Socorristas escrita por BlueBlack


Capítulo 34
O horizonte escuro ao alvorecer


Notas iniciais do capítulo

Heey!
Demorei? Sim, eu sei! Mas estamos chegando perto de Cura Mortal, como podem ver (e garanto que vai ser beeeeem diferente dos livros agora), e achei melhor ver o filme antes de continuar postando. But, assisti ontem (estou numa depressão profunda neste momento, quem quiser conversar sobre e desabafar, vou amar), então teremos um ritmo melhor por aqui.

E muitíssimo obrigada a VSQueen e O lado bom do Yaoi por terem comentado e SKOOKIE por ter favoritado a fanfic! Fico muito feliz com isso, é cada vez mais gratificante postar para vocês! *-*
Espero que gostem do cap.!

Boa Leitura!



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Thomas nos explicou o que passara com os Criadores no Berg e não pude deixar de me sentir frustrada com o quão irrelevante tinha sido. Eles pareciam pensar em cada detalhe, até prever o que faríamos, para garantir que continuássemos os ratos que sempre fomos.

 Pelo menos estava explicado por que não havia armas de fogo na cidade dos Cranks, mas fiquei me perguntando o que os Criadores perdiam ou deixavam de ganhar com uma arma a mais ou a menos no Experimento. Eles tinham controle de absolutamente tudo. Que diferença fazia terem tido descuido com uma arma de fogo?

  — Desculpe não ter sido eu desta vez. — eu disse a Thomas enquanto comíamos.

  — O quê? — ele indagou de boca cheia, com uma careta completamente confusa.

  — A curar você. Desculpe não conseguir fazer nada a respeito.

 Thomas balançou a cabeça em negação e engoliu.

  — Não tem que se desculpar.

 Olhei para as minhas unhas e cutuquei-as, flexionando os lábios para baixo.

  — Eu sei, mas não é legal pensar que eles conseguiram fazer por você coisa que nós não conseguimos. Mas me diga... O que está rolando entre você e a Crank? — perguntei com um sorriso divertido.

 Eu sabia que Thomas não estava a fim de ouvir drama algum naquele momento, não depois de tudo o que tinha passado, e ainda com a dor no ombro que dizia ainda sentir. Eu só queria garantir que não passasse pela cabeça dele que eu não lamentava por aquilo.

  — Não sei. — Thomas respondeu com um dar de ombros, desanimado, observando Brenda com Jorge, do outro lado da sala. — Ela é ótima. Eu não teria sobrevivido se não fosse por ela. Mas...

  —... ainda pensa em Teresa. — completei com um aceno de cabeça.

  — Depois de tudo que aconteceu no Labirinto, é impossível não pensar. Mais da metade das minhas lembranças se resumem nela e há algumas horas eu... — ele comprimiu os lábios e correu os olhos pelo chão, suspirando. — Ela falou na minha mente outra vez. Disse que uma coisa horrível vai acontecer comigo amanhã, mas que preciso confiar nela.

  — Ainda se falam pela telepatia? — perguntei com as sobrancelhas arqueadas em surpresa.

  — Não, ela nunca me responde. Disse isso mais cedo e sumiu de novo. Acho que estão proibindo-a de falar comigo.  

  — E acredita nela? Quando diz que você tem que confiar? — tentei manter o tom mais imparcial possível, mas Thomas sabia muito bem minha opinião sobre a garota para que eu conseguisse disfarçar agora. — Olha, não tenho nada a ver com seus triângulos amorosos e seu charme que faz todas caírem aos seus pés. E ainda que eu ache que seus filhos com Brenda seriam bem mais bonitos, ninguém pode crucificar você por pensar em Teresa. Agora, se Brenda está sendo tão direta nas intenções dela, sem esses mistérios todos que eu sei muito bem que te dão dor de cabeça, por que não cogitar uma chance?

  — Não disse que não cogitei.

 Soltei uma risada involuntária e fiquei levemente mais satisfeita por ver um meio sorriso nos lábios dele.

  — Você é mesmo um galinha. — falei, ainda sorrindo. — Acho que já sabe o que fazer sobre essa história, não sabe?

  — Deixar de lado e resolver os plongs com os Criadores antes. — ele respondeu com um aceno de cabeça.

  — Por isso amo você. — cutuquei-o com o cotovelo e me levantei para me preparar para a partida.

