Socorristas escrita por BlueBlack


Capítulo 22
Mais que cumplicidade


Notas iniciais do capítulo

Obrigada pelos comentáriosssss ♥

Boa Leitura!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/733980/chapter/22

— Tragam um pano maior e gelo, agora! – ordenei aos gritos assim que descansaram Mike na cama, e eles partiram sem sequer erguer a cabeça.

 Mike continuava inconsciente, mas pelo menos respirava. Eu virava nervosamente o tempo todo para a porta esperando que os garotos voltassem logo, todos os panos completamente encharcados de sangue, assim como minhas mãos. O cheiro de plástico queimado quase me sufocava.

 Trouxeram o que parecia um lençol enrolado várias vezes em gelo e água e tirei algumas camadas do que já cobria o ferimento antes de coloca-lo. Pressionei os panos e respirei fundo, observando Mike com meus olhos ardendo.

  — Diga que ainda temos analgésicos. – murmurei a quem quer que estivesse ali.

  — Vou buscar. – Newt respondeu e o ouvi sair do quarto.

 Sentei-me na beirada da cama sem conseguir desviar os olhos lacrimosos de Mike. Ele havia perdido a memória, a família, a vida toda... E como se não bastasse, precisaria continuar com menos uma parte do corpo. Sem contar o que da personalidade dele provavelmente iria embora. Eu já esperava qualquer coisa dos próximos dias. Não duvidava de mais nada que aquela vida poderia fazer a nós.

 

O tempo passou e o dia finalmente começou a clarear. Os Verdugos haviam levado alguém com mais precisão do que a noite anterior. Eu não fazia ideia do que acontecia do lado de fora daquele quarto, estava frustrada demais para me importar. Mike continuava desacordado, enquanto o sangue coagulava.

 Horas mais tarde, a porta do quarto foi aberta, mas continuei sentada na cadeira, olhando para frente com a indignação me impedindo de ter alguma reação. Newt se aproximou do meu lado e pude ouvir outros passos o acompanhando.

  — Alby está desacordado, com um corte na cabeça. – ele disse. Acompanhei com indiferença a linha amarela que fez um desenho no ar. – Winston o encontrou dentro da Casa dos Mapas depois que trouxemos Mike para cá.

 Assenti com a cabeça em resposta, sem saber o que dizer que não ofenderia alguém. Mike moveu a cabeça para o lado e remexeu as pernas e me empertiguei instantaneamente, mas ele logo ficou imóvel outra vez, o peito subindo e descendo pela respiração calma. Uma parte de mim desejava que ele continuasse assim e não precisasse lidar com a perda ao acordar. Voltei a me encostar ao espaldar e o som de passos retornou. A porta se fechou e alguém passou por trás de mim, sentando-se no chão ao meu lado, encostado no criado-mudo.

  — Ele vai ficar bem. – Thomas afirmou. – Você conseguiu, outra vez.

  — Queria poder fazer mais.  

  — Não pode tomar conta de tudo o tempo todo.

  — É um ótimo conselho! – retruquei enfurecida, encarando-o com o olhar duro. Thomas desviou o olhar, passando a língua pela bochecha, e encolhi-me contra a cadeira. — Desculpe.

  — Conversei com Teresa depois que saí do Labirinto. Tivemos algumas ideias que podem nos ajudar a sair daqui, mas Newt contou o que aconteceu à noite antes que eu pudesse dizer.

  — É, se tem a ver com os Mapas, já era. – comentei distraída com o nada. — E quem sabe se aquela nova cabeça pensante vale de alguma coisa.

  — Ela me contou que vocês conversaram. E expliquei a ela o que aconteceu nos últimos meses, acho que agora as coisas vão ficar mais calmas entre vocês.

  — Sei que confia nela por causa dessa sua ligação telepática e da paixãozinha que está crescendo aí dentro. – falei com o tom brando, completamente insípida ao encara-lo. — Mas tenho mais razões para não gostar dela do que para gostar.  

  — Você confiou em nós.

  — Nenhum de vocês ficou parado enquanto eu era espancada.

