Olá, Happy. escrita por Letley


Capítulo 15
Sexta-feira, 02 de Dezembro de 2016.


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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Olá, Happy.

Eu estou entediado, não porque não tem nada para fazer, mas sim porque não quero fazer nada. Faz dois dias que não vou para escola. Eu só fico aqui, trancado no meu quarto, jogado sobre a cama e olhando para o teto. Esperando de alguma forma que as respostas para as minhas perguntas surjam entre o papel de parede barato com desenhos de dragões do meu quarto (eu tinha dez anos quando o escolhi, só para esclarecer, mas não é como se eu não gostasse dele).

Mavis vem de hora em hora perguntar se estou bem. Tenho mentido para ela, disse que estava resfriado e que me tranquei porque não queria que ela pegasse um resfriado e isso a prejudicasse de alguma forma. Sei que ela notou pelas minhas tosses forçadas que eu estou mentindo, mas ela é gentil demais para fazer algo sobre isso. Eu gosto de Mavis, ela é como uma irmã mais velha para mim, sempre cuidando de mim e me dando conselhos quando preciso. Se casar com ela foi a melhor escolha que Zeref poderia ter feito.

Falando em Zeref, ele veio me ver. É estranho dizer isso porque moramos na mesma casa, mas parece que ele veio de longe para me visitar. Ele tem trabalhado muito ultimamente e não volta para casa com muita frequência, mas ele voltou hoje, achei que ele não ia se incomodar comigo, mas ele usou a chave reserva do meu quarto e entrou sem minha permissão. Eu me cobri com o cobertor e me virei para o outro lado, não queria levar uma bronca dele, mas quando ele se sentou ao meu lado e colocou a mão sobre meu braço foi quase impossível não me sentir culpado por estar preocupando ele.

— Você está bem?

Sua voz estava baixa e vacilante. Era o mesmo tom que ele usava quando eu ainda morava no meu apartamento e ele ia me visitar. Era o mesmo tom que ele usava quando não sabia o que me dizer.

— É só um... resfriado – Respondi, tossindo no meio da frase, tentando a qualquer custo fazer ele acreditar que aquilo realmente era só um resfriado.

— Natsu, por favor – Eu olhei para ele, foi quase impossível não fazê-lo. Meu quarto estava escuro, mas dava para ver que Zeref tinha olheiras enormes embaixo dos olhos, sua expressão era séria e ao mesmo tempo exausta. Por um segundo, ele pareceu o papai – Você não tem que mentir para mim ou para Mavis.

— Desculpe – Foi tudo que eu pude dizer.

Eu não sabia dizer se meu irmão estava zangado ou chateado, até agora ainda não sei. Zeref sempre se chateava quando eu estava chateado, parecia até mesmo contagioso, antes do papai morrer era sempre assim. Se eu estava feliz ele também estava, se eu estava triste então ele também ficava triste, se eu começasse a chorar ele me abraçava e ficava acariciando minha cabeça até eu parar de chorar. Quando eu era criança achava isso o máximo, parecia que de todas as pessoas no mundo eu era a que mais importava, eu me sentia amado e protegido. Mas então eu cresci, meu irmão se distanciou de mim e o papai só brigava comigo o tempo inteiro. Em algum momento entre minha infância e minha adolescência minha família começou a ruir, acho que eu causei isso, sendo teimoso e desobedecendo, ou talvez (só talvez) as coisas tivessem que ser assim.

— É por causa da sua amiga? – Perguntou. Não precisei perguntar para saber de quem ele estava falando.

— Levy não é minha amiga.

Minha voz soou fria e ríspida. Comecei a pensar se eu não estou guardando algum ressentimento contra Levy, mas verdade é que eu quero evitá-la, porque Levy me assusta. A forma como ela está agindo, os olhos sem vida e a vontade que ela tem de morrer, tudo isso me deixa aterrorizado. Levy provavelmente nunca viu a morte de perto, acho que ela não sabe o quão desesperador é ver alguém morrendo na sua frente.

— Achei que vocês fossem amigos já que você ajudou a socorrê-la.

Não respondi, nem precisava. Zeref sabia que esse assunto não iria a lugar algum então ele apenas suspirou esperando que eu dissesse algo.

— Você… Você sente falta do papai? – Perguntei depois de um tempo. Zeref ficou imóvel, parecia estar pensando bem em uma resposta.  

— É claro, sinto muita falta dele e da mamãe também.

Eu não podia dizer que eu sentia falta da nossa mãe já que nunca a conheci, mas sentia sim falta de uma mãe. Afinal, eu nunca tive uma.

— Eu também. Ultimamente, eu tenho pensado muito no papai e de como eu errei com ele.

— Natsu, não foi sua culpa.

— Foi sim – Falei, mas Zeref não ouviu ou fingiu não ter ouvido – No dia em que Levy… bom, você sabe… Quando eu vi ela naquele estado eu só conseguia pensar no papai, eu só consegui pensar que eu poderia ter feito mais para ajudar.

— Foi uma situação difícil, Natsu. Você não tinha o que fazer por ela e muito menos pelo papai, você… Você está bem?

Algo ficou preso na minha garganta e começou a me agoniar, me sufocando, me sufocando, me sufocando. Tive que sentar na cama e pedir para que Zeref abrisse a janela para deixar o ar entrar. Ultimamente sempre que fico nervoso eu tenho essa sensação, é como se uma corda se enrolasse no meu pescoço e começasse a me enforcar. Meu irmão se sentou ao meu lado, passou os braços sobre meus ombros e começou a pedir para que eu me acalmasse, o que lhe rendeu cinco minutos de apenas: “Calma, calma. Vai ficar tudo bem.”

Eu não acho que vai ficar tudo bem, mas eu não tenho coragem de dizer isso a Zeref nem a ninguém. Eles não precisam saber que nada vai ficar bem como eles desejam, que algo ruim sempre vai estar a espreita para estragar tudo.

Mavis apareceu no quarto com um copo d’água e alguns comprimidos. Ela com certeza estava ouvindo toda a conversa, mas eu não tive forças para reclamar com ela e sinceramente isso nem me importava, eu só queria voltar a respirar. De repente os dois começaram a discutir sobre o que fariam comigo, se me levariam ou não a um hospital. Acho que eles estão treinando sua mais nova adquirida paternidade comigo, desde que descobriram que teriam um bebê eles agem assim, cuidadosos e preocupados. Embora eu ache que eles agiriam assim de qualquer forma.

No fim eu não fui a um hospital, apenas tomei os comprimidos que Mavis me deu e voltei a me deitar na minha cama. Zeref continuou do meu lado. Ligamos a TV e ficamos assistindo a um filme qualquer, Mavis resolveu se juntar a nós quando o filme já estava na metade. Não voltamos a falar de Levy ou do papai.

Na verdade, desde que o papai morreu, essa foi a primeira vez que senti que ainda éramos uma família.  

N.D.


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Notas finais do capítulo

Até a próxima ♥