de hóquei não é como eu. Ele não se dedica, mal participa das aulas, também não faz parte de nenhum grupo de estudos acadêmicos além dos treinos e jogos. Então, como pode ser tão aclamado e quase idolatrado pelos professores sérios? Quando o esporte mais popular da nossa escola é o basquete?

Resposta? Ele paga bem por isso.

Lízzie não toleraria um relacionamento com o cara se não fosse por necessidade. Afinal, o fato dele ser jogador era um dos motivos do desafeto dela por ele. Além é claro da mania que Frederic sempre teve de provocá-la chamando-a de Beth. Liz praticamente se transformava em outra pessoa quando ele surgia. Geralmente cordata e centrada, ela perdia a o controle e trocava ironias e farpas azedas. Eu até considerava engraçada aquela situação. Gostava de ver a maneira como ela o colocava no lugar dele.

Então, depois de tudo isso, como Frederic ainda acredita que tem algum poder para me afastar de Lízzie? Só não voltei com ela por causa de Brenda... se eu a magoar, acho que nunca mais ela olhará para mim. Não estou pronto para um afastamento definitivo. E para piorar, Fred sabe disso.

LÍZZIE

Estávamos a caminho da sala de aula. Morgana e Savana iriam para a aula de inglês, eu e Jess para literatura. Mas havia alguns minutos e a presença de muitos alunos nos corredores me deu a certeza de que os professores ainda não estavam em aula. Era minha oportunidade de contar a novidade a elas. Com voz tranquila e certamente feliz, falei:

— Fred e eu estamos namorando.– apertei os livros nos braços controlando as batidas agitadas de meu coração. Como negar a felicidade que aquela notícia me conferia?

Porém...

Nenhum movimento foi feito, ninguém surtou. Ninguém saltou para me perguntar como o fato acontecera. Por que eu tomara essa decisão. Então repeti a frase com um pouco mais de informação. Decididamente não fora clara o suficiente.

— Fred e eu decidimos namorar a sério.

Pronto, depois dessa todas me olharam.

— Uma hora isso ia acontecer. Eu sabia! - Savana falou sorrindo e quase saltando diante de mim.

— Ninguém está surpreso com essa novidade Liz... - Jess falou serena com um breve sorriso no rosto. - A gente já sabia que você estava a ponto de tomar essa decisão.

Estremeci lembrando do modo como Fred tocou no assunto e fui sincera:

— Não fui eu... - estava envergonhada de mim mesma – Sou covarde demais para admitir que estou apaixonada por ele. Foi ele quem sugeriu o namoro...

Savana arregalou os olhos espertos e as bochechas se inflaram mostrando as sardas delicadas.

— Ele disse que está apaixonado por você?

E outra voz, mais surpresa questionou:

— Você está apaixonada por ele?

A terceira queria uma informação diferente:

— Quando essas declarações todas aconteceram?

As três perguntas saíram ao mesmo tempo me obrigando a correr os olhos por elas. E logo depois tentar responder cada uma a contento.

— Ele não disse que está apaixonado por mim. Ele apenas sugeriu que nós levássemos nossa história adiante como namorados de verdade. Para ver o que acontece. Eu aceitei, era isso que eu queria. Mas nenhum de nós falou em sentimentos ou paixão... não sei se Fred gosta de mim...

— Claro que gosta! - ouvi Morgana exclamar com uma convicção que não estava presente em mim.

— E quando você descobriu que está apaixonada por ele? - Jess ignorou meu dilema quanto ao que Fred sentia por mim, ela ainda estava atenta ao fato de eu ter me apaixonado pelo capitão do time de hóquei.

— Há poucos dias... mas já estava desconfiada... - confirmar para ela como me sentia com relação a Fred era a comprovação fina de que meus sentimentos eram muito, muito, muito reais. Pois estava provavelmente me oferecendo para tomar um sermão.

Jess nada falou, nem em favor, nem em contrário. Apenas sorriu para mim. Talvez aquilo fosse o máximo de aprovação que estivesse pronta a oferecer naquele momento.

— Quando vocês decidiram isso? - Morgana repetiu seu questionamento com aquele sorriso cúmplice direcionado a mim. Eu sabia que ela estava feliz com essa decisão.

— Ontem...

Percebi um leve suspiro de satisfação quando elas notaram que eu não guardara segredo delas. E então, quase ao mesmo tempo, nossos telefones vibraram indicando que estávamos recebendo uma informação importante. Olhei a tela do meu e meu coração quase parou.

Era um vídeo gravado em celular, na legenda estava escrito: Elizabeth Gillies provocando confusão na escola. A imagem era de Fred e Rich frente a frente se encarando sérios diante da sala de aula. Meu namorado parecia intimidador diante de Richard. Será que brigaram? Ó céus! Fiquei encarando a imagem dos dois na tela do celular, travada, com a seta de play na frente. Não tive coragem suficiente para assistir.

Mas as garotas tiveram.

— Que besteira... eles estão só conversando... - Morgana falou depois de alguns segundos.

— Pode ser, mas eles não parecem muito cordiais... - Jess ofereceu sua opinião sensata.

— Eles nunca foram cordiais um com o outro. - falei tomando coragem enquanto abria o dito vídeo.

— Não é bem assim, na verdade, Rich nunca foi cordial com o Fred. Nunca vi o Fred provocar ninguém além de você Liz... - Savana comentou sem retirar os olhos do celular.

Vi os poucos segundos de imagens. Tudo indicava uma simples conversa. Uma conversa nada amigável, mas nada ali indicava mais do isso. Pura e simples conversa. Parecia uma besteira como Morgana falou, mas aquela besteira poderia provocar muitas confusões.

Droga! Pensei encarando o rosto sério de Fred e os braços cruzados de Rich diante do corpo.

Logo o vídeo recebeu comentários de incentivo. Garantindo que Fred sairia vencedor se eles decidissem brigar. Que eu não merecia tanta atenção. Que Frederic perdera a razão e que eu seria a eterna namorada do Rich. Outras garotas pedindo a Frederic que não brigasse por mim, que elas o queriam e que estavam a sua espera. E assim as bobagens se acumulavam, uma sob a outra.

Meu sangue ferveu.

O que dera em Fred? Aquilo era coisa dele? Parecia que sim. Parecia que ele se aproximara de Rich e não o contrário. Richard não é dado a esse tipo de atitude. Frederic é quem leva as situações a ferro e a fogo. Não deixa nada para depois. Não pensa muito antes de agir.

E por quê? Eu já garantira que evitaria as tentativas de aproximação de Rich. Será que Fred não acreditava em mim? Pior. Será que não confiava em mim?

Então, a sensatez me atingiu em cheio novamente:

— Esse é um dos motivos pelos quais acho que vocês não combinam... - Jess falou, quase como se estivesse dentro de minha cabeça. - Rich se parece mais com você, ele nunca tomaria satisfações de um ex namorado. Até na tentativa de aproximação ele tem sido controlado...