Encadeados escrita por Nipuni


Capítulo 12
O Quê Ela Viu


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem!! ♥



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Fiquei inquieta durante todo o percurso de volta a Tóquio. Meus dedos batucavam sobre as pernas e Sasuke se virava pra me checar esporadicamente – depois que saímos da praia, eu não disse mais nada e ele não forçou. Passava das onze quando as luzes da cidade apareceram no horizonte, e o rádio tocava alguma música no volume mínimo.

— Está com fome? – ele não se virou, olhos bem abertos – Podemos passar em algum lugar...

— Não precisa. – tornei a voltar o rosto pra minha janela. Meus fios pingavam sobre as roupas encharcadas, e o mesmo acontecia com Sasuke. Aquilo parecia me incomodar mais do que a ele.

Foram mais quarenta segundos antes que ele tentasse falar outra coisa.

— Ainda pode me perguntar, sabe? Mesmo sem o que você queria me mostrar, não tem problema. – uma pausa. – Você ficou meio estranha depois que voltamos pro carro.

 – Não é por... – me interrompi. Se falasse demais, acabaria me denunciando. – Não foi nada. Tá tudo bem.

Ele não tentou mais nada, mas eu sabia que Sasuke não havia acreditado. O assunto apareceria de novo.

Todas as ruas que passamos estavam movimentadas de pessoas e automóveis. Nenhum semáforo estava fechado e alcançamos o conjunto de apartamentos em que Sasuke morava antes que o relógio do meu celular marcasse meia noite.

Tiramos os sapatos na entrada e o apartamento estava completamente apagado. Ele tateou o interruptor ao lado da parede e não encontrei a bagunça de antes quando a luz se acendeu. Os livros estavam categoricamente guardados nas estantes e não havia papéis avulsos em lugar nenhum. Descobri que a mesa da sala era de nogueira.

Aoda apareceu no portal da cozinha, sentando-se sobre o assoalho e balançando a cauda peluda como uma naja ao nos ver.

— Por aqui. – Sasuke me direcionou pelo corredor até a primeira porta de três. Puxou a maçaneta para baixo, abrindo a passagem para mim.

Não sei o que eu esperava que seu quarto fosse. Quatro paredes delimitavam espaço suficiente para uma cama, uma escrivaninha, uma porta que levava à uma sacada e outra que provavelmente era de um banheiro. Também haviam estantes com livros, e um armário fechado escorado ao lado da parede esquerda.

— É um quarto normal. – pensei em voz alta, dando um passo para dentro.

Sasuke fechou a porta ao entrar.

— O que esperava? – ele estava parado atrás de mim, e eu continuei de costas ao analisar. Tudo estava perfeitamente organizado, nem uma fibra de tecido no lugar errado.

— Paredes pretas, correntes, gaiolas... – passei pela cama até a porta de vidro que dava na varanda. – Chicotes?

Sua boca se entortou no menor dos sorrisos.

— Que imaginação. – ele caminhou até o armário e puxou uma toalha, uma camiseta e um par de shorts, vindo até mim. – Pode usar meu banheiro. – Apanhei os itens e Sasuke se afastou, arrancando a camisa sobre a cabeça e puxando outra toalha do armário. – A chave está na porta, caso você queria trancar.

Meus olhos se prenderam no que havia em seu ombro esquerdo. A primeira coisa que me veio à mente foi como a tatuagem se parecia com três vírgulas se convergindo sobre um mesmo ponto. O preto era absoluto, e parecia bastante recente.

— Então essa é sua infame tatuagem. – virei o rosto para o lado, analisando de outro ângulo. – É bem... Exótica.

Sasuke levou a mão até o desenho e não parecia confortável comigo olhando. Tentei não achar estranho, considerando toda sua tranquilidade até então.

— É uma boa palavra. – ele não olhava diretamente pra mim.

— O que ela quer dizer? Significa alguma coisa?

