O Pecado de Cyn _ Crônicas do Olho Azul DEGUSTAÇÃO escrita por Félix de Souza


Capítulo 1
Prólogo




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Rastejando profundamente em sua alma
Uma vida que diminui
Equilibrado na extremidade do desprezo
Para quem você irá rezar?
City Of God _ Sodom.

 

Minha lembrança mais antiga foi quando eu cometi o erro de chamar o senhor Gilles, de tio.

— Tio? _ Ele me perguntou, com um sorriso que eu aprendi a temer daí em diante. Um meio sorriso, de olhos vazios.

— Eu não sou seu tio, meu garoto. _ Nesse momento ele praticamente me carregou pelas orelhas em direção à jaula do leão.

— Sou seu dono!

E assim, ele me jogou em direção as grades da jaula, o leão estava faminto, o leão sempre estava faminto. Eu me choquei com as grades e o leão se lançou demente contra elas do outro lado. Por sorte o impacto do meu corpo, mais o impulso do leão contra ela me jogou para trás e para longe das garras do animal. Cai de bunda no chão, talvez eu tenha chorado não me lembro dos detalhes, mas lembro do medo, lembro-me da gargalhada de Gilles e do olhar assassino do leão.

Depois disso passei o dia todo limpando as latrinas e aos quatro anos de idade eu descobri o sentido da vida.

A vida é uma merda e meu trabalho era limpar o mundo.

* * *

O senhor Gilles D'Arc era o dono e mestre do picadeiro do fabuloso circo de aberrações, Desidia Circus.

Circo itinerante, que circulava por todo o reino de Sodom, minha terra natal.

 Os membros dessa trupe foram de certa forma minha primeira família, sendo o senhor Gilles nosso padrasto, por assim dizer.

De fato ele era nosso dono para todos os fins práticos, todos foram vendidos ou abandonados a ele.

No principio e durante muito tempo, éramos quatorze membros na trupe. Eu fui vendido muito pequeno a Gilles, tanto que são no circo minhas primeiras lembranças. Ainda pequeno eu fazia trabalhos braçais, depois eu vim me tornar palhaço e arremessador de facas. Não que eu fosse bom com facas, mas você vai entender.

Gilles D’Arc era o mestre do picadeiro e nosso senhor. Uma personalidade terrível e odiosa que me sustentou e nutriu nos primeiros anos de minha vida. Sempre fantasiado de Alerquim, às vezes tinha a forte sensação que aquele era seu rosto e aparência verdadeiros, o rosto extremamente pálido e o sorriso congelado.

A trupe era composta pelos trigêmeos infernunitas, Malacoda, Alichino e Rubicante.

Infernunitas são pessoas que supostamente nascem com sangue demoníaco e vivem a margem da sociedade, por motivos óbvios.

Malacoda tinha uma cauda em forma de lança, e era como um membro extra e movia e com ela podia mover e manipular objetos. Era o malabarista. 

Alichino nascerá com asas coriáceas, mas em algum momento de sua vida elas se quebraram. Ele não podia exatamente voar, mas podia plainar com ela, oque era útil para função que exercia. Era o trapezista, e não era bom nisso. Esperava-se que ele caísse, ele sempre caia, mas como podia plainar...

 Rubicante era todo vermelho, sua aparência não permitia que saísse sequer do circo para fazer compras sem causar alvoroço, mas o dom de Rubicante era ser imune ao fogo. Era o engolidor de fogo, que soprava e engolia chamas, e muitas vezes se incendiou no picadeiro, pois também era um desastre nisso. A plateia sempre aplaudia.

Os três possuíam um rosto cônico, olhos amendoados e cabelos encaracolados, de cor castanha, não fosse suas deformidades seriam rapazes até de boa aparência.

De algum jeito, Gilles conseguiu um filhote de Yeti.

Chamávamos de Calcabrina e ele vivia doente por causa do clima quente de Sodom, mas mesmo doente e ainda filhote era de uma força descomunal. Era o levantador de alteres.

