When I Dreamed escrita por Shiroyuki


Capítulo 6
Capítulo 6. trying once and giving up




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6. trying once and giving up

 

Encontros não eram exatamente tão difíceis quanto Yuuri imaginava. Ou talvez, ele apenas não estivesse se esforçando o suficiente para que chegasse a ser algo difícil. Não leve a mal – May era legal. Ela era divertida, engraçada, tinha gostos em comum com Yuuri, afinal, eram ambos bailarinos. Eles já haviam dançado juntos durante as práticas em mais de uma ocasião, ela era ótima. E era bonita também, Yuuri sabia disso. Como esperado, não era difícil estar na companhia dela, assim como não era difícil sair com Phichit, com Yuuko ou com Minako. Isso por si só já deixava uma grande pista de como isso terminaria. Yuuri só conseguia esperar que isso acontecesse da melhor forma possível.

Ela estava agindo de uma forma completamente diferente do dia em que o chamou para tomar o café. Yuuri não saberia explicar, mas ela parecia muito mais hesitante, como se medisse cada palavra antes de pronunciar. E ela estava tão bem arrumada, com um vestido rosa-claro que parecia não ter sido barato, o cabelo ligeiramente ondulado nas pontas, e uma maquiagem discreta no rosto. Yuuri quase se arrependia por ter colocado qualquer roupa, sem a menor consideração com ela.

Ela também corava a cada interação com Yuuri, e então tirava as mechas que caíam sobre a face, parecendo extremamente sem graça. Ela ria de tudo o que Yuuri dizia, e se encolhia, parecendo quase frágil, quando precisava falar sobre algo. Não era difícil ler suas intenções, mas Yuuri ainda tinha suas dúvidas. Afinal, era com ele que ela estava saindo, e ele simplesmente não conseguia conceber a ideia de que alguém, qualquer que fosse, pudesse ter este tipo de interesse em alguém tão simples, sem graça, sem atrativos e entediante quanto ele.

Eles já estavam conversando ao que pareciam ser horas. Yuuri achou que seria rude ficar olhando no celular para contar, mesmo com aquela sensação insistente de que o tempo se arrastava devagar. Depois de tomar o café no lugar em que May escolhera, e comer alguns doces, os dois saíram de lá e foram caminhar na praça que ficava por perto.

Yuuri não se sentia nervoso em conversar – conseguia lidar com interações sociais perfeitamente bem, desde que não envolvesse apresentações em público, com desconhecidos, ou se estivesse sentindo qualquer forma de julgamento ou avaliação das suas habilidades. Essas coisas sempre o deixava destruído por dentro, incapaz de agir naturalmente. Mas uma conversa amigável, com uma pessoa conhecida, em um lugar reservado, com isso ele conseguia lidar.

No entanto, apesar de não ser exatamente desagradável, e de todos os pontos positivos em May, Yuuri simplesmente não encontrava em si qualquer vontade de continuar naquela situação. May tinha olhos azuis – isso foi algo que ele só havia percebido naquele dia. E quanto mais ele olhava, mais sentia que aquele não era o tom certo de azul que ele queria ver. Não fazia o menor sentido, mas esse tipo de pensamento o deixava perturbado.

—  Yuuri?

A voz de May chamou sua atenção, e ele percebeu que ela parecia estar tentando há algum tempo já. Ele automaticamente se sentiu mal. Mesmo quando tentava fazer tudo certo, falhava, e parecia injusto deixar May assim, ainda mais quando ele sabia que nada disso poderia dar certo, e ela parecia ter tantas… expectativas. Mesmo que ele não conseguisse compreender de onde raios ela tirou todo esse interesse repentino em alguém como ele.

— Desculpe, eu me distraí. O que dizia? – ele sorriu, tentando ao menos ser gentil antes do final do encontro. May sorriu em resposta, um sorriso mais comedido do que os anteriores.

— Não era importante, mas… hm, você está ficando mais calado… – ela soltou uma risada embaraçada e nervosa – Eu sei que eu costumo falar sem parar, deve ser chato…

— Não, não, não é nada disso! – Yuuri se apressou em tentar consertar, agitando-se. – Eu estou me divertindo com você, juro! Eu só… eu…

Yuuri se perdeu no que pretendia dizer. As palavras estavam lá, ele só não sabia mais como colocá-las no lugar. Por um segundo, seu mundo parou, quando ele percebeu o vislumbre de cabelos curtos, platinados, refletindo a luz do sol, do outro lado da praça. Aqueles cabelos… ele já havia visto incontáveis vezes antes, não havia como se enganar. Seu coração acelerou, pesando, quase como se estivesse chegando ao seu estômago, e antes que ele pudesse sequer processar a informação, suas pernas já estavam colocando-se em movimento, levando-o na direção para onde ele ia.