 Thomas suspirou e torceu as mãos nelas mesmas, olhando para o outro lado. Eu não queria parecer tão implicante assim, mas não suportaria ser enganada depois de tudo que já aconteceu, principalmente se a minha teoria sobre o incêndio da Casa dos Mapas estivesse certa.

 Ele se levantou e ergui meu olhar.

  — Ela não sabe da sua lembrança, então não tem problema nenhum com você. E posso conviver com a sua raiva...

  — Não estou com raiva de você, pelo amor...

  —... mas precisa me ajudar na próxima vez que os Verdugos vierem. – continuou como se eu não tivesse interrompido e me calei no instante seguinte.  

  — Como assim?

  — Os Mapas foram destruídos e eles eram a nossa melhor chance de sair daqui, especialmente porque Teresa disse que o Labirinto é um código. Sou o único aqui que cada vez mais acha esse lugar familiar, por isso minhas lembranças são importantes.

 Ele parou e continuou me encarando para ter certeza de que eu estava entendendo.

  — Preciso delas de volta. E só tem um jeito de fazer isso acontecer. Você não pode se meter dessa vez, a menos que garanta que vão me dar o Soro da Dor a tempo.

 Eu naturalmente discordaria disso e tentaria arranjar uma solução melhor, mas não havia e era óbvio. Os Clareanos já estavam sendo levados, o tempo estava correndo, então não podíamos desperdiçar mais nada. Olhei para Mike desacordado na cama e tive certeza de que ele apoiaria Thomas. Além disso, Mike agora era um dos maiores motivos para me incentivar a fazer qualquer coisa.

 Concordei com a cabeça singelamente e ele devolveu com um suspiro aliviado.  

  — Vou falar com Minho e Newt sobre o que Teresa e eu conversamos para ver se os Corredores lembram de alguma coisa dos Mapas, e vou tentar deixar isso como último recurso. – ele explicou por fim e parecia mais entusiasmado que nunca. O gosto de laranja quase me entusiasmou também.

  — Conte comigo, ok? Para qualquer coisa.

 Thomas assentiu e saiu apressado do quarto, batendo a porta com uma força desnecessária.  

 Mais tarde, ele ainda voltou para avisar que os Mapas estavam bem, e só o que pude fazer foi olhar de volta para Mike, esperando que acordasse.

 Uma ou duas horas mais tarde, ele finalmente o fez. Encarou-me por um tempo enquanto eu me levantava para me aproximar e depois fitou o teto, os olhos num torpor gigantesco. Não queria aborrecê-lo ou dizer alguma coisa que soasse inútil e forçada, por isso medi cada palavra na minha mente, tentando conter as lágrimas também.

  — Thomas, Newt e Minho estão trabalhando numa saída daqui com os Mapas, não havia nenhum no incêndio, então estão a salvo. Eles não disseram nada depois que começaram, mas, de certa forma, estou confiante. Devem estar ocupados. – falei o mais calmamente possível para que a minha garganta não fechasse.  

 O semblante dele não expressava absolutamente nada. Isso era até comum, mas tive a impressão de que desta vez duraria mais tempo.

  — Fui para a Casa dos Mapas pouco antes dos Verdugos começarem a entrar. – Mike começou rouco. — Queria ir saber por Alby por que ele tinha decidido de repente tomar uma atitude que prestasse, mas demorei demais e não pude sair. Garanto a você que ele não estava nem um pouco a fim de ler os Mapas, mas tirou todos os baús do lugar. Pouco depois do que deveria ser o meu turno, um Verdugo começou a tentar entrar. Eu me distraí e tudo começou a pegar fogo, e Alby estava desacordado no chão com um machucado enorme na testa. O Verdugo entrou, eu lutei com ele, tentei deixa-lo longe do trolho e talvez queimá-lo, mas as coisas saíram do planejado e, bom... – ele ergueu o braço ferido, ainda coberto com os panos, e virei a cabeça para o outro lado, os olhos mirados para cima. — Só consegui sair depois que o Verdugo seguiu os companheiros, quando provavelmente já tinham pegado um de nós. Quem foi?