— Só que eu tenho um gosto péssimo pra tatuagens. – ele não sorriu.

Estava pronta para respondê-lo quando ele deixou o quarto sem dizer mais nada. A porta bateu e meus ouvidos zumbiram com o silêncio. Me fechei no banheiro de lajotas escuras já tirando a roupa encharcada do corpo e a deixei em um montinho sobre a pia, entrando imediatamente debaixo da água quente.

 O contraste entre minha pele fria com a corrente de calor me rendeu alguns arrepios que não duraram, e eu acabei demorando mais do que o normal. Meu estômago se revirou numa onda estranha ao perceber: aquele era o banheiro que Sasuke tomava banho.

Sem roupa.

Virei a torneira para direita, cessando a torrente de água. Sequei o corpo e o cabelo com a toalha, vestindo a roupa rapidamente. Uma cortina de vapor me seguiu quando saí do banheiro, trotando até a porta do quarto para abri-la.

Sasuke não estava lá, e eu ouvi outro chuveiro ligado. Então ele não tinha terminado ainda.

Deixei a porta aberta e me joguei sobre a cama. O colchão me cuspiu para cima e me abraçou de volta, balançando antes de parar. Eu sentia seu cheiro na blusa que vestia, e minha barriga gelava toda vez que eu inspirava o ar pra dentro.

Talvez eu devesse perguntar sobre a foto, mesmo sem ela. Não teria o aparato visual, mas já tinha olhado para ela o bastante para descrevê-la. Se eu estava mesmo obstinada a conseguir respostas, não poderia ficar sentada esperando que elas viessem de bom grado até mim – principalmente quando parecia que o universo conspirava contra minha vontade.

— No que está pensando? – só percebi que Sasuke estava no quarto quando ouvi sua voz.

Cinco minutos. Era só isso que eu precisava pra juntar coragem e perguntar.

Sentei sobre a cama, fechando as pernas no processo. Sasuke caminhou calmamente até uma das estantes, procurando alguma coisa.

— Onde eu vou dormir?

— Na cama.

— E onde você vai dormir?

Ele espiou sobre o ombro lânguido, os olhos estreitos num sorriso que eu não conseguia ver.

— Ao seu lado.

Mordi a língua, mas controlei a dor pra não perder a compostura. Na frente dele, pelo menos.

— Não sei se posso concordar com isso.

— Mas vai, quando eu tiver terminado. – ele puxou alguma coisa da estante e andou até o estéreo que estava sobre a escrivaninha.

Tive medo de perguntar.

— Terminado com o que?

O estalo de um compartimento de abrindo ecoou no quarto quando Sasuke não continuou. Espiei de onde estava enquanto ele colocava um CD dentro do aparelho, abaixando a tampa logo em seguida. As caixas de som chiaram antes que a música começasse.

Sasuke andou até onde eu estava e estendeu a mão pra mim. Olhei pra ele, para o estéreo e para sua mão, nessa sequência. Ergui uma sobrancelha.

— O quê?

— Vamos dançar.

Engoli uma risada.

— Eu não danço. – balancei a cabeça para os lados e tentei ir mais pra trás na cama. Sasuke foi mais rápido.

Ele puxou minha mão e fez com que eu me levantasse do colchão, segurando minhas costas para que eu não conseguisse me afastar.

— Comigo você dança.

Tentei não me desesperar enquanto ele me levava mais pra longe da cama. Meu ouvido pulsava junto com o timbre da música, e eu coordenava minha respiração para não sair dos trilhos.

— Não sei se já ouvi essa música. – Sasuke me puxou mais pra perto e eu não conseguia mais ver seu rosto. Manteria a compostura, mas a proximidade começava a me derreter como se fosse feita de manteiga.

— Não me surpreende. – sua voz atroou perto de minha orelha e eu prendi a respiração, instintivamente. – Você nunca teve um gosto musical muito bom, mesmo. Uma ironia.

Nunca tive?