Encontrou novamente o dono dos cabelos, em meio a outras pessoas que também andavam pela praça, e avançou na sua direção sem hesitar nem por um segundo. No desespero, não soube como chamá-lo, ou como se anunciar. Apenas segurou-o pelo ombro, ávido por uma chance de ver seu rosto, tão de perto.

O rosto que o fitou, atônito, não era o que ele esperava. Para começar, era uma mulher, magra, alta, de ombros largos. Devia estar nos seus quase quarenta anos, e parecia extremamente aterrorizada, provavelmente pensando que Yuuri estivera prestes a assaltá-la ou qualquer coisa do tipo. Agora que ele podia olhar de perto, percebia que o cabelo dela nem era exatamente do mesmo tom que ele pensava. Estava mais para um loiro extremamente claro do que para o cinza quase prateado que ele estava acostumado a ver cintilar etereamente em seus sonhos.

— D-desculpe-me, eu a confundi com alguém. Perdão. – Ele recuou, encolhendo-se e desejando poder sumir. A mulher riu, sem graça, relevando o assunto e partindo para seus afazeres. Yuuri continuou parado no mesmo lugar, enquanto a via se afastar a passos rápidos, e ele questionava a própria sanidade.

O que ele estava pensando? Que a pessoa nos seus sonhos iria milagrosamente tomar vida e andar pelas ruas assim? Estúpido. Yuuri estava sendo estúpido, e não gostava nenhum pouco dessa constatação.

— Hey, Yuuri, o que foi isso? – Yuuri se assustou ao ser chamado, e só então lembrou de May, e do fato de que havia acabado de abandoná-la no meio da praça para seguir correndo como um louco atrás de uma completa desconhecida. Ela se aproximava rápido, parecendo preocupada.  – Era alguém que você conhecia?

— Não… não exatamente. Eu… confundi com alguém, só isso. – Ele explicou, engolindo em seco. May continuava a encará-lo com um olhar inquisidor que começava a ser desconfortável.

— Você fez uma cara tão estranha quando viu essa pessoa… – May riu, e Yuuri sentiu seu rosto se aquecer. Que tipo de expressão ele devia ter feito? – Seus olhos brilharam de uma forma que eu nunca tinha visto antes. Essa pessoa que você pensou ter visto… é alguém importante para você. Não é?

Yuuri sentiu seu coração martelar, provavelmente pelo exercício não planejado recente, ou talvez pelas palavras de May, mas ele não queria pensar na segunda alternativa; mesmo que estivesse prestes a responder a ela “sim, é alguém importante”. Como poderia! Ele estava falando sobre uma pessoa imaginária, inventada pela sua cabeça, e que ele nunca, jamais, teria a chance de conhecer porque essa pessoa... Simplesmente. Não. Existia.

E essa afirmação mental, tão óbvia na verdade, doeu mais do que deveria.

— Algo assim. – ele não podia deixar May sem uma resposta, não depois de agir com tanta falta de consideração com ela. Ela parecia engolir suas palavras, certamente tentando não ser invasiva demais. Achou melhor não insistir no assunto.

Yuuri indicou o caminho para que continuassem a caminhar, lentamente, pela praça, passando próximo aos canteiros repletos de flores, de todas as cores e formatos. Não sabia mais como retomar o assunto. Parou por alguns segundos, observando calmamente as flores, remoendo o constrangimento recente e desejando apagar aqueles últimos minutos da sua existência completamente. May, ao seu lado, olhava para as flores assim como ele, embora não demonstrasse muita atenção também.

— Sabe, Yuuri… Eu percebi você desde o primeiro dia em que você entrou para o grupo de dança. – Yuuri ofegou, surpreso com a afirmativa súbita de May. Ela ainda não olhava para ele enquanto falava, focada demais nas próprias palavras para notar a evidente surpresa estampada no rosto dele. – Quando você dança… eu simplesmente não consigo tirar meus olhos de você. Sua forma de se mover é única, e eu nunca havia visto ninguém fazer o que você faz. Me arrisco a dizer que você está completamente em outro nível do resto do nosso grupo. Quando você dançou comigo, eu senti essa diferença muito claramente.

