Toujours Pur escrita por Pandizzy


Capítulo 13
Capítulo Doze - Filho da Viúva


Notas iniciais do capítulo

MANO! MANO!
Esse capítulo é dedicado a linda da Lady Herondale que recomendou a fanfic ♥ te amo, lala. Adorei sua recomendação.

Depois de décadas, eu consegui escrever um novo capítulo do Regulus. Yaaaaaaay. Aposto que sentiram saudade do nosso menininho.



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Regulus ajeitou a bolsa em seu ombro, lutando para abrir seu caminho na multidão que se acumulava com o fim das aulas do dia. Ao contrário do que se esperava de um bruxo de quatorze anos, ele ainda não havia entrado na fase do estirão e permanecia tão baixo e magro quanto sempre, sendo obrigado a lutar seu caminho até a Sala Comunal com violência. Ser lembrado do fato de que, na sua idade, Sirius já estava com quase um metro e oitenta de altura não era algo bom e bem-vindo.

Um aluno do sexto ano esbarrou em seu ombro, ignorando-o completamente enquanto ria com seus amigos e jogava seu braço ao redor dos ombros de sua namorada. Regulus olhou para suas costas largas com desprezo, andando para longe.

Ele virou em um corredor mais vazio, sendo capaz de respirar mais livremente sem o ar viciado e o calor de dezenas de corpos se movendo pelo mesmo espaço. Seus olhos logo encontraram a forma nervosa de Severus Snape em sua frente, olhando para trás com desconfiança e ajeitando a alça de sua mochila em um óbvio tique nervoso. Regulus revirou seus olhos e suspirou, sabendo muito bem que iria se arrepender de fazer aquilo.

— Algum problema? — perguntou, parando em frente à Severus.

Os olhos negros do mais velho se ergueram em choque, provavelmente surpreso de alguém estar lhe dirigindo a palavra. Ele olhou ao redor mais uma vez, seu rosto incrivelmente pálido e assustado.

Severus sempre foi uma fonte de curiosidade para Regulus. Ele era um aluno extremamente inteligente, dedicado e seguia às regras com afinco, mas não havia sido feito monitor da Sonserina e era constantemente ignorado pelos professores e superiores de Hogwarts, parecia até mesmo confortado por sua situação na escola. Ele acreditava que o mundo lhe devia algo por todo o seu sofrimento e nunca corria atrás do que desejava. Se não fosse por seu tipo sanguíneo e sua falta de vontade, nada iria impedi-lo de conquistar tudo o que queria.

— Não — murmurou Snape. — Não, estou bem.

Regulus suspirou, analisando Severus de cima a baixo com seus olhos. Ele era magro, magro demais para as garotas desviarem seus olhos de pessoas como Ariel Mulciber e James Potter e olharem para ele com uma atenção mais específica. Essa, talvez, deveria ser sua maior tormenta.

Snape ajeitou sua mochila mais uma vez e olhou para trás, ansioso. Regulus ergueu uma de suas sobrancelhas e sorriu internamente, vendo sua oportunidade perfeita.

— James e seus capangas estão perto da biblioteca — disse. — Então, você deve ficar seguro aqui.

Uma expressão de surpresa tomou o rosto de Severus e sua boca se abriu em choque por alguns segundos antes de suas feições se suavizarem e ele relaxar. Balançou a cabeça e olhou para os próprios pés, incapaz de manter a encarada de Regulus.

— Eu não… — gaguejou. — Eu não sei do que você está falando.

Um sorriso simples tomou os lábios do mais novo e ele mudou o seu peso de uma perna para a outra, suspirando.

Todos sabem que ele está te procurando — disse, simples e livremente como se fosse apenas um comentário sobre o tempo. — Não há o que esconder.

Os ombros de Severus caíram, aceitando seu destino. Não era surpresa que o principal alvo de James Potter era aquele garoto, não seria preciso pensar muito para descobrir o porquê. Snape era fraco, solitário e inofensivo. Era o alvo perfeito. Não tinha amigos leais que poderiam revidar as maldições jogadas em sua pessoa e nenhuma autoridade acreditaria em sua palavra contra os testemunhos de dois puro-sangue com sobrenomes fortes como Potter e Black.

