Um passo errado escrita por nanacfabreti


Capítulo 20
Escolhas




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Aquele dia estava tão longo e maçante que parecia contar muito além das vinte quatro horas de dias normais.

Erick e Alicia passaram uma boa parte do tempo na delegacia respondendo perguntas, muitas delas por mais de uma vez, e mesmo com o advogado contratado por Cássio tendo dito que eles podiam se abster em suas respostas, ambos fizeram questão de contar como tudo aconteceu.

Laura estava do lado de fora da sala de depoimentos, desesperada. Ela deixou tudo em Nova Olimpia e sem pensar seguiu para Santo Valle.

—Meu Deus...Isso só pode ser um pesadelo! —Ela sussurrou para si mesma, mas o ex namorado ouviu.

Cássio estava sentado a duas cadeiras de distancia dela, mas não conseguia tirar os olhos da mãe de seu primogênito. Embora o momento não fosse nada propício, ele não pôde deixar de observar o quão bela Laura ainda era. O tempo havia sido generoso com ela, e Cássio se perdeu em lembranças da época em que eles namoraram, e como evitava fazer, naquele dia deixou seus pensamentos passearem por lugares que ele não costumava se permitir.

E se ele tivesse escolhido ficar com Laura, como estaria sua vida?

Suspirou sentindo pela primeira vez uma ponta de arrependimento. Ele sabia o quanto a amou e lembrou-se, com certa vergonha, de que escolhera Marcela por motivos menos importantes que o amor...Sim, porque amor mesmo ele só sentiu por ela, a mãe de Erick.

—Laura... —Ele falou aquele nome e seu coração acelerou de um jeito bom. —Vou fazer o possível para que nosso filho não seja prejudicado nessa história.

Ela não olhou para Cássio, manteve sua atenção voltada para o chão.

—A essa hora nós podíamos estar num velório... —Ela fungou e sentiu o peso daquelas palavras. Começou a chorar.

Cássio não pensou duas vezes, levantou de onde estava e segurando em seus braços a puxou para um abraço. Laura não se opôs, ela estava realmente precisando de amparo e não encarou aquilo com segundas intenções. Já Cássio...bem, ele sentiu as chamas da juventude se reacenderem quando reconheceu aquele perfume. Chanel N°5, ele sabia porque logo que se separam comprou um frasco e guardou, por um bom tempo, ou melhor, pelo tempo que duraram os cinquenta mls, do perfume que ele borrifada no ar para nunca se esquecer do cheiro dela.

Quando foram liberados, Alicia e Erick saíram juntos, ela que segurava a mão do namorado, apertou-a diante daquela cena. Erick piscou algumas vezes tamanho seu estranhamento e só não foi mais impactado porque estava exausto e com a cabeça cheia de preocupações muito maiores do que ver seus pais, juntos, unidos por um abraço que durou mais do que o normal.

—Filho! —Ela gritou assim que o viu. Largou Cássio e correu até Érick. —Meu amor, você está bem?

Ele balançou a cabeça numa afirmativa.

—Foi só um susto, Laura. —Alicia ponderou e sua afirmação chegou a irritar seu namorado.

—Querida...seu rosto! —Laura impressionou-se com os pontos na face da garota.

Cássio foi até o advogado para saber seu parecer e ele confirmou o que eles temiam. Embora ainda não tivesse sido confirmado, ele com sua larga experiência, acreditava que a Erick seria denunciado por tentativa de homicídio, e teria de trabalhar duro para que a promotoria negasse o pedido.

—Nossa eu preciso sair desse lugar. —Erick passou as mãos pelo rosto. Estava esgotado.

—Eu vou para casa tentar acalmar os ânimos por lá... —Alicia avisou enquanto acariciava um dos braços de Erick. —Depois vou pro haras...quero ficar com você.

Erick pigarreou e desviou os olhos dela.

—Acho melhor ficar na sua casa hoje...Pense em como seus pais devem estar se sentindo. —Ele argumentou com certa frieza e Alicia percebeu.

Laura disfarçou e foi até o bebedouro, quis deixar os dois a sós.

—Não me quer com você? —Ela franziu a testa e sentiu os pontos repuxarem a pele. — É por que estou me parecendo com o frankenstein?

Era para ter sido uma piada, mas Erick não estava achando graça de nada.

—Pare de brincar com coisas sérias, Alicia... — Ele olhou para ela e voltou a imaginar um final trágico para todo aquele acontecimento.