Yuuri estava pronto para refutar, mas May continuou a falar sem dar a ele qualquer brecha para interrompê-la.

— Mas… você só faz isso quando pensa que não tem ninguém te olhando. Quando está tão concentrado que não nota nada ao seu redor. Você tem tudo para ser o melhor bailarino daquele lugar, Yuuri. Mais do que isso, você podia já estar em alguma companhia profissional, ao invés de estar perdendo tempo em um grupo universitário que mal consegue lugares para se apresentar. Você devia estar em um palco, sendo aplaudido, e não preso em um lugar sem oportunidades de mostrar isso que existe em você para o mundo.

Yuuri não sabia como reagir diante daquelas palavras sendo dirigidas a ele com tanto furor.

— Você parece a Minako falando… – Ele comentou sem pensar, arrependendo-se logo depois. May tinha tanta determinação no olhar que Yuuri se perguntava onde tudo isso se escondera durante todo o decorrer daquele encontro. Novamente, ela parecia uma pessoa completamente diferente das últimas vezes, e isso confundia Yuuri de uma forma incomparável. Ele nunca havia sido muito bom lidando com mudanças bruscas.

— Você devia ouvir ela de vez em quando. – O tom cortante na voz de May o pegou de surpresa, quando ela finalmente se virou para encará-lo nos olhos. Ok, ela estava realmente furiosa. Era quase igual à sua irmã, quando ele era criança e comia o pudim que ela havia comprado, ou entrava no quarto dela sem permissão para pegar alguma coisa. A comparação o fez ficar com medo, mesmo isso sendo algo irracional. May não iria fazer nada contra ele, afinal… não é? – Eu não estou brincando, Yuuri, eu realmente vi isso tudo em você, e eu te admirei por isso. Mas eu não conseguia entender, por que você não usava esse seu talento para crescer, porque não mostrava isso à ninguém, e continuava a se esconder atrás desses óculos, encolhido e apagado…

Ok, essa doeu, um pouco. Já era a segunda vez naquele dia que alguém questionava o seu modo de vida, e não era nem final da tarde ainda.

— Eu… eu pensei que talvez eu pudesse me aproximar de você. Se nós nos tornassemos amigos, ou.. Ou algo mais… – ela corou furiosamente, e Yuuri só pensava em formas de escapar daquela situação antes que fugisse do seu controle, se é que isso  já não havia acontecido. Ele não era bom lidando com sentimentos, nem com seus próprios, imagine com os dos outros. – Enfim, eu pensei que se eu fosse próxima a você, poderia te ajudar a se abrir mais, se revelar e mostrar isso a todos. Eu… eu quis ser um apoio para você, um pilar, algo assim, você pode chamar como quiser. Pensei que… que poderia…

— May, eu… eu aprecio os seus sentimentos, de verdade. Mas... isso que você quer, eu não sei se seria possível. – Yuuri soltou o ar. Percebia o olhar esperançoso da garota, mas depois de  ouvi-la falar, ele tinha certeza de que além de saber que isso jamais poderia ir para frente, ela estava se iludindo também, idealizando algo que não tinha a mais remota chance de se tornar realidade. Exatamente como você faz, uma vozinha lá no fundo da sua mente o lembrou, e ele sentiu seu coração se apertar com o pensamento. – Você pode ter pensado que compreendia, mas você não me conhece de verdade. Se me conhecesse, estaria decepcionada. Eu não sou essa pessoa que você imaginou, nem um pouco. E mesmo que você me desse esse apoio, eu… – Ele respirou fundo, tentando pensar em uma maneira de falar o que precisava ser dito, sem soar rude ou prepotente. – Eu já recebi esse tipo de ajuda. De amigos meus, da minha família, até mesmo de Minako, e… bem, eu continuo sendo assim, sabe? – Ele deu de ombros, tentando minimizar o impacto das suas palavras – Eu não consigo mudar. Eu estou tentando, mas… isso é algo que eu preciso fazer por mim mesmo, sozinho. Não há como você me ajudar, ninguém poderia, entende? Muito... Muito obrigado, por pensar todas essas coisas de mim. De verdade. Mas… acho que é melhor irmos para casa agora…

May sorriu – sim, ela sorriu, e Yuuri achava isso por si só incrível, depois de admitir tudo aquilo sem nem pestanejar, ela ainda continuar firme daquela forma. Às vezes, ele queria ser um pouco assim, também. Ela pensou por alguns segundos e mexeu nos cabelos, respirando lentamente, como se também estivesse se esforçando para manter a calma.

