Lar escrita por MJthequeen


Capítulo 9
Richard


Notas iniciais do capítulo

Oi gente!!
Primeiramente, eu quero dizer que li todos os comentários e, meu Deus, vocês são demais!!!!!!!!!! Sério, muito obrigada pelo apoio! Eu recebi tantas palavras lindas, tanta gente que gosta da história, muito, muito obrigada! Eu acabei de terminar o capítulo e, como ele tá grande, resolvi postar logo hahaah eu vou responder tudo amanhã, SEM FALTA! ♥ é que agora vou dormir, sabe, tô mt cansada aaaa pq temos que estudar tanto pro enem? :[ enfim, muito obrigada mesmo!!

Sobre o capítulo: eu achei que postaria primeira a Estelar, dps Ravena e por fim esse do Robin, mas eu comecei a escrever o dele e achei tããão legal que fiquei com vontade de postar logo hahahaah e eu não sou garota de passar vontade :P
Vou lembrar vocês que eu sou uma estudante do terceiro ano de só 17 anos, apaixonada por RobStar e uso o Google para buscar todas as informações; não sou mestre na psicologia, na botânica ou na geografia hahaah eu escrevo por diversão, ok? ♥ tento ser o mais realista possível, mas às vezes é foda né gente kkk podem me corrigir se acharem preciso!

Vocês gostariam que eu colocasse horários/datas??? Se sim, eu altero os capítulos anteriores já hahaha me deixem saber, se vcs quiserem.

*A PARTIR DE AGORA A NARRAÇÃO PODE SE ALTERAR PARA 3ª PESSOA, SE EU ACHAR NECESSÁRIO*

É isso, vejo td mundo que comentou amanhã nas respostas!! ;]

B~O~A
N~O~I~T~E
GOTHAMMMMM



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Lar

 

A garota cruza os braços e muda o peso do corpo da perna esquerda, para a direita. De lábios e cenho franzido, ela tenta se convencer de que o incômodo é em alguma parte do seu uniforme. Ela o vestiu rápido demais essa noite; deve ter pano mal esticado em suas pernas. A proteção no peito parece tão mais pesada. Devem ser os dois dias sem treino, conclui.

É isso, Barbara pensa, e semicerra seus olhos. É só isso que a está incomodando, não tem nada a ver com a lua cheia, a noite escura e morna sobre seus ombros e o fato de estar sozinha sobre um dos prédios mais altos e mais distantes do centro comercial de Jumpcity. Gotham é mais fria, mais fétida, mais escura do que isso e, Deus, como ela está acostumada com Gotham! Ela respira aquela cidade; está respirando-a agora mesmo, muitos quilômetros distante.

Algo dentro dela vai diminuindo, desaparecendo enquanto os segundos se passam. Ela tinha fé que ele chegaria. A voz amarga de seu pai lhe dizendo que ela nunca deveria desistir de algo em que acreditasse continua passando em sua mente, ecoando no fundo da sua cabeça. Barbs nunca tinha mesmo sido esse tipo de garota. Ela não desistia; mesmo por que todas suas apostas eram sempre muito bem fundadas.

Dick sabia disso.

Azedume toma sua boca quando ela vê o horário em outro prédio, do outro lado da rua. 22hrs. Jump é uma doce e gentil cidade, cheia de coisas interessantes para comprar, uma biblioteca simpática e praia e parques agradáveis. Mas não há nada para ela aqui.

Batgirl se inclina, séria, e cai do prédio como se jogar-se fosse algo recorrente. E é. Mal segundos se passam e sua capa se abre e ela plana suavemente pelo ar, até o chão estar firme sobre seus pés, um beco vazio onde encostou sua moto.

Com uma expressão indecifrável, Barbara monta na motocicleta, costas baixas e quadril empinado. Jim tinha as melhores intenções do mundo, mas talvez ele estivesse errado. Barbara precisava deixar para lá. Bruce e Dick podiam cuidar dos assuntos deles sozinhos. Agora mesmo, Richard tinha outros amigos para apoiá-lo. Ele não lhe devia nenhuma explicação. É por isso que não a respondia, tampouco a deixava saber se tinha visualizado as mensagens. Um suspiro de raiva corta sua garganta quando ela pisa no acelerador.

Antes que saía do beco, porém, Barbara é interceptada. Um barulho forte de motor toma seus ouvidos e outra moto, muito parecida com a dela, para em horizontal na sua frente. Sua respiração simplesmente cessa nos segundos em que o motorista desliga os faróis.

— Achei que você tinha dito que ia me esperar.

 

 

A luz do farol de sua próprio moto não me deixa ver seu rosto. Mesmo que eu não esteja vendo, quase posso imaginar sua expressão. É algo entre seriedade e choque. Estou pelo menos 10 minutos atrasado, sei disso. Saí da Torre sentindo que queria ficar; queria ver Star partir primeiro. Mas Barbara tinha escolhido um horário e eu devia respeitar isso e, além de tudo, eu não gostaria de voltar sozinho. Seria bom tê-la comigo.

É um suspiro de alivio e um barulho de sorriso que rompe meus pensamentos; veio dela.   

— Eu deveria ter te comprado um relógio de presente. Seria mais útil.

Ela acelera e eu automaticamente dou ré, saindo de sua frente antes que Barbara decida me atropelar. Também estou sorrindo quando a moto dela está pouco a frente da minha, no meio da rua pouco movimentada. Ela tinha escolhido o lugar certo para irmos embora sem chamar atenção; já nos bastava os jornais. Antes que eu responda, posso ouvir sua voz saindo diretamente do meu capacete, que também funciona como um comunicador. Na minha viseira posso ver as ondas de áudio da sua voz, a distância dela e seu nome escrito pouco embaixo, na esquerda, sem que atrapalhe minha visão da estrada. Barbs nos conectou com poucos toques, mesmo que o ponto eletrônico que eles usam em Gotham seja bem diferente da tecnologia do Ciborgue. Não sei como ainda consigo me impressionar com ela.

Aposto que você esqueceu o caminho para Gotham— e acelera, sem que eu tenha tempo de segui-la. – O que você faria sem mim?

— Sério, quanto tempo você anda passando com o Batman? A arrogância é contagiosa – digo em tom de humor, seguindo seus passos através do GPS, uma vez que ela já está bem distante por causa da velocidade. A cidade é um blur e eu continuo atrás dela, mesmo que eu saiba outros mil caminhos para sair de Jump e ir até Gotham.

A risada de Barbara ecoa no meu ouvido poucos segundos depois, como se ela estivesse pensando sobre a frase.

Conheci alguém mais arrogante que o Batman— admite e eu arqueio as sobrancelhas.

— Parece uma pessoa agradável – ironizo e Barbs ri outra vez. – Algum idiota da sua escola?

Ouço um “tsc” familiar, enquanto viro à esquerda e à direita. Estamos perto da saída de Jump. Até Gotham são algumas horas de viagem, mas nós dois estamos bem acordados e dispostos, não será tão cansativo quanto para alguém normal.

Você nem imagina, Menino Prodígio.

A resposta não me satisfaz, mas eu não insisto. Conheço Barbs; se ela quisesse dizer quem é, tinha dito. Se for alguém da escola dela ou de seu trabalho de meio turno, vamos acabar conversando sobre isso em outro momento.

 Alguns minutos se passaram quando finalmente saímos da cidade e agora posso ver sua moto outra vez. A sua capa negra cobre qualquer visão interessante que eu poderia ter. Interessante... Será que Star já chegou? Acho que ela teria me ligado. Quando fomos com a T-Ship para Tamaran daquela vez, demoramos pouco mais de 2 horas, uma vez que a nave não voa na velocidade da luz. Estelar sim. Eu devia ter colocado aquele comunicador dela no meu cinto, não na bolsa...

Vou avisar Alfred que saímos de Jumpcity— a voz agradável de Barbs interrompe meus pensamentos. Franzo as sobrancelhas.

— Não avise – eu a interrompo na tarefa, sério. Por alguns segundos, só posso ouvir sua respiração e ela só me responde um ou dois minutos depois.

Bruce sabe que estou voltando; ele tem a localização da minha moto.

— Mas não tem a minha – respondo imediatamente. Ouço-a sorrindo.

Grande entrada triunfal de surpresa, então? Sabe, papai sempre voltava reclamando quando vocês faziam isso com ele.

— Como se fosse realmente possível pegar o Batman de surpresa – murmuro, e Barbara some do meu campo de visão. Sou eu quem está na frente agora, mesmo que o vento leve minha capa para trás com força.

 

 

Gotham City é úmida e cinzenta. O sol ainda está nascendo no horizonte, mas a cidade continua tão escura quanto é sempre; é como se um véu negro a cobrisse e a protegesse de si mesma.  Mesmo pela manhã, as luzes das cidades brilham sobre os becos densos lamacentos, encobrem alguns drogados que vemos rapidamente quando eu e Barbs passamos em nossos motos. Se falarem sobre nós, nem o Diabo acreditaria neles. Quanto mais próximos estamos do centro, mais o cheiro podre das ruas invade meu nariz e estrangula minha garganta. Nos meus olhos, só os asfalto imundo e as paredes pretas e sombrias dos prédios mais populares. Tento prestar atenção nos pequenos sons latejantes: a sirene da policia virando em uma esquina, uma criança chamando pela mãe, adolescentes pichando o muro mais próximo. Todos eles somem conforme adentramos a cidade.

O sentimento que me toma faz com que eu franza os lábios e acelere mais do que deveria. Não posso ouvir nada além da respiração de Barbara no meu ouvido, mas, quando ela toma minha frente, seu cabelo ruivo reflete todas as cores do sol. Eu ignoro o desconforto nas minhas pernas, por causa da posição em que estamos por pelo menos 6 horas – todas as nossas breves pausas serviram para beber água e, para ser sincero, eu estou doido para usar o banheiro. Contudo, há uma coisa maior me incomodando.