Ela respirou fundo e arqueou as sobrancelhas estranhando o jeito com que Erick estava a tratando. Magoada seguiu até Cássio.

—Meu pai foi pra casa?

—Eu exigi que ele fosse... nunca vi pessoas tão descontroladas como seus pais, e se ele ficasse aqui acabaria sendo preso por desacato. —Ele reclamou. —Quer que eu a deixe em sua casa?

Alicia olhou para Erick e depois confirmou que sim com a cabeça.

—Nós vamos de taxi. —Laura se adiantou quando percebeu que o pai de Erick ia dizer alguma coisa.

—Posso levá-los. —Ele ainda assim se ofereceu.

—Vão segurar meu jipe por quanto tempo?

—Bom, ele é uma prova...não dá pra ter uma previsão exata. —O advogado interveio.

Cássio segurou o queixo enquanto pensava numa solução.

*****

—É impressão minha ou está evitando sua namorada? —Laura indagou o filho quando já estavam no banco traseiro do táxi.

Ela observou a maneira com que o filho tinha se despedido de Alicia, nem um beijo ele foi capaz de dar nela.

Erick permaneceu em silêncio, estava com os nervos á flor da pele e teve de se segurar para não explodir com a mãe, ali dentro do carro.

—Pode ir tomar banho, eu cuido do gato. —Laura pegou o pacote da ração de Jack e encheu o potinho.

O filho nada respondeu, seguiu para o banheiro e aproveitou o barulho da agua batendo no chão para chorar. Erick estava destruído, e por mais que tentasse, não conseguia se livrar das cenas de horror vividas no dia anterior.

Aquela arma em sua mão e por pouco ele não havia estourado os miolos de alguém que um dia havia sido tão próximo dele.

Lembrou-se também de sua ira enquanto batia com a chave de rodas no braço do rapaz. Tudo o que Erick queria era acabar com Alison. O ódio o cegou, e agora Erick estava envergonhado, arrependido de ter se mostrado daquele jeito para a namorada.

—Alicia acabou de ligar no meu celular. —Laura dobrava algumas roupas que encontrara desarrumadas no quarto. — Retorne para ela, Alicia está muito preocupada com você.

Erick ficou quieto. Sentou-se na beira da cama e depois de um tempo encarou a mãe.

—Alicia parece que vive em outro mundo...há poucas horas esteve com a vida por um fio, no entanto age como se estivesse tudo bem.

—E acha isso ruim? —Laura sentou-se ao seu lado, confusa.

—Ela tinha que estar me odiando... me acusando, mas não, para ela é como se eu não tivesse feito nada de errado. —Ele reclamou escondendo o rosto com as mãos.

Laura franziu a testa e se levantou, cruzou os braços e encarou o filho.

—Você só pode estar de brincadeira, não é Erick? Primeiro que deveria estar dando graças a Deus por ter ao seu lado uma mulher como Alicia, sim, porque qualquer outra pessoa estaria dramatizando ainda mais isso tudo. —Ela segurou o rosto do filho. —Segundo, que você não tem culpa de nada...O Alison planejou tudo isso e você é uma grande vítima.

Erick voltou a chorar, de forma tão desarmada que parecia um menino.

—Não imagina mãe, não pode pensar como foi vê-la ali, com uma arma na cabeça...Mãe, eu nunca senti nada parecido e juro, se precisasse eu morreria por ela.

Laura não se conteve, outra vez o sofrimento do filho refletia diretamente em seus sentimentos, ela odiava vê-lo daquela forma. Abraçou o rapaz e só não o pegou no colo porque embora estivesse tão frágil como quando caiu na primeira vez que andou de bicicleta, agora as proporções eram desfavoráveis.

—Não fique pensando nisso... —Ela tentou acalmá-lo com a voz terna. — Todos estão bem, sua namorada está aí, viva e esperando por seu amor...

—Ele cortou o rosto dela, ele a jogou contra o chão e tudo por vingança...era algo que deveria ter sido feito apenas contra mim...A Alicia não merecia ter passado por tudo aquilo e eu nunca vou me perdoar...

Laura conhecia bem o filho e previa problemas...

Naquele mesmo dia Alicia tentou falar com Erick por mais umas vinte vezes. Ligou tanto para seu celular que chegou a acabar com a bateria dele.

Laura já havia esgotado suas desculpas, e todas por todas as vezes que desligara, um novo sermão era regido ao filho.