— Você não me conhece há tanto tempo assim. – apertei a gola de sua blusa, esperando não ter soado áspera demais.

Sasuke ficou calado por um minuto inteiro.

— É, parece que não. – sua respiração batia em meu pescoço e movia meu cabelo curto e molhado para os lados. Ele se recostou em meu ombro enquanto a música chegava na metade. – Faz quanto tempo desde o lance do hospital? Quatro semanas?

Algo do tipo.

— Deve ser. – dois minutos e eu mencionaria a fotografia.

Ele confirmou silenciosamente. Recuou de meu ombro e as orbes escuras viajaram em meu rosto, procurando alguma coisa. Sasuke me girou num rodopio jeitoso, mas logo me tomou de volta, pressionando meu corpo contra o seu. Nossos narizes encostaram.

— Parece mais tempo. – seus olhos viam através de mim, as pupilas dilatadas. Notei um círculo cinza ao redor da íris pela primeira vez.

— Acha mesmo? – minha voz falhou e eu engoli em seco.

— Você não? – foi um sussurro. – Pensei que concordaria comigo nisso.

Hesitei. A música ainda tocava, mas Sasuke começava a desacelerar, e me olhar com seu ar predador de antes. Estávamos quase parando.

Uma brisa fria entrou pela fresta da porta e nos envolveu num manto transparente. Eu não conseguia mais ouvir a música ao fundo. Seu corpo esguio se curvou para frente, devagar, o fervor de sua pele alcançando a minha sem jamais tocá-la. Me perguntei se era biologicamente possível um coração explodir de tanta ansiedade.

— O que faria se eu te beijasse agora? – suas palavras se desenrolaram, preguiçosas, até mim.

Não havia dúvida.

— Te beijaria de volta.

Sasuke apertou minha cintura com as mãos e me beijou sem dar tempo para segundos pensamentos. Segurei sua camisa com firmeza, como se estivesse com medo de soltá-lo. Eu estava com medo de soltá-lo. Minha boca foi apartada por sua língua e seus beijos eram insistentes e ferozes, fazendo a temperatura do meu corpo subir enquanto eu tentava acompanhar.

Ele se abaixou e encontrou minhas pernas, me erguendo do chão. Dobrei meus joelhos e os amarrei ao redor de seus quadris, suas mãos segurando minhas ancas como apoio. Me carregou por quatro passos e então fui deitada contra a cama, sentindo ela balançar enquanto nos mexíamos.

Num gesto ligeiro – que nem eu sei de onde saiu –, saí de debaixo do seu corpo e me sentei sobre seu colo, virando para o outro lado. Sasuke não perdeu tempo e me posicionou direito sobre suas pernas, os olhos entreabertos escorrendo desejo.

Nossos lábios se colidiram novamente e eu senti que não havia nada mais certo do que aquilo, ou nada melhor do que aquilo. Ou nada que eu quisesse mais do que aquilo.

Meus dedos ergueram a bainha de sua blusa e levantaram o tecido automaticamente, cessando os beijos por menos de três segundos enquanto eu a arrancava e a jogava no chão ao lado. Passeei em seu cabelo e em seu rosto, memorizando cada sensação com cuidado. Escorreguei as mãos em seu pescoço musculoso e senti os tendões próximos ao ombro se contraindo enquanto eu descia, espalmando minha pele contra a sua.

Porém, quando eu alcancei o fim de seu pescoço, tudo desapareceu. De repente, eu não estava mais em seu quarto sobre sua cama fazendo literalmente a única coisa que eu queria que nunca acabasse.

Estava em outro lugar.

As paredes eram de madeira e o chão era cheio de tapetes, e o cômodo estava escuro. Eu estava em pé no canto do quarto, a camisa que Sasuke havia me dado para vestir cobrindo os shorts e quase batendo nos joelhos. Uma janela mostrava que estava nevando do lado de fora, os pinhos quase nus.

