MacGuffin escrita por Yuu-Chan-Br


Capítulo 6
Ato 5




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— Não fale como se você soubesse de tudo – soltou rouco, gutural.

— Mas eu sei. – Tomou mais um gole de soju. – Eu sei muito bem.

A fala parecia grego para Zen, que arqueou uma sobrancelha na mais pura descrença. Sua boca mal havia se entreaberto para perguntar a respeito da fala súbita quando o ruivo se aproximou, aos risos e mexendo num celular que não era seu.

— Vou levar o Yoosung-i pra casa – divertia-se imenso ao deslizar o polegar pela tela, alternando a visão entre sua ação e os amigos mais velhos. – Ele já está dormindo, vai acabar dando PT se continuar assim.

Zen e Jumin podiam discordar em muitas coisas, quase tudo, mas ambos vislumbraram o hacker com ares de “E de quem é a culpa?” ao serem abordados. Ignorando a repreensão muda, Seven pagou sua parte da conta, despediu-se dos demais com um loiro parcialmente desacordado escorado no ombro. “Vou deixar os pombinhos a sós”, ainda brincou e lhes soprou um beijo antes de ser expulso pelo albino e ir embora às gargalhadas.

— Ugh, essas brincadeiras imbecis – resmoneou o mais novo dos restantes ao tomar um gole raivoso de sua bebida. Ou ao menos tentando, pois a percepção do copo vazio servira para o irritar ainda mais. – Ei, futuro presidente. – Balançou de leve o recipiente vazio em mãos, instigando-o a enchê-lo outra vez.

O moreno fez menção de alcançar a garrafa já quase no fim, mas esbarrou no próprio copo por acidente, derrubando o resto de seu conteúdo pelo balcão, o líquido transparente escorrendo para o lado de fora.

— Ei, cuidado! – exclamou o mais novo ao sinalizar para o garçom os guardanapos do lado de dentro do bar. Usou o tufo recebido para tentar absorver o máximo possível da bebida enquanto se desculpava pelo acidente do amigo.

— Talvez seja melhor eu também ir para casa – comentou Jumin, a voz arrastada quando comparada a seu normal. Apoiou as mãos na madeira e ameaçou levantar, mas precisou ser amparado ao quase cair para o lado.

— Ei, você tá bêbado? – perguntou Zen, num misto de estranheza e divertimento.

— Eu só levantei rápido demais. – Olhou-o de esguelha ao receber um riso mal contido em resposta.

— Sei… – Achava graça. – Quer que eu chame seu motorista ou coisa assim? Eu preciso ir pra fila do caixa.

— Não precisa. – Parecia incerto sobre aceitar ou não a mão a lhe amparar as costas, mas, por fim, decidiu não se afastar.

— A conta não vai se pagar sozinha, senhor futuro presidente – disse ao arquear uma sobrancelha.

— Será? – brincou, um sorriso de suave escárnio a se formar em seus lábios.

Zen não compreendeu sua ação logo de início, demorando alguns segundos até arregalar os olhos e virar a cabeça na direção do caixa. Ali, logo atrás de um casal, estava um homem alto, de terno preto e cabelo bem curto, era o próximo da fila.

— Escuta aqui, seu babaca, você quer parar de fazer isso?

— O que seria “isso”? – era possível sentir um prazer sádico na fala do moreno, emoldurado pelo sorriso de zombaria em sua face vitoriosa. – Pode me ajudar até o carro? – perguntou sem deixar o ator reclamar novamente. – Peço para o motorista Kim o deixar em casa em seguida.

— Minha vontade é te deixar ir sozinho pra tropeçar nos próprios pés e cair – disse entredentes.

— É mesmo? – divertia-se, em especial por receber apenas um grunhido em resposta.

Apesar das muitas reclamações, Zen caminhou atrás do outro com a mão em suas costas, guiando-o ciosamente ao carro onde ambos entraram. Conquanto não o fizesse como Seven, amparando-o no ombro, não parecia menos preocupado. Acima de tudo, o cuidado não tão próximo mais parecia cautela com a imagem do moreno e Jumin o apreciava por isso.