Merda, como eu estava com saudades de Gotham. É terrível ter que admitir isso.

Finalmente, eu reconheço o caminho em que estamos com a ponta dos meus pés. Sinto um arrepio na espinha e meu coração está batendo forte. Estou ansioso.  Estamos tão perto da entrada subterrânea da caverna, tão perto...

Dick— a voz de Barbara me chama e no meu visor aparece como ela está desacelerando. Posso ouvi-la lambendo os lábios. – Você... Olha, você sabe como Bruce é, não sabe?  

Ela parece receosa. Eu arqueio a sobrancelha, também desacelerando, mesmo que minha vontade seja outra.

— Barbs, algum problema?

Nenhum. Eu só... — ela respira fundo. – Me promete uma coisa?

— Estou ouvindo.

Promete que não vai ficar bravo comigo.

Junto as sobrancelhas. Isso me incomodou. Muito.

— Esse tipo de coisa nunca acaba bem – eu murmuro, tentando fazer parecer engraçado. Estou tentando imaginar sobre o que Bruce fez com que Barbara escondesse de mim.

Dick.

— Barbs, não posso prometer que não vou ficar bravo com você, mas prometo que vou te ouvir sobre, ok? – digo, sério.

A moto dela mal se aproxima da entrada escondida perto de um dos bosques que cercam Gotham, e uma passagem se revela. Nós entramos ao mesmo tempo em que meus batimentos começam a ecoar por todo meu corpo. É um corredor completamente frio e escuro e o barulho dos nossos veículos também ecoam. Finalmente, posso distinguir a já velha e conhecida caverna.

— Justo.

E, quando estaciona, Barbara se levanta num só movimento e retira o capacete com as duas mãos. Seu cabelo ruivo frisado lhe cai como uma luva. Não tenho tempo para reparar sua feição cansada da viagem; também estacionei e também tiro meu capacete, olhando de semblante fechado para tudo o que há ao redor.

A iluminação baixa e azul da caverna faz com que eu sinta que ainda é noite. O cheiro é como o de chuva, misturado com algo mais forte que deve vir dos morcegos. A batcaverna foi construída de forma que todo o espaço da caverna fosse aproveitado: as construções se elevam em partes específicas e corredores e escadas as interligam, de modo que nada é perto demais, ou longe demais. As áreas de comum interesse estão mais próximas, por isso os trajes estão pertos dos carros, o laboratório do lado do batcomputador e todas as peças recolhidas de cenas de crimes do outro lado.

É claro, o dinossauro, a metros de nós dois, é a primeira coisa que chama minha atenção. A segunda é a moeda, reluzente como ouro. A terceira é Alfred vindo em nossa direção.

Céus, ele não mudou nada. Um sorriso atravessa meu rosto no exato momento que suas sobrancelhas se erguem só um pouco – eu fui capaz de ferir sua elegância inglesa?

— Patrão Dick, eu teria achado prudente ser avisado de sua...

— Al! Meu Deus, como eu senti saudades suas! – eu o interrompo, passando um dos braços por seu ombro depois de deixar minha moto e o capacete de lado. Estou um pouco mais alto que ele. Alfred tem cheiro de chá e eu ainda estou sorrindo quando ele me abraça de volta, alguns segundos depois de pensar se deveria fazer isso.

Ouço Barbara se movimentando e sei que ela também sorri. Alguns segundos se passam quando me separo dele, encarando seu rosto cheio de experiência. Seu semblante é calmo, mas seus olhos me dizem como ele está feliz e isso é o suficiente. Eu costumava ligá-lo algumas vezes, mas é muito diferente de realmente vê-lo pessoalmente.

— Fico feliz que tenha escolhido vir – murmura, sério. Eu aperto seu ombro com uma das mãos. Ele olha por cima do meu. – Senhorita Gordon. Eu acredito que sua estadia em Jumpcity tenha sido prazerosa?

— É uma cidade muito interessante, Alfred, obrigada por perguntar. Sobre o garoto aqui, foi necessário alguns socos e puxões de orelha, mas acho que é para isso que eu sirvo – Barbara diz irônica, dando de ombros e parando do nosso lado. Tirou a máscara e seu rosto brilhante, cheio de sardas na ponta do nariz e bochechas, parece feliz. Aproveitando o momento e a familiaridade do lugar, também tiro a minha e coloco no meu cinto.

Arqueio as sobrancelhas.

— Sonha. Você não aguenta meia-hora comigo, Barbs – desdenho, rindo. Ela cruza os braços no peito.  

— Menino prodígio, você vai se arrepender tanto de ter dito isso quando eu estiver chutando sua b...

— Receio que isso terá que esperar.

A voz como um trovão interrompe sua fala e ecoa por toda a caverna. Eu e Barbs erguermos os rostos, surpresos, mas Alfred mal se move um centímetro. Então, na ponta da escada que dá diretamente para o Batcomputador, eu o vejo. Meu sorriso morre e dá lugar a uma única e estreita linha, que mal revela meus lábios. 

É exatamente como o rosto de Bruce está. Bruce, pois apesar de vestir seu uniforme, que parece muito melhor do que o último que vi pessoalmente, como a roupa de Barbara, a máscara cai para trás como um capuz. E seu semblante é exatamente como o meu. Apesar de saber que eu era filho adotado de Bruce Wayne, a filha do comissário tinha repetido muitas vezes que eu e ele éramos muito parecidos. Até demais. Nós dois nos encaramos em silêncio; Bruce não mudou nada.

Ele acena com a cabeça e se vira, sumindo de vista e cortando nosso contato. É um pedido para que nós subamos. Quietos, é o que fazemos. Deixo que Barbara vá na minha frente e Alfred está atrás de mim. Quando os poucos degraus da escada acabam, estou no centro operacional da caverna. O Batcomputador fica encostado numa parede; há um grande monitor no meio, cercado de outros pequenos, todos ligados. Vejo imagens de câmeras de segurança em algumas áreas da Gotham, e um dos monitores parece com um mapa e há uma pequena imagem de Barbara no canto es   querdo. Provavelmente o rastreador da moto dela.

Batman digita algo rapidamente, de costas, e vejo quando todas as pistas de seja-lá-qual-caso-ele-está-investigando agora sumirem. Finalmente, ele se vira para nós, encostado no teclado e de braços cruzados. Está olhando para Barbara. 

— Vamos conversar sobre toda àquela aparição desnecessária nos jornais – diz, sério, e ouço Barbara suspirando. Não é culpa dela. – Mas depois. Você pode ficar em um dos quartos de hóspedes enquanto não for para casa.

Barbs dá um passo à frente.

— Bruce, eu acho que eu deveria f...

— Desculpe, Barbara, mas não. Essa é uma conversa entre Dick e eu. Nós vamos resolver o resto logo.

Ela fecha a boca, não parecendo convencida, contudo percebo que já desistiu. Olha-me de canto e suas sobrancelhas se curvam, mordendo o lábio inferior. Ela levanta a mão e segura meu pulso, me olhando nos olhos, como se dissesse que está tudo bem. Isso me faz me lembrar assustadoramente de Estelar. Algo dentro de mim se mexe desconfortável. Queria que ela estivesse aqui comigo. Queria segurar sua mão. Sentir seu cheiro. Barbara é ótima, mas Estelar... engulo em seco e aceno com a cabeça.

Não sei o que Bruce achou desse movimento dela, mas Barbara dá as costas para nós dois e segue em direção ao elevador, aonde Alfred vai com ela, depois de um breve cumprimento para o Wayne.

Enfim, estamos só nós dois. Eu não me lembro de quantas vezes pensei sobre isso. Muitas. Vezes demais. E o silêncio reina. Não sei ler seu olhar, mas sei que sua mente rebobina sobre o mesmo que eu. Ele me chamando de criança; eu desaprovando todas as vezes que não confiou em mim, tudo o que ele escondia – e veja só tudo o que omiti dos meus amigos. Da minha melhor amiga.

Sua feição suaviza e, por consequência, a minha também.

— Você cresceu – diz, baixo, mas sua voz é muito alta no silêncio da caverna. Ele se desencosta e vem na minha direção. Não me movo. – Não estou falando só sobre sua altura. O seu time é... interessante. 

Eu junto as sobrancelhas.

— É claro, eu deveria saber que você vem monitorando os Titãs – eu tinha ideia disso, mas ouvi-lo falando mexe comigo. Me sinto... orgulhoso? Há um toque de soberba na minha voz.

— Meu papel como um dos membros da Liga da Justiça – explica, sério. – Mas, honestamente, eu estava curioso.  Queria ver como você estava se saindo.

Balanço a cabeça de um lado para o outro.

— E você ainda não acredita em mim...

E o rosto de Bruce se retorce de um jeito que não vi nem durante nossa discussão. Ele parece que está pensando tão rápido, e parece que há tanto que quer dizer. Vejo muitas coisas nos seus olhos agora e a caverna está repentinamente quente.

— Não, Dick. Eu sempre acreditei em você e no treinamento que eu te dei. Quando você saiu por aquela porta e notícias sobre sua atuação em Jumpcity estavam em todos os jornais, em nenhum momento eu achei que você não era capaz. Entretanto, eu pensei que você voltaria; não por que não pode lidar bem com as coisas sozinhos, mas por que você é meu filho. Eu me enganei. Você montou um time e o lidera até hoje. Não vou dizer que concordo com todas as formas que vocês agem... Mas sei que essa parte não é escolha minha. É por tudo isso que eu te pedi para vir para casa. Você não é uma criança e nem era quando saiu daqui. As coisas que eu te disse quando discutimos... Dick... Richard, eu quero te pedir desculpas.