 

Mais tarde, quando a terra alaranjada do Deserto se tornou roxa pelo pôr do sol, nós partimos em direção às montanhas outra vez. Newt e eu caminhávamos lado a lado, em silêncio, assim como todos os outros. Não havia muita conversa quando não se tinha controle da própria vida. Estiquei minha mão para o lado e segurei a de Newt, meu coração preenchido pelo vácuo sabendo que não deitaria entre os braços dele naquela noite, nem dormiria com a paz do aroma de chocolate. Era uma bela vantagem ter os sentidos misturados nessas horas, pois o cheiro de todos nós estava insuportável; não sabíamos o que tinham feito a Thomas para ele ter voltado mais agradável, mas estávamos com inveja.

 Por um segundo, prestei atenção no toque da mão de Newt na minha e percebi que, diferente das outras vezes, eu sentia levemente um cheiro mais ardido, e os dedos dele não estavam entrelaçados nos meus como de costume.

  — Tudo bem? — perguntei singela, quase certa de que era apenas impressão minha.

  — Sim. — respondeu, ainda encarando o chão enquanto andava, o semblante inexpressivo.

  — Pois não parece.

  — Normal. — ele deu de ombros. Eu estava prestes a retrucar de modo menos gentil quando ele ergueu a cabeça e fez um aceno, apontando Thomas. — Algo de errado com ele?

  — Não tanto quanto o que quer que tenha de errado com você.

  — Nelly, eu estou bem. — ele afirmou, enfim pondo os olhos em mim. — Só estou cansado.

 Sustentei seu olhar por alguns longos segundos, ligeiramente desconfiada, mas Newt parecia decidido a manter aquela máscara de apatia. Claro, tudo estava um grande plong, mas eu podia sentir algo a mais nele desta vez.

  — Vou fazer a terapia dele, ok? — disse com um fraco sorriso e me forcei a fazer o mesmo, deixando-o se afastar.

 Eu encarava o chão totalmente perdida em pensamentos na tentativa de desvendar o que havia de errado, quando Mike surgiu, caminhando ao meu lado.

  — Cara, seja lá como tenha feito, é um belo feitiço. — ele comentou.

 Olhei para ele com uma sobrancelha erguida, em sinal para que explicasse, e Mike soltou uma risada fraca.

  — Ele quase amassou a lata de comida com as próprias mãos, vendo você e o trolho do Thomas conversando lá dentro.

 Franzi a testa para aquilo e desviei o olhar para Newt, envolvido com Thomas um pouco mais distante de nós.

  — O quê? Está dizendo... Ciúmes? — indaguei, realmente duvidando que fosse aquilo. Ele assentiu com a cabeça com um olhar de quem diz que era muito óbvio. Mike quebrou o contato visual, pensativo, e então voltou a falar.

  — E, honestamente, isso me preocupa. — disse, ainda sem me encarar, como se quisesse amenizar o significado de suas palavras.

 A cor marrom girou numa única linha no ar e não gostei nem um pouco dela desta vez.

  — Por quê? — questionei.

  — Newt é “O Grude”, Nelly. — ele me fitou. — Sempre foi, aparentemente. Vendo ele agir assim, eu acabei entendendo o que isso significa.

  — Desde quando você enrola tanto para chegar ao ponto?

 Mike suspirou e balançou a cabeça para os lados, contemplando o Deserto por um momento.

  — Ele sempre foi bonzinho demais. E posso dizer isso com mais certeza que você, conheço aquele trolho. Não acho que um tempo atrás ele ficaria com tanta raiva assim por te ver com alguém, ainda mais sendo o Thomas. Eles eram quase um casal desde que Thomas chegou, não faz sentido.  

 Tentei não expressar facialmente eu ter entendido o que ele estava querendo dizer, era um detalhe que nunca me ocorrera. Agora eu sabia por que ele estava se dando o trabalho de ser cauteloso com as palavras.

  — É pouco. — falei, olhando para frente com o olhar duro, tentando ignorar aqueles pensamentos.

  — O quê?

  — Isso é pouco motivo.

  — Nelly, você precisa concordar que é uma possibilidade.

  — Não, é simplesmente a mesma possibilidade que todos nós temos.

  — Aí. — ele esticou o braço para tocar o meu e me obrigar a encará-lo. Eu o fiz a muito contragosto. Não tinha um assunto melhor para a caminhada de cinco dias até o Refúgio? — A trolha sensata, que sabia o que fazer e o que pensar na hora certa, está fazendo falta.

  — Meu lado Socorrista é assim.