— Se você já não estivesse apaixonado por outra pessoa, eu teria alguma chance? Seja sincero. – o tom de voz dela era quase brincalhão, mas Yuuri sentiu que parte daquela tranquilidade toda estava sendo forçado. Sabia por experiência própria como era fingir que não se importava tanto e que estava tudo bem, quando claramente não estava. Então, processou o conteúdo daquela pergunta cuidadosamente, e voltou a encará-la, com os olhos franzidos, e a boca aberta tentando formular uma resposta.

— Do que você está…? Como assim? – A confusão no semblante de Yuuri quando ele finalmente entendeu era tão evidente que May não aguentou, e riu.

— Eu estava desconfiada desde o início, já que você não parecia muito focado, e era quase como se estivesse com a cabeça em outro lugar, em outro alguém, mas ficou bem óbvio quando você saiu correndo do nada. Você achou ter visto essa pessoa, não é? A pessoa de quem você gosta.

 May era tão direta que não deixava brechas para ele escapar. Ele tentou responder alguma coisa uma, duas, três vezes, e ela apenas riu de novo, entretendo-se com a falta de coerência e de compostura em Yuuri.

— Não precisa se explicar, Yuuri. Eu entendi bem. – ela o fitou com o canto dos olhos, parecendo muito mais tranquila agora do que alguns minutos atrás. Talvez, ver Yuuri nervoso tivesse de alguma forma ajudado ela a compreender melhor a própria situação. Ou talvez, isso fosse divertido o suficiente para servir como consolo. – Espero que possamos ser amigos, ainda assim, você não acha?

— Ah, claro! Claro! – Yuuri sorriu, aliviado pela primeira vez ao entender que May não guardara mágoas e não parecia frustrada, pelo menos, não tanto quanto ele temia. –Me desculpe por…

— Hey. Se você ousar se desculpar comigo, eu não respondo pelos meus atos…

Ela deixou a ameaça no ar, e Yuuri julgou que seria melhor não discutir. Estendeu a mão para ela, que aceitou prontamente o cumprimento.

—  Amigos, certo?

—  Amigos.

.

.

.

— Quanto tempo faz desde a última vez?

— O quê? – Victor fingiu impecável inocência, como se não soubesse exatamente aonde seu amigo estava querendo chegar.

— Que você trepou.

— Que horror, Chris! – Victor fingiu estar horrorizado com o linguajar do amigo, colocando a mão no peito e se afastando dramaticamente, embora estivesse tão acostumado com Chris durante os anos, que mesmo sua atuação exagerada deixava transparecer facilmente que nada mais que ele dissesse poderia chocá-lo. – Você sabe muito bem que eu não tenho tempo para pensar nisso agora.

Victor adoçou seu café, ignorando o franzir de nariz que Chris fazia ao observar a quantidade absurda de açúcar que ele sempre colocava em tudo o que bebia. A opinião de Chris sobre o seu café e sobre sua vida amorosa eram as últimas coisas na sua lista de preocupações no momento.

Ele havia embarcado na sua espiral de inspiração desvairada, que geralmente consistia em dias de alimentação precária, cafés e energéticos variados e noites em claro na frente do computador, parando apenas para idas ao banheiro e para dar comida à Makkachin, invariavelmente. Isso costumava funcionar e dar muito certo para ele.

No entanto, dessa vez, Yuri estava lá para presenciar todo o acontecimento, e ficar perfeitamente perplexo com a maneira como seu irmão levava a vida. Então, sem qualquer cerimônia, Yuri o chutou para fora da sua própria casa, obrigando-o a tomar um ar puro e se exercitar como uma pessoa normal, e ignorando completamente os protestos de Victor sobre seu fluxo criativo e as excentricidades advindas de um trabalho no ramo das ideias.