Meu ar sumiu nos meus pulmões. Estou petrificado no meu lugar. Nunca achei que ouviria essas coisas dele. Mas Bruce está bem ali e seu olhar é muito sincero, tanto quanto sua voz. Meu coração está batendo muito forte; isso faz com que eu me lembre de quando era menor, de quando ele me treinou e de quando me adotou oficialmente. De quando meus pais caíram daquele trapézio e de quando ganhei mais um nome. Das primeiras vezes que usei a corda para voar por ai, e me senti tão livre quanto todas as vezes que mamãe disse que me seguraria. Acho que, até hoje, ela está me segurando, como Star faz quando agarra tão firme nos meus pulsos e nunca me solta.

 É um misto de estranhamento e felicidade o que estou sentindo no peito: estranhamento por que já não me lembrava do que era ter essa figura paterna e porque Bruce só tinha sido assim emocional quando eu ainda tinha 9 anos e ele precisava ser paciente. Por que todas as coisas felizes que eu vinha sentindo eram proporcionadas por meus amigos. E agora, nesse momento, é tudo o que ele diz que me deixa feliz.

— Bruce... Eu... Olha, você precisa saber que, naquela noite, eu estava muito bravo. Mas o que eu te disse, sobre você sempre estar me protegendo, sobre você esconder as coisas de mim...

— Você tem um time. Dick, você entende isso agora.

— Eu confio na capacidade deles.  

— Sim, mas você ainda se preocupa. É inevitável. Eles são bons, mas “e se?”, você pensa. Se um deles se ferisse, você nunca ia se perdoar.

Olhos claros e cabelo loiro aparece na minha mente. Terra. Sim, nós já perdemos uma. Fecho os olhos com força. É terrível ter que concordar com ele, mas Bruce tem razão. Finalmente, posso entendê-lo e me colocar em seu lugar e as coisas ficam claras. Todas as vezes, eu me preocupo. É por isso que estamos sempre treinando para melhorar, para que a possibilidade de uma queda sequer exista. Eu não aguentaria que nenhum deles se machucasse por minha causa. Star, principalmente. Preciso falar com ela. 

Suspiro, deixando meus ombros caírem.

— É, eu entendo. – Levo minha mão direita até o final do nariz e massageio essa área. A viagem me deixou cansado. As coisas que Bruce disse... – Estou feliz de estar aqui. – Tiro a mão do rosto e olho diretamente para seus olhos azuis, um tom muito parecido com o meu.

— Gotham é sua casa – Bruce está mais perto agora. Eu suspiro com suas palavras.

Não nego, nem confirmo o pensamento. Talvez ele tenha razão. Há algo de... Íntimo em estar aqui. Me sinto bem; muito mais do que achei que sentiria. Eu estava com medo.

Eu e Bruce não conseguimos olhar para o lado. Quando percebo, nós nos abraçamos. É um abraço tão apertado quanto o que eu dei em Alfred e fecho meus olhos com força, aproveitando o momento. É ainda mais especial, pois sei que Bruce é muito fechado para isso. Ele coloca um das mãos na minha cabeça, como se me protegesse.

— Gotham é sua casa e você é meu filho, Dick – sussurra, e eu aceno a cabeça ainda em seu ombro.

— Eu sei. Eu sei, pai – murmuro de volta, deixando que as palavras saiam do meu peito. Me pergunto se Ravena já tinha ouvido esses pensamentos na minha alma. Aposto que sim.

Ele me aperta mais forte e eu me lembro de quando ainda era pequeno.

—Esconder as coisas, você tinha me dito. Eu sei que não posso mais fazer isso. É meu outro motivo para tê-lo chamado. Algo que me fez perceber que não podíamos permanecer desse jeito. – Eu franzo o cenho conforme ele fala e nós nos separamos. Sinto a desconfiança no ar. Droga, eu devia saber que era mais de uma coisa. Eu devia saber que não era só saudades. Nunca é assim com Batman. E a promessa que fiz para Barbara... Não vou gostar nem um pouco desse assunto. Bruce está sério como a morte. – Algo que vou ter que pedir desculpas outra vez. E sua autorização.

Aperto minha mão em punho.

— Diga de uma vez, Bruce.

Ele balança a cabeça.

— Não, não agora. Não é um bom momento, você deve estar cansado – quero protestar, mas ele não me deixa brechas em seu discurso. – Alfred e eu mantivemos seu quarto do mesmo jeito desde aquele dia. Eu vou pedir que ele providencie alguma refeição, você também deve estar com fome. Tome um banho e descanse, Dick.  Quando acordar, eu prometo que vamos falar sobre.

 

 

Estou entre achar que as palavras de Bruce tem efeito em mim, ou em estar realmente cansado. De qualquer forma, quase posso sentir minhas pálpebras caindo. A mansão é silenciosa e muito limpa quando saio pelo relógio. Outra coisa que não mudou nada; Alfred a mantém como sempre. Eu não o encontro, nem encontro Barbara quando subo para o segundo andar, onde ficam meu quarto, o de Bruce, o de Alfred e alguns de hóspedes.

Paro no corredor. Já é 6hrs30min; Barbara deve estar deitada, esperando algum horário adequado para aparecer em sua casa, para que o pai não desconfie. Olhando o corredor, ele também é o mesmo e ela deve estar na quarta porta, talvez eu devesse falar com ela? É quando percebo algo esquisito. Uma das portas é diferente das outras. Semicerro os olhos. Não, essa porta tinha sido sempre a mesma. Eles a trocaram. Estranhando, eu me aproximo e ergo a mão, pronta para tocar na maçaneta e...

— Dick? – ouço a voz feminina me chamando, alarmada. Viro-me no susto. É como se eu fosse pego cometendo um crime. Barbara está em roupas civis, jeans e uma blusa cor-de-rosa de manga longa, colada no seu corpo. O cabelo está molhado. Quanto tempo passei lá embaixo? – O que está fazendo? – ela engole em seco. Encaro-o sério.

— Só estranhei a porta – explico, saindo de perto da citada. – Não era essa, era?

— Não. Precisaram trocar – ela me olha de forma esquisita e sei que há algo no ar que não estou captando. Isso é irritante.

— Por quê?

— Quebraram.

Resposta estranha, mas verdadeira. Barbara não está mentindo, eu posso dizer. Mas quem quebrou?! Não tenho ideia de como Alfred faria isso. E Batman não seria tão descuidado... Estou prestes a perguntar quem, quando Alf nos interrompe.

— Patrão Dick, seria ajuizado se o senhor resolvesse descansar. – Ele tem uma bandeja nas mãos, uma cúpula de inox cobrindo algum prato, e concluo que já estava preparando algo para eu comer muito antes de Bruce decidir isso. – Ou tomar um banho, como a senhorita Gordon fez.

Sorrio para ele, levantando minhas mãos em forma de rendição. Minha bolsa está na direita.

— Tudo bem, tudo bem, estou indo.

Ele se vira para Barbs por um momento.

— Eu posso levá-la até o centro se a senhorita esperar um momento – sugere, provavelmente se referindo a dirigi-la até lá. Barbara sorri agradecendo.

— Seria ótimo, Alfred.

Alfred acena e vai até o meu quarto, provavelmente para deixar a bandeja. Olho para Barbs.

— Você já vai?

— Se eu ficar aqui, vou ficar tentada a deitar e dormir. E, se eu me atrasasse, papai ficaria louco. Ele não consegue ficar mais de três dias sem sua garotinha – ela ri, parecendo menos tensa por que concluiu algo e dando de ombros. Eu rio também. – Mas mais tarde me manda uma mensagem? Sabe, eu estou curiosa sobre o que Bruce te disse. Nós podemos fazer uma tour por Gotham se você quiser, também. Só vou para a escola amanhã.

Como a tour em que a apresentei Jump, percebo.

— Só se dessa vez não formos fotografados por nenhum jornal.

Barbara revira os olhos e faz um corte imaginário na garganta com o dedo, apontando para baixo logo depois. É, Batman vai matá-la. Então um sorriso travesso surge no canto dos seus lábios.

— O famoso Dick Grayson andando por Gotham sem aparecer em um jornal? Pode sonhar – diz e sou eu quem revira os olhos agora. Obrigado por lembrar, Barbs.

Nós nos despedimos rapidamente e ela vai em direção ao primeiro andar, enquanto eu vou para meu quarto, de onde Alfred saiu minutos atrás. Esqueci de continuar a pergunta sobre a porta, mas a vontade de ir até lá some quando fecho e tranco a minha e olho para o cômodo.

É um quarto mais espaçoso do que o que tenho na Torre, paredes azuis claras e além da cama, computador, estante com livros, televisão, videogames, um enorme guarda-roupa, tenho vários equipamentos de ginástica. Bruce me deu depois de eu reclamar de precisar descer para a caverna todas as vezes que queria treinar. É muito útil e, quando alguém nos visita, Bruce simplesmente falava sobre todas as artes marciais que eu fazia e não era segredo para ninguém – nem para as revistas.

Meu quarto é quase uma casa inteira; talvez eu devesse ter pedido por uma geladeira também. Tem alguns pôsteres de bandas que eu gosto nas paredes e um enorme dos Flying Graysons. Preciso visitá-los. Na Torre, eu mantinha um apenas dobrado em uma das gavetas, por causa da minha identidade e do fato deles já terem mexido no meu guarda-roupa uma vez – Hm, Star no meu uniforme. Uma olhada rápida no meu guarda-roupa revela todas as minhas roupas e porta retratos, a maioria com meus pais e alguns com Bruce, Barbara e outros colegas da Academia de Gotham. Fecho tudo e tento não me impressionar com o cheiro de limpeza. É claro que Alfred manteria tudo organizado.    

