MacGuffin escrita por Yuu-Chan-Br


Capítulo 7
Ato 6


Notas iniciais do capítulo

Hoje é aniversário do KuuChan, desenhista das capas das minhas fanfics e co-escritor de tantas outras. ♥ Parabéns, meu neném, que venham ainda muitos e muitos anos~~



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Silêncio. A apreensão do assunto que parecia nunca vir lhe causava inquietude, a qual se expressava através do pé batendo contra o assoalho – era um mau costume adquirido ao longo dos anos. Sua vontade era de pegar Jumin pelos ombros e o sacudir enquanto gritava para desembuchar de uma vez, mas se conteve. O moreno parecia concentrado em sua xícara de café – não  tomava seu conteúdo, mas aquecia confortavelmente as mãos ao redor da mesma, parecendo prestes a adormecer uma segunda vez. Seu espirro lhe causou um sobressalto e parte sua agradeceu pela própria alergia servir ao menos para o acordar.

— Sai, sai – resmungou para a gata branca, insistente em esfregar seu acúmulo de ácaros contra sua calça limpa, talvez tendo a atenção chamada pelos movimentos de sua perna. Voltou a espirrar.

— Elizabeth – Jumin chamou, afagando as costas da pequena criatura quando se aproximou. Sorriu. – Obrigado pelo café – comentou ao se endireitar na cadeira, acompanhado de um miado.

— Eu fiquei surpreso, na verdade, não pensei que gente rica tivesse comida em casa – brincou e tomou um gole do líquido. Franziu o cenho e levou uma mão à boca, da qual retirou um longo fio branco, na expressão do mais profundo asco. – Caramba, bola de pêlo! Por que tinha que me seguir até na cozinha? – Emendou a fala com uma enxurrada de espirros.

— Ela gosta de você. – Tomou também um gole, ouvindo-a miar em concordância.

— Bem, eu prefiro humanas. – Esfregou o nariz. – Mas o que era tão importante pra você não me deixar ir embora, afinal? – Sua paciência não era das maiores.

— Oh, sim. – Pousou a xícara sobre a mesa. – É um assunto delicado. Mesmo achando pertinente o abordar, não tive muito tempo para refletir sobre a melhor forma de o iniciar. – Franziu as sobrancelhas e pressionou os dígitos contra a louça morna, a angústia visível em seus traços.

— Você faz tanto suspense que chega a dar medo, sabia? – resmungou. – É só falar e pronto! O quê? Você resolveu sair do armário e assumir os boatos? – cutucou-o e se divertiu com a face de indignação recebida.

— Se fosse um jogo de adivinhação, você não poderia passar mais longe – respondeu, cansado.  – É o exato oposto disso. – Brincou com a xícara entre as mãos, rolando-a com sutileza de um lado a outro. – Nunca fui bom em falar sobre minha própria vida, mas considerei me abrir sobre isso com você desde o início do relacionamento de Jiyeon e Jaehee – torceu os lábios, ainda desacostumado a chamar a ex secretária pelo primeiro nome. Ergueu os olhos cristalinos do café ao amigo, tão sério quanto conseguia parecer, enxergando nele a apreensão da próxima fala. – Zen, pode te parecer absurdo, mas eu já estive na sua situação. Imagino que, melhor do que ninguém, eu consiga compreender suas frustrações e seu sofrimento, apesar de minha forma de encarar o acontecido seja oposta à sua. – Sorveu um gole do líquido escuro.

O ator sentiu sua mente embranquecer, como se seu cérebro sofresse uma pane. Era difícil imaginar Jumin apaixonado, e ainda  mais ainda sofrendo por amor. Várias perguntas lhe ocorreram durante sua fala. Que situação? E por quem? Quando? E por que não dera certo? Deveria tirar todas as dúvidas ou o esperar falar por conta própria? Além de tudo, ainda possuía uma sensação em seu âmago lhe gritando o nome da possível candidata a tais sentimentos, a única cujas circunstâncias seriam capazes de causar tamanho suplício ao empresário. Suas suspeitas foram confirmadas no segundo seguinte, ao ouvir do moreno num exalar pelo nariz, quase um riso de escárnio a si mesmo:

— Rika…

Silêncio pairou na sala, mais incômodo do que da vez anterior – Zen não pensava ser possível, mas estava enganado. Engoliu a seco. Sua primeira reação era rir de nervoso, mas puxou todo o resquício de força de vontade de seu corpo para se conter. Considerando o atual estado do amigo, ele não lidaria bem com a atitude, mesmo sendo um reflexo involuntário. Além disso, não estava em condições de julgar, definitivamente.