Sem poder voltar para casa, com apenas alguns trocados e seu celular no bolso, Victor não viu alternativa a não ser ligar para Chris. Assim, ao menos, ele teria alguém para quem partilhar qualquer ideia súbita que o assolasse durante o tempo de descanso forçado, alguém que de fato o ajudaria a lembrar da ideia depois.

Os dois se encontraram em um café próximo a sua casa, e depois de uma breve conversa sobre o livro, Chris entendeu a intenção de Yuri em fazer o irmão espairecer, e começou a introduzir outros assuntos na conversa, impedindo que ele pudesse falar sobre qualquer coisa relacionada à escrita. Victor se sentiu extremamente encurralado, embora não fosse surpresa alguma o interesse que Chris tinha sobre a sua vida pessoal. Era um defensor muito ávido da teoria de que Victor não aproveitava o suficiente da vida. Além disso, ele costumava ser muito mais despudorado quando eles se encontravam fora do ambiente de trabalho, o que já dizia algo, por si só.

— Eu estou falando sério. – Chris ajeitou os óculos de armação redonda no rosto, com ar superior. Seus cabelos estavam, como sempre, ajeitados naquela desordem natural que deveria parecer casual, mas que provavelmente havia sido minuciosamente planejada. – Um escritor também precisa de experiências reais, e você tem que aproveitar enquanto ainda é jovem, bonito, têm disposição, e um bumbum durinho. Sem falar do cabelo.

— Você não sabe do que está falando. – Victor revirou os olhos. Então, pressionou os dedos no topo da própria cabeça, preocupado. – O que tem o meu cabelo?

Chris riu. Era óbvio que estava se divertindo com tudo aquilo.

— Isso não importa. Você não se sente… solitário de vez em quando, Victor? – Dessa vez, Victor percebeu que ele falava mais sério. Chris podia não parecer, mas no fundo era um grande romântico. Por isso se encaixava tão bem no ramo da literatura. E só porque ele estava apaixonado, em um relacionamento duradouro e estável, que mesmo depois de tanto tempo e ainda trabalhando juntos, continuava a ser empolgante, achava que todo mundo no mundo deveria estar em um assim também. – Antes de Yuri chegar, você vivia sozinho naquele apartamento…

— Eu tenho o Makkachin, ok?

— Ok, com o Makkachin. Mas isso não muda o fato de que você praticamente evitou qualquer interação humana por muito tempo. E você vive para escrever os seus livros, passa meses sem sair de casa direito, pedindo comida não-tão-saudável e assistindo séries de tv de gosto duvidoso. Durante o tempo que nós dois nos conhecemos, você chegou a sair com alguém alguma vez? Fez algum amigo, ao menos?

— Eu… me encontrei com algumas pessoas. Algumas vezes. – Victor moveu seu café em um gesto amplo, e Chris arqueou uma das sobrancelhas perfeitamente alinhadas, com um sorriso que dizia claramente que não acreditava em nada que Victor tentasse dizer ali. – Olha, eu não estou procurando por nada sério agora, ok? Às vezes eu saio com alguém, sem pressão, e isso dura uma noite e tudo fica ótimo depois. Estou bem assim.

Antes que Victor pudesse acrescentar mais alguma coisa, o atendente do café se aproximou da mesa, depositando um cupcake com chantilly cor-de-rosa diante dele. Victor ergueu os olhos, intrigado, e o atendente sorriu encantadoramente. Era um jovem, não devia ser muito mais novo do que o próprio Victor; Tinha o cabelo não muito longo, cacheado e castanho. Os olhos também castanhos, eram muito vívidos. A pele bronzeada acrescentava um charme a mais na sua aparência jovial.

— Eu não pedi por isso. – Victor afirmou, ainda confuso. Chris escondeu uma risadinha debochada com uma das mãos, que Victor fingiu não perceber.

— É uma cortesia. – o homem sorriu mais abertamente, inclinando de leve a cabeça, e piscando os olhos mais vezes do que seria necessário. Ele se afastou, ainda jogando um longo olhar na direção de Victor, e andou com notável excesso de graça até seu lugar no balcão. Victor se sentia estranhamente observado.

Chris encarou Victor com um sorriso que guardava todos os segredos do universo, e arqueou as sobrancelhas sugestivamente. Victor olhou para o prato diante de si. Do lado do cupcake havia um pequeno post-it, com um número escrito e um coração desenhado embaixo.