Deixo minha bolsa na cadeira em frente à escrivaninha. A bandeja está na minha cama, mas eu me dirijo para o banheiro, onde tiro as roupas numa rapidez incrível. Apesar do leve frio da manhã e do próprio clima da cidade, tomo um banho frio. Isso alivia todos os meus músculos. Passo pelo menos 30 minutos lá dentro, que Alfred já tinha providenciado sabonetes, xampus e até condicionadores. Saio tentando manter a mente limpa, já que estou cansado e não preciso me preocupar ainda. É só o primeiro dia.

Visto uma samba-canção e uma camiseta branca, deixando uma toalha pendurada no pescoço. O cheiro de sabonete continua no meu nariz mesmo depois de eu devorar os dois lanches naturais e o copo de suco que Alfred tinha me trazido. Finalmente, acabei.

Sento-me na cama e pego a bolsa. O aparelho que Estelar me deu está logo em cima e eu pego ansioso. Ela realmente me deu isso só para que nós pudéssemos nos falar. Tento fazer do jeito que ela me disse; só deslizo o dedo para cima. Ele acende e, no ar, está projetando um menu azul aparentemente simples. No meio, vejo em letras bem grandes “3 convocações desprezadas”, pisco. Isso é equivalente a chamadas perdidas? Star disse que eu poderia ligá-la a qualquer momento.

Há uma lista de contatos e o nome dela é o único que está lá. Confiando no que ela disse, aperto em seu nome. Aparece uma tela de loading e eu espero, sério. Meu coração está batendo forte e acho que meu estômago está revirando. Ótimo. A tela pisca. De repente, ela aparece.

O projetor pega todo seu rosto, até o fim do busto e uma parede dourada atrás. É Estelar. Posso dizer que é ela, pois continua a garota mais deslumbrante que já conheci. E, Deus, está mais linda ainda agora. Destaca-se seu rosto oval, bronzeado, e com um lindo sorriso. Seus lábios parecem mais carnudos e um batom escuro os cobre. Os olhos já verdes estão contornados por maquiagem verde que se estende até sua têmpora; é extravagante, mas combina com ela. Eu não tinha ideia de que Tamaraneanos tinham isso, mas Star está usando cílios postiços com pequenas pedrarias coloridas. Seu protetor de peito/pescoço continua o mesmo, mas consigo ver que uma capa da cor do seu uniforme se estende, provavelmente tão longa quanto a do Batman. Entretanto, o mais impressionante é quando volto o olhar; seu cabelo, parecendo mais escuro por causa da luz, está penteado para trás e uma coroa prateada cobre parte de sua testa e a lateral de seu rosto. É muito parecida com a mesma que a vi usando quando nos conhecemos.   

Mesmo quando fomos lá, é difícil acreditar que Star é realmente uma princesa. Acho que ela nunca demonstrou tanto isso quanto agora. Estou extasiado com sua imagem e sou incapaz de dizer algo. Ela joga o cabelo para frente do ombro, piscando algumas vezes, mas seu sorriso nunca vacila.

  — Robin!— a voz dela sai de alguma saída de som do aparelho. Eu o coloco sobre a cama, imaginando como ele consegue captar minha imagem. Consigo perceber que ela está segurando o seu. – X’hal, é tão bom vê-lo! Eu te chamei algumas vezes, espero que eu não tenha atrapalhado nada. Só queria saber se está tudo bem. Você chegou, eu presumo?

— Star... Você está linda... – murmuro, olhando em seus olhos tão verdes. O sorriso dela se estende e acho que posso ver um leve rubor tomar seu nariz. Queria repetir aquele beijo agora mesmo. Tusso. Devo estar parecendo um idiota. – Quer dizer, é, eu cheguei. Estou bem. Acabei de sair do banho, na verdade. Você chegou há muito tempo?

Fico feliz que tenha gostado— ela olha para baixo, parecendo envergonhada, mas ergue o rosto rapidamente como se tivesse acabado de notar algo. – Mas não estou super arrumada para nada! Eles insistiram que eu me arrumasse para a festa que darão pela minha chegada. Quer dizer, alguns criados me arrumaram.— Explica rapidamente, mas não parece tão feliz com essa festa quanto deveria. – É muito agradável te ver também, Dick.— Eu sorrio de volta. É bom ouvi-la me chamando pelo nome. Star olha para cima, pensando em algo. – Pelas minhas contas, eu cheguei há 5 horas.

— Uou, isso é bastante, Star. Me desculpe, eu queria ter ligado antes, mas cheguei deve ter menos de 1 hora – digo, coçando a bochecha. Sorrio de canto. – Acho que as motos não são tão rápidas quanto você.

Da próxima vez, você pode me pedir uma carona para Gotham— responde, sorrindo, e eu rio. Star em Gotham. Meu Deus. – E você conseguiu conversar com o Batman?— Seu sorriso desaparece outra vez. 

Balanço a cabeça, positivamente.

— Foi mais simples do que eu imaginei. Acho que só temos algumas poucas coisas para resolver, agora – digo. Ela parece muito feliz com isso. Também estou. Solucionar as coisas rapidamente por aqui vai me fazer vê-la mais cedo. Não consigo evitar um sorriso que desenha meus lábios. – Ele e eu... Nós nos entendemos como pai e filho devem fazer.

Ela me responde com o melhor olhar de compreensão, as sobrancelhas tão bem desenhadas no seu rosto ondulado.  

Eu fico tão, tão feliz! É fundamental que o Bumgorf esteja em sintonia com seu K’norfka. E eu percebi como Batman é importante para você, Richard. As boas notícias são gloriosas!

— São sim – concordo, deixando a toalha de lado. Meu cabelo já está quase seco. – Mas e as coisas por ai em Tamaran?

Estelar morde o lábio inferior. Honestamente, é tudo o que eu queria estar fazendo agora. Ela fica muito gata com essa coroa. Tenho vontade de puxar a peça para trás e despentear seu cabelo.

Boas, no limite do possível. Aparentemente, eu preciso resolver alguns problemas territoriais.

— Territoriais? – Ela concorda com a cabeça e seus olhos rodeiam o que provavelmente é seu quarto. Estelar volta a me olhar com um suspiro, o rosto cheio de dúvida. O silêncio me faz perceber que ela está pensando se deve me contar ou não. É obvio em seu rosto. – Star, você sabe que pode contar comigo para qualquer problema.

Um sorriso pequeno em seus lábios limpa as dúvidas por um instante.

Não é nada demais, eu prometo. Eles só querem minha... — procura a palavra, pensativa. – Opinião.  

Algo no jeito que ela fala me confessa que é sim mais sério do que quer deixar transparecer. Franzo o cenho. Não posso obrigá-la a falar, é claro. Ela vai me contar se quiser. Meu estômago se revira só de pensar que a última vez que ela voltou para seu planeta foi para se casar.

— Se você diz. Mas estou aqui, se precisar da minha opinião – concluo, percebendo que ela não quer mais alongar o assunto. – Você conseguiu falar com os Titãs?

O T-comunicador funciona aqui, felizmente. Quando cheguei, mandei uma mensagem para o computador e Ravena acabou de me responder. Provavelmente ela é a única acordada— explica e nós dois rimos, pensando sobre como Rae vai ter que se virar com os dois garotos. Ela é menos paciente do que aparenta; espero que Mutano não a irrite. Vou ligar lá assim que desligar aqui. Pensativa, Star morde o lábio inferior outra vez. – Então, estamos ambos em nossas casas...— murmura, confusa. Estou prestes a respondê-la, não sei bem como, quando ouço batidas abafadas na porta dela. Estelar olha para o lado.

Ghyanhad’s wlothog bahmude Wlokmu Koriand’r – ouço, voz masculina e abafada. Posso reconhecer que é Galfore. Dessa vez, não estou usando o aparelho de tradução, como quando fomos para Tamaran, então não tenho a mínima ideia do que ele está falando. Parecem só um monte de grunhidos.

Estelar responde alto e séria na mesma língua, que na voz dela fica muito mais suave do que na do seu guardião, e se vira para mim, parecendo chateada. 

Richard, me desculpe. Galfore está me chamando. Atrasos são tão charmosos aqui quanto na Terra.— Eu sorrio quando ela diz isso.

— Não tem problema, Estelar. A gente pode se falar mais tarde.  Aproveite a festa – digo, ainda sorrindo. Ela concorda com a cabeça e penteia com a ponta dos dedos a parte de seu cabelo que colocou para frente.

Eu sei que o Batman deve estar te mantendo ocupado, então vou esperar que você me ligue – sussurra, como se para Galfore ou ninguém além de mim escutar. Está séria e seus olhos estão semicerrados, mas o rubor nas suas bochechas permanece ali. – Você vai me chamar, não vai...? 

 Todas as vezes, eu mal consigo acreditar em como ela é linda, e linda mil vezes. Meu peito se aquece, mas minhas mãos estão geladas quando eu mordo meu próprio lábio, como ela vem fazendo, e passo a ponta da língua sobre o superior.

— Só se você prometer me dar outro beijo quando voltar.

Ok, não acredito que disse isso. Eu deveria ter proibido Mutano de mostrar comédias românticas para Star e dito não quando ela pediu para que assistíssemos todos juntos.  Acho que é tarde demais para isso agora. Estelar parece surpresa, mas então seus lábios curvam para cima, um meio sorriso e um olhar misterioso.

Glurth sakves, Dick.

E sua imagem desaparece, enquanto ainda estou sorrindo e tentando imaginar o que raios isso quer dizer.

 

 

A primeira coisa que procuro, quando acordo, é meu celular. Já passa das 16hrs. Coço os olhos, me sentando na cama. Fazia um tempo que eu não dormia bem assim; não sonhei com nada, mas simplesmente dormir sem ficar acordando no meio da madrugada ou me revirando nos lençóis é satisfatório. É um pouco ruim por que eu já estava acostumado a dormir de noite e ficar acordado de dia, como é o comum, e agora sei que vou precisar trocar isso se eu quiser ajudar Batman. Volto a encostar a cabeça no travesseiro enquanto ligo o Wifi. Talvez agora Bruce esteja disposto a me falar o que tem para falar.