— Eles vão desistir da biblioteca em breve — murmurou Regulus. — Você deveria ir para a Sala Comunal e ficar lá até o jantar, talvez até mais.

O rosto de Severus se fechou e ele cruzou seus braços.

— Por que eu deveria te ouvir? — perguntou, irritado. — Seu irmão é o braço direito de Potter.

Regulus suspirou e revirou seus olhos, incapaz de se sentir surpreso com a fala de Severus.

Era algo que muitos achavam, a eterna maldição de ser o irmão caçula de criaturas grandiosas como os gêmeos. Regulus deveria ser uma versão mais baixa e mais magra de algum dos dois, tão inteligente e elegante quanto Lily ou carismático e popular como Sirius. Seu pai achava isso, certamente, sempre reclamando que o destino havia lhe dado apenas um filho homem que era digno de carregar o sobrenome Black.

— Eu e meu irmão não temos nada em comum — murmurou Regulus. — Somos praticamente estranhos.

Uma memória distinta cobriu sua visão, tampando seus ouvidos com algodão e alterando seus sentidos. Ele se lembrava claramente de ter entrado no quarto que pertencia aos gêmeos durante a quietude da noite, carregando seu hipogrifo de pelúcia, e ver a forma trêmula de seu irmão mais velho deitada sobre a cama da irmã. Ele estava chorando e ela estava tentando consolá-lo.

Naquela noite, como tantas outras noites antes e depois, Sirius havia recebido a ira de seu pai no lugar do irmão, levando a surra que deveria ter sido de Regulus.

— Você me odeia, irmão? — ele sabia que havia perguntado, culpado por não ter sido corajoso como Sirius e ter enfrentado a raiva de Orion.

A resposta não veio do irmão, mas sim de Lily:

Eu te odeio.

Regulus balançou a cabeça e a memória escorreu por sua mente.

Severus estreitou os olhos, desconfiado. Uma mecha de cabelo negro e oleoso caiu em seu rosto, mas ele a ignorou em favor de continuar encarando o mais novo.

— Como eu posso saber se você está falando a verdade? — questionou, o escárnio laceado em sua voz.

— Não pode — Regulus respondeu. — Só precisa acreditar em mim. Se quiser, é claro. — ele piscou duas vezes e levantou seu rosto para poder encarar Snape em seus olhos. — Eu sou seu amigo, não quero te machucar. — ao ver a desconfiança estampada no rosto do outro, Regulus suspirou. — Se preferir continuar se escondendo nas sombras, fique à vontade, mas eu imagino que logo James e Sirius e Peter irão conseguir te achar. Eles sempre conseguem.

Regulus fez como se iria continuar seu caminho, afastando seu corpo do de Severus e ajeitando a bolsa em seu membro. Ele era inteligente e havia sido criado por Walburga Black, alguém que sabia como conseguir o que queria sem ter que pedir gentilmente. Severus ergueu o braço e agarrou seu bíceps, silenciosamente pedindo que ele ficasse.

— Desculpe-me — disse. — É só que… com o Potter e o seu irmão, eu estou sempre alerta. Cada momento de cada dia é uma oportunidade para eles me atormentarem.

— Não se preocupe — respondeu Regulus. — Se você estiver comigo, eles não vão te machucar. Meu irmão não ousaria tocar um dedo em mim. — Severus piscou e o início de um sorriso tomou seus lábios. — Vamos, Sev.

Severus deu um sorriso simples, puxando os cantos de sua boca e se virou, seguindo o caminho que Regulus iria tomar, lado ao lado do irmão mais novo dos famosos Black.

Fazia anos que ele havia percebido que precisava de aliados se quisesse vencer, não importava o que sua mãe achava de que ele era melhor sozinho. Amigos, que iriam trocar suas próprias vidas pela dele. Severus era inteligente, esperto e não havia mais ninguém ao seu lado que poderia rejeitar a influência de Regulus.

Ele poderia provar ao seu pai de que era um filho tão bom quanto Sirius, que era tão digno quanto o irmão mais velho.

Sim, Orion o odiava, mas ele odiava Regulus mais.