Os palhaços, dos quais eu de vez em quando fazia parte e quando digo fazer parte quero dizer que quando Gilles estava entediado ou aborrecido comigo mandava eles me darem uma surra pública, eram três.

Cagnazzo, um Gnoll anão, que foi rejeitado pela tribo ainda pequeno e vendido a Gilles, pois nasceu com nanismo.

Barbariccia, um anão autêntico das montanhas, que Gilles encontrou mendigando em Judeca, e o “contratou” em troca de comida e abrigo. Sua barba era um arremedo ruivo de pelo facial sempre irregular, sua idade era difícil de definir. 

Farfarello, de longe a criatura mais sinistra do circo, pelo menos era o que eu pensava na época.

Farfarello era um duende e o motivo dele trabalhar no circo me era um mistério naqueles dias.

O circo também contava com dois loucos.

Porque as pessoas adoravam ver loucos fazendo coisas aleatórias e perigosas, eu nunca entendi direito, mas eles eram postos muitas vezes para lutar entre si e isso gerava apostas, o que por sua vez gerava lucro para Gilles. Muitas vezes sai ferido de tentar impedi-los de se matarem. Eram loucos violentos e lunáticos.

Chamavam-se, Graffiacane e Ciriatto.

Graffiacane a primeira vista parecia normal, alto, magrelo, cabelos negros, sempre com a barba á fazer, mas tinha um ódio irracional por cachorros. Certa vez o vi comendo um vivo, uma cena capaz de acabar com a sensibilidade de qualquer um cedo.

Ciriatto não tinha nada de normal. Tinha uma aparência medonha, gordo, calvo, com um nariz largo e torto para cima que lhe rendeu o apelido de porcalhão. Também porque não cuidava da higiene pessoal e sempre lutava se tivesse que tomar banho.

Outro membro, o Libicocco, era nosso, bem, era nossa mulher barbada. É difícil de definir.

Tinha voz de homem, barba de homem e corpo de mulher. E acredite ou não, mais de uma vez eu vi pagarem por uma noite inteira na sua companhia, certos cavalheiros respeitáveis, como Gilles gostava de dizer. Na época eu não entendia por que.

Draghignazzo era nosso leão de chácara.

Era forte, silencioso e feio que nem um iguana. Draghignazzo era uma espécie de homem lagarto, era humanoide e fora isso não tinha nada de humano. Era o único que Gilles parecia respeitar, talvez até pagasse pelos serviços.

Já, Scarmiglione era meu parceiro de show.

Eu era o arremessador de facas e Scarmiglione, ou se você preferir, Scar, era um meio Troll e ficava preso na roda.

Entendeu agora?

Não importa se eu não era bom com arremesso, ele se curava. Pobre Scar, esperava-se que eu o acertasse.

De uma forma meio estranha, Scar foi meu primeiro amigo. Eu não entendia como que raios, alguém podia ser meio Troll.

Quer dizer, trolls e humanos não se cruzam de forma alguma, se é que você me entende.

Ele nunca falava sobre isso.

E essa era minha noção de família, nos odiávamos a maior parte do tempo, e tudo ia bem como um passeio no inferno até os meus sete anos de idade, quando tudo mudou.

Foi quando Catherine Deshayes entrou em nossas vidas.

Num desses passeios no inferno, um de nós ficou a beira da morte e providencialmente, ela apareceu para salvar o dia.

Madame Deshayes. Vidente e Alquimista.

 


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Notas finais do capítulo

Essa história surgiu como um background de um personagem para um jogo de R.P.G.
Como a campanha demora a sair, resolvi arriscar em fazer oque eu chamo de O Background mais detalhado de todos os tempos.
Porque, se você joga R.P.G, quantas vezes você viu o personagem órfão, treinado na espada pelo pai guerreiro e na magia pela mãe feiticeira?