Antes de dormir, eu mandei uma mensagem para Ravena, informando que já tinha chegado e ela me disse que estava tudo bem. Dick, é só o primeiro dia. Não tem como nenhum vilão ter percebido que a Torre está em desvantagem numérica. E, mesmo se perceber, sei que os três são muito capazes. Penso em ligar para Estelar, provavelmente a festa já acabou, mas recebo uma mensagem de Barbara antes; ela mandou já tinha meia hora.

 “Eu+você = café no HotMermaid?”

Coloco uma calça de moletom cinza e calço chinelos, descendo até a cozinha antes de responder. A cozinha é moderna e clara como o resto da casa, e tão espaçosa quanto, também. Eu só pego uma maçã antes de seguir para a caverna. No caminho, vejo Alfred limpando um das dezenas de vasos que Bruce tem nessa mansão.

— Vejo que acordou, Patrão Dick – Alfred diz, calmo como sempre. – O seu quarto...

— Estava ótimo, Alfred. Obrigado por cuidar dele – ele acena, como se dissesse que não é nada demais. Olho em direção a biblioteca e ele segue meu olhar. – Bruce está lá embaixo...?

— Não, ele saiu para as Empresas Wayne.  – Arqueio a sobrancelha. É óbvio que a maior parte das ações são dele, mas Bruce não gostava de comandar a empresa. Esse era o papel de Lucius. Para a grande mídia, ele vivia em festas e viagens com modelos. Alfred parece captar minha confusão e continua: — Sua partida, dentre outras coisas, afetou o Patrão Bruce.

Aceno com a cabeça.

— É, eu percebi ontem.

— Ele resolveu finalmente assumir o papel de CEO. Receio que você o veja raramente durante o dia, Patrão Dick – termina, como se pedisse desculpas. Eu sorrio.

— Não tem problema, Alfred. Eu vou treinar um pouco enquanto o espero. De qualquer forma, nós não acabamos nossa conversa – digo, sorrindo, e já andando em direção ao relógio, uma passagem secreta. Sou interrompido pela voz de Alfred, um tom mais alto que o normal.

— A Srta. Gordon tinha me dito que o levaria para um passeio por Gotham...? – Ele continua com a mesma expressão limpa de sempre.

Eu franzo a boca.

— É, Barbs comentou algo assim. Mas eu pensei em recusar.

— Acredito que o senhor devesse ir. Você acabou de chegar, Patrão Dick. Tenho certeza que Bruce vai te manter enfurnado na caverna por tempo o suficiente depois disso.

Dessa vez é meu cenho que se franze. Não é errado o argumento dele, mas algo em sua voz e no jeito como olha de mim para o relógio faz com que eu estranhe tudo isso. Alfred está me impedindo de ir até a caverna...? Antes que eu pense mais nisso, meu celular vibra no meu bolso. Eu o pego, deslizando a tela com o polegar. Eu movo os ombros para o inglês.

— Talvez você tenha razão, Alfred. Passar um tempo com Barbara não seria ruim. Velhos tempos, eu acho.

“Passarinho sai, as gatas fazem uma festa. Fato interessante: enquanto você estava fora, Selina, Quinn e Hera decidiram adotar o título de Sereias de Gotham. Deixando de lado o fato de que a Batgirl é a *única* sereia de Gotham, acho que encontrei um informante. Barbara e Dick; sem Robin. Sem máscara.”

 

Além de um jeans caro demais, estou usando um moletom verde-musgo com capuz e coturnos grossos nos pés. Não tive vontade de passar gel no cabelo e ele parece um pouco comprido demais, mas a aparência é boa. Richard Grayson não usa gel; Robin sim.

Estou observando sobre o ombro de Barbara. Ela apareceu fresca como noite de outono, vestindo um moletom cinza que destaca seu cabelo laranja, preso num coque, e óculos escuros sem marca no rosto. Quando chegou, nós não precisamos falar nada, só acenamos positivamente um para o outro e estou seguindo seus passos, uma vez que a pista é dela. Sei que Barbara vai me explicar melhor essa coisa de Sereias de Gotham assim que sairmos daqui, pegarmos um metrô e chegarmos ao café, que era o plano inicial. 

Ela marcou comigo numa das poucas ruas vazias da Bowery. Se há um bairro que cheira mais à Gotham que esse, eu o desconheço. É o pior da cidade. O sol ainda está se pondo, mas a rua já parece escura por causa das construções altas e velhas. Ninguém nos reconheceria. Eu coloco capuz sobre a cabeça e, só para ter certeza, meus óculos no rosto. Encostados numa das paredes de um dos prédios semiabandonados, estamos esperando que algo aconteça no beco. Sei por que ela preferiu as roupas civis; posso imaginar a cara de Bruce se souber que fomos vasculhar uma pista sem falar com ele antes. E ele já deve estar bravo o suficiente de Batgirl ter sido vista em Jump, Robin não pode aparecer por aqui sem discutirmos sobre.

A respiração curta e leve de Barbara já parece mais impaciente quando, de repente, a porta dos fundos do prédio, que dá justamente no beco, se abre. Nós nos olhamos e, num movimento rápido, ela puxa o homem quase careca, baixinho e gordo contra a parede, pelo seu colarinho mal arrumado. Eu fecho a porta com delicadeza, me encostando a ela e assistindo Barbara. É como se ele não pesasse nada que Batgirl o ergue alguns centímetros do chão, consciente da faca que o homem tem no quadril.

Antes que, com uma das mãos, ele a alcance, ela o sufoca com um dos braços e, com a mão livre, pega ela mesmo a faca, erguendo-a na altura do rosto dele. Eu estou prestando atenção nos dois, algo dentro de mim quente e familiar por vê-la em ação, mas também meus ouvidos estão atentos se há alguém dentro desse prédio – provavelmente um esconderijo – e se está o esperando. Não ouço nada.

— Aaron Flaming – ela murmura, a voz sempre calma coberta por terror. Barbs parece mais velha. Sempre parecemos. – Você entrou com Helen K. Ochoa no Iceberg Lounge semana passada. Eu sei que ela te deu dinheiro. Quero saber por quê. – Barbs está brincando com a faca entre os dedos e eu percebo como o olhar dele vibra entre a faca e o rosto dela.

Uma gota de suor vem caindo da sua careca, até a lateral com poucos fios de cabelos. Ele sorri, os lábios trêmulos.

— Ha...Ha, um homem não pode mais se divertir mais? Eu paguei algumas bebidas para ela, ela me devolveu o dinheiro. – Barbara aperta o colarinho dele um pouco mais. O olhar dele cai em mim, provavelmente pensando nas consequências de escapar. – Vocês... Vocês são novos demais para entender o que acontece em uma boate... – É claro que ele sabe que somos nós. Batgirl e Robin. Seu rosto em dúvida, o susto, o medo de que Batman apareça, tudo deixa isso muito claro. Sua camisa parece cara demais para alguém que mora nesse lugar.

Consigo ver como as sobrancelhas dela se juntam, impaciente.

— Não estou brincando, Aaron. – Sua voz sai como um rosnado baixo. O vento e o barulho quase surdo dos dentes dele se batendo são nossos únicos acompanhantes. Talvez ele estivesse sozinho no prédio. Não sei. Provavelmente não vamos descobrir; isso atrairia muita atenção.

Ele engole seco, me olhando mais uma vez; não me movo. É o alvo dela. Barbara sabe o que está fazendo.

— Onde está o grande e poderoso Batman? Deixou as crianças sozinhas para cuidarem da casa? – Barbara não treme. Percebendo que Batman não vai aparecer, mesmo, Aaron solta um grande sorriso. É como se o medo sumisse dele, como se pensasse que não somos tão capazes sem o morcego. – As duas vadias do Batman. Você não tem ideia com o que está lidando, Batputa.

E a faca para entre os dedos finos e de unhas feitas, bege como sua pele. As íris deles se rasgam até lá, a bocha se fecha no mesmo instante. Barbara segue seu olhar, diretamente para a lâmina, na altura dos olhos deles, no meio, na linha do nariz. Ela poderia acertá-lo quando quisesse. De olhos fechados. A faca entraria no seu crânio. Perfuraria o maldito cérebro.

— Tem razão. Não há Batman aqui – sussurra, um mistério no fundo da voz de garota, quase mulher. – Ele nunca vai saber disso.

— Disso o qu...

A voz dele é interrompida por um grito grotesco. Barbara acabou de esfaquear a palma da mão dele – nada perigoso, mas o jeito como ele a empurra para trás e se retorce de dor, a mão presa na parede, revela a intenção dela.

— Sua filha da puta, maldita filha da puta – geme entre os suspiros de dor, os olhos cheios de lágrimas. Estou menos surpreso do que deveria. Nunca faríamos isso em Jumpcity. Gotham não é Jumpcity e o olhar que Barbs me lança, sobre o meu de reprovação, faz com que eu perceba isso.

— Eu não sou tão paciente quanto ela – digo, deixando a porta de lado e parando ao lado de Barbara, que o encara sem parecer afetada com os xingamentos.

— Vai se foder, seu arrombado do caralho, eu vou...

Eu seguro sua cabeça com a mão direta e dou com força contra a parede, onde ele solta mais um grito arranhado. Minha mão está molhada com lágrimas de dor. Não me arrependo. A adrenalina no sangue, eu ainda estou segurando sua face, seus olhos arregalados como bolas de golfes nas aberturas entre meus dedos.

— O dinheiro. Nós podemos fazer isso a noite toda, Aaron – ameaço, minha boca numa linha fina, o Batman dentro de mim orgulhoso. – Mas até quando você vai aguentar?

Vejo-o engolindo em seco, os lábios trêmulos, dessa vez, por causa do choro. Suas íris vão de mim para Barbara, olhando-o como se pudesse perfurar sua outra mão. Acho que é o que tem vontade de fazer. 