Era algo estranho em se pensar. Muitos assumiram que certamente Regulus, o filho leal e dedicado a causa, seria o favorito de ambos os seus pais, mas isso não era verdade. Sua mãe sempre o havia amado, protegendo-o da ira de seu pai e planejando o golpe que iria retirar Sirius da linha de sucessão a fortuna e títulos da família Black. Lily era apenas uma menina, então ela não era uma ameaça.

Mas Orion, oh, como Orion desprezava Regulus. Era quase doentio o ódio que o patriarca sentia pelo filho mais novo. Chamava-o de covarde, tolo e ilegítimo. O último era o que doía mais. Por alguma razão, o pai achava que ele era um bastardo, fruto de uma traição imoral da esposa em vingança por seus próprios casos. Se era verdade ou mentira, não se dava para saber, mas inúmeras vezes, Orion repetia as provas que achava que tinha em uma tentativa de humilhar o filho e a esposa.

Desde criança, Regulus sempre foi uma versão menor e mais simples de Sirius, seu cabelo não sendo tão escuro e sua risada não era tão alta. Alguns achavam isso normal, irmãos precisavam ser parecidos, afinal, mas tudo o que seu pai via eram as coisas erradas em sua aparência, coisas que não deveriam estar ali.

Diferente de Sirius e Orion, os olhos de Regulus eram largos, redondos e castanhos. Ninguém em sua família possuía olhos castanhos e que gritava o quanto ele não pertencia naquele lugar.

Os olhos de Lily eram verdes, uma cor tão rara quanto os seus castanhos, entretanto ela parecia com Lucretia, então Orion não se incomodava com ela. Além do mais, Lily era a filha favorita do pai. Regulus não tinha essa sorte.

Sirius também não tinha, porém havia algo no mais velho que o diferenciava do irmão. Era inteligente, carismático e bonito, garotas puro-sangue iriam se matar para ter a chance de carregar seus bebês, dizia seu pai. Um verdadeiro herdeiro, digno do nome Black. Ele poderia ser desafiador demais para os gostos do patriarca ou ter se desviado do caminho certo, mas ele ainda vivia no Largo Grimmauld, ainda estava na tapeçaria na parede. Ele ainda era seu filho.

Regulus, no entanto, ninguém tinha certeza.

Sua mãe nunca havia dito sobre os comentários de seu pai sobre sua possível ilegitimidade, ela nunca o defendia, mas também nunca concordava.

Faria sentido, não faria? Walburga não confiava em Sirius, dizia que ele era igual ao pai, teimoso e irritado, um perigo para o legado da família Black, mas ela amava Regulus. Amava-o com todo o seu coração, como uma mãe deveria amar. Faria sentido se ela quisesse que o filho de seu amante, alguém que realmente lhe amava e que queria ter filhos com, fosse o novo chefe da família. Seria a sua vingança final contra Orion.

Ela só nunca havia perguntado à Regulus se ele realmente queria suceder seu pai.

***

Suor escorreu pelo rosto de Reggie, infiltrando sua camisa de algodão e descendo por seu peitoral magro. A atmosfera ao seu redor estava pesada, úmida e o humor de todos se igualava ao clima. Duas vezes, Emmeline Vance se irritou com os suspiros cansados das pessoas ao seu redor e mudou de lugar, bufando enquanto puxava suas coisas e caminhava para alguma outra mesa com lugares vagos.

Na terceira vez, Regulus a observou em silêncio, olhando-a virar o rosto irritado ao procurar por uma cadeira vazia. Quando percebeu que a única mesa disponível era a de Evan Rosier, no entanto, seu rosto se empalideceu e seus olhos se arregalaram. A atmosfera estava quieta enquanto Emmeline saía de biblioteca rapidamente e se direcionava ao dormitório da Sonserina, sem dúvida.

Ninguém se sentava perto de Evan Rosier. Era quase uma regra.

Talvez fossem as pedras que destruíram sua noção de certo e errado, ou talvez ele sempre foi assim, mas todos sabiam que havia algo muito doente em Evan Rosier, sua mente era corrompida. Ele não se importava com possíveis punições, apenas com o próprio prazer.