  — O Fulgor é uma doença, Nelly.

  — Mike, fala sério... — comecei, enfim perdendo a paciência de verdade.

  — Escuta, eu não queria falar tudo isso porque sabia que você ia ver o fim do mundo bem na sua frente. Mas você precisa recuperar a razão que tinha na Clareira, ou não vai precisar desse vírus para ficar maluca. Não estou dizendo que ele está infectado. Quem dera fosse fácil assim descobrir, não é?

 Eu respirei fundo para reunir calma, tentei colocar meus pensamentos no trilho da razão na minha cabeça. Era desesperador ver o quanto o lado de fora, o mundo real, tinha me feito mal.

  — O que está dizendo, então? — indaguei.

  — Só para ficar atenta... e tomar cuidado. Pode ser que sim e pode ser que não, pode acontecer de nunca sabermos. Mas caso seja e estejamos vivos para ver... Falta uma mão, mas ainda tenho dois ombros para você chorar.

 Revirei os olhos e os cerrei em descrença à brincadeira.

  — Seu cinismo me assusta às vezes. — falei.

  — Considero um dom.

 Mike acabou se afastando e me deixando caminhar sozinha. Nenhuma conversa até aquele momento tinha me perturbado tanto. Podíamos e devíamos ter medo da probabilidade de não sermos Imunes, principalmente porque eu já estava perdida demais de mim mesma, paranoica e cansada; mas minha sanidade mental costumava ser mantida de pé com a presença de Newt; se ele estivesse bem, eu também ficaria. Ele estar agindo diferente por causa do Fulgor era a pior coisa que poderia me ocorrer agora.

 Ele voltou a caminhar ao meu lado após conversar com Thomas, mas não disse nada. Tive uma imensa vontade de chorar, mas me controlei; não queria que ele se preocupasse comigo numa hora dessas. Segurei sua mão de novo e o aproximei mais, de modo que nossos braços se cruzaram completamente um com o outro, e apoiei minha cabeça no ombro dele.

  — Sabe o quanto você é importante para mim, não sabe? — falei serena. Meu tom era mais fraco que nunca pelo nó que eu tentava engolir.

 Newt permaneceu quieto por quase um minuto inteiro, ainda olhando atentamente para frente, por isso usei também meu outro braço para envolver o seu, acariciando seu bíceps com o polegar.

  — Eu sei. — ele disse firmemente. Newt me envolveu pela cintura e encaramos os olhos um do outro. Por um momento senti como se estivéssemos naquela bolha particular outra vez, mas a sensação logo foi embora, e eu quis desesperadamente que voltasse. — Você também é importante pra mim.

 Newt pôs a mão sobre a minha bochecha e selou meus lábios com os seus. O mesmo frio na barriga que senti na primeira vez que nos beijamos revirou meu estômago, e logo desapareceu, assim como aquele gosto doce. Afastamos os rostos e voltamos a percorrer o caminho. Talvez ele estivesse pensando no mesmo que Mike, que estava infectado, e saber que desta vez eu não era o suficiente para ajuda-lo fez eu me sentir cheia de um vazio.

 

Com o passar das horas, só o que ouvíamos era o raspar dos nossos pés contra o chão poeirento. Estava sendo horrível ficar tão perto de Newt com a tensão mais que palpável entre nós; mas assim que o ambiente mudou, senti falta disso.

 Os Clareanos começaram a retardar os passos e me assustei ao erguer a cabeça e descobrir por quê. O sol lançava uma fraca luz sobre nós, suficiente para eu reconhecer Teresa aproximando-se, com uma lança de ponta afiada na mão, acompanhada de um grupo enorme de garotas. Apesar do que Thomas dissera, eu ainda tinha esperanças que as próximas notícias que tivéssemos dela fossem de que estivesse morta.

 Gradativamente, as garotas nos cercaram e fomos obrigados a parar num amontoado de Clareanos no meio do círculo. Todas tinham arcos e flechas apontados diretamente para nós, a desvantagem era absurda. Aquilo era outra Variável? Porque não fazia sentido nenhum. Pra que misturar Teresa com um bando de outras garotas? E bem antes de chegarmos ao Refúgio Seguro?

  — Que palhaçada é essa, Teresa? Bela maneira de receber seus antigos parceiros. — Minho disse após um momento de silêncio.