 Tentei pigarrear para falar, mas um soluço escapou. Respirei fundo e cobri minha boca com a mão, esforçando-me para fita-lo.

  — Um garoto chamado Adam. – disse com um aceno de cabeça indiferente, fingindo que meus olhos não estavam claramente marejados.

  — Não faça isso. – repreendeu ainda inexpressivo, devolvendo o olhar. — A menos que esteja chorando por ele, porque ele queria ficar com você.

 Baixei os olhos para o colchão, o queixo tremendo.

  — Dê o fora daqui se for continuar com isso. – acrescentou seriamente. — Eu podia ter morrido, mas só perdi a mértila da mão, grande coisa.

 A julgar pelo estado dele logo após ter saído da Casa dos Mapas, eu não acreditava que ele estava tão indiferente assim. E a cor marrom estava mais fraca, vibrando no ar. Funguei e balancei a cabeça em afirmação de qualquer modo; não me importava como ele achava melhor fazer isso, contanto que ficasse bem.

  — Vou precisar trocar seus curativos todos os dias. – comentei aleatoriamente.

  — O que está esperando para começar então?

 Sentei-me na beirada da cama com tudo que era necessário para enfaixar o ferimento devidamente. O gelo tinha funcionado muito bem, apesar de ainda ser perturbador ver a carne daquela maneira, avermelhada e mole. Independente do quanto eu gostasse de saber fazer aquilo, o corpo humano era nojento.

  — Está bonito, não acha? – Mike ironizou, a outra mão por baixo da cabeça numa posição descontraída e um sorriso brincando em seus lábios.

  — Mais do que a sua cara, com certeza. – repliquei com um relancear zombeteiro a ele. — Eu ia lá tentar ajudar quando vi o incêndio, mas não consegui.

  — É, eu estava me perguntando onde estava a heroína da Clareira num momento daqueles. Achei que eu fosse uma exceção dos que você queria salvar.

  — Como se eu fosse seletiva nisso.

  — Ai. – ele resmungou encarando o toco enfaixado pela metade e enrolei o curativo mais rápido. — Estou me controlando muito para não gritar, continue falando algum plong. – Mike disse e vi seu rosto se contorcer numa careta de dor. — Alby está vivo?

  — Está. – respondi secamente, sentindo gosto de alho e me controlando muito para não fazer uma careta também. — Está dormindo em outro quarto, provavelmente vai acordar logo. Deve ter inalado muita fumaça desde que desmaiou.

  — Pobre trolho. – ironizou o mais maldosamente possível.

  — Contamos aos outros o que ele fez?

  — Eu sei lá... Não é como se fizesse diferença banir alguém agora.

 Soltei um suspiro prolongado e cortei a fita ao terminar, dando fim ao curativo e levantando para guardar as coisas.

  — É melhor não. – decidi.

 Mike continuou me encarando enquanto minhas mãos se ocupavam em encher um copo com água.

  — Foi ele quem resolveu deixar você falar primeiro no Conclave. – ele disse e o fitei. — Alby. Ele achou que você merecia o benefício da dúvida mais do que Herman por estar aqui há mais tempo e ter feito tudo que fez.

 Assenti com a cabeça e entreguei o analgésico a ele.

  — Não vamos contar nada. – falei. — Principalmente ao Newt. Como você disse, não faz diferença, e acho que entendo por que ele fez aquilo, depois de passar pela Transformação. Como Gally. E não é como se eu não tivesse dado uma de louca aqui também.

 O som de passos pesados soou no corredor do lado de fora do quarto e Newt apareceu à porta. Antes que eu pudesse temer que tivesse ouvido alguma coisa, ele falou para mim:

  — Thomas disse que você queria ajudar. Encontramos uma coisa.

 

No porão da Sede encontravam-se Newt, Teresa e mais três garotos ao redor de uma mesa retangular comprida. Os baús em que os Mapas ficavam estavam espalhados pelo local e pilhas de folhas de papel cobriam a mesa.

  — Só precisamos de ajuda para desvendar essas mértilas. – Newt disse.