Homem ou mulher, primeiro ou sétimo ano, todos estavam na mira de seu toque invasivo. Na primeira vez, você nem esperava que isso acontecesse, estava estudando com calma quando sentia um toque gelado subindo por sua coxa e a vergonha queimava suas bochechas. Não importava o quanto você pedisse para ele parar, ele não parava, e não adiantava reclamar para os professores. Todos respondiam ao diretor e Cygnus Black III não iria fazer nada porque o garoto era puro-sangue.

Regulus respirou fundo, vendo mais e mais seus colegas saírem da biblioteca, procurando algum refúgio do calor. Ele tentou se lembrar de um dia quente como aquele, escondido do tempo em alguma casa de sua família no norte da ilha, participando de algum jogo que Lily e Sirius inventaram, era a primeira vez que eles deixavam o irmão mais novo participar de suas brincadeiras…

Piscou e a memória foi embora, escondido no canto mais escuro de sua mente. Ele olhou ao redor, percebendo que apenas um punhado de pessoas continuavam ali e respirou fundo mais uma vez. Percebia que não conseguia absorver o ar, relaxar e fazer o que era preciso. Estava com medo e não gostava disso.

Olhou para o relógio em seu pulso. 11:45. Estava na hora.

Regulus se levantou, agarrando o livro em sua frente e andou até uma estante alta e larga atrás do lugar em que Evan Rosier estava sentado. As mãos do mais velho estava relaxadas em seu colo e ele nem pareceu perceber a aproximação do outro, tão imerso em seus pensamentos quanto estava.

Ele parecia diferente da última vez em que conversaram, duas semanas antes. Naquele dia, Evan estava sofrendo abstinência de suas pedras e seu corpo mostrava os efeitos com uma aparência doente e moribunda, mas agora, ninguém iria desconfiar que ele era um viciado. Seu rosto havia ganhado uma cor nova e saudável, seus olhos perderam seu brilho insano e suas veias se tornaram um cinza suspeito, não tão como o preto alarmante de antes.

Um sorriso tomou os lábios pálidos de Rosier quando Regulus colocou o livro que segurava na estante e pegou outro, fingindo ler e tentar entender suas palavras.

— Black — disse, em cumprimento.

— Rosier — respondeu Regulus, escondendo seu rosto com a capa de couro do livro.

— Em que posso te ajudar? — murmurou. Estavam falando baixo o suficiente para que ninguém mais os ouvisse.

— Tínhamos um acordo — disse, erguendo os olhos para ver se ninguém os estava observando. — O livro da minha irmã.

Evan fez um som de concordância no fundo de sua garganta e virou a página do livro aberto em sua frente.

— Sim, sim. Eu me lembro disso. — ele tocou o próprio queixo, aproximando seu rosto da página de pergaminho em sua frente como se estivesse tentando entender as palavras escritas ali. — Quer fazer a troca agora?

O fôlego deixou o peito de Regulus. Não estava esperando aquilo. Gostava de planejar as situações antes de acontecerem, imaginar o que cada pessoa presente na sala iria fazer no próximo segundo e como poderia reagir a isso. Era o seu mecanismo de defesa para sobreviver com sua mente e corpo intactos em sua família, sabendo exatamente o que seu pai ou Sirius iriam dizer e as caretas que Lily faria em reação.

Evan Rosier, no entanto, sempre o surpreendia.

— Sim — respondeu Regulus, segundos depois de ter se recomposto. — Está com você?

— Obviamente — disse Evan. — Não posso deixar no dormitório ou Mulciber e seus puxa-sacos iriam desconfiar e acabar investigando. Carrego comigo o tempo todo.

Regulus desviou levemente o olhar do que estava segurando e direcionou sua visão para a mala aberta de Evan. Estava praticamente vazia com apenas um livro e um lápis solitário dentro da escuridão. O livro era novo, a edição mais recente da edição didática exigida para a aula de Poções Avançadas, e extremamente familiar. O livro de Lily.

Percebendo o interesse de Regulus, Evan empurrou a mochila para baixo da mesa com o pé e virou o rosto levemente para que o mais novo pudesse ver seu sorriso maldoso.

— Você está com as pedras? — perguntou entre sussurros.

— Não — respondeu, suspirando. — Não posso carregar pedras de Morgana por aí.

— Pode sim — murmurou Evan. — Você é puro-sangue e um Black, ainda por cima. É praticamente intocável.