 Teresa tinha o semblante completamente impassível. Não parecia triste, com raiva, muito menos feliz por nos ver. Ou ao menos por ver Thomas. Parecia um robô que não nos conhecia. Ela começou a se aproximar de nós com a lança erguida e percebi que encarava Thomas. Cerrei o punho com a falta que uma arma me fazia agora.

  — Teresa? Mas que droga...

  — Cale a boca. — ela disse secamente, interrompendo Newt. — E se alguém fizer algum movimento, as flechas começarão a disparar.

  — Que soldadinha intimidadora. — eu ironizei. Ouvi o som de um arco próximo a mim se movimentar e encarei a outra garota. Era loira, o cabelo comprido preso numa trança bagunçada. “Grupo B” veio imediatamente à minha cabeça. Franzi a testa para ela com atenção, sentindo algo realmente estranho. E de repente, uma avalanche bateu contra o meu cérebro.

  — Foi bem horrível. — a loira disse.

  — Mas você parece estar conseguindo lidar. — repliquei, remexendo-me na cama, incomodada com a história. Eu tinha por volta de treze anos.

  — Preciso ser forte por ele. Acho que é o melhor jeito de isso acabar bem. E o seu, se enturmou pelo menos?

  — Não falo com ele desde que chegamos aqui. É até melhor, posso ficar em paz, sem ouvir sermão de irmão mais velho para ser gentil e obedecer.

  — Você é ótima. Ninguém mais teria me dado uma ajuda naquelas coisas inúteis de química. Mas por falar em química...

  —... por falar em química eu acho que você deveria ir dormir para o teste de amanhã. — a interrompi, levantando da cama para sair do quarto, prevendo o que ela diria. Eu sentia gosto de uva.

  — Vai continuar negando o clima entre vocês? — ela sorriu o sorriso encantador e infantil que tinha, enquanto se virava para me encarar divertida.

  — Você é ridícula, Sonya.

  — E você está apaixonada. Está precisando mesmo de um namorado.

  — Estou é precisando de uma nova vida. Não sei quando vou poder voltar nem se vão me deixar ter as aulas com vocês ainda. Se cuide, ok?

  — Você também. Boa noite.

  — Boa noite.

 Ela continuava impassível na minha frente, com o arco e flecha apontado para mim. Eu estava longe de me sentir intimidada, mesmo que agora houvesse, sim, grandes chances de ela não hesitar em me acertar. Um doce muito açucarado preenchia meu paladar, por isso eu não tinha medo. Além disso, ouvia uma voz na minha cabeça dizendo que, de certa forma, estava tudo bem.

 Dei as costas a ela outra vez e percebi o quão atento Aris analisava as garotas. Ele tinha quase o mesmo olhar que eu tinha para a loira, Sonya.

  — São o seu grupo... não são? — perguntei às costas dele o mais baixo possível.

 Aris não falou, apenas balançou a cabeça, afirmando. Aquela era a confirmação de que a minha fuga do CRUEL aos quatorze anos realmente tinha atrapalhado os planos deles. Eu, de fato, ficaria no Grupo B, se não fosse pela fuga, e por essa razão conheci a loira. Talvez eu devesse reconhecer as outras também... Mas por que só ela? E por que raios parecia que só eu estava tendo as lembranças de volta?

  — Newt. — eu me virei para ele, enfim notando que ele encarava Sonya com extrema atenção. Os dois se olhavam nos olhos, mas ela parecia tão rancorosa quanto Teresa. Ele não... — Newt, acho que...

 Cortando-me, um berro extremamente alto escapou da minha garganta involuntariamente. Senti uma pressão, vindo da minha nuca para a minha cabeça, como se algo tentasse romper de dentro dela. Eu caí de joelhos, os dedos agressivamente entrelaçados no meu cabelo, meus olhos apertados. Imediatamente me lembrei da voz falando na minha cabeça antes da partida da Clareira. Agora alguém ia me dizer que eu não receberia a cura? O pensamento só me desesperou.

 Imagens do meu tempo com o grupo que me resgatou do CRUEL encheram minha mente, mais lembranças da minha mãe, Bruno e Herman. Eu não tinha a menor vontade de prestar atenção, a dor era absurda. Senti movimentos ao meu redor e alguém esbarrar fortemente em mim, mas também sentia que, se eu abrisse os olhos, eles pulariam para o chão.