— Rika-ssi, então… – Passou a alça da xícara de uma mão a outra, incerto sobre como abordar o assunto. Sentia-se nervoso.

— Pode perguntar – afirmou o moreno, os olhos cristalinos fixos nos rubros. – Sei que está curioso. Não sei ao certo o porquê, mas você parece muito curioso.

Zen retorceu os lábios. Não gostava quando era analisado daquela forma, embora soubesse como seus sentimentos ficavam estampados no rosto quando não estava trabalhando. Sua linguagem corporal era um livro aberto. Ainda estava chocado por ouvir de Jumin uma história de frustração amorosa, mas, por ora, deixaria sua descrença do lado. Concentrar-se-ia nas próprias dúvidas. Apesar de contrariado, deu-se por vencido, fazendo-lhe a pergunta:

— Como você lidou com isso? Não foi ruim? Não foi triste? – Mordeu o lábio inferior, hesitante. – Não foi… dolorido?

Um pequeno sorriso se estampou nos lábios do moreno – não de escárnio, como antes, mas um misto de satisfação e melancolia. Zen não soube ao certo o motivo de sua expressão, mas, de alguma forma, intuía uma ponta de regozijo por estarem, enfim, conversando como duas pessoas civilizadas em vez de fazerem uma troca de alfinetadas gratuita. Quis rir de si mesmo.

— Sim, foi dolorido – admitiu o maior, tomando mais um gole do líquido ainda aquecido, embora parte de seu calor já houvesse fluído para suas mãos através da louça. – Mas minha situação não era cem por cento igual à sua. Quando conheci Rika, ela e V já possuíam um relacionamento, então desde o início não haviam chances para mim. – Roçou o polegar contra a porcelana esmaltada, pensativo. – Apesar de acreditar que não teria tentado nada mesmo se não houvesse esse compromisso quando fomos apresentados.

— Por que não? – Zen perguntou, tão confuso quanto poderia.

— Porque era possível perceber o que sentiam um pelo outro só de olhar – disse com sinceridade. – V sempre foi um amigo muito importante e querido, mesmo antes de eu conhecer Rika. Como eu poderia interferir em sua felicidade?

O ator franziu as sobrancelhas e se encolheu na própria cadeira, uma ferroada acertando-lhe o peito em cheio. Quis retrucar, mas lhe faltou coragem, sabia estar errado. Sabia desde o início, mas não conseguia evitar.

— Você também percebeu, não? Digo, não havia visto Jiyeon frente a frente antes da festa, mas era possível perceber, mesmo pelas mensagens no aplicativo, como ela e Jaehee pareciam compartilhar de uma conexão alheia ao resto de nós, certo?

O outro rangeu os dentes e pressionou uma das mãos em punho, sobre a mesa. Ele estava certo. Odiava o fato de ele estar certo, com todas as forças.

— Pensei que talvez fosse só uma amizade muito forte – tentou contornar a afirmação, os olhos se desviando para o lado –, por serem duas garotas… Pensei que fosse a amizade que Jae-ssi tanto esperava – dessa vez, sim, riu de nervoso. – No início eu realmente pensei, mas… – suspendeu a fala ao iniciar de uma leve ardência em sua garganta.

— Mas depois você só não quis acreditar, certo? – Não pareceu se importar com a encarada agressiva recebida, como se já estivesse preparado para isso. – É natural. Imagino como muita coisa deve ter se passado pela sua cabeça e como deve ter relutado contra aceitar o relacionamento delas – soltou um quase riso. – Ainda reluta até hoje, parece. Infelizmente, ou felizmente – remendou-se, de fato sem saber qual seria a colocação mais correta –, a relação delas parece bem sólida agora, é a hora perfeita para você se conformar. – Meneou a cabeça numa negativa. – Nada do que fizer ou disser vai a convencer de trocar Jaehee por você e, quanto antes aceitar isso, melhor, para todos.

— Para todos uma ova! – Bateu as mãos sobre a mesa com força, fazendo a gata, até então aninhada no colo de seu dono, sobressaltar-se e sair correndo até o sofá, de onde observava a cena, desconfiada. – Acha mesmo que vai ser melhor pra mim manter tudo isso entalado? – Bateu as mãos uma segunda vez, com menos intensidade. Apesar de tudo, sentiu uma pontada de receio após espantar o pequeno animal. – Acha mesmo que isso vai me fazer feliz? – Sentia a voz embargada e o detestava.