Regulus preferiu não responder a isso. Ele sabia que era verdade, mas achava que seria melhor não falar nada para não parecer que estava se gabando.

— Podemos fazer a troca amanhã — comentou, colocando o livro na estante e pegando outro. — Depois que as rondas acabarem, nos encontraremos na sala de transfiguração.

Evan se levantou, fechando o livro e sua mochila. Ele sorriu, aproximando seu corpo do de Regulus e tocando em sua cintura. Sua respiração era quente ao bater contra a nuca do mais e trazia ao arrepios ao seu corpo.

— Mal posso esperar — murmurou, descendo sua mão um pouco mais e apertando a carne que encontrou. Regulus estremeceu.

Quando ele foi embora, o calor de seu toque permaneceu, marcando a pele do Sonserina. Regulus engoliu em seco e ajeitou suas vestes, olhou ao redor para se assegurar de que ninguém havia visto essa altercação e respirou fundo.

Decidiu sair da biblioteca. Não havia mais motivo para estar ali, havia entrado simplesmente para poder conversar com Rosier e sua conversa já acabou. Respirou fundo e saiu do corredor em que estava, virando em uma estante extremamente familiar, querendo andar logo para as largas portas de madeira da biblioteca.

Ao virar, no entanto, ele se deparou com a figura alta e esguia de sua irmã. Lily estava usando um rabo de cavalo alto e o uniforme feminino da Sonserina, além de saltos altos que a deixavam ainda mais alta do que normalmente era. Seus lábios pintados de vermelhos estavam curvados em um bico desconfiado e estreitava os olhos, analisando o irmão de cima para baixo.

— O que você pensa que está fazendo? — perguntou, cruzando os braços e apoiando seu peso inteiro em uma das pernas.

Regulus parou de andar e olhou ao seu redor, sem saber o que fazer ou o que dizer.

James Potter, que estava sentado na mesa ao lado deles, lhe deu um sorriso encorajador. Lily deveria estar com ele antes de se levantar e interromper o caminho de Regulus, provavelmente discutindo algo sobre a monitoria ou os monitores em si. Seu cabelo estava bagunçado e seus óculos tortos, mas sua blusa estava passada e completamente abotoada, além de usar uma gravata vermelha e dourada com um nó perfeito. Era como se ele quisesse impressionar alguém.

— Saindo da biblioteca... — tentou dizer, erguendo uma sobrancelha e fazendo uma careta.

Lily revirou os olhos. Havia um largo hematoma roxo em sua bochecha esquerda. Regulus havia ouvido sobre como Ariel Mulciber havia perdido a paciência e batido na sua irmã, sobre como tio Cygnus não iria fazer nada e sobre como Lily havia recusado as poções de cura de Madame Pomfrey para o seu rosto, preferindo que todos vissem o que ele havia feito nela. Por praticidade, contudo, ela permitiu que curasse seu braço, mas Regulus suspeitava que não teria caso não o precisasse para escrever.

— Sim, eu percebi, mas o que está fazendo falando com alguém como Evan Rosier? — murmurou. — Ele é um viciado, Reggie. Extremamente perigoso e imprevisível.

Regulus bufou. A irmã havia criado o apelido Reggie quando tinha apenas dois anos, alguns meses após o nascimento do mais novo quando tentou dizer seu nome e falhou miseravelmente. Era fofo e ele o odiava completamente.

— Sim, obrigado, Lily — disse, apertando seus pulsos. — Eu posso cuidar de mim mesmo.

— Não, não pode — respondeu de maneira superior. — Ainda é jovem. Irresponsável, inconsequente. Não sabe o perigo que é ser visto com alguém como Rosier, mesmo ele sendo puro-sangue. Tem sorte de ter sido eu e James que lhe vimos, não outra pessoa.

Regulus piscou. James? Desde quando sua irmã chamava Potter de James? Ele a encarou por alguns segundos, tentando ler sua expressão. Não era tão bom como Sirius nesse quesito, mas poderia se virar. Os olhos de Lily estavam arregalados, suas bochechas coradas e ela olhava para o lado em busca de apoio do Grifinória.

Mas é claro…, pensou.