 Eu prontamente coloquei-me ao redor da mesa com os outros e ouvi atentamente a explicação do que precisávamos fazer. Thomas e Minho haviam saído para o Labirinto com os outros Corredores e dispensei a crítica sobre isso que visitou minha mente; antes de irem, tinham repetido os desenhos de alguns Mapas das áreas em papel-manteiga e os sobreposto, de tal modo que a luz revelava linhas se cruzando em um “F” bem no centro. Gostando ou não de Teresa, ela estava certa: o Labirinto era um código.

 Todos nós passamos o dia inteiro dentro do porão, pegando os Mapas e os desenhando com as canetas que não tinham sido destruídas no incêndio. Meu entusiasmo e minha ansiedade misturavam-se numa enorme bolha no peito, quase me tirando o fôlego. Há muito eu não sentia tamanha esperança. Pelo menos, não uma tão real. O trabalho febril que todos faziam ao redor convencia-me muito bem que teríamos um resultado. Eu gostava da cor lilás que sempre estava por ali nos rondando. Daria certo. Precisava dar.

 Após várias horas, a noite chegou e continuávamos ali. Newt empertigou-se, soltando sua caneta e flexionando os dedos, avisando-nos que iria checar os preparativos para a chegada dos Verdugos e dar uma olhada em Mike e Alby. Tudo com o ar de líder que ele sempre tivera.

 Newt saiu e continuamos o trabalho silencioso, ocupados apenas com nossos próprios pensamentos e delineares precisos com a mão. Vez ou outra, um dos garotos perguntava como exatamente aquilo ajudaria e, após a primeira vez em que Teresa respondeu com um aleatório e sem nexo “sim”, todos passaram a fazer o mesmo sempre que alguém abria a boca, para que uma discussão não se iniciasse.

 Os músculos do meu braço, mão e costas estavam rígidos e eu não ousava mexer mais que o necessário, evitando uma explosão de dor pelo corpo. Alguns de nós tinham se sentado no chão, mas eu sabia que minhas linhas ficariam piores se os imitasse. Newt voltou e retomou seu lugar ao meu lado, já pegando mais folhas para desenhar. Soltei um muxoxo impaciente quando fiz uma linha muito torta e soltei outra vez ao tentar consertar e piorar. Bufei e continuei mais rápido, tentando não apelar para pedir as réguas improvisadas dos outros. Atirei o papel para a pilha e comecei outro, já entortando a linha outra vez.

  — Vá com calma. – Newt disse.

 Endireitei minha postura, abanando as mãos e movendo a coluna para os dois lados, respirei fundo e retomei a tarefa. Fomos noite adentro com os desenhos, calados e concentrados, ouvindo os gemidos dos Verdugos aproximaram-se pouco a pouco da Sede. Quando o prédio estremeceu com uma investida de um deles, no entanto, xinguei baixinho pelo susto e fomos obrigados a parar. Vários minutos seguiram-se em completo e tenso silêncio, até que gritos irromperam de algum andar de cima. Esperamos pelo que viria olhando para cima e para a escada do porão. O medo era palpável, mesmo que soubéssemos que o lugar menos provável a ser atacado era justamente ali. Vidros foram estilhaçados e ouvimos um alto barulho de crack, a Sede voltando a tremer enquanto era atacada. Os gritos aumentaram, especialmente um que expressava dor. Larguei meu peso para trás, apoiando meu quadril na mesa, frustrada que precisávamos ficar parados ouvindo aquilo.

 Quando o tempo pareceu parar com o mortal silêncio do andar de cima, todos nós voltamos ao trabalho. Pisquei algumas vezes perante a folha, sentindo meus olhos inchados de cansaço, mas apertei a caneta na mão e prossegui.

  — Melhor você subir. – falei a Newt ao ver a pequena pilha que restava ao lado dele. — Termino isso.

 Seus olhos estavam fundos e seu semblante inexpressivo quando olhou para mim e balançou a cabeça em concordância. Ele seguiu para a saída e puxei sua pilha para perto. Pude ver Teresa alternando o olhar entre mim e ele, mas ela já voltava aos tracejados quando a encarei.