— Não. – Arqueou uma sobrancelha ao responder, como se fosse o cúmulo do óbvio. – Disse que seria melhor para todos, não que te faria feliz.

Zen sentiu o sangue ferver em suas veias, mas se conteve, embora a cólera com as palavras ditas fizesse suas mãos tremerem sobre a mesa.

— É provável que você fique muito infeliz, inclusive – Jumin continuou, não se deixando influenciar pelas reações extremas do outro. – Mas, com o tempo, você vai aprender a lidar com esse sentimento e o ignorar.

— Ah, sim – riu, irônico –, funcionou maravilhas pra você, né?

— Bem, sim, afinal você não teria sabido se eu não contasse, teria? – Pareceu confuso quanto à abordagem do outro ao dito.

— Ah, às vezes me dá vontade de te socar a cara pra ver se entra alguma coisa na sua cabeça…

Apesar da “ameaça”, Zen escorregou de volta à cadeira num grunhido desgosto, apoiando a cabeça em ambas as mãos, cansado de toda aquela discussão.

— Não imagino como uma coisa pode ter relação com a outra, mas talvez seja proveitoso para você comprar um saco de pancadas para descontar toda essa frustração. – Tomou um gole do resto de café e retorceu o rosto ao sentir o líquido já gelado. Demorara demais. – Na verdade esperava que fosse chorar ou algo do gênero, mas violência também pode ser uma forma de extravasar, afinal.

— Por que eu ia chorar na sua frente?! – indagou, inconformado.

Era verdade.

Zen sentia vontade de chorar.

Desde o início do assunto, quando a ardência se apoderara de sua garganta, a vontade era chorar, gritar e espernear, tal qual faria uma criança de colo. Talvez não se importasse de derramar meia dúzia de lágrimas e fazer um desabafo mais sincero com outra pessoa, mas não Jumin. Não duvidava de suas boas intenções, mas detestava a sensação de inferioridade ao se demonstrar tão frágil diante dele – o mesmo motivo que o fazia falhar terrivelmente em compreender como ele dormira com tamanha facilidade não só na sua frente, como encostado em seu ombro.

— Quem sabe você precise. Algumas pessoas se sentem melhor depois de chorar – ripostou com toda a sua lógica.

— Eu não vou me sentir melhor de chorar! Ainda mais na sua frente!  – Alterou a voz e ergueu o rosto ao dizer, conseguindo destacar o momento exato em que suas palavras o feriam. Arregalou os olhos.

Han Jumin, cujas feições dificilmente deixavam transparecer qualquer sentimento, havia franzido as sobrancelhas com intensidade. Seus olhos também estavam semicerrados, como se precisasse conter uma intensa dor. Talvez fosse por causa da bebida, do desabafo, do assunto delicado ou todas as opções anteriores, mas o moreno aparentava estar mais acessível, mais exposto. Frágil, até. A mesma fragilidade que o outro tanto pelejava para não demonstrar. Zen voltou a sentir a pontada de remorso e, por um breve momento, visualizou o homem correndo em direção ao sofá e lhe lançando um olhar ressabiado, tal qual fizera sua gata.

Ele não o fez.

Em vez disso, suspirou e passou uma das mãos pelo rosto até o cabelo, desalinhando as mechas até então arrumadas de sua franja, como se cada fio estivesse em seu devido lugar. Não disse mais nada. Vira-o entreabrir e fechar os lábios algumas vezes, prestes a retomar a conversa, mas não. Seria impossível o culpar, sabendo ter proferido palavras pesadas, dolorosas.

— Como você consegue agir como se não fosse nada? – riu pelo nariz. – Como consegue ficar tão calmo e analisar tudo com essa lógica fria e calculista? – Voltava a pressionar as mãos em punhos, sentindo-as tremer uma vez mais. Nervosismo, raiva, angústia… um acumulado de sentimentos a lhe pesar o peito. – Você não devia estar sofrendo? Ei? – Observou-o e sentiu não só os olhos, como todo o corpo arder em agonia, das pontas dos pés ao último fio de cabelo, o sufoco da voz a lhe denunciar a antecipação de um choro há muito reprimido.

— Não estou calmo – respondeu, os sobrolhos franzidos a lhe causar incômoda dor. – Se fosse descrever, diria estar anestesiado. É isso que acontece, afinal, quando você mata os próprios sentimentos – exalou pelo nariz, inclinado a  rir da própria desgraça.

