Ao seu lado escrita por nanacfabreti


Capítulo 12
Labirinto




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—Me desculpe. –Ian sussurrou antes de sairmos do carro.

Não respondi nada, respirei fundo e segurei sua mão enquanto seguíamos ao encontro fatídico, ele estava trêmulo e sua pele gelada, mesmo assim me senti mais segura.

Quando ela nos avistou sua expressão tornou-se intimidadora, era como se estivesse vendo algo realmente assustador, seus olhos brilhavam enquanto vidrados em nós.

—Eu não posso acreditar nisso...só pode ser um pesadelo. –Ela sibilou assustando a todos nós.

Antes que qualquer um pudesse esboçar alguma reação, ela lançou-se sobre mim e segurando meus ombros ,balançava-me como se quisesse ver-me despertando.

—Você está louca? –Meu pai a puxou enquanto Ian tentava me defender. –Alguém pode me explicar que está acontecendo? –Ele olhou-me.

—Senhor, nós vamos explicar, mas...quero adiantar que Lívia só quis me proteger. –Com a voz tremula Ian adiantou-se.

—Protegê-lo?Se existe alguém aqui que precisa de proteção, esse alguém é minha filha. –Minha mãe estava aos berros.

Eu sabia que ela estragaria tudo.

—Vamos entrar, aqui não é lugar para esse tipo de conversa. –Meu pai ordenou.

Ian e eu acatamos seu pedido e seguimos em frente, eu não queria que ninguém presenciasse algo como o que acabava de acontecer.

—Não vou a lugar algum. –Ela gritou. –Vamos para casa Lívia, lá conversaremos.Ela veio em minha direção novamente.

Meu pai colocou-se a minha frente.

—Teremos essa conversa aqui, e, se não quiser participar, fique á vontade para ir. –Ele falou duramente.

—Como se você soubesse resolver algum problema. Nossa filha correndo um risco enorme e você encobrindo-a. –Ela permaneceu reclamando enquanto seguia para o interior da casa.

Eu fazia o possível para que suas palavras não afetassem a mim, já que não podia controlar o que Ian sentia.

Senti-me como se estivesse literalmente em um júri, meu pai sentado em minha frente,e minha mãe andando de um lado para o outro,ela estava desempenhando bem seu papel.

O vento soprava a cortina de tecido claro, o cenário não combinava com a ocasião.

Ian estava ao meu lado, visivelmente abalado, nem lembrava a pessoa incrível por qual eu estava perdidamente apaixonada, tive vontade de tirá-lo dali, eu sabia quantas coisas duras ele ouviria ainda.

Percebi que minha mãe preparava uma bomba de acusações, seu silêncio era denunciante.

Comecei a falar antes dela:

—Pai, de tudo o que você sabe, a única coisa que omiti foi o fato de Ian ter o vírus HIV, e não foi por querer mentir, muito menos por não confiar em você, mas eu queria preservá-lo, queria que o julgasse pelo que ele é, e não por sua doença. –Comecei a falar lutando contra minha vontade de chorar, não queria dramatizar ainda mais a situação.

—Lívia, esse discurso pode enganar seu pai, mas não a mim, eu sempre soube da doença de Ian, me solidarizei com sua família, e você o tempo todo mentindo para mim. –Ela sentou-se em minha frente com voz mais controlada, mas ainda assim hostil.

—Não foi nada premeditado,e para ser sincero eu lutei contra meu sentimento, e até com a ideia de ficar com Lívia, mas depois de conversar com meu médico, e ele me assegurar que hoje uma relação como a nossa pode ser normal, eu decidi arriscar. –Ian resumiu nossa história.

—Olha! Você decidiu arriscar. –Ela levantou as mãos. –Arriscar a vida da minha filha? –Perguntou aos berros.

—Não finja ser ignorante mãe, você sabe muito bem que uma contaminação pode muito bem ser evitada se tomarmos os devidos cuidados. –Foi minha vez de falar.

— Como se contaminou Ian? –Meu pai perguntou diretamente a ele.

Olhei para Ian.

—Não precisa... –Tentei falar que aquilo era algo que não dizia respeito a mais ninguém.

Ele segurou minha mão e balançou a cabeça.

—Eu nunca fiz uso de drogas e ao contrario do que muitos pensam, minha vida sexual não era promíscua, mas, minha ex namorada acabou me contaminando, ela se descobriu soro positivo, depois que seu ex namorado adoeceu. Nossa relação era estável e por isso achei que não precisava me prevenir, terminamos por outros motivos e há alguns meses ela veio me dar a notícia. –Ele relatava como se estivesse dando uma palestra, aquele assunto não parecia incomodá-lo tanto.