Era tarde da noite, mais de dez horas quando Laura ouviu que batiam na porta. A avó de Alicia tinha saído dali há minutos atrás, estava preocupada com o funcionário, que para ela já nem era mais apenas isso, Erick já era considerado por ela como alguém da família.

Achando que poderia ser ela novamente, abriu sem perguntar.

— Me desculpe, mas eu não aguentei... —Alicia estava parada , os olhos perdidos denunciavam seu desespero. —Eu discuti com meus pais, eles não queriam me deixar vir, mas eu não podia...

Laura balançou a cabeça e a abraçou. Para ela era magnifico saber que seu filho era amado naquela proporção.

—Eu o fiz comer alguma coisa e confesso, dei a ele um calmante homeopático que eu tomo, é bem fraquinho, eu não sabia o que fazer...Ele está muito chocado com tudo isso. —Laura cochichou.

—Eu sei, eu nunca o vi assim, mas precisamos superar.

Laura sorriu, pegou sua bolsa e caminhou até a porta.

—Eu vou para um hotel...fique com ele, —ela acariciou o rosto de Alicia. — seu amor é tudo o que ele precisa.

—Não...que hotel...Fique em meu quarto no casarão, tenho certeza de que minha avó vai adorar. —Alicia sugeriu usando um tom baixo, não queria que Erick acordasse.

—Sua avó acabou de me oferecer o mesmo... —Ela sorriu. —Acho que vou aceitar então. —abraçou Alicia e respirou aliviada. —Obrigada!

—Imagina, aquela casa é enorme. —Ela deu de ombros.

—Não por isso, e sim por amar o meu filho dessa forma.

Alicia baixou seus olhos e sentiu uma emoção diferente preencher seu peito. Apenas balançou a cabeça confirmando.

Caminhando delicadamente para não fazer barulho, Alicia foi até o quarto e encontrou Erick adormecido, Jack estava enrolado na cama, perto dos pés do namorado. Ela foi até a cômoda onde guardava seus pijamas e pegou um deles, depois de vesti-lo, ergueu o cobertor que estava sobre Erick e se deitou ao seu lado.

Velou seu sono por mais de um quarto de hora e tudo o que ela pensava era em como não sabia viver sem ele. Tentou se conter, mas não conseguiu, delicadamente com a ponta dos dedos acariciou seu rosto e suave como uma pluma, encostou seus lábios nos dele.

Erick abriu os olhos e chegou a pensar que fosse um sonho bom. Sorriu, porque finalmente sua mente havia lhe dado uma trégua.

—Vim ficar com você, meu amor... —Alicia sussurrou.

Erick estava com os olhos pesados, o calmante dado pela mãe havia mesmo surtido efeito, ou algo próximo disso. Ele havia conseguido trazer sono a Erick, agora paz, somente Alicia conseguiu fazer isso.

—Eu te amo... —Erick conseguiu dizer enquanto encaixava Alicia em seu corpo como se ela fosse um bichinho de pelúcia.

O casal dormiu por toda a noite, e pela manhã, quando abriu os olhos Erick demorou um tempo para entender que Alicia estava mesmo ali e que não tinha sido um sonho.

—Bom dia!!! —Ela espreguiçou-se sorrindo para ele.

—Você é mesmo louca Alicia...louca! —Ele não conseguiu lutar contra a felicidade de tê-la em sua cama.

—"Tu és eternamente responsável por aquilo que cativas"... —Ela o puxou pela gola da camiseta para que seus lábios se encontrassem. —Eu sou o resultado do que você criou Erick.

Ele riu, porque não tinha outra alternativa.

—Você precisa ser estudada por cientistas... —Ele afirmou enquanto a apertava fortemente contra seu peito.

Aproveitaram a mesa do café da manhã do haras e juntaram-se a Laura e Marta que já estavam terminando o desjejum.

—Vejam só... o amor cura tudo, mesmo! —Marta brincou. —Parecem renovados.

—Sua neta deveria ser vendida em cápsulas... —Erick beijou o rosto de Alicia e a tomou nos braços, sentando com ela no colo.

— Nada como um dia após o outro... —Laura respirou animada.

—Bom...em breve tudo isso estará resolvido e vocês estarão na terra da rainha. —Marta disse animada entre um gole e outro de suco.

Alicia fez uma careta.

—Bem...quanto a isso teremos que mudar os planos ou ao menos adiá-los... —Ela pegou uma fatia de melão. —Ontem enquanto conversava com Regina, ela me disse que teríamos de viajar em no máximo dez dias.