O ator ainda esperou breves momentos por uma continuação de sua fala. Uma explicação, um detalhe, uma descrição além daquilo, mas nada veio. A mutez do amigo quanto aos próprios sentimentos soava hipócrita quando toda a interação girava em torno da exposição de sua intimidade. “Por que eu preciso me abrir enquanto você fica seguro no seu pedestal?”, pensou, irritação a tomar conta de cada molécula de seu organismo. Não ficou só na vontade, permitindo-se, de fato, rir da própria desgraça.

— Não importa o quanto a gente converse, sempre parece que você tá em outro nível, como se fosse uma realidade diferente da minha – voltou a rir, descontrolando-se. — Por isso eu detesto passar tanto tempo com você. Quando parece que vai ficar tolerável, a coisa toda desanda de algum jeito. É um tipo de magia? – não parava de rir. – Você é mesmo humano? Sei que brincava sobre você ser um tipo de robô, mas… – Moveu o rosto em negativa, perturbado.

Talvez ele não quisesse dizer tudo aquilo ao amigo. Apesar das zombarias, mesmo Zen conseguia delimitar o que seria pesado demais para ser alvo gozação, ou ao menos saberia, numa situação menos caótica. Naquele momento, deixando-se levar pelo calor da discussão e o acúmulo de suas frustrações – tanto amorosas quanto em relação ao empresário diante de si –, cuspiu-lhe a frase:

— Tem certeza que o que você sentia pela Rika-ssi era amor? Você é mesmo capaz de amar alguém?

Conhecendo Jumin, era de se esperar uma resposta a altura. Algum deboche ou racionalização que não passava nem perto da imaginação do albino – ele não estava em condições de pensar muito além da vaga compreensão do moreno. Aguardava qualquer reação, menos a que, de fato, obtivera. Do outro lado da mesa, pôde-se ouvir um suspiro sôfrego, custoso, escapando do homem cuja mão voltara a esfregar os fios, desta vez descendo até o rosto e ali ficando. Permaneceu de tal modo por intermináveis instantes, provocando no mais novo curiosidade com uma pontada de preocupação. Ao enfim abaixar a mão, podia-se ver os olhos úmidos e levemente avermelhados do maior.

— Você pensa saber de tudo, não é mesmo? – indagou Jumin, o desagrado causado pela alteração da própria voz estampado em seu rosto. – Vejo você reclamar sobre como trato meus subordinados, minhas relações interpessoais, como critica meu estilo de vida… – Ameaçou abrir um sorriso irônico, mas logo voltou à expressão sisuda de outrora. – Mas eu tenho tentado – pausou e mordeu o lábio inferior, angustiado – tenho tentado ao máximo melhorar minha convivência com aqueles ao meu redor, ser mais compreensivo, enquanto você continua a me criticar pelo simples fato de eu pensar ou agir diferente.  – Encarou-o. – Põe em cheque meu sentimento por eu ter escolhido o guardar para mim por saber ser algo que traria dor para todos nós, todos. Se eu pudesse minimizar essa dor guardando tudo pra mim, seria a melhor opção, então eu fiz. – Bateu um punho sobre a mesa, embora não tão forte quanto o amigo, decerto receava assustar a gata ainda mais. – E faria de novo, se isso os deixasse felizes!

O riso grave de Jumin reverberou pela sala conforme ele abaixava o próprio rosto, seu sofrimento emanado com intensidade ao outro.

— E você ainda põe em dúvida…? – continuou, perturbado. – Talvez quem não tenha empatia e tato seja você, no final… – Tremia de leve, apesar do esforço para não perder por completo a compostura. – Para mim, ver os dois juntos e felizes, tanto meu melhor amigo quanto a mulher que eu amava, valia muito mais do que expressão um sentimento que só serviria para causar discórdia e nos afastar. Mesmo sofrendo por guardar tudo para mim, foi muito mais recompensador do que um alívio momentâneo que poderia culminar num futuro rompimento de relações, porque o que eu sentia pela Rika não era só para mim, mas para ela. Eu queria que ela, acima de tudo – fez questão de frisar a fala –, fosse feliz. Para mim, amor é algo tão generoso que eu seria incapaz de botar meus sentimentos acima dos dela. – Voltou a encará-lo, os olhos avermelhados repletos de emoção e vida, um contraste perturbador com seu ser cotidiano. – E para você, Zen, o que é amor?