Todos ali na sala ouviam-no atenção, até mesmo minha mãe.

—Pai, eu vi como as coisas mudaram no colégio desde que a contaminação de Ian tornou-se pública, eu vejo o preconceito das pessoas em cada gesto.Tive medo de contar e você julgá-lo, mas antes mesmo de toda essa confusão, eu já havia decidido que acabaria com essas mentiras. – Admiti. –Eu amo Ian, e mesmo que você, ou minha mãe não aceitem, isso não vai mudar, e eu vou lutar para ficar com ele, porque eu sei quem é ele é.

— Isso é um desafio? –Ela resmungou.

— Quero que saibam que eu jamais colocaria Lívia em uma situação de risco, eu preso por sua saúde, e amo de mais para não ter todo o cuidado necessário. –Ian tentava convencê-los de sua boas intenções.

Meu pai estava pensativo, ele nós observava e parecia estar em conflito, o que era totalmente compreensível.

—Bem, isso parece muito bonito para um livro, um filme, mas...aqui é vida real, e eu não vou mesmo admitir que você coloque seu futuro, sua vida em risco, afinal de um jeito ou de outro isso não vai terminar bem. – Minha mãe voltou a se levantar. –Sua mãe Ian, ela também acha isso uma loucura, aliás, foi ela quem me alertou, como é uma pessoas cristã, pensa no próximo e também não se conforma com sua irresponsabilidade.

—Um momento. –Meu pai interferiu quando eu me preparava para perder a cabeça. –Eu ouvi a todos, e, é isso que eu gosto de fazer, já você, como uma advogada, deveria ser melhor do que eu nisso.

—Não tente desmoralizar diante da minha filha, eu sei o que estou fazendo. –Ela voltou a se alterar.

— Não trata-se de você, existe algo maior aqui. –Ele apontou par Ian e eu. –Nós sabemos que o HIV é algo sério, mas, não estamos falando em radioatividade ou algo do gênero, se eles tomarem cuidado...

—Não, você só pode estar brincando. –Minha mãe o interrompeu num rompante de raiva e desespero. –Nem ouse terminar o que pretendia dizer.

Ele respirou fundo enquanto nós, as duas partes mais interessadas, apenas observávamos calados, como se fossemos espectadores de nossas vidas.

—O quê então? –Meu pai passou as mãos fechadas em concha pelo rosto e sentou-se na poltrona como se estivesse exausto. –Vamos trancar Lívia, proibi-la de ver o rapaz? Tiraremos ela do colégio ou colocaremos seguranças para acompanhá-la?

Soltei minha respiração que estava presa por sei lá quanto tempo, logo prendi-a novamente, não sabia se ela levaria a sério as considerações do meu pai.

—Farei o que for necessário. –Ela finalmente falou, seca como se não estivesse tratando dos sentimentos da sua única filha. –Se preciso for eu me mudo de lá, troco Lívia de escola sim...

—Hahahaha... –Explodi numa gargalhada nervosa e impetuosa, todos se voltaram para mim. –Acha mesmo que me mudar de escola, ou mesmo de cidade...até de país, pode nos separar?Nós sempre daremos um jeito. –Dei de ombros.

Minha mãe começou a tremer, foi perceptível a olhos nus,Ian parecia não estar me reconhecendo, e meu pai, esse sim me surpreendeu, olhou-me como se aprovasse o que eu acabava de dizer.

—Você está diferente Lívia, não se parece em nada com a minha filha. –Ela reclamou com lágrimas nos olhos.

—Isso é porque eu não estou cedendo ás suas vontades, ou fugindo do que você programou para mim, mãe. –Apertei os dedos contra meus olhos, não queria chorar. –Sei que vocês devem estar pensando que isso é apenas uma paixão de adolescente, algo passageiro...Mas não é, eu entrei nisso ciente de tudo o que eu enfrentaria e até mesmo do que abriria mão, se quisesse mesmo ficar com ele, e por mais que todos tenham suas opiniões particulares, somente nós dois sabemos o bem fazemos um ao outro, o que sentimos quando estamos juntos, e se Ian concordar, eu não vou deixar ninguém tirar isso de mim.

