Hard Times escrita por fckfic


Capítulo 2
Nuvem Negra


Notas iniciais do capítulo

Aqui está o segundo capítulo. Espero que gostem!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/731645/chapter/2

As conversas a seguir entre Fausto e Felipe/Yasmin e Yuri estão em paralelo. Portanto, Fausto está conversando com o Felipe, ao mesmo tempo em que Yasmin está conversando com Yuri e as perguntas e respostas são intercaladas. Espero não ter confundido muito a cabeça de vocês. Qualquer dúvida deixe nos comentários.

 

(Felipe) – O que aconteceu? Como assim vocês vão se divorciar?

(Yasmin) – Não foi uma decisão tomada do dia pra noite meu filho. É algo que vem acontecendo há muito tempo, mas só agora resolvemos tomar uma decisão quanto a isso.

(Fausto) – Só queremos ser um bom exemplo pra você e o seu irmão. Como vamos desejar que vocês lutem pela felicidade se nós mesmos não fazemos isso?

(Yuri) – Eu pensei que você estava feliz. Que vocês eram felizes.

(Felipe) – Isso não tá certo. Eu nunca vi uma briga séria entre vocês dois. Tudo sempre é tão calmo. Como acabou do nada?

(Yasmin) – Sempre tentamos esconder nossos problemas de vocês. E nem era preciso, parecia que vocês estavam dormindo e não conseguiam enxergar o que acontecia.

(Fausto) – Eu vou morar por um tempo no apartamento do seu tio Carlos que estava alugado. Sua mãe ficará com a casa e vocês irão morar com ela. Quando eu conseguir um lugar mais apropriado, vamos decidir os dias que vocês ficarão comigo e todo o resto.

(Yuri) – Foi por minha culpa?

(Felipe) – Foi por culpa dele?

(Yasmin) – Claro que não. Como pode pensar isso? Nós te amamos tanto. Se há algum culpado, somos nós. Seu pai e eu. 

(Fausto) – Vamos conseguir passar por isso campeão. Continuamos sendo seus pais acima de tudo.

(Yuri) – Eu te amo tanto. O que mais desejo no mundo é a sua felicidade, seja ela qual for.

Não foi uma conversa tão esclarecedora. Afinal, há algo que possa explicar como duas pessoas num dia se amam e no outro se separam? Os meninos iriam sofrer, apesar de qualquer coisa que tenha acontecido no passado. Foi um golpe perceber que brigavam tanto ao ponto de perceber que seus pais também não estavam em paz.

Felipe assim que se lembrou do encontro que tinha com Beatriz, mandou uma mensagem pedindo desculpas e avisando que tinha alguns problemas de família. O problema é que já passava das 21:00 e a garota tinha certeza de que havia sido abandonada e aquela mensagem não passava de uma desculpa esfarrapada.

Yuri foi para o seu quarto e desabou em lágrimas. Apesar da negação da mãe de que ele era o responsável pelo fim do casamento, não conseguia deixar de pensar que sim, ele era o culpado.

A nuvem negra pairou sobre a família Barreto assim que Yuri aceitou sua homossexualidade. Em seu aniversário de 13 anos, ele chamou a mãe para uma conversa e disse por fim tudo o que sentia. Yasmin, chorando compulsivamente, o abraçou forte como nunca antes. Ela já presumia a orientação sexual do filho e apesar da criação religiosa, não o abandonaria de jeito nenhum.

O grande problema era contar para Fausto. O pai sempre se orgulhava quando Felipe, no auge de seus 15 anos, o mostrava alguma garota com quem ele estava ficando. Dizia com orgulho que o filho era um homem de verdade e fazia questão de deixar claro que não aceitaria nada diferente do caçula.

Após segurar por meses o segredo, Yuri resolveu encarar o pai e contar a verdade de uma vez. Foi complicado, doloroso, devastador. O garoto sentia que seu pai nunca mais o olhou da mesma maneira desde aquele dia. E ver seu irmão ganhar todo o carinho e admiração daquele homem foi uma granada em seu peito.

O fim de semana foi tempestuoso naquela casa estruturalmente sólida, mas emocionalmente caindo aos pedaços. Segunda era o dia de encarar a vida e constatar que ela continua, não importa o quão destruído estão as coisas.

Felipe decidiu procurar por Beatriz assim que chegou à escola. Sentia que precisava se desculpar pessoalmente e quem sabe tentar concertar as coisas. Apesar de não ter cabeça para nada amoroso no momento, uma hora ele teria que continuar e essa era uma possibilidade que não estava disposto a perder.

Procurou ela pelos corredores e foi até sua sala. Não conseguiu encontra-la, então parou uma de suas amigas para perguntar se ela já tinha chegado, recebendo um não em resposta. Decidiu continuar a procura no intervalo, então foi pra sala deixar a mochila. Assim que entrou, o sinal tocou e a galera começou a entrar na sala. A primeira aula era de Física e o professor era o típico pontual, que não perde um minuto.