Já sentados no banco de trás, o mais novo podia sentir a tensão no ar. Não por conta do amigo – que inclusive cruzara os braços e ameaçava cochilar a qualquer momento –, mas por toda a situação. Não apreciava em nada a ideia de receber tantos favores sem conseguir retribuir, em especial dele, e por isso detestava com intensidade cada segundo das caronas cedidas pelo outro. Ele não compreendia? Sabia ter boas intenções, mas preferiria dirigir a própria moto. Aliás, talvez Jumin ficasse tão incomodado quanto ele se andasse na garupa de sua moto – a imagem mental o fez soltar um pequeno riso esganiçado, o qual se apressou em abafar no instante seguinte. Por sorte não o havia acordado.

— Como você consegue ficar tão tranquilo assim a ponto de dormir? – Achava graça e se irritava ao mesmo tempo, o rosto inclinando-se em curiosidade.

Na curva seguinte, apesar do cuidado do motorista, um Jumin adormecido escorregara pelo estofado até encostar a cabeça no ombro do menor, o qual fez uma careta de início, mas se conformou. Zen suspeitou que o universo conspirava para pôr em cheque sua paciência, testando ao máximo sua capacidade de suportar situações desconfortáveis. Malditas fossem as leis da física! Mesmo assim, a expressão serena do homem ao lado não lhe permitia coragem de o acordar. Apesar dos pesares, reconhecia seu empenho. Não era de todo, mas mudara um bocado seu comportamento desde a saída de Jaehee da empresa e, mesmo após um dia de trabalho, arranjara tempo para participar da pequena festa para si. Irritante e cabeça-dura como fosse, Han Jumin era, sem dúvidas, merecedor do título de “amigo”, embora negasse com veemência quando lhe perguntassem. Sentiu-se sorrir e agradeceu aos céus por ele estar dormindo. Não suportaria o constrangimento de o fazer em sua frente quando era o motivo do ato.

 

***

 

Sol.

A claridade o aquecia e deixava confortável, sentindo os raios atravessarem as camadas de sua roupa até a pele. Era um dia agradável e experenciava a maior felicidade de sua vida até então. Não só os raios luminosos o aqueciam, mas também a mão de sua amada, a qual segurava como se fosse um pequeno cristal. Logo ao lado, segurando um pomposo buquê de astromélias e rosas amarelas – como o dado de presente em uma de suas apresentações, desta vez com o segundo significado –, estava Jiyeon, mais bela e radiante do que nunca, mais até do que o próprio sol, em seu volumoso vestido branco. Ela, um largo sorriso nos lábios, se aproximou e envolveu os braços num seu, o queixo em seu ombro:

— Esse é o dia mais feliz da minha vida, Zen-a!

Zen sorriu de volta e lhe afagou o rosto, tomando cuidado de afastar o véu para o lado. Encostou a testa na sua ao vê-la fechar os olhos e suspirou, satisfeito consigo mesmo.

— É o meu também, Jagiya.

— Agora já pode chamar de Yeobo? – Riu-se.

— É verdade. – Também se divertiu.

Permaneceram daquele modo por alguns minutos, trocando diminutas carícias, as quais culminavam em pequenas crises de riso, até Jiyeon lhe erguer os olhos cor de âmbar, o coração do homem palpitando com tanta intensidade ao ponto de o fazer temer um infarto. Ambos se aproximavam aos poucos, quase em câmera lenta, até os lábios se encostarem. Massagearam-nos por alguns momentos antes de aprofundar o contato, permitindo o roçar suave das línguas – mais do que volúpia, havia uma sensação de completude no ato, como se enfim atingissem seu objetivo. Imerso em seus sentimentos e sensações, sobressaltou-se ao abrir os olhos. Chegou a pular e recuar para trás, mas uma das mãos – a que não continua o buquê – lhe segurou firme o antebraço.

“É um pesadelo”, pensou consigo, “só pode ser um pesadelo”!

Ali, diante de si, e onde antes havia a formosa amada, encontrava-se um homem alto, moreno e de olhos claros a observá-lo com o tão conhecido sorriso de zombaria. Puxou-o para si num solavanco, deixando-os próximos como antes.

— Vai fugir? Pensei que fosse o dia mais feliz da sua vida, Yeobo.

Não houve tempo, pensamento, escapatória. Não houve reação. Não conseguiu. Quando deu por si, fora abraçado pela cintura e tivera os lábios tomados pelo outro com intensidade, de forma ainda mais profunda que o beijo anterior.