Falei o que achava necessário, poderia ter passado a tarde toda defendendo a minha causa, defendendo o meu amor, mesmo assim, esperava não ter que me estender mais, até porque estava mesmo decidida,por mais que pudesse parecer imprudente, ou desobediente da minha parte, mesmo sem a aprovação dos meus pais, eu não me imaginava sem Ian.

Segurei sua mão e fiquei bem próxima do seu corpo, era tudo o que eu precisava naquele instante,Ian olhou-me ainda incrédulo, mas, seus lábios estavam levemente curvados para cima num sorriso espontâneo.

—Quero dizer que entendo todos aqui. –Meu pai respirou fundo antes de começar com seu tom blasé. –Não vou mentir e dizer que isso não me assusta, porque sim, me assusta, eu temo por minha filha, e não só por Ian ter esse vírus, mas porque como pai eu temo que minha filha sofra por qualquer coisa, e por isso, por não querer ver seu sofrimento, e por tudo o que eu vi hoje e em outras oportunidades é que não vou me opor ao namoro de vocês.

—Você é mesmo um louco Jorge! –Minha mãe gritou aos prantos. –Eu sempre achei que deveria tê-lo mantido afastado de nossa filha, você sempre foi um péssimo pai.

—Mãe... –Aproximei-me dela e toquei levemente seu braço, ela não reagiu, apenas me olhou profundamente. –Nada de ruim vai acontecer, nós sempre tomaremos todos os cuidados.

Ela jogou-se derrotada em uma das poltronas e passou a chorar copiosamente enquanto escondia seu rosto em suas mãos.

Ian a olhou com pena, com culpa.

—Eu nunca seria imprudente, eu amo sua filha e jamais arriscaria... –Ele começou a dizer timidamente sem sair de onde estava.

Meu pai caminhou até ele e amigavelmente colocou uma das mãos em seu ombro.

Por um instante os soluços e fungadas emitidos por ela foram interrompidos, suas mãos caíram sobre suas pernas e ela encarou Ian diretamente.

—Se você a ama como diz, afaste-se dela, afaste-se de Lívia, deixe-a seguir com sua vida. –Ela passou as mãos pelos olhos numa tentativa de secá-los enquanto meu pai e eu assistíamos a tudo aquilo. –Ian, você sabe que essa seria a maior prova de amor que poderia dar à ela.

Ele automaticamente assentiu com a cabeça, seu rosto estampava uma expressão derrotada.Senti o ar faltando em meus pulmões, era como se eu estivesse afogando em tanta decepção, e, por mais preparada que eu estivesse para sua ira, aquilo realmente me surpreendeu, talvez não a proposta em si, mas a forma com que foi dita.

—Para ser sincero eu mesmo já considerei isso. –Ian aproximou-se dela e começou a falar como se houvessem apenas os dois ali. –Se eu fizesse isso estaria evitando alguns problemas como esse, ou o que vou enfrentar assim que chegar em casa, mas, por mais egoísta que isso possa soar, eu não posso me afastar dela, Lívia é tudo o que tenho para seguir em frente, ela me faz ter fé.

Ela o encarou como se pela primeira vez estivesse escolhendo as palavras para depois dizê-las, eu só não sabia se isso era bom ou ruim.

—Não acha que está colocando muita responsabilidade nas costas de uma menina? –Ela franziu o cenho. –Como acha que Lívia vai se sentir se amanhã ela se interessar por outro rapaz?

Pensei em interromper, era o certo a fazer mas, eu precisava ouvir o que Ian iria responder, não por que realmente cogitava alguma daquelas hipóteses, mas, eu precisava ver qual seria sua postura diante de perguntas tão fortes, eu precisava ver se ele estava tão decidido e crédulo sobre nós dois como eu estava.

Ian não olhou para mim como eu esperava, ele baixou seus olhos e depois de um breve silêncio arfou.

—Se isso acontecer eu não vou fazer nada, nada exceto deixá-la ir, eu confio em Lívia e se um dia ela achar melhor se afastar de mim, tudo o que posso fazer é respeitar sua decisão. –Ele finalmente colocou os olhos em mim, muito rapidamente mas, o fez. –Tudo o que mais quero é a felicidade dela.

Naquele instante eu não soube se aquilo era o que eu esperava ouvir, de certa forma Ian foi mais realista do que eu talvez estivesse esperando, mesmo assim suas palavras me tocaram e me certificaram de que estávamos em sintonia.