Guilherme não conseguiu prestar muita atenção nas três primeiras aulas. Depois de uma rápida conversa com Felipe inteirou-se de que os pais do melhor amigo estavam se divorciando. Ele pensava o quanto Yuri deveria estar devastado. O clima que surgiu na madrugada de sábado, na cozinha da família Barreto, ainda ardia seu corpo só de imaginar o que poderia ter acontecido.

A amizade entre ele e Felipe já durava mais de um ano. Ele era um novato no colégio e Felipe havia reprovado o 2º ano. Depois de um trabalho em um grupo, os dois começaram a se falar e notaram que tinham muita coisa em comum. E assim surgiu a dupla mais cobiçada do colégio – parece clichê, mas é a verdade.

Guilherme ouviu várias histórias sobre Yuri do melhor amigo. Não tinha certeza se todas eram verdades ou contadas de modo exagerado, pois Felipe não escondia o desprezo pelo irmão. E foi na primeira noite em que foi dormir na casa dos Barreto que percebeu que os garotos também o atraiam.

O caçula invadiu o quarto do irmão no meio da madrugada para reclamar de algo usando apenas uma cueca. Imediatamente algo endureceu no Gui – perdoem a piada – e desde então nunca conseguiu vê-lo como apenas o irmão que o melhor amigo odeia.

É verdade que outros homens já o atraíram antes, mas o jovem sempre tentava justificar como sendo uma admiração. Uma vontade de ser igual aquele que desejava. Para ele, criado por uma mãe fanaticamente religiosa, uma possível bissexualidade não entrava nem em questão. Mas era tão difícil reprimir esse sentimento quando estava de frente a Yuri.

O intervalo chegou para seu alívio. Não aguentava mais ficar sentado naquela cadeira ouvindo os professores falarem de como a vida deles mudaria após o fim do 3º ano. Saiu com Felipe para comprar lanches na cantina. Escolheu uma coxinha e uma latinha de guaraná. Sentou numa das mesas daquele espaço e comeu em silêncio. Felipe não fez diferente. Parecia que estava em outro mundo.

Os trinta minutos de intervalo passaram como se fossem três e Guilherme já estava pronto para voltar para sua sala, isso se não tivesse visto Yuri andando apressado em direção ao banheiro. Resolveu segui-lo para puxar uma conversa assim que o sinal tocou indicando a volta das aulas. Sua próxima aula era de Química em laboratório, porém continuou o caminho seguindo sua presa.

Ao entrar no banheiro se deparou com Yuri lavando as mãos na pia de frente ao espelho. Fechou a porta do banheiro e olhou para as cabines, parecia que todas estavam vazias. Continuou ali parado até os olhos curiosos de Yuri encontrarem seus olhos confusos.

— Algum problema?

— Eu queria falar com você.

— Não posso conversar agora. O sinal já tocou e eu tenho que ir pra sala. – Yuri secou as mãos com o papel higiênico, sacando no lixo ao lado. Encaminhou-se para a saída, mas como Guilherme estava na frente da porta, ficaram de frente um pro outro.

— Só queria saber como você tá. O Felipe me contou o que tá acontecendo e imaginei que deve tá sendo uma barra pra você.

— E desde quando você se preocupa comigo Guilherme?

— Pensei que seria gentil em oferecer o meu apoio. Não é porque seu irmão é meu melhor amigo que temos que ser automaticamente inimigos. Eu até gosto de você.

— Não vejo como você pode gostar de mim se nem ao menos me conhece. Licença, por favor.

— Estou sendo sincero. Eu sinto muito pelos seus pais e qualquer coisa que precisar, eu me esforçarei pra te ajudar.

— O quão burro você acha que eu sou? – Guilherme não entendeu a pergunta e fez uma expressão confusa. Isso irritou Yuri. – Não adianta fingir. Eu sei que meu irmão planejou com você para que me conquistasse e depois me desse o fora. Não consigo nem descrever o quanto isso é infantil. Mas você pode ver que não é o momento pra joguinhos. Não vai funcionar. O plano de vocês não vai funcionar.

— Okay, eu não sei de onde você tirou essa de plano, mas está muito enganado. Felipe e eu não planejamos nada contra você e ele nem sabe que estou aqui falando contigo.

— Guilherme, eu sei que tu é hétero e se por um momento pensou que eu me iludiria com a chance de haver algo entre nós, se enganou completamente. De embuste na minha vida já tá cheio. Agora sai da minha frente e tenha vergonha na cara antes de voltar a fazer uma brincadeira dessas com alguém que não está em um bom momento.

Yuri era especialista em atirar com as palavras. Acredite que o que saí daquela boca pode doer mais que uma bala perdida. E assim Guilherme se rendeu e nem tentou se explicar mais. Apenas saiu daquele banheiro querendo sumir do mundo pela vergonha que agora sentia, mesmo sem ter feito nada de errado.

Não sei não, mas algo me diz que as coisas entre esses dois estão indo num caminho bem complicado.

Quando as aulas daquela turbulenta segunda finalmente chegaram ao fim, Felipe foi até a sala de Yuri ver se encontrava Beatriz. E assim que se aproximou da garota, ela apenas o olhou com desdém e continuou andando com as amigas. Foi um vácuo realmente memorável e se alguém gravasse, as chances de virar um sucesso na internet eram grandes.

