5 Minutinhos escrita por Owl KodS


Capítulo 1
Capítulo 1




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Ela observou mãe e filho, um nos braços do outro naquele momento final. Sabia o que tinha que fazer, afinal foram tantos anos que seu trabalho se tornara monótono de automático.

Os dois eram uma pequena família pobre em uma casinha de madeira próximo a um distrito industrial esquecido. Apenas mais uma família em um milhão naqueles tempos sombrios nos quais as máquinas valiam mais que a vida humana. Ela os observou no último adeus, quando a mulher tossiu sangue sobre as cobertas imundas e manchadas. O rapaz não se moveu.

A foice apitou. Havia trabalho a ser feito, mais trabalho, sempre mais trabalho, mas aquela família precisava de mais 5 minutinhos.

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Ela se moveu. Passou por eras e anos até alcançar aquele mesmo lugar. A casa continuava a mesma, uma pequena construção de madeira pintada em um tom escuro de marrom, mas havia grama em volta e as pessoas pareciam felizes e não apenas espectros cinzentos e deploráveis, consumidos pela cidade.

Lá estava a mulher sentada em sua cadeira com um tricô no colo e a enorme barriga anunciando a chegada de seu pequeno companheiro. A luz de uma lareira refletia em seu rosto pálido parecendo aquecer até mesmo o coração mecânico de sua observadora.

O marido se aproximou e lhe beijou os lábios com delicadeza antes de sair para mais um dia de trabalho, mas aquele não seria um dia longo.

Não foi muito tempo, na verdade não foram mais que 5 minutinhos. Aqueles poucos minutos foram a diferença entre a felicidade de uma família e a danação de uma mãe e seu filho, porém era seu maldito mecânico trabalho e deveria cumpri-lo.

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Outra morte, era assim que marcava o passar de seus dias. Uma forma monótona e triste sem dúvidas. Estava em um hospital. O local branco e esterilizado tinha dois cheiros paradoxais: O nascimento e a morte, mesclando-se no ar de forma melancólica.

Havia uma criança entre os braços da mulher, o mundo parecia parado enquanto ela observava aquele embrulho nos braços fracos da mulher e sorriu. Era uma cena terrível demais para ser observada sem reação nenhuma.

5 minutinhos bastaram para que as enfermeiras levassem a criança e trouxessem o desfibrilador, mas a verdade é  que já era tarde demais para qualquer uma daquelas coisas.

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Era a primeira vez que os dois se encontravam. Era uma belíssima tarde de verão, bonita demais para que dois órfãos se encontrassem.

Ela era uma pessoa triste vivendo de pedir nas ruas para levar até uma casa que nunca sentira sua. Já ele era vivia de pedir pois a mãe estava doente. Ela sorriu para o rapaz que pedia ao seu lado, ao invés de bater no rapaz como seus companheiros fariam. Aquele menininho estava tirando o dinheiro que pertencia a ela, mas ao invés disso ela sorriu e esticou algumas notas e moedas, não era tudo o que tinha, mas era tudo o que podia dar.

A observadora sorriu levemente observando aquelas crianças, mesmo que seu trabalho a levasse para um lado diferente, um lado mais sombrio e triste, mas podia tirar 5 minutinhos para observar a inocência de dois sofredores.

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Ficou muito tempo sem ver qualquer um dos dois. Um hiato de 10 ou 15 trabalhos sem vê-los. Já podia sentir o resto da sua humanidade se esvaindo até o dia em que os encontrou mais uma vez.

Ela estava deitada sobre a cama. Sofrendo abraçada no travesseiro. As lágrimas salgadas manchavam o travesseiro, mas isso não parecia fazer diferença. O sangue entre as pernas e a observadora não pode evitar de se sentir uma intrusa naquele momento.

O homem a abraçava pelas costas, esfregando as mãos de forma carinhosa para consolá-la, mesmo que ele se sentisse inconsolável.

Ela quis dar 5 minutos a eles, mas não haviam mais 5 minutos a dar quando ela chegou. Eles já haviam perdido a coisa mais importante de suas vidas, seu filho, mais uma vez.

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Mais uma vez ela podia ver aquelas duas vidas sofridas se encontrarem. Eles não já não eram adultos e pareciam mais pobres que nunca.

O pobre rapaz estava erguido do chão por vários centímetros pela mão forte e calejada do padeiro, depois de tentar roubar um pão. Ele sabia o que era certo e errado, mas tinha acabado de perder a mãe e ninguém lhe dava oportunidade, tinha fome e nenhum centavo.

A menina era esperta como uma gata. Vivera sozinha naquelas ruas por tanto tempo que conhecia todos os seus truques. Ela foi rápida em virar a irá do nemesis contra ela, fazendo o rapaz cair com um baque surdo no chão.

E assim se deu início um interessante jogo de pega-pega que o padeiro, um senhor velho e gordo no alto de seus 69 anos não podia vencer.

Seu rosto ficou vermelho com o esforço e seus olhos vacilaram quando ele caiu no chão. Por 5 minutinhos ele pode ver pela última vez a fachada impecável de sua loja amarela contra o céu azul acinzentado pela chuva que caira mais cedo.

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Ela podia ver com clareza agora. Apesar dos sacrifícios aqueles dois órfãos haviam prosperado lado a lado e era assim que estavam quando ela chegou.

A cena comovente do homem sobre sua cama macia, tossindo o sangue seco, enquanto a mulher lhe segurava as mãos e beijava as faces. Eles jamais se afastariam. Ela sempre estaria junto dele, desde o trágico momento em que ele nasceu até sua morte, mesmo que para isso ela precisasse de toda a coragem para se algo mais.

5 minutos se passaram. O rosto de seu amor perdeu a cor e os olhos se fecharam.

Ela ergueu sua foice sobre a cabeça do homem, mas a mulher não o deixaria partir, nem que para isso precisasse se tornar imortal.

Mais 5 minutinhos se passaram em câmera lenta quando a mulher agarrou a arma afiada que ceifava a alma da última coisa que tinha.

5 minutinhos era tudo o que precisava para reconhecer os próprios olhos sob o manto negro.

5 minutinhos para se tornar algo mais, algo imortal.

5 minutinhos para ter seu amado para sempre.

5 minutinhos para perceber que era ela mesma quem levava seu amor..


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Notas finais do capítulo

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