— E-Eu... Helen queria... queria que eu encontrasse e fizesse a ponte entre ela e um ex cientista da ACE Chemicals. Ela disse... disse que não podia ser vista com esse cara, só que suas mensagens corriam o risco de ser interceptadas pelo... pelo Batman – diz entre um soluço e outro, sufocado pela palma da minha mão. Eu olho para Barbara, como se para confirmar se isso faz sentido e ela balança a cabeça.

— O nome do cientista – demando, o mesmo tom de raiva que usei antes.

— Noah... Noah Oyama.

Eu puxo a cabeça dele para frente e, com força, empurro para trás, batendo-a outra vez. Aaron cai desmaiado no chão quando eu puxo a faca que o prendia na parede e jogo, ainda ensanguentada, em cima dele. Barbara está segurando o celular contra o ouvido, de costas para mim, quando a olho.

— É, eu acho que o nome dele é Josh Finch, vi algo no noticiário. Ele está desmaiado na 1177, Bowery. Por favor, venham rápido – a voz dela é levemente afetada e eu levanto a sobrancelha quando ela se vira para me olhar.

Eu aplaudo silenciosamente, um leve sorriso de canto.

— E o Oscar vai para…

Barbs balança a cabeça.

— Papai sempre achou que eu seria a artista da família – e da de ombros, também sorrindo. Nós andamos rapidamente para fora dali, onde ela pega a bolsa que deixou em outra rua. Estamos indo em direção à estação de metrô e, quando sinto que já estamos longe o suficiente, Barbs tira os óculos de sol e o coloca na bolsa, soltando os cabelos.

Como sempre, os olhos azuis combinam com as sardas. E com as cascatas ruivas que caem pouco depois dos seus ombros, próximo do peito.

— Josh Finch? – pergunto. Ela tinha usado esse nome no telefone. Posso ouvir o barulho de uma viatura duas ruas atrás da gente. Andamos mais rápido, passando despercebidos por civis, a maioria prostitutas, ladrões ou viciados. Talvez os três. Não é um bom lugar para estar, definitivamente.

— Aaron Flaming era um nome falso. Josh é foragido por envolvimento com tráfico de drogas e substâncias ilegais, como anabolizantes, por exemplo. Ele conseguiu falsificar toda uma nova vida, mas é claro que eu descobri isso. – Ela pisca para mim e eu reviro os olhos. – Inclusive essa sua casa também era falsa; ele tem muito dinheiro para um bairro como Bowery. Josh morava próximo de Chinatown. Enfim, não quis usar esse nome na frente dele para que pensasse que estava a um passo na nossa frente. De qualquer forma, agora que sei que Hellen queria que ele fizesse um contato com alguém da ACE, tudo isso faz muito sentido... 

Concordo com a cabeça quando finalmente entramos na estação. Algumas pessoas nos olham como se estivéssemos limpos demais para um lugar como esse. Eu me aproximo de Barbara, tiro meu moletom e coloco sobre seus ombros, ficando só com uma camiseta de manga longa, branca, e os óculos de sol. Sou Richard Grayson, afinal. Vou ter que ficar com esse óculos por um tempo. Barbara não parece surpresa com minha aproximação. Apesar de nenhum contato físico, só isso já dá a impressão de que somos um casal.

— Realmente. Se ele estava anteriormente envolvido com drogas ilícitas, ele com certeza conhecia alguém da ACE. Mas qual é a relação dessa Helen com as Sereias de Gotham? – murmuro e Barbara ri do jeito como falo o nome do grupo. É um pouco esquisito.

— Você tem um café para me levar, Dick. Eu te explico melhor quando chegarmos lá.

E Barbara entrelaça seus dedos sem que eu tenha percebido que sua mão estava ali a todo o momento. Sou incapaz de afastá-la, não sei se por educação, por ela ser uma grande amiga ou por estarmos no papel de namorados-esperando-o-metrô. O toque me lembra assustadoramente de Estelar e seu cheiro doce nas minhas luvas depois de todas as lutas.

Mas Barbs nunca será tão quente quanto ela.

 

 

Eu ignoro o fato do óculos incomodar o osso do meu nariz. Ignoro os olhares femininos na minha direção, o jeito como a garçonete sorri um pouco mais para mim do que para Barbara – tento não deixar que isso infle meu ego. Ciborgue estaria rindo se estivesse aqui, fazendo piadas sobre o que elas pensariam de mim se soubessem que sou o Robin. Mutano estaria murmurando que ele é o mais bonito do time e não sabe o que elas veem em mim. Um dia só e já estou sentindo falta deles.

Tento focar os pensamentos em Barbara. Finalmente chegamos ao café e ela está sentada na minha frente, numa mesa confortável e pequena, no fim do estabelecimento e próxima de uma janela. É um lugar bonito, a decoração e os móveis quase todos em madeira escura, a luz baixa e amarela que combina com o frio de Gotham e que convida todo mundo para entrar.

Ainda estou de óculos, mesmo que seja um pouco ridículo, mas Barbara está na sua melhor forma. Quando chegamos, ela foi ao banheiro e voltou pouco depois, sem usar o moletom que provavelmente encaixou na bolsa junto do meu. Por baixo ela estava vestindo uma camisa vinho também de manga longa, mas muito mais justa que a minha, com botões que descem até o cós do seu jeans e um decote em “U”. No pescoço, uma gargantilha negra, que me faz pensar que Ravena com certeza gostaria muito. O cabelo solto, a franja para o lado e na boca um batom levemente mais escuro que seus lábios. Ela cobriu as sardas com maquiagem. Sinceramente, prefiro-as lá, mas não sou eu quem deve decidir.

Vê-la assim me faz lembrar que realmente crescemos. Nós costumávamos vir aqui sempre. Eu tinha me acostumado a vê-la todos os dias e sair com ela sempre, Batgirl ou Barbara Gordon. Ela foi, por muito tempo, minha melhor amiga. Só não posso dizer que é a única a saber muitos segredos meus, pois Ravena esteve na minha mente.

Estou feliz de estar aqui com ela. 

— Obrigada por esperarem – A garçonete se inclina levemente, me olhando com um sorriso ainda maior de quando veio. – Seu cappuccino com canela e seu macchiato de caramelo – entre o primeiro para mim e o segundo para Barbara. – Há algo a mais em que posso ajudá-los? – A garçonete continua sorrindo para mim e nem olha para Barbs, que agora parece, sim, ofendida. Estou prestes a responder quando ela coloca a mão sobre a minha em cima da mesa, me interrompendo.   

— Eu e Richard estamos completando dois anos de namoro hoje. Vocês tem algum bolo especial para uma data tão importante quanto essa? – Diz, sorrindo docemente, como se tudo isso fosse verdade.

O queixo da garçonete quase cai e ela fica vermelha de vergonha, engolindo em seco.

— E-Eu vou checar, Senhorita... – e sai quase correndo, o cardápio contra o peito.

Barbara ri para mim e tira a mão da minha.

— Isso foi cruel, sabe – comento, tentando não rir. Ela dá de ombros.

— Ser cruel faz parte do trabalho – ri e eu faço um “tsc” com a língua, mexendo a cabeça de um lado para o outro como se a repreendesse. Eu levo minha bebida até a boca e lambo os lábios pouco depois, provando o chantilly.

— Então... Sereias de Gotham...? E por que não quis avisar Batman sobre essa pista...? – Estou sério, esperando uma explicação lógica para termos ido sozinhos. É claro que Barbara não queria só passar um tempo comigo combatendo o crime. Ela suspira, deixando-se encostar de qualquer jeito na cadeira e segurando seu copo com as duas mãos, na altura do nariz.

— Pouco depois de você deixar Gotham, aparentemente a relação entre o Coringa e a Arlequina mudou. Não sei, e nem sei se Batman sabe como, mas de alguma forma ela se cansou dele ou ele deu um chute na bunda dela.

Levanto a sobrancelha.

— A última opção, com certeza – digo, me lembrando de como àquela doida era completamente louca por ele. Barbara parece pensativa.

— Um pouco dos dois, eu chuto. O Coringa é tão instável... – o jeito como ela diz o nome dele mostra como Barbara detesta o palhaço do crime. Barbara tira o olhar da janela e volta a focar em mim. – Enfim, numa noite em que eu estava acompanhando o Batman, quando o Coringa já não aparecia por um tempo, ela apareceu junto da Hera. As duas estavam roubando o banco central.

— Hera roubando um banco? Não faz o perfil.

— Nem um pouco. Infelizmente, nós não chegamos a tempo de impedir; só descobrimos que foram elas através de testemunhas, a câmera de segurança e, claro, as plantas no local – Barb morde o lábio inferior. – Desde então, só ficou mais estranho. A Mulher Gato invadiu o departamento de Botânica da Universidade de Gotham e levou uma só espécie. Nós nunca pensamos num assalto à universidade, então Batman só ficou sabendo praticamente no dia seguinte – Barbara abre a galeria no seu celular e me mostra fotos da câmera de segurança da universidade. Sem dúvidas, é a Mulher Gato que entra sorrateiramente.

— Que espécie era?

Tacca chantrieri. Ou, se você preferir, a Flor-morcego. Eu ergo na hora o rosto para Barbara, que me olha compreensiva. – É, foi exatamente a cara que eu e Batman fizemos quando descobrimos.

— Ainda assim, não faz sentido que a Mulher Gato tenha roubado a planta. Ela podia simplesmente ter conseguido as sementes de forma legal. E também não prova seu envolvimento com as outras duas...