Arregalou os olhos. Sentiu-se sofrer um solavanco e o coração palpitar, mas seus arredores já não eram os mesmos. Desnorteado, Zen custou a se localizar. Ainda estava no banco de trás do carro do amigo. Sentindo um peso sobre o próprio ombro, encontrou sobre ele o mesmo homem cujos lábios pressionavam os seus durante o sonho – pesadelo? –, causando-lhe uma estranheza incalculável. As faces ardiam enquanto ele se esforçava ao máximo para manter a calma, difícil como se provasse, a cena ainda mais desacreditável após a intensidade de seu susto. Como Jumin conseguia dormir mesmo após ter se remexido tanto? Era algum tipo de super poder? Inclinava o rosto de um lado a outro enquanto o encarava, como se uma observação mais atenta lhe pudesse render respostas – muito embora apenas servisse para revirar os sentimentos sem nome criados dentro de si após a peça pregada por seu cérebro. Era euforia? Desgosto? Vergonha? Tudo junto? Lá no fundo, havia uma pequena, diminuta, quase imperceptível parte de si excitada, esta ignorada de pronto, pelo bem de sua sanidade mental.

— Chegamos – disse o motorista, interrompendo sua corrente de pensamentos. Ele olhou para trás e não pôde evitar uma pequena surpresa ao ver o chefe tão pacificamente adormecido. Perplexo, olhou para o outro como se perguntasse qual medida deveria tomar.

— Ei, futuro presidente – Zen moveu o ombro de leve, empurrando-lhe a cabeça. – Chegamos. – Não soube se achou graça ou se irritou ao ver o maior resmungar palavras ininteligíveis e voltar a se acomodar no apoio improvisado, apesar da probabilidade de sentir ambos fosse alta. – Ei, bela adormecida? – provocou, não sabendo ao certo como o acordar, mas nada adiantava. Perdido e num princípio de desespero, voltou a encarar o motorista.

— Sinto muito, senhor, mas poderia me ajudar a levar o Sr. Han até seu apartamento? – perguntou em tom indultário.

Num grande suspiro, o ator se conformou. Passou o braço do outro em torno do próprio pescoço e saiu pela porta aberta pelo motorista. Jumin não era exatamente a pessoa mais leve do mundo, tornando a tarefa difícil. Escorregava-lhe pelos ombros com frequência, sendo preciso o amparar pela cintura. Fosse qualquer outra situação, o ato não lhe causaria coisa alguma além de desgosto, mas a lembrança fresca do sonho acabava por o constranger e frustrar. Infeliz como estivesse, não conseguira evitar a recordação da última vez em que fora preciso amparar um bêbado – ou melhor, duas –. Achou graça. Apesar da dose dupla e de estarem despertas, Jiyeon e Jaehee eram mais leves e, num geral, toda a sensação era diferente. O perfume do moreno era mais amadeirado do que o doce das moças, e seu corpo era mais rígido. Ao puxá-lo para si por uma das mãos pôde sentir também uma certa aspereza, causando-lhe estranhamento. Apesar de tudo, sempre considerara Jumin um riquinho mimado, elas não deveriam ser  macias? Recordou-se de ter ficado com as pontas dos dedos ressecadas quando permanecia muito tempo estudando suas falas, então talvez o manuseio de papel fosse a causa da secura do outro. Perdido em seu devaneio, custou a ouvir Kim a chamar seu nome.

— Minhas desculpas, mas a chave do apartamento está no bolso do Sr. Han.

Perdido, Zen não compreendeu de primeiro a afirmação do outro. “Sim, está no bolso dele, e daí?”, pensou, demorando breves instantes até compreender o pedido implícito. Franziu o cenho. Não bastasse ser babá de bêbado de um homem adulto, precisaria também vasculhar suas roupas em busca da chave; o rolar de olhos foi inevitável. Estalando a língua em irritação, ele puxou Jumin mais para si, procurando uma posição permissível de lhe alcançar o bolso da calça. Ergueu o rosto ao sentir o peso do maior contra seu corpo, dando um passo para trás e precisando estacar o pé no chão a fim de apoio. Não gostava daquela posição. O rosto do moreno havia encostado em seu outro ombro e, precisando esticar a mão até a altura de sua coxa, tudo parecia muito errado quando tirado do contexto – conseguia visualizar Jiyeon e Seven tirando fotos aos risos caso estivessem ali. Desgostoso, tateou com cuidado até sentir o gelado do metal contra seus dígitos. Aliviado, agarrou o objeto e já o retirava do bolso quando sentiu o remexer do mais velho contra si, pânico lhe preenchendo todas as células. Não tardou a ter os olhos claros semicerrados na direção dos próprios. Desorientado, acabou por dizer:

— Bom dia – brincou.