Sabia ter irritado o moreno, sabia receber um bronca. Vez ou outra conseguia pescar uma palavra aqui e ali e dar sentido a suas frases baseado no contexto, mas, num todo, fora incapaz de focar em sua fala durante os primeiros segundos. O choque fora demais. Sentado em sua cadeira havia um Zen estupefato, olhos arregalados e boca fechada durante a verborragia do maior. Por fim, baixou os orbes rubros.

Em qualquer outro momento, o ator teria rebatido suas críticas de forma ainda mais enfática, mas não era este o caso. Sentia-se estúpido. Ele estava certo, Zen bem sabia – suas atitudes se igualavam às de um adolescente apaixonado, incapaz de medir as consequências dos próprios atos, e a percepção do fato lhe pesou no peito. Mesmo Yoosung, o mais novo do grupo, tivera maturidade para aceitar a impossibilidade de romance, então por que ele insistia em repetir os mesmos erros? Mordeu o lábio inferior, perdido. Fora longe demais. Se chegara ao ponto de ver Han Jumin chorar, aquilo era, com toda a certeza do mundo, longe demais. Sentia-se, contudo, incapaz de dar a resposta mais básica esperada de uma situação daquelas. “Desculpa” nunca antes parecera tão difícil.

Cansado, o mais velho voltou a se acomodar em sua cadeira, a respiração alterada sendo uma pisada a mais em seu orgulho já dilacerado. Esforçava-se para voltar ao normal, ou ao menos retomar o mínimo de compostura. Pousou as mãos com dedos entrelaçados sobre a mesa, pressionando ambos os polegares e deixando o mutismo se apropriar da cena, um contraste e tanto com suas mentes fervilhantes.  

— Ah – Jumin foi o primeiro a quebrar o silêncio, seu grunhido acompanhado de um esfregar dos dedos sobre a testa. – Por isso eu não queria falar mais, tinha certeza que acabaria desse jeito…

A fala esficaçara no outro a frustração já quase extinguida, chegando a lhe causar um espasmo no olho.

— Porque você precisa sempre ser o senhor incrível na frente dos outros, não é mesmo? – Sorriu, pedante.

— Como você sempre consegue a proeza de interpretar todas as minhas falas da pior forma possível?

Zen encolheu os ombros, a reclamação servindo de bode expiatório para a própria culpa.

— Você parou de falar sobre o que sentia quando eu finalmente desabafei. – Jumin arqueou uma sobrancelha, a calma voltando a si aos grados. – O foco da conversa era você, não eu, por isso não via a necessidade de me aprofundar a respeito de meus sentimentos. – Quase bufou, escorregando pela cadeira, deixando-se parecer desajeitado. Riu de si mesmo. – Você tem o dom de conseguir me tirar do sério, às vezes desconfio ser seu passatempo preferido.

— Claro que não! – ripostou de pronto. – Você que faz isso. – Rolou os olhos. – Eu acabo perdendo a paciência e falando o que não devo.

— Vai pôr a culpa em mim agora? – Alargou o sorriso, fitando-o.

— Eu só disse como me sinto! – rosnou. – Não era isso que você queria?

Depois de todo o acontecido, Zen esperava que sua quota de surpresas estivesse preenchida pela noite, mas não. Jumin exalou pelo nariz e começou a rir baixo, galgando a escala de hilaridade até começar a gargalhar sem controle algum. A cena absurda o fez ponderar se o futuro presidente da empresa havia enfim perdido o juízo.

— Por que você tá rindo? – perguntou, inconformado.

— Eu só – era interrompido pela própria voz – senti vontade. — Tentava se controlar, sem sucesso. – Depois de falar tudo, senti um alívio – admitiu, sua respiração profunda entrecortada pelos risos.

— Alívio? – Franziu as sobrancelhas.

— Sim – não conseguia parar. – Eu guardei por tantos anos, achei que não contaria para ninguém. – Soltou um “pfff” abafado. – Acabei contando justo para você…!

— Ei! Como assim “justo pra mim”? – indagou, recebendo outra gargalhada em resposta.

Apesar da bizarrice que era a visão e Han Jumin tendo uma crise de risos, não podia negar como a cena possuía também um certo frescor. Vê-lo reagir de tal modo era, sem dúvidas, incomum, e por isso mesmo a situação servira para aliviar toda a tensão de outrora. Quando deu por si, Zen também ria. Ria até alcançar seu grau de intensidade e sentir os olhos a lacrimejrar de alegria. Enxugou-os às pressas, divertindo-se com a cena.