— Você não sabe de nada — murmurou. — Minha relação com Evan Rosier é perfeitamente normal.

— Por favor, — respondeu ela. — Tem que ser mais esperto do que isso. O que o papai e a mamãe pensariam se soubessem? O que Sirius pensaria? Ficariam decepcionados, tenho certeza.

Regulus não se importava nem um pouco com o que Sirius pensava, mas Lily se importava. A única pessoa que ela amava no mundo além de si mesma era o irmão gêmeo, então não era uma surpresa ela incluí-lo na sua fala.

Muitos anos antes, quando Lily e Sirius ainda não haviam brigado, tia Lucretia comentou como ela achava que os dois eram uma pessoa só, dividida pela natureza em dois corpos. Era um comentário simples, um comentário para ser dito e logo esquecido, mas a ideia ficou presa na mente de Regulus e o fez observar. Os gêmeos ficavam perdidos quando separados, agindo como se não soubessem mais como viver sem o outro. Compartilhavam suas dores, seus sentimentos. A briga que os separou deveria ter sido como um veneno que agia de maneira demorada, lentamente os matando.

Lily estreitou os olhos ainda mais e inclinou seu corpo, abaixando-se até que sua linha de visão estivesse na mesma altura que a de Regulus.

— Você não me engana, Regulus Black — murmurou. — Sei que está planejando algo e eu vou descobrir o que é.

Regulus preferiu não responder, achava que passaria uma mensagem melhor se ficasse quieto. Ele desviou de Lily e continuou seu caminho, ignorando quando ela continuou a encará-lo, queimando um buraco em suas costas com a intensidade de seu olhar.

***

Ele encontrou Severus no limite da Floresta Proibida.

Snape estava encostado contra um árvore larga, brincando com a varinha entre seus dedos longos e assoprando com a boca em uma tentativa falha de afastar as mechas oleosas de seu cabelo de caírem em cima de seus olhos. Regulus se aproximou tão silenciosamente quanto pôde, enfiando as mãos nos bolsos das vestes e olhando por cima do ombro para ver se alguém o seguia.

— Oi — disse quando estava em frente à Severus.

— Está atrasado — respondeu o outro, sem olhar para ele. Regulus revirou seus olhos e suspirou.

— Sim, estou ciente disso — falou. — O velho Slug me prendeu na sala por mais meia-hora, não consegui sair antes.

Severus ergueu seu queixo e franziu o cenho.

— Por que ele te prendeu? — perguntou, endireitando seu corpo e guardando a varinha.

— Não importa agora — respondeu. — Eu falei com Rosier. Vai acontecer amanhã à noite.

Severus piscou, seus cílios curtos e negros se misturando em uma linha rápida e escura. Ele lambeu seus lábios ressecados e brincou com os próprios dedos, o cenho ainda franzido. Regulus o observou em silêncio, sabendo muito bem que logo Snape iria dar voz às suas preocupações.

— Não tenho certeza se deveríamos fazer isso — murmurou, nervoso. — É muito perigoso. Alguém poderia descobrir…

Regulus bufou.

Ninguém vai descobrir se formos cuidadosos, Sev. — ele tocou na bochecha do mais velho, forçando-o a olhar em seus olhos. A pele dele era gelada ao toque, estranha. — Somos cuidadosos, está bem? Tivemos anos de planejamento para esse momento. Não iremos arruinar tudo isso agora sendo descobertos.

Severus piscou algumas vezes e suspirou, cansado.

— Eu sei, mas… — ele deu de ombros. — Lily está desconfiando. Eu a ouvi falando sobre isso com Potter.

Regulus ergueu uma sobrancelha e cruzou seus braços.

— Ainda está espiando a minha irmã? — questionou. Severus não respondeu, mas suas bochechas coradas foram respostas suficientes. — Olha, eu já te disse que não me importo com sua paixão por ela, mas você precisa tomar cuidado. O que você acha que Sirius iria fazer se descobrisse?

De maneira proposital, Regulus omitiu o fato de que Lily também não iria ficar extremamente feliz com a ideia de Severus Snape estar lhe seguindo, ouvindo suas conversas e sabe se lá o que mais. Não iria ajudar com os seus planos.