Ele ergueu os olhos e o atendente ainda o fitava, esperançoso, de longe. Victor sorriu, fazendo uma leve mesura com a cabeça, um gesto quase automático, e percebeu o momento em que o garoto ficou completamente corado, e atrapalhadamente recuou, voltando pelo seu caminho para a cozinha.

— Você não devia brincar com o coração de jovens inocentes assim, Vitya~ – Chris choramingou, apoiando o queixo nas mãos sobre a mesa.

— Eu não estou…

— Então vai ligar para ele? – Chris interrompeu e apontou discretamente para o número. Victor suspirou, encarando o cupcake como se ele fosse a fonte de todos os seus problemas. Aquele garoto parecia interessante, e sua aparência condizia com o gosto de Victor, em geral. Se isso tivesse acontecido há alguns meses, talvez ele tivesse aceitado sem pensar duas vezes.

Agora, ele já não tinha tanta certeza.

— Acho que não. – Victor pegou o cupcake do prato e o analisou por alguns segundos, antes de dar uma primeira mordida. Era delicioso, mas doce demais, mesmo para o seu gosto. – Talvez na próxima.

— Hmm… – Chris murmurou, fitando o amigo com o mesmo ar crítico que ele encarava às obras que estavam sob a sua supervisão. Victor teve a nítida sensação de que estava sendo analisado com a mesma atenção que seus manuscritos recebiam. – Está bem, Victor. Pode me falar sobre o seu livro.

Os olhos de Victor brilharam com a permissão, e ele lançou um dos seus famosos sorrisos animados em formato de coração, com os lábios ainda cheios de chantilly cor-de-rosa.

Sem hesitar nem por um segundo, ele passou o resto do tempo ali no café tagarelando sobre as ideias que tivera, o que pretendia fazer com elas, e sobre o misterioso e adorável dançarino que não saía da sua cabeça.

.

.

.

Quando entrou no apartamento, Yuuri já se deparou com Phichit, sentado no sofá rodeado papéis espalhados, revistas, um bloco de anotações e um tablet que ele usava ao mesmo tempo que o notebook que tinha no colo. Aquela visão era típica nas épocas de trabalhos de final de semestre, mas ainda era cedo para isso, eles ainda estavam no início do período.

—  O que é tudo isso? – enquanto tirava os tênis na entrada, deixando sua bolsa no gancho próximo a porta, Yuuri indagou. Tudo o que queria agora era um banho e a sua cama, mas estava intrigado com aquela visão inesperada. Não era típico de Phichit mergulhar em trabalho se não fosse estritamente necessário.

—  Você não checou o Instagram nem o Twitter hoje não é? Adivinha quem é o mais novo estagiário no departamento de comunicação da universidade? Hm? Te dou três chances.

— Phichit! – Yuuri voou na direção do amigo, empolgado com a novidade enquanto o via se agitar em comemoração, tão sutilmente quanto o material ao seu redor permitia. – Você conseguiu! Isso é incrível! Como foi? Você já tem trabalho para fazer? O que você vai fazer lá?

— Por enquanto, posso escrever algumas matérias para eles avaliarem se é bom ou não, e bem, esses trabalhos braçais típicos de estágio. Cafézinho e xerox. Eu serei um escravo ligeiramente remunerado, basicamente, mas é ótimo para o currículo. Po-rém! Nada disso importa, garanhão! Me fala sobre você, como foi o encontro? Porque você chegou bem mais tarde do que eu esperei, e isso só pode significar que foi bem.

— É, não foi ruim. – Yuuri deu de ombros. Phichit assoviou sugestivamente. – Não, não desse jeito que você está pensando!

— Mas foi bom o suficiente para você querer ficar mais tempo, não? Por acaso foi bom o suficiente para fazer você esquecer do cara do sonho? – ele arriscou. Yuuri fez uma careta, debatendo internamente sobre contar ou não à Phichit sobre seu vexame em praça pública, perseguindo mulheres de meia idade só porque elas platinam os cabelos.

— Não exatamente. May foi sincera comigo, e eu fui sincero com ela também. Decidimos que ficamos melhor como amigos mesmo. Quer dizer, isso foi bem óbvio para mim desde o início…

— Você não sentiu nada? – Phichit indagou, e Yuuri balançou a cabeça negativamente, embora não se sentisse derrotado com essa confissão. – Que pena… quer dizer, eu encontrei o Facebook dela, e ela parecia bem legal. Ela gosta de memes e de cachorrinhos.