 Não demorou muito até que os primeiros de nós anunciassem terem terminado e logo meu corpo agradeceu por finalizar a última linha. Teresa encarou as pilhas que formamos e pegou outra folha de papel, desenhando seis círculos de cima a baixo do lado esquerdo e escrevendo as palavras que o Labirinto soletrava na frente de cada um: “Flutua”, “Pega”, “Sangra”, “Morte”, “Rígido”, “Aperta”. Depois de uma noite inteira de trabalho, era isso o que tínhamos conseguido.

 Thomas e Newt entraram no instante em que ela se recolheu para um canto com a folha. Meus braços estavam apoiados pesadamente na mesa, encarando os Mapas e as palavras, observando atentamente as datas. Já tínhamos comentado observações no decorrer da noite. Após a palavra “Aperta”, passava-se uma semana sem aparecer nenhuma letra no Labirinto, e então tudo recomeçava com “Flutua”. O desânimo de Thomas ficou mais do que evidente quando contamos isso.

  — Divertido, não acha? – Newt ironizou.

 Thomas permaneceu calado, mas cravou seus pensamentos na minha mente ao olhar para mim, tanto que pude sentir o gosto doce que a voz dele trazia. Se aquilo era tudo o que o Labirinto tinha a mostrar, Thomas sem dúvidas apelaria.

 

Newt me obrigou a dormir por várias horas durante o dia, dizendo que poderia tomar conta de Alby e Mike. Não contestei por muito tempo e meu corpo relaxou completamente na cama de um dos quartos, de modo que acordei quase no fim do dia, com os danos causados pelos Verdugos reparados e todos os feridos tratados. Newt comentou que Thomas estava estranho, sumido, calado, evitando socializar com qualquer um. Chuck parecia mesmo abandonado.

  — Ter contato direto com um Verdugo não é uma experiência agradável. – respondi com o tom indiferente.

  — E por acaso o Hércules está achando que vai ser o escolhido da vez? – ele replicou.

  — Não, ele vai garantir isso.

 Newt não respondeu por um tempo, talvez tentando entender o que aquilo significava ou esperando que eu continuasse.

  — Que história é essa? – indagou com as sobrancelhas franzidas.

 Meneei a cabeça para o lado significativamente e ele, com nada mais do que a descrença impressa no rosto, deu um passo para se afastar e ir atrás de Thomas.

  — Não, espera! – falei e o puxei de volta pelo braço, pondo-me na sua frente e o encurralando com a parede externa da Sede. — Primeiro... pense. As lembranças dele são mais importantes do que qualquer outra coisa, talvez Zart não tivesse sido levado hoje se tivéssemos feito isso logo.

  — Deixei Alby sozinho no incêndio... – começou num murmúrio irritado.

  — Thomas está querendo ajudar, Newt, e temos o Soro da Dor. Ele vai ficar bem. – afirmei, quase deixando escapar que Alby quisera ficar no incêndio.

 Ele desviou o olhar irritado por um momento e voltou a me fitar com a ruga de desconfiança na testa.

  — Estão sempre de malditos segredinhos, não é? – disse cínico e um sorriso divertido escapou dos meus lábios.

  — Assim como você e Minho esconderam sobre os Mapas estarem a salvo. – repliquei e o beijei, puxando sua camisa para que ficasse mais perto. Newt pôs as mãos nas minhas costas, mas afastou seu rosto.

  — Isso é errado, você sabe, não sabe? – relanceou para alguém atrás de mim que estivesse nos vendo.

  — Não tenho culpa de ter sido a única garota além de Teresa a vir pra cá. Afinal, o que eles vão pensar se formos para um lugar mais reservado? – perguntei baixinho e uma ruga de desconcerto fincou-se entre suas sobrancelhas, seus olhos encarando-me por brevíssimos segundos antes de se desviarem com a sombra de um sorriso muito bem escondido. Ri da timidez, minhas mãos ainda em seu peito, nossos rostos ainda bem próximos. Minhas pernas poderiam ter fraquejado completamente com o aroma delicioso de chocolate quente.