 Lentamente, a dor desceu de volta até a minha nuca e desapareceu, deixando apenas um leve incômodo. Pisquei algumas vezes e percebi que eu chorara, e minha mão estava dolorida pela força empregada na minha cabeça. Mike e Minho estavam bem na minha frente, observando-me com inquietude, uma garota ao lado de cada um apontando as flechas com precisão. Newt estava abaixado ao meu lado, sobre as mãos e os joelhos, a respiração descompassada. Por um momento achei que tivessem apagado minha memória como fizeram logo antes de eu começar a ter os sentidos misturados, mas não. Eu ainda me lembrava da garota. Não sentia nada diferente.

  — Você está bem? — Newt perguntou a mim. Pisquei outra vez para me situar, enfim percebendo que eu o encarara por bastante tempo sem falar nada.  

  — O que aconteceu? — indaguei, completamente confusa.

 Newt relanceou para Sonya como se ela fosse a culpada, mas nada mais. Ela ainda apontava a flecha para nós exatamente como antes.

  — Você vem conosco. — a voz de Teresa me chamou a atenção de volta. — Thomas, vamos! Lembrem-se: se algum de vocês tentar alguma coisa, flechas vão voar.

 Meu coração deu um salto e eu quase gritei.

  — De maneira alguma! — Minho esbravejou. — Não vão levá-lo a lugar nenhum.

  — Isso não é uma brincadeira idiota...

  — Não, isso é lavagem cerebral. Que droga aconteceu com você? É a última pessoa que aceitaria fazer alguma coisa contra a vontade dele. — eu a interrompi.

  — Cale a boca. — ela mandou sem emoção.

 Dei alguns passos a frente e me coloquei na frente de Thomas, com tanto ódio borbulhando dentro de mim que era impossível desviar o olhar dela.

  — Thomas não vai a lugar algum sem a gente. — falei, um nó se formando na minha garganta com o esforço de manter o tom controlado.

  — É ela, não é? — uma garota próxima disse, olhando para Teresa.

  — Você tem alguma dúvida? — outra replicou. Em seguida, vi o olhar da primeira ficar mais firme e o arco se erguer mais.

  — Bom, então vamos fazer o que disseram.

  — Não vai ser preciso se não houver intervenção. — Teresa falou sem desviar o olhar de mim. — Saia da frente e as coisas não vão piorar.

  — Os Criadores mandaram você. — concluí quase incrédula, mesmo sabendo que não devia ser surpresa. — Que droga, Teresa, será que é tão difícil ver qual o lado errado nessa história?

 Ela não fez nada além de se aproximar com uma lança firme na mão. Eu não soube o que ela faria até ver a arma sendo erguida.

  — Certo. — Thomas disse de repente, puxando meu braço para trás e tomando a dianteira. Teresa ficou imóvel no mesmo instante. — Pode me levar.

  — Só ergui a lança. — Teresa disse.

  — É. Sou mesmo corajoso.

 Thomas foi atingido com a arma no rosto e pude ver um borrifo de sangue sair de sua boca quando caiu no chão. Após encará-lo, assustada, agarrei a lança de Teresa para mim, mas ela movimentou a arma de modo que me acertasse na cabeça. Ouvi um dos garotos gritar atrás de mim. Uma flecha disparou. Depois outra. Uma onda turbulenta de fúria me preencheu e senti que teria força suficiente para agarrá-la pelo cabelo e jogá-la contra as montanhas. Ainda assim, só o que fiz foi desferir um tapa em sua bochecha que estalou mais alto do que eu esperava. Quis golpeá-la com mais brutalidade, um soco, um pontapé, mas algo perfurou minha panturrilha antes que eu pudesse fazê-lo, e caí sobre um dos joelhos e as mãos quando a dor se espalhou por toda a minha perna, quase me tirando a sensibilidade. Respirei muito fundo para não arrancar a flecha dali e finca-la no pescoço da garota. Thomas estava apoiado num cotovelo, com a outra mão massageando o local ferido, alternando o olhar entre eu e mais alguém atrás de mim, aterrorizado.

  — Se alguém mais fizer gracinha, vamos mirar mais alto. — Teresa disse. Deus, ela soava tão patética... — Não se mova enquanto não sairmos daqui. — mandou, apontando para algum dos Clareanos. — Tragam o saco.

 Duas garotas se aproximaram de Thomas, uma delas com um grande e desgastado saco de juta. Ele permaneceu imóvel e por um momento esqueci a dor na perna.