— Ela é legal. Só não é… meu tipo, ou algo assim. – Yuuri se ergueu novamente, andando na direção do corredor que levava aos quartos.

— Sei bem qual é o seu tipo.

Phichit resmungou isso para si mesmo, mas Yuuri ouviu mesmo que já tivesse se afastado. Ele não tinha argumentos para negar essa afirmação. Enquanto separava roupas confortáveis para tomar um banho, deixou que sua cabeça mais uma vez se desligasse da realidade. Não podia se dar ao luxo de ficar preocupando-se com problemas pessoais como aqueles. Precisava ter uma coreografia planejada até o final daquela semana, se quisesse ter tempo o suficiente para praticá-la e aperfeiçoá-la para apresentar no evento, e até agora, tinha pouco mais do que nada em mãos.

Yuuri juntou suas coisas e seguiu para o banheiro. Despiu-se e deixou que a água quente relaxasse os músculos que ele nem percebeu que estavam tão tensos. Seus pensamentos mais do que imediatamente, fugiram do seu controle e começaram a vagar.

In Regards to Love havia sido uma grande inspiração, de fato, e ele usaria isso como base para a sua performance. As cenas românticas eram tão bem escritas que Yuuri quase podia sentir como seria apaixonar-se de verdade, e as partes mais ousadas não ficavam atrás. O sentimento de paixão era algo que Yuuri conseguia, em parte, captar a partir da narrativa. Agora, performar um playboy conquistador, que sabe o que está fazendo, que se move sedutoramente, envolvendo sua amada com a intensidade da sua presença… já era algo além da sua capacidade de compreensão.

Isso havia ficado muito claro durante o decorrer daquele dia. Yuuri podia ser reservado e limitado em muitos campos, mas não era bobo. Podia ver durante todo o encontro o interesse de May, e a forma como ela se comportava deixou claro que tudo o que ela queria era que Yuuri tomasse atitudes, deixando brechas para que ele pudesse avançar. Ela provavelmente queria que Yuuri fosse como aquele playboy, e mesmo na hipótese surreal de ele ter algum interesse em cumprir esse papel, sabia bem que jamais teria a capacidade de agir desta forma, ainda que fosse sua vontade. Simplesmente não combinava com ele.

Se fosse um caso onde precisasse escolher, para ser mais sincero, ele se identificaria mais com o papel da donzela. Paciente, esperançosa e relutante de início, facilmente impressionável, mas cabeça dura, ela se deixava ser seduzida e permitia que o conquistador agisse de forma livre, guiando-a nos caminhos desconhecidos de um relacionamento que a surpreendeu em todos os sentidos. Yuuri se sentiria mais confortável sendo guiado por alguém do que sendo este guia para outra pessoa.

Yuuri sentia como se já conhecesse o sentimento de estar nessa posição. As lembranças do sonho mais recente invadiram sua mente sem permissão. As mãos e a respiração do seu acompanhante, que faziam sua pele formigar. A forma como ele parecia conduzir Yuuri, sem a necessidade de palavras, apenas com sua presença, inebriante, envolvente, fazendo com que Yuuri espontaneamente decididisse que precisava de mais…

Seus olhos se abriram em um rompante debaixo do chuveiro.

— É isso!

Yuuri não precisava agir como um playboy sedutor e confiante que conquistava todas as donzelas.

Não quando ele podia simplesmente ser a donzela.


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Notas finais do capítulo

Oi gente~ foi mal pela demora em postar dessa vez .-. eu estive ocupada com alguns problemas pessoais mais atolada em trabalhos, prazos, etc etc, não tive tempo para revisar o capítulo, escrever tá sendo difícil ultimamente, mas as coisas estão melhorando e eu espero não atrasar mais tanto.
Além disso, eu estou meio que sem a disponibilidade da minha beta por enquanto, ela também anda ocupada, então, se houver qualquer errinho, sintam-se livres pra me avisar o/

Enfim~ Yuuri teve seu encontro mais ou menos desastroso, mas que ainda serviu para ajudar a clarear os pensamentos. Já Victor, mais empolgado do que nunca, só consegue focar na sua musa de inspiração~ Espero que estejam gostando da história, vou tentar postar o próximo capítulo, que já está encaminhado, mais rápido para compensar pela demora.
Obrigada! E até logo~ ♥



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