— Essa muda estava sendo modificada geneticamente pela universidade, para fins acadêmicos. Ela é mais forte que as outras; consegue crescer maior e em temperaturas menores – explica, voltando a bloquear o celular. – A Flor-morcego é tipicamente de lugares tropicais, o que não tem nada a ver com Gotham. Além disso, o professor que coordenava o projeto também nos revelou que essa muda vai conseguir se multiplicar de forma muito rápida... Selina ter roubado uma flor assim, ao em vez dos diamantes que ele já estava acostumado, fez com que Bruce passasse em seu apartamento. A grande surpresa é que ela não estava mais lá. Na verdade, ela vendeu o apartamento.

Todos nós sabíamos do envolvimento de Bruce com a Selina. Apesar de eu nunca entender por que raios ele dormia com uma criminosa, não era um assunto que ele queria discutir com seu filho de 16 anos. Apesar de tudo, a Kyle parecia gostar dele. Ao menos é o que aparentava em todas as festas que ele dava e ela estava. Barbara geralmente me acompanhava nessas festas e também sabia disso. Nesses dois anos que passaram juntos, sozinhos, provavelmente ela tinha estado com ele quando a Mulher Gato roubava alguma joalheria, e mais de uma vez – e também se perguntado por que ele não acabava logo com isso.

Estou pensando em tudo isso quando Barbs continua, depois de roubar um gole da minha bebida:

— Passamos três dias procurando por alguma outra pista. Investigamos a universidade de ponta cabeça, Dick. Não havia nada além de tudo o que já sabíamos. E então, no quarto dia, Bruce captou movimentações nas docas: Pamela, Harleen e Selina. Alerquina em um uniforme novo, inclusive. Não precisa ser inteligente para perceber que, primeiro, elas queriam ser vistas juntas. As três num só lugar onde sabem que Batman está sempre de olho? Quantas cargas já não interceptamos lá? Elas sabiam que chegaríamos. Segundo, Arlequina numa nova roupa?  Dick, ela estava claramente tentando se desvincular do Coringa.

— E quando vocês chegaram? – Eu roubo a bebida de Barbara sobre seu olhar de desaprovação. Agora estou curioso sobre esse novo uniforme da Harley. O seu último era apertado demais para a mente superimaginativa de um garoto de 14 anos... Eu engulo o líquido num gole só, tentando não pensar nisso.

— Precisávamos combater não só elas, o que é difícil o suficiente, mas um exército de capangas. Então você pode concluir para que o dinheiro do banco servia. Além disso, Harley não parava de gritar que estávamos arruinando a festa e a entrega especial que a Srta. Miau tinha para elas. Não exatamente preparados para isso e com a nova toxina da Hera que quase derrubou Bruce, nós fomos presos juntos, com as hienas da Quinn de escolta especial – ela revira os olhos, provavelmente imaginando o que podia ter feito para impedir isso. Eu a observo com meu melhor olhar de apoio. – Selina estava entregando a flor para Hera, que parecia muito mais do que satisfeita. Foi quando ela, Hera, nos falou que tinham planos maiores para nós... Para Gotham... Só por isso não nos matariam agora, por que não seríamos úteis mortos. “Essa cidade suja e poluidora vai sucumbir pela imagem do Morcego que tanto a elevou, através das Sereias de Gotham” – repete, séria, na voz que provavelmente deve ser de Hera Venenosa. – Foi quando eu desmaiei de dor.

Levo minha mão até o queixo, pensando.

— Hera não podia usar seus poderes para fazer todas aquelas modificações na planta? Ela não precisaria roubar uma já modificada.

— Foi o que eu pensei, Dick. Mas se Selina roubou, provavelmente não. Talvez ela esteja fraca...? Bruce analisou toda cena de combate depois. Ele repetiu incontáveis vezes que as plantas dela não pareciam as mesmas. – Barbara suspira, passando a mão nos cabelos. – Minha identidade é a única que Selina não sabe, contudo ela pode prever facilmente se pensar em todas as vezes que me viu com Richard Grayson. O meu medo é pelo meu pai... – Sua voz vai diminuindo e ela olha através da janela. O sol já se pôs e está escuro como toda noite é, mas as noites de Gotham são sempre mais escuras.

Eu coloco minha mão sobre a sua na mesa. Nossas bebidas já acabaram. Aperto seus dedos, acariciando o indicador com meu polegar e Barbara me abre um pequeno sorriso.

— Vai ficar tudo bem, Barbs. Nós vamos impedir o que quer que esteja acontecendo. Fale-me sobre Helen.

Ela balança a cabeça, se arrumando na cadeira.

— Nós acordamos no mesmo lugar, poucas horas depois. Elas tinham sumido. Além de... outros problemas... – Barbara desvia o olhar quando diz isso e eu fico sem entender. Ela tosse. – Além de outras coisas, Bruce ficou obcecado e preocupado com esse caso. Sabe, por envolver Selina. Por isso, nós acabamos em mil pistas falsas, sempre tentando procurar coisas que fizessem sentido. Alguma dica de onde elas estão escondidas. Nada. Nem uma movimentação. Poucas coisas na rua; parece que Coringa está louco para ter Harley de volta. Parece que o Pinguim não quer um bando de meninas achando que podem tomar conta de Gotham. Nada disso ajuda. Por isso, quando eu encontrei sem querer a pasta de Helen K. Ochoa, durante mais uma de minhas pesquisas intermináveis, não quis contar ao Bruce. Achei que podia chegar à outra pista falsa e não era disso que precisávamos – diz, me explicando detalhadamente. O café vai ficando mais cheio conforme os minutos se passam e por isso ela começa a sussurrar.

 — Eu segui seus passos, em segredo, por duas semanas. Nada de incomum. Emprego de garçonete, apartamento modesto perto do centro, onde mora sozinha com uma filha pequena. Mas ela é bonita e é nova, Dick, 27 anos.  Eu estava quase desistindo quando a vi, pela primeira vez nessas duas semanas, sair do trabalho com uma roupa de festa e seguir com o táxi para outro lugar que, definitivamente, não era seu apartamento. Ela foi para a Iceberg Lounge, a boate perto da Bowery; é num bairro totalmente diferente do seu e frequentado por pessoas... Bem, totalmente diferentes dela. Não seria assim tão chocante se ela não tivesse entrado com esse cara, Aaron, que não parecia o tipo ideal. Estranhando tudo isso, eu a segui para dentro. Eu não consegui ouvir a conversa, por ter entrado sem meu equipamento completo, porém vi quando ela tirou dois maços de dinheiro e entregou para ele; não era menos de 10 mil reais. Helen mal fazia isso em quatro meses como garçonete! Eu consegui tirar foto do rosto dele e fazer um reconhecimento facial no Batcomputador... que o apontou automaticamente como o foragido Josh Finch. Antes de Bruce me pedir para ir para Jumpy, eu consegui descobrir tudo isso sobre Josh, sobre essa nova vida que ele tinha criado. Ele ia para a Bowery só no começo da semana, mas eu estava pensando se deveria contar tudo isso ao Bruce... Decidi que falaria com Helen primeiro, entretanto, quando fui até o apartamento dela, estava abandonado. O porteiro me disse que ela saiu da cidade, por isso resolvi que deveria lidar com o está dentro dela primeiro. Então, só me restava Josh. Tomei coragem hoje de tarde e resolvi te chamar para ir comigo, descobrir a fonte do dinheiro.

Deus, ainda estou confuso sobre Helen.

— Barbs, tudo isso realmente é estranho, mas eu ainda não entendi. Por que Helen? O que havia na pasta dela?

Barbara sorri para mim e se solta da minha mão, puxando algo de sua bolsa. É uma pasta média, cor creme, que ela estende para mim. Com um clipe, está pendurada uma foto 3x4 na parte de cima, onde a pasta se abre. Encaro a foto. Há algo de familiar nos grandes olhos redondos, cheios de cílios, cabelo curto negro caindo na lateral do rosto, e lábios carnudos e vermelhos. Eu abro a pasta e puxo a ficha ao mesmo tempo em que Barbara volta a falar:

— Eu achei nos arquivos digitais do Bruce e imprimi. Não é uma ficha criminal, Helen nunca passou pela policia. Ou, melhor dizendo, Helen Kyle Ochoa nunca passou pela policia, Dick. O K é de Kyle, seu nome de solteira. O Ochoa é do falecido marido, que só lhe deixou com pouco dinheiro e a filha. Helen é...

— Prima da Selina – completo, surpreso, enquanto leio a ficha. Coloco-a dentro da pasta de novo e volto a olhar o rosto satisfeito de Barbara, que a guarda. – Isso faz todo sentido. Selina sabia que Bruce perceberia qualquer passo seu, mas uma prima que ele provavelmente já até esqueceu ou ignora a existência...?

— Exato. Eu não tenho ideia da proximidade das duas, Selina nunca apareceu no apartamento da Helen enquanto eu a assistia, mas Helen é mãe, e mãe solteira. Talvez o dinheiro como garçonete não fosse bom. Se Selina prometeu uma boa quantia por algo tão fácil quanto encontrar um homem, lhe entregar algo e sumir, Helen pode ter aceitado pela filha.

Eu penso sobre isso, passando o dedo indicador sobre o lábio superior.

— E seria alguém de confiança, para quem as três não teriam que pagar muito dinheiro. Uma quantia substancial, talvez. E Helen não chamaria tanta atenção quanto um capanga idiota no submundo. Um casal se encontrando numa boate?

— É muito comum – Barbara conclui para mim e nos olhamos satisfeitos. – Tudo faz sentido, não é? E agora que sabemos o nome do cientista que elas estão procurando... – A voz dela está esperançosa e eu sorrio.

—... É só acharmos primeiro e monitorarmos os passos. Barbs, você é um gênio! – digo, sorrindo. – Bruce vai gostar de ouvir isso.

— Ele vai amar a parte em que fiz coisas pelas costas dele e depois te convenci a sair escondido comigo e esfaqueamos um bandido! Estou pronta para minha estrelinha de melhor bat-aluna – diz, um falso tom de felicidade e nós dois caímos na risada com a situação. É claro que Batman vai ficar uma fera, mas quando ele não fica?