Notei que minha mãe ainda não estava satisfeita, e, obviamente só ficaria se o rumo daquela conversa tivesse seguido para uma direção completamente oposta, se Ian e eu tivéssemos sucumbido ás suas ordens.Eu precisava encerrar aquilo, por mim e por Ian, eu já imaginava que ele passaria por algo parecido ou pior, assim que colocasse os pés dentro de sua casa.

—Mãe, eu não espero que você aprove minha relação com Ian, esse é um direito seu, e por respeitá-la,eu posso dar um tempo aqui... –Olhei para meu pai. –Claro, se meu pai permitir, eu fico aqui até ...bem até que tudo volte a fazer sentido, ou que você consiga ao menos compreender tudo o que aconteceu.

Ela fechou os olhos.

—Filha, você pode ficar aqui o tempo que quiser, essa casa é sua também. –Ele assentiu.

—Não! Lívia permanecerá vivendo comigo, nada vai mudar. –Ela levantou-se num rompante, colocou-se de forma recomposta, como se todas aquelas lamurias e revoltas tivessem acontecido há muito tempo atrás.

—Ouça, se for assim, espero que tudo permaneça como sempre foi, não tente forçar situações que possam constranger  a qualquer um dos dois. –Meu pai apontou para nós, ele realmente estava do nosso lado. –Se isso acontecer ...–ele olhou diretamente para mim –filha, eu estarei aqui para te ajudar.

Ela olhou meu pai com um certo ar de desprezo, mordeu os lábios e se levantou.

—Vamos para casa Lívia, para mim já chega. –Ela ordenou demonstrando realmente estar cansada.

Olhei para Ian, queria ir com ele, ou melhor, se pudesse voltaria para a casa da praia.Ele fez-me um sinal com os olhos, queria que eu acatasse o que minha mãe estava pedindo.

—Lívia, se pudesse ficar mais um pouco. –Meu pai voltou a se colocar ao meu lado. –Gostaria de falar a sós com você, depois eu mesmo a levo para casa.

Houve um momento de apreensão, todos se entreolharam, minha mãe respirou fundo e começou a caminhar em direção da porta de saída, Ian manteve-se quieto.

—Tudo bem. –Menti. –Mas vou me despedir de Ian lá fora. –Segurei sua mão e caminhamos logo atrás de minha mãe.

—Nossa... –Ele suspirou enquanto encostava-se em seu carro.

—Meu Deus, eu nem sei o que dizer. –Encostei minha cabeça em seu peito, seus batimentos estavam acelerados.

Ian acariciou meus cabelos com tanta delicadeza que eu não queria mais sair de lá.

—Não quero que se preocupe, você já disse tudo.Ele sussurrou depois de beijar o topo da minha cabeça.

Senti meu coração apertar.

—O pior é que ainda não acabou. –Afastei-me para olhá-lo. –Você vai ter que ouvir mais um monte de coisas. Imagine sua mãe...

Ian respirou fundo.

—Já disse para não se preocupar. –Ele disse em tom fraterno. –Eu sei como lidar com isso, pelo menos com minha mãe.

Parei por um instante, algo maior estava me perturbando,pensar que Ian podia mudar de ideia estava me assombrando.Eu temia que estando só, com tempo para pensar, ele pudesse considerar o que escutara antes, que talvez pudesse achar melhor se afastar de mim, e isso me mataria.

—Ian, vou falar com meu pai, eu terei essa conversa depois. –Afirmei decidida. –Vou com você, falaremos com seus pais juntos, da mesma forma que fizemos com os meus.

Ele estreitou os olhos me desaprovando.

—Não, você deve isso ao seu pai, além do mais, em casa não será nada parecido com o que foi aqui. –Ele sorriu com amargura.

—Ian...Por favor, me deixe ir com você. –Supliquei me jogando em seu peito. –Eu quero poder fazer algo, quero mostrar aos seus pais que não estamos fazendo nada errado.

Ian segurou-me pelos ombros, fixou seus olhos nos meus, sua expressão estava séria.

—Lívia, estou falando sério, você não precisa ouvir mais nada, muito menos dizer, tudo está bem delineado, não existe nada que eu possa escutar que vá mudar as coisas.

Fechei meus olhos enquanto me abrigava eu seus braços.

—Eu amo você Ian Sodier. –Sussurrei.

—Acha mesmo que não sei? –Ele indagou enquanto acariciava meu rosto.

Olhei pra ele, estava sorrindo.

—É bom que saiba mesmo, porque essa é minha única certeza. –Admiti enquanto ele me abraçava com tanta força que literalmente senti o ar me faltar.

—Até mais. –Ele despediu-se já entrando em seu carro.


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