— Sirius quer te afastar dela. Não te acha digno o suficiente para cuidar de Lily, deseja que ela se case com James Potter. — sua voz estava cheia de escárnio e ódio quando disse as últimas duas palavras. — Você se lembra, não se lembra? No playground em Cokeworth, quando ela quebrou a perna e ele te impediu de ajudá-la? — Regulus não havia ido visitar sua tia naquelas férias, mas ele sabia o suficiente sobre o que havia acontecido. — Aquele dia poderia ter sido o primeiro dia de seu romance com Lily se meu irmão não tivesse se intrometido.

Os olhos de Severus ficaram tristes e seus ombros caíram. Regulus nunca implantava coisas novas na mente de Snape, apenas dava forças àquelas que ele já pensava.

— Isso não importa agora — continuou dizendo, retomando o assunto anterior. — Vai acontecer amanhã à noite, não teremos outra oportunidade tão boa como essa.

— Estou ciente, mas… nem sabemos mesmo se realmente é um dos ingredientes.

Eu sei — murmurou Regulus. — Vi a minha irmã fazendo inúmeras anotações sobre o sangue do Filho da Viúva, sobre o seu poder. Seria idiotice não ser. — suspirou, cansado de toda aquela conversa. — Trouxe o que te pedi?

Severus pegou algo no bolso de suas vestes e puxou, empunhando alguma coisa curta e fina enrolada em uma toalha velha de cozinha. Regulus não respirava ao ver a gloriosa forma tocar seus dedos enquanto pegava o objeto e retirava os trapos sujos que a enrolavam, estava ansioso demais para isso, com batimento cardíaco acelerado e mãos suadas.

Era uma adaga. Uma adaga simples e enferrujada, mas perfeita para os propósitos de Regulus. Em uma de suas pontas, havia uma lâmina metálica e afiada com uma curva perversa, na outra, havia um frasco circular e transparente, perfeito para comportar o sangue mágico absorvido de alguma vítima infeliz.

— Foi caro? — perguntou Regulus, maravilhado com a arma.

— Não — respondeu Severus. — Imaginei que seria, mas Borgin parecia ansioso para se livrar disso. Dá má sorte, disse.

— Claro que dá má sorte — retrucou o mais novo. — Isso mata pessoas.

Severus riu, rouco, mas o rosto de Regulus continuou impassível. Depois de alguns segundos com apenas a risada de Severus preenchendo o silêncio entre os dois, o garoto percebeu que deveria ficar quieto.

— Confio em você, Sev, para me ajudar amanhã. — Regulus deu um sorriso, mas seus olhos estavam frios como aço. — Não vai me decepcionar, vai?

Severus suspirou e a preocupação derreteu para fora de seu rosto.

— Nunca.

Regulus olhou ao redor, estava com a sensação de estar sendo observado. As sombras feitas pela árvores nublavam sua visão, prejudicando-a, e o som distante de centenas de centauros galopando pela floresta impedia que ele conseguisse identificar qualquer respiração estrangeira e que não pertencia ali.

— Deve ir agora — murmurou. — Vão acabar desconfiando se ficarmos muito tempo escondidos aqui.

— Entendo — disse o outro. — Te vejo na Sala Comunal.

Severus saiu e Regulus permaneceu, imaginando que iria atrair menos atenção se ele fosse alguns minutos depois do colega. A irritante impressão de estar sendo observado não saiu da parte de trás de sua nuca enquanto olhava os ponteiros de seu relógio se moverem lentamente pelo espaço.

Ele se desencostou da árvore em que estava apoiado e deu um passo para frente, querendo se desvencilhar das sombras e voltar para o terreno conhecido de Hogwarts. Entretanto, um braço forte e musculoso se prendeu em sua cintura, o puxando contra um corpo quente enquanto uma mão suada tampava sua boca, impedindo que qualquer grito por ajuda escapasse de seus lábios.

— O Lorde das Trevas marca uma reunião com você para daqui a três dias, ao amanhecer, no Cabeça de Javali — disse uma voz que era extremamente parecida com a de Rodolphus Lestrange, o marido de sua prima Bellatrix. — Recuse-se e será considerado um traidor. Conte a alguém e perca sua vida por isso. Não se atrase.


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