Ao forçar as vistas, enxerguei uma cama paralela a mim. Alguém estava deitado debaixo das cobertas, e um cachorro estava espalhado no espaço que sobrava.

Dei três passos até a cama, espiando quem estava lá, e meu coração parou.

Era eu.

Puta merda.

Aquela versão minha estava encolhida sobre o colchão, claramente dormindo. Estremeci quando o brilho azul e vermelho de sirenes clarearam a floresta do lado de fora, e eu ouvi pneus andando sobre a terra. Ela ouviu também, sentando-se na cama num sobressalto tão grande que me assustei.

O que diabos era aquilo? Eu tinha perdido a cabeça. Só podia ser.

A outra Sakura pulou para fora da cama e puxou um roupão que estava sobre o criado-mudo. Notei que o cachorro só ergueu a cabeça, mas logo se deitou de novo. Ela saiu do quarto e eu automaticamente fui atrás.

Três batidas na porta ressoaram na cabana inteira, e eu senti uma onda de ansiedade sendo disparada em mim. Me perguntei o porque internamente.

Ela marchou até a porta, puxando o cabelo para frente ao destrancar a porta. Do outro lado, um oficial da polícia aguardava.

Foi como se alguém tivesse me dado um soco na garganta. Minhas entranhas estavam de cabeça pra baixo e tinha um nó tão grande dentro de mim que eu não consegui me mover. Ela também não. O policial disse alguma coisa que não consegui entender e estendeu uma carteira para ela.

— Ainda não encontramos o corpo, mas acreditamos que é só uma questão de tempo. – consegui traduzir. Ele falava inglês. – Sinto muito.

Ela pegou a carteira e a abriu. Notei como o couro parecia desgastado, desgastado do tipo “arrastado repetidamente no asfalto”. Aquela Sakura não respondeu, ainda focada na carteira.

— Diga de novo – sua voz estava tremendo. – O que foi?

— Houve um registro de acidente rodoviário há algumas horas. As cercas de proteção estavam partidas e nós encontramos a camionete no oceano. – o policial não parecia feliz em dizer, e a estudava atentamente. – Só havia isso.

Eu não conseguia respirar. Ela não conseguia respirar.

Foi aí que eu percebi que tudo que ela sentia, eu sentia também. Foram dois minutos de silêncio até que ela dissesse mais alguma coisa.

— Entendi.

— Precisamos que venha até a delegacia de Jacksonville na sua próxima conveniência. – ele tirou o chapéu e abaixou o rosto. – Fazer o boletim e buscar o atestado.

Ela fechou a carteira e fez que sim. O policial desejou boa noite e foi embora, mas ela não saiu da porta. Sentou no chão e antes que eu pudesse ver o que iria fazer em seguida, toda a cena se desmanchou como açúcar na água.

E então eu estava de volta no quarto. Sasuke estava deitado sob mim, minhas mãos o pressionando contra a cama. Senti minhas unhas intrincadas em sua pele, especificamente sobre sua tatuagem. Seus olhos estavam abertos para mim e ele estava pálido.

Minhas bochechas estavam molhadas e algo pingava de meu queixo. Eu estava chorando e não sabia porque.

Ainda não conseguia respirar. Sasuke percebeu, e claramente sabia de algo que continuava a me eludir.

— O que você viu?


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Notas finais do capítulo

SOBRE ESSE CAPÍTULO: Me desculpem. Eu jurei pra muita gente que ia responder perguntas nesse capítulo mas acontece que eu fiquei o dia inteiro escrevendo e a versão inicial dele deu mais de cinco mil palavras ENTÃO NÃO TINHA COMO EU POSTAR.
Tinha ficado muito cansativo e eu sei que tem muita gente que não tem tempo pra ler esses capítulos enormes, então eu dei uma cortada nele e no próximo as dúvidas começarão a ser tiradas, ok? sdijfsoijf não me odeiem até lá!
Espero que tenham gostado ainda assim!!



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