— Olha só o que você faz, eu peguei sua loucura – disse parte em protesto, parte brincadeira. – Nunca pensei que fosse rir tanto à toa com você, Jumin-i. – Súbito, sentiu um nó na garganta. – Nunca pensei que – tinha dificuldade em proferir as palavras, o rosto se contorcendo pouco a pouco – teríamos algo em comum, ainda mais algo assim… – Exausto demais para prender seus ímpetos, Zen deixou as lágrimas graúdas rolarem dos cantos de seus olhos bochecha abaixo.

Não sabia ao certo como, nem por que, mas entrara numa crise de choro. Sentia-se soluçar ao escorrer do líquido morno até seu queixo, pingando por fim sobre a mesa.

Não havia mais riso. A reação do mais novo servira para interromper o momento do outro que, perdido, fitou-o em agonia. Voltou a ficar sério, buscando no fundo de seu âmago os resquícios de sobriedade para proporcionar conforto ao outro. Aquilo era, enfim, o objetivo de Jumin desde o início. Ainda desnorteado, franziu o cenho e buscou, como fizera com Jaehee, o lenço em seu bolso, ofertando-o ao outro.

— Tem certeza? – perguntou o ator após alternar o foco entre o tecido e o homem que o oferecera. – Vai ficar cheio de meleca – brincou ao esboçar um sorriso, embora seu rosto estivesse encharcado àquela altura.

— Não sou eu que lavo – respondeu com toda a sinceridade, fazendo-o rir e chorar em simultâneo. Satisfez-se ao vê-lo pegar o lenço.

Numa situação qualquer Zen o teria chamado de riquinho mimado, ou arranjado algum outro motivo para o perturbar de alguma forma, mas, naquela situação, ele apenas disse:

— Obrigado.

— De nada. – Voltou a pousar as mãos sobre a mesa, os dedos entrelaçados.

Em silêncio, Jumin lhe lançava olhares fugidios de em quando, não tendo certeza se deveria o observar durante o choro ou se seria repreendido por isso. Zen sempre fora sensível a ações que supostamente lhe feriam o orgulho, mas o mais velho nunca conseguira distinguir quais elas seriam com sucesso. Talvez esse fosse o principal motivo de seus desentendimentos. Deveria fazer algo ou o deixar chorar sozinho o quanto quisesse? Deveria dar pequenos tapas em seu ombros? Seria estranho demais oferecer um abraço, desse tanto estava certo, mas haveria uma deixa para dizer algo? Ou já dissera o suficiente? Ele ficaria satisfeito com seu momento mudo?

A cena deixava o moreno petrificado. A reação de Zen não fazia sentido e Jumin nunca fora bom em lidar com situações que fugissem a seu senso de lógica – muito embora tivesse acabado de protagonizar algo parecido. Humanos não faziam sentido, afinal, ele incluso. Por ora, contentar-se-ia em aguardar. Se ele quisesse dizer algo, diria, se não, ficariam ambos em silêncio até o outro julgar ter chorado o suficiente. Já havia tentado por força e não obtivera um bom resultado, talvez funcionasse caso fosse mais permissivo. Não conseguia evitar, porém, o intenso apertar de seu peito ao ver o belo rosto do amigo tão deformado em angústia.

 


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Notas finais do capítulo

[Yuu-Chan-Br]: I’M ON FIRE~~ Pois bem, gente, eis aqui o capítulo 7. Feels, né? ♥ Eu senti a necessidade de fazer os dois perderem a linha para se sentirem em pé de igualdade (não acho que o Zen se abriria de outra forma), ao mesmo tempo que quis muito fazer o Jumin sincero com os próprios sentimentos. Durante a rota dele, no jogo, mesmo, eu senti falta de fechamento quanto aos sentimentos que ele nutria pela Rika. Concordo que nessas horas o melhor é não falar pra pessoa (se o sentimento não é recíproco, só causa dor pra todo mundo), mas o fato de ele não ter desabafado com NINGUÉM acabou deixando ele parado no tempo. Num geral sinto que todos os personagens de Mystic Messenger desconhecem o significado de “meio termo”. 8D É exatamente isso que eu vou buscar na história.

Muitíssimo obrigada a todos que me acompanharam até agora, em especial àqueles que deixam comentários sobre os capítulos. ♥ Escrever MacGuffin não teria metade da graça sem as reações de vocês!



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