 Após alguns longos encarando os olhos um do outro, Newt inventou alguma desculpa em que não prestei atenção para voltar ao trabalho. Comprimindo um sorriso, afastei-me dele e deixei que fosse, ciente do meu olhar bobo e ingênuo.

 

As seis palavras do Labirinto haviam se aferrado a minha mente durante as horas seguintes, por mais vazias que fossem. Elas com certeza serviam de algo, não era possível que estivessem ali por razão nenhuma.

 Estava pensando nisso enquanto ajudava Caçarola a fazer um jantar apressado; enquanto pegava a seringa do Soro da Dor e colocava debaixo do meu travesseiro de modo que não quebrasse; e enquanto esperava os Verdugos chegarem. Thomas ficou no primeiro andar com Teresa e outros garotos, Newt permaneceu no quarto com Alby e eu no quarto com Mike.

 Tudo recomeçou. Os barulhos, os gritos, a oscilação da estrutura da Sede. Era um ritual que nunca mudava e que dependia de Thomas para que parasse. O som do que parecia a porta da frente sendo destruída estourou dentro do prédio. Fui até a janela e pude ver o corpo de um garoto preso na viscosidade de um Verdugo, enquanto este e seus cúmplices apressavam-se na direção de uma das Portas. Uma outra figura entrou na cena, correndo até eles, pulando em seu caminho e fazendo-os pararem. Thomas tentou libertar o garoto que era levado, mas os Verdugos ergueram pinças e agulhas e o atacaram. O medo pulsou forte no meu peito. O plano era Thomas ser picado, não levado. Todos se amontoaram ao redor dele e o perdi de vista. Meus olhos arregalados observavam tudo rigidamente, esperando e torcendo.

 Debatendo-se, Thomas conseguiu livrar-se das armas metálicas, correndo para longe delas. Os Verdugos desistiram, afinal, já tinham um vítima, então bateram em retirada para o Labirinto. Thomas desmontou no chão. Newt, Teresa, Chuck e mais outros corriam desembestados até ele. Vi Newt erguendo-o por baixo dos braços e afastei-me da janela, puxando a seringa do travesseiro.

  — Que mértila ele acha que é? – Mike indagou alarmado, logo atrás de mim.

  — Conto depois.

 Dizendo isso, saí do quarto para o corredor e desci as escadas. Newt e Jeff carregavam Thomas para dentro, até descansá-lo num sofá.

  — Eu sabia que você era um imbecil, mas... – Newt começou extremamente furioso, incapaz de terminar a frase.

  — Não... Newt... você não entende... – Thomas resmungava, as palavras apenas um sopro de ar. Eu sabia exatamente o quão fraco ele se sentia.

  — Cale a boca e não desperdice sua energia!

 Ajoelhei-me ao lado de Thomas com uma calma sobrenatural. Inseri a agulha em seu braço e apertei o êmbolo, e seu corpo parou de tremer aos poucos. Logo, a agonia dissolvia-se dele.

  — Ele foi picado dezenas de vezes. – Clint informou.

  — Vamos levá-lo para um dos quartos daqui de baixo durante o dia e coloca-lo no Amansador quando os Verdugos vierem. – sugeri e vi Newt passar a mão sobre a boca, claramente nervoso. Encarei-o com um misto de firmeza e calma, e seu semblante se abrandou, a cabeça inclinando-se em concordância.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Capítulo mais zen desta vez para mostrar o papel da Nelly na decisão do Thomas e a reação do Mike sobre a perda.
Espero que tenham gostado! ^^
****** Spoiler do próximo *******
.
.
.
.
.
.
.
" - Tudo isso que estamos passando começou há muito mais tempo do que parece. Os Criadores escolheram todos nós quando éramos muito pequenos, mas não me lembro como ou o motivo. Eles achavam que tínhamos uma inteligência acima da média. Então nos tiraram de nossas famílias para nos criarem em escolas especiais por muitos anos. Mas tiveram problemas com uma garota e o irmão dela, porque não conseguiam serem encontrados.".

Até lá! ♥



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Socorristas" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.