— Ah – grunhiu e levou a mão à cabeça, cambaleando para o lado antes de voltar a ser amparado pelo mais novo. Olhou para o lado e reconheceu a porta de seu apartamento, depois Zen e então seu funcionário. Suspirou. – Pode ir para casa, motorista Kim, está liberado. – Ignorou por completo o olhar assassino do amigo, esperando o terceiro sair de sua visão.

— Não sei se fico feliz ou não por você ter deixado ele ir – desabafou Zen, destrancando a fechadura.

— Oh? – Olhou-o com curiosidade.

— Fico feliz porque já é tarde e você liberar ele quer dizer que tem o mínimo de senso comum. – Abriu a porta num empurrão. – Por outro isso quer dizer que a responsabilidade de cuidar de você é minha.

Jumin divertiu-se com a reclamação indireta.

— Não se preocupe, não deve ser tão difícil agora que eu acordei. – Escorou-se no batente da porta e caminhou até o centro da sala, onde se desequilibrou e precisou se apoiar no encosto de uma cadeira.

— Ei, ei, cuidado! – Fechou a porta às pressas e galgou os passos rumo ao moreno. – Eu não quero ter que correr com ninguém pro hospital, viu? Vai com calma. – Puxou outra cadeira e o ajudou a sentar. – Não era pra você deitar agora? Pessoas bêbadas precisam dormir.

— Eu me sentiria repugnante se dormisse sem um banho – afirmou ao afrouxar a gravata e desabotoar o primeiro botão da camisa.

— Ah, sim. – Abriu um largo sorriso. – Se quiser abro a água fria e te jogo lá dentro, parece uma experiência pra lavar minha alma.

— Não deveria lavar a minha alma, se serei eu no chuveiro? – riu baixo, irritando o outro.

— Se já está engraçadinho assim, pode se virar por conta própria, né? – Suspirou e olhou para o chão, soltando um “ah” baixo. – Eu não tirei os sapatos…

— Não tem problema, eu peço para a empregada limpar o chão pela manhã. – Havia um sorriso a lhe dançar nos lábios, como uma criança com brinquedo novo. – Afinal, você me salvou de derrubar uma cadeira.

— Você é um bêbado muito chato, sabia? – resmungou ao retirar os próprios calçados.

— Não fico bêbado com frequência, agradeço a nova informação – alfinetou.

— Ugh… Olha, você parece ótimo, então toma seu banho e vai dormir. Eu vou pra casa.

Zen já estava na metade do caminho para a saída quando o moreno disse, de longe:

— Espere!

— O que foi agora?! – Virou-se raivoso em sua direção, mas a expressão de zanga não perdurou, pois a de Jumin lhe causava espanto.

O homem antes tão cheio de zombaria parecia perturbado, dolorido, como se carregasse o peso do mundo nas costas. Esfregou as têmporas e, num suspiro cansado, fez menção à cadeira em frente a si.

— Sente-se, precisamos conversar.

Zen não apreciava em nada o tom sério de sua voz, tampouco as feições deprimidas, mas talvez tivesse sido este o motivo de acatar o pedido sem retrucar – uma ocasião rara, digna de lembrança. A expectativa do assunto a ser abordado lhe apertava o peito e o corroía de ansiedade. Sair com Han Jumin definitivamente não lhe fazia bem para a saúde.


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Notas finais do capítulo

[Yuu-Chan-Br]: BÔNUS: Tinha acabado de escrever a cena do Jumin derrubando a bebida, fui almoçar e derrubei minha água na mesa toda. 8D Muito bom. *slow claps* O sonho do Zen foi precioso, PRECIOSO. Mais alguém aí lembra que ele tem sonhos premonitórios? *RI* POIS É, NÉ? Capítulo mais curto, mas o corte nessa parte foi estratégico. ♥ Assim fica com mais emoção! De todo modo, espero que todos estejam apreciando a história até aqui. Como disse antes, o ritmo é lento (6 capítulos e eles nem começaram a se gostar ainda… vish, a essa altura já estava terminando Dream Café), mas não teria sentido correr e acabar forçando a interação deles, não seria agradável nem ler, nem escrever. Além disso, é muito mais emocionante sentir aquela aflição por saber quando algo vai acontecer, não? ♥ ♥ ♥



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