Erick engoliu seco, sentiu como se tivesse recebido um balde de água gelada no rosto.

—O que tem isso querida? Já não estavam com tudo certo? —Marta pareceu intrigada.

—O Cássio me explicou ontem, que enquanto tudo não se resolver o Erick não pode sair do país. —Ela deu de ombros. — Sem ele eu não vou.

—Mas a bolsa dá a você essa flexibilidade com as datas? —Erick quis saber, estava extremamente incomodado.

Alicia balançou a cabeça.

—Não...se fosse estudar teria de começar na data imposta por eles. —Ela voltou a comer. — Por mim tudo bem, podemos ir a Londres a passeio.

Laura e Marta encaram Alicia e não puderam disfarçar o ar de espanto, ambas sabiam o quanto aquela bolsa de estudos era importante para ela e era estranho que ela estivesse tão resignada quanto a desistir.

—Alicia, você não pode perder essa oportunidade. —Erick voltou ao seu estado de nervosismo, talvez com uma dose a mais.

Alicia que anda estava sentada em suas pernas virou seu corpo para olhar para ele.

—Erick, eu já disse...não vou sem você, tínhamos feito planos e não faz sentido que essa viagem aconteça de outra forma.

—Querida, mas você pode ir e depois, assim que resolvermos tudo por aqui, o Erick a encontra. —Laura interveio com preocupação.

—Gente! Não é o fim do mundo, sem contar que a minha sociedade com a Regina continua em pé. Vou me dedicar a isso, aqui, em Santo Valle.

—Já deu a resposta a eles? —Erick quis saber.

—Ainda não, mais tarde vou até o estúdio e pedirei que Regina cuide disso pra mim.

Todos se calaram, cada um preso em seus próprios pensamentos, certamente os mais perturbadores eram os de Erick. Ele sentia como se estivesse mergulhando de cabeça num abismo,e quando achava que já havia chegado ao extremo do ruim, recebia outro golpe que piorava tudo.

Erick, esse sim sabia que Alicia literalmente tinha dado o sangue para realizar aquele que era seu grande projeto de vida, e ela estava abrindo mão de tudo. Por ele.

Ele não podia deixar que aquilo acontecesse, não era justo, então passou todo o tempo pensando em uma maneira de resolver aquele problema.

Enquanto Alicia comentava animada , sobre seus planos quanto a sociedade com Regina, Erick a observava e não sabia de onde ela tirava toda aquela resiliência.

—Eu vou dar uns telefonemas e já volto. —Ele beijou o rosto de Alicia.

—Acho que vou aproveitar para ir até o estúdio, depois volto para ficar com você...posso ser sua motorista particular enquanto está sem o jipe. —Alicia fez charme arrancado risos de sua Marta e de Laura.

—Tudo bem... —Erick estava aéreo. —eu vou indo então.

Vendo a mudança repentina de atitudes do namorado, Alicia foi atrás dele, odiava que ficasse qualquer climas ruim entre os dois.

—Hey! —Ela gritou para chamar sua atenção.

Erick parou de caminhar e virou-se para ela.

—Não ficou chateado por conta da não-viagem, não é?

Erick colocou as mãos na cintura e fechou os olhos.

—Alicia, esse é seu sonho... —Ele disse com pesar.

Ela olhou para cima e depois deu de ombros.

—Era mesmo. —Ela afirmou convicta, deu dois passos a frente, e isso os deixou muito próximos. —As coisas mudam...Agora despeça-se direito de mim!

Um nó acabava de se formar na garganta de Erick, ele estava angustiado, mesmo assim atendeu aquele pedido de Alicia. Segurando-a com força pela cintura, empurrou a garota até a cerca que levava as baias dos cavalos, e a beijou, com gana, com desejo. As mãos passearam pelo corpo dela, ansiosas. Só teve mais sutileza quando tocou seu braço machucado.

—Eu amo você Alicia. —Ele segurou o rosto dela com as duas mãos. —Você sempre vai estar em primeiro lugar. — Ele fixou seus olhos nos dela.

Alicia sorriu.

—Agora sim...essa é uma boa forma de se despedir.

Erick baixou a cabeça, do contrario não conseguiria conter a emoção que o dominava.

—É...acho que sim. —Falou para ele mesmo ao seguir de volta para a edícula. Ele estava decidido, e aqueles telefonemas seriam cruciais para nortear sua vida.


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