— Eu realmente tenho uma boa explicação, só preciso de um minuto. – Felipe não desistiu e se colocou na frente da garota.

— Tudo bem, você desistiu. Agora adivinha? Eu também desisti.

— Você vai se arrepender se não me der a chance de explicar o que aconteceu no sábado. Depois que você ouvir pode chutar minhas bolas ou fazer qualquer humilhação pública que imaginar, mas eu preciso falar.

Beatriz se rendeu, mesmo pressentindo que se arrependeria. Olhou para as duas amigas indicando que iria conversar com o garoto e elas a olharam como se fosse uma trouxa. Por fim, os dois caminharam até um espaço mais vazio em que podiam conversar a sós.

— É provável que eu não acredite em uma sequer palavra do que vai dizer, mas você parece daqueles que não desiste fácil e isso é muito chato. Então antes, quero que me prometa que se no final dessa conversa, eu dizer não, você vai respeitar minha decisão e nunca mais tentar algo. Posso contar com isso?

— Você tá no seu direito. Prometo respeitar sua decisão.

— Seja rápido.

— As coisas na minha casa estão uma bagunça. Meus pais deram uma notícia no sábado que me pegou de surpresa e eu fiquei sem reação por um tempo. Foi aí que percebi que havia te deixado esperando e mandei aquela mensagem. Eu peço desculpas pelo fato de não ter lembrado de te avisar que não daria, mas não tinha jeito da gente sair naquela noite.

— Eu queria acreditar em você, seria até favorável pro meu ego. Isso parece tanto com uma desculpa de alguém que arranjou algo melhor pra fazer ou apenas queria se divertir à custa dos outros.

— Meus pais vão se divorciar. – completo silêncio por segundos – Era essa a notícia que eles deram.

Felipe suspirou e passou a mão direita pelo cabelo, abaixando a cabeça. Beatriz estava confusa e não sabia o que falar. Se ela o acusasse de mentiroso e depois descobrisse que era verdade não conseguiria colocar os pés naquela escola novamente. Mas ela pela segunda vez se rendeu ao olhar daquele menino que parecia verdadeiro.

— Sinto muito. Meus pais se divorciaram quando eu ainda era muito novinha, então demorei até processar como isso funcionar. Foi uma merda quando me dei conta. Eu espero que as coisas fiquem bem. Parece inútil dizer, mas uma hora para de doer tanto.

Felipe não queria demonstrar vulnerabilidade na frente da garota. Para ele, o status de macho-alfa que não se aflige com nada era como parte do seu charme.

— Valeu! Obviamente, eu não tô com cabeça pra um encontro agora, mas ainda quero que um dia a gente tenha a oportunidade.

— Quando se sentir a vontade, a gente marca.

— Ah, você tá aí. – Yuri apareceu na frente deles – Pensei que já tivesse ido embora e me deixado. Vamos logo ou...?

— Nós falamos por aí. – Beatriz saiu envergonhada e forçou um sorriso pra Yuri como despedida.

— Você é idiota ou quê? – Felipe perguntou irritado andando a passos largos em direção à saída.

— Não sabia que agora precisava esperar você namorar minha colega de sala pra irmos pra casa.

— Vai se foder.

Mais uma conversa normal entre esses dois irmãos. E assim seguiu-se o dia até a lua dominar o céu e pairar mais uma nuvem negra sobre o teto daquela casa, já com infiltração.

Felipe estava entediado na sala assistindo televisão, mas seu tédio deu lugar a uma facada no peito assim que avistou seu pai aparecendo com duas malas no cômodo.

— Pra onde você está indo? – levantou depressa do sofá tentando entender a situação.

— Eu já não avisei que me mudaria pro apartamento do seu tio Carlos?

— Sim, mas eu imaginei que isso iria demorar. O apartamento não tava alugado?

— Não está mais. Vem cá dar um abraço no seu velho. – e olha, devo dizer que foram poucas as vezes que Fausto pediu por um abraço.

— Tem certeza que é isso que você quer fazer?

— Não é mais uma opção.

Yuri surgiu na escada e presenciou aquela linda cena de pai e filho. E mesmo parecendo errado, ele sentiu felicidade em ver o irmão com um semblante de derrota, se separando daquele que tanto admira.

— Tchau papai. – disse frio, como se não estivesse afetado nenhum pouco.

É confuso entender os sentimentos do caçula. Por um lado, ele se sentia vingado pela falta de afeto do pai nos últimos anos. Por outro lado, se sentia triste porque agora as oportunidades dos dois se acertarem se reduziram ainda mais.

— Vejo vocês logo crianças.

O pai saiu da casa com a ajuda de Felipe carregando uma das malas. Yasmin estava a chorar na cozinha e Yuri sentou-se no sofá tentando fazer prevalecer uma de suas emoções, felicidade ou tristeza. O mais velho voltou e encarou o irmão como se o desafiasse.

— Você tá feliz, não é? Pois aproveite, porque eu vou fazer com o que pai volte pra essa casa.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Não deixem de comentar o que estão achando da trama e dos personagens. Quero muito saber. Até o próximo!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Hard Times" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.