  — Thomas... — comecei, sem saber ao certo o que dizer. Antes que pudesse dizer algo, sua cabeça foi coberta pelo saco. Tornei o olhar a Teresa. — Vai se arrepender tanto disso... Ele provavelmente é o único aqui que ainda confia em você mesmo com essa palhaçada, sua infeliz...

 Ela de repente movimentou a lança outra vez e acertou Thomas na nuca, e ele se estatelou ainda mais no chão.

  — Nelly, não se mova. — Newt disse de algum lugar atrás de mim, quase ríspido, logo quando eu ia justamente tentar me levantar.

 As garotas agarraram Thomas de modo grosseiro para acabarem de cobri-lo por inteiro com o saco. Não pude evitar uma careta de dor ao ver o ferimento no ombro dele ser eventualmente pressionado.

  — Sigam-nos e flechas começarão a voar. — Teresa disse, pousando seus olhos em mim por último.

 Elas desfizeram o círculo ao nosso redor vagarosamente e a corda no final do saco que cercava Thomas foi segurada. Começaram a puxá-lo à medida que caminhavam. Eu fechei os olhos e abaixei a cabeça, furiosa demais para continuar olhando.

  — Nós vamos encontra-la! Espere só até termos armas e o momento certo! — Minho gritou, e, mesmo distante, pude ouvir Thomas levar outro golpe.  

 Quando tive a certeza de que elas não olhariam mais para trás, larguei meu corpo no chão para olhar o ferimento. Minha calça estava mais escura com o sangue ao redor da ponta da flecha.

  — Vamos continuar até o Refúgio. — Jorge disse ao se abaixar na minha frente com um pano.

  — Não, precisamos tirar o Thomas dessa. — falei imediatamente.

 Jorge segurou ao redor da flecha e puxou-a da minha carne, e a dor aguda que tomou minha perna me obrigou a soltar um gemido.

  — Mértila. — murmurei para o céu, largando meu corpo de uma vez só no chão com as mãos cruzadas sobre a testa. Eu fechei os olhos para prestar total atenção na minha respiração pesada pela imensa dor.

 Senti o pano envolver minha perna e comecei a imaginar o inferno que seria andar por mais aqueles dias até a linha de chegada.

  — Erraram as miras de propósito. — ouvi a voz de Mike dizer e tornei a abrir os olhos. Ele e Newt estavam bem acima de mim. Newt pôs a mão nas minhas costas para me fazer sentar e me obriguei a isso. Eu me lembrava de quando Gally me machucara na Clareira ao me empurrar. E vendo o olhar de Newt agora para a minha perna, percebi que não era mais o mesmo.  

 Com um súbito medo, vasculhei entre os garotos alguém que estivesse machucado pelas flechas que ouvi voarem. Mas eu era a única ferida.

  — Claro que erraram, sou a única entre vocês que é completamente inútil para eles. — concluí em resposta a Mike, pousando meus olhos em Minho e Jorge que acabavam de falar um com o outro. — Vamos atrás do Thomas, não vamos?

  — Seu amigo fez um trato comigo. Brenda e eu não temos nada a ver com as intrigas entre seus Labirintos, principalmente se isso for algum tipo de teste para ver quem sobrevive. — Jorge disse.

 Olhei para a garota bem ao lado dele e percebi que ela parecia distante. Devia estar pensando em Thomas. Encarei Minho e ele meneou a cabeça.

  — Vamos continuar até o Refúgio. — ele disse.

 Respirei fundo mais uma vez para me conter e pisquei demoradamente.

  — Sim, capitão. — respondi. Eu não conseguiria fazer nada sozinha, muito menos desempenhar o papel de Minho como líder, depois de ter provocado o disparo das flechas.

 Newt me ajudou a levantar, e então pude me surpreender com o quão ferrada minha perna estava. Apenas apoiar a ponta do pé no chão espalhava uma dor absurda por quase a perna inteira.  

  — Não vou nem comentar. — Mike disse ao reparar nisso também.

 Voltamos à caminhada, Newt apoiando um lado do meu corpo e Mike o outro. Tentei não pensar na possibilidade de infecção com aquela flecha.


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Notas finais do capítulo

Admito que, para mim, Nelly e Sonya teriam uma chance de acontecer, se as circunstâncias fossem outras (spoilers) e Nelly tivesse ido para o Labirinto B. Pronto, falei sdjdkwjeks
O que acharam? Críticas? Elogios? Rebeliões? Lágrimas por TDC? Eu sei que eu tenho aqui... 3
Espero que tenham gostado!

Até o próximo! ;)



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