— Você é a má influência da minha juventude, então? – insinuo, me inclinando na cadeira. – Jim vai gostar de saber disso.

Barbs dá de ombros, rindo.

— É o que você faz comigo – fala, mordendo seu lábio inferior. Eu fico em silêncio por um momento e nós dois nos encaramos. Ok, isso foi estranho. Barbara tosse. – Que tal mais uma bebida? – Eu concordo. Isso eu posso aproveitar. – Vem cá, você sabe que Bruce vai ter que dar uma festa por causa da volta de Richard J. Grayson Wayne do colégio interno na Inglaterra, não é? – Faço uma careta.

— Não precisa me lembrar disso.

Ela sorri.

— Ou é isso, ou você fica na mansão pelo resto dos dias que passar por aqui.

Eu balanço os ombros, sem me importa tanto.

— O que são duas semanas? – Barbara junta as sobrancelhas, me olhando de forma confusa.

— Hm... Dick, eu acho que você vai ter que ficar um pouco mais que isso. – Dessa vez, quem junta as sobrancelhas sou eu. Como assim? Talvez seja sobre as Sereias. Barbara deve querer minha ajuda agora e isso realmente pode demorar bem mais que duas semanas.

Vou respondê-la que, pensando bem, faz sentindo, quanto sinto meu celular vibrando; eu o conectei com meu comunicador e, quando pego, tem uma mensagem de Ciborgue.

“Ei, Rob, entrando em contato para dizer que está tudo ok por aqui. Nós impedimos outro ataque do Maluco do Controle numa locadora. Sério, qual o problema desse cara? A noticia ruim: talvez tenhamos sidos fotografados por alguns jornais e civis, sabe, sem dois membros do time. Mas não se preocupa. Curte Gotham. Não é nada demais. Liga para gente quando der. Mutano disse para você mandar um beijo para a “Barbie”. Cuidado com as ruivas, menino prodígio. LOL.”

Eu balanço a cabeça para a parte final da mensagem e respondo rindo. Para tirar meu celular do bolso precisei tirar o dispositivo que Star me deu e coloquei sobre a mesa. Enquanto digito o texto para Cy, Barbs olha o objeto e arqueia a sobrancelha.

— E o que é isso? T-alguma-coisa? – sorri, zombando do jeito como botamos T em tudo. Bem, Batman tem seu Bat, né?

Guardo o celular e pego o dispositivo de Star. Queria falar com ela, mas ele projeta um menu  no ar, então acho que não seria muito aconselhável sequer ligá-lo num café público e bem cheio. É outra garçonete que aparece com nossas bebidas, as mesmas, só que trocadas, e nós rimos internamente disso. A primeira ainda deve estar em choque; Barbara é péssima.

— Star me deu. Hm... Ela resolveu ir para o planeta dela e nós podemos nos comunicar melhor com esse aparelho – explico, por cima, bebendo o meu Macchiato. Não quero entrar em muitos detalhes. Barbara parece repentinamente pensativa e coloca parte do cabelo para trás da orelha, soprando seu copo.

— Ela deu um para todos os membros? – pergunta, como quem não quer nada. Eu ignoro a pretensão dessa pergunta. Conheço Barbs desde pequeno, não preciso ter receios com ela.

— Não.

Barbara me olha nos olhos. Eu desejo ver todos os pequenos pontos que desenham seu nariz empinado e bochechas saltadas, as infinitas sardas que formam universos no seu rosto. Os universos que Star pode observar de seu grande mundo, literalmente seu mundo, devem ser muito diferentes.

Barbs corta nosso olhar, levando o copo até os lábios e provando o líquido, olhando para a janela. Acho que vai começar a chover, mas em Gotham sempre chove. Guardo o dispositivo de Estelar no bolso.

 — Você está com saudades de Jump? – percebo como ela não puxa o som de “i” no fim da palavra e como continua sem me olhar quando fala. Seus olhos voltam lentamente para mim quando pausa no meu rosto e eu vejo a sombra do ressentimento sobre as íris que conheço tão bem. – Você está em casa, Dick. Achei que perceberia isso assim que pisasse aqui.

— Eu tenho uma equipe em Jumpcity, Barbs – Lembro-a, sério, mas suave na voz. Não quero que ela fique com raiva. – E eles são meus melhores amigos.

Barbara abre a boca para dizer algo. Suas sobrancelhas se juntam. Ela junta um monte de coragem numa respiração forte e então tudo acaba, derrete em seu queixo. A vontade de falar o que quer que ela fosse falar some num suspiro confuso e num leve bico que faz com os lábios, tomando outro gole do cappuccino.

Ela volta a mexer na bolsa, mas dessa vez, depois de ter uma confusão com os moletons, tira um envelope para presentes, bem fechado com um adesivo vermelho. Arqueio as sobrancelhas.

— Eu disse que tinha comprado duas.

Olho em dúvida, abrindo o envelope. Quando tiro o que está dentro, é a camiseta do Robin que o R acende no peito. Rio, olhando a roupa. Na verdade, ela é bem bonita. As cores são levemente mais escuras que as que eu uso. Não provo, mas só de esticá-la no ar sei que é do meu tamanho exato. O R acende quando apertado, o que na verdade é mais legal do que parece.

— Barbie, você lê minha mente ou coisa assim? Como sabia que o Robin é meu herói favorito? – digo, algo, quando algumas pessoas começam a olhar para nossa mesa. Estamos nós dois risonhos.

“Barbie”? – repente, sorrindo de canto, e eu pisco para ela. – Falando nisso, o que você acha do Robin parar de usar gel? Eu aposto que o cabelo dele é top... – ela arqueia duas vezes as sobrancelhas para o meu cabelo sem gel e eu reviro os olhos.  

— Ele ia perder uma das características que o definem. É tipo o Homem Aranha sem teias – explico, usando um personagem dos quadrinhos do Mutano como exemplo, Barbara cruza os braços, de repente séria, mas encarando o teto, pensando em algo. Eu guardo o enquanto ela murmura:

— Dick, acho que o Robin vai perder muitas coisas.

Não gosto do tom de voz dela; o que raios ela quer dizer com “perder muitas coisas”? Eu não vou perder nada. Não tenho ideia do por que, mas isso faz com que eu pense em Alfred hoje, mais cedo.  Em como ele insistiu para que eu viesse. Barbara está muito misteriosa, escondendo algo de mim. Primeiro, a promessa. Depois, todos esses murmúrios e constatações sobre Robin.

 Estou para respondê-la, mas o celular vibra e, pensando que pode ser Cy, eu o pego de novo, olhando bravo para o objeto como se tudo que desse errado na minha vida fosse culpa dele. É uma mensagem de Bruce, para quem dei o número novo na noite passada – na verdade, para Alfred.

“Estou na mansão. Não precisa vir agora, eu sei que você está com a Barbara. Te vejo mais tarde.”

Arrumo o Ray Ban no rosto e, só de ver minha expressão, Barbara parece perceber quem é e seu rosto se suaviza.

— Barbara, preciso ir para a mansão. Bruce tem algo para me dizer. Nós podemos dividir um táxi? – ofereço, não querendo deixá-la sozinha. De repente estou ansioso para falar com ele, mais uma vez. Ela levanta a mão, acenando com a cabeça.

— Não, não precisa. Não se preocupa, Dick. Meu pai gosta de passar por aqui quando acaba o horário dele – ela sorri para mim, mas acho que está um pouco pálida. Eu concordo, ela me devolve o moletom e combinamos que devemos falar com Bruce sobre tudo o que ela descobriu. Estou cumprimentando-a com um beijo na bochecha, quando ela segura meus ombros, nossos rostos extremamente próximos, e me olha como numa súplica. – Só se lembra da promessa, ok?

Eu balanço a cabeça e, antes de me afastar dela, dou um beijo leve na sua testa. Foi quase automático e ela solta um suspira de alivio, apertando seus dedos na minha camiseta.

— Ok.

 

 

Alfred é quem abre a porta da mansão para mim, provavelmente depois dos sensores terem avisado da aproximação do táxi. Eu tenho uma moto própria e civil aqui na mansão, mas além de chamar atenção demais por ela ser uma Harley-Davidson, eu e Barbara não poderíamos aparecer na  Bowery com montados nela – só o pensamento já me faz rir.

Eu tento parecer calmo e casual conforme andamos em direção a biblioteca e ele me pergunta sobre meu dia com a “Srta. Gordon”. Bruce vai ficar tão bravo quando souber o que fizemos sozinhos. Alfred não desce o elevador comigo, o que praticamente me prepara para o que vem a seguir. É uma conversa privada. Todos esses anos de treinamento fizeram com que eu escondesse minhas emoções muito bem, mesmo sem o óculos ou a máscara. Deixei meu celular, o dispositivo da Star, o moletom e o óculos com Alfred, para que ele colocasse no meu quarto.

Será que Bruce vai me pedir para ficar...? Depois de tudo o que ele me disse ontem, para mim é a alternativa mais óbvia. Ele vai dizer que precisa de mim em Gotham. Isso infla meu ego um pouco. Vai ser péssimo dizer que não. Balanço a cabeça. Não deve ser isso. Bruce vem se virado muito bem sem mim, Barbara é ótima. E, de qualquer forma, ele me ensinou tudo o que sei. Talvez ele queira me treinar mais? Isso seria interessante. Talvez isso eu aceitasse.

 Quem sabe ele não vai me explicar tudo sobre as Sereias de Gotham e pedir minha ajuda no caso? Nosso primeiro caso depois da “reconciliação”. Eu teria que fingir que não sei de nada que Barbs já me explicou hoje. Uma visão diferente da situação com certeza me ajudaria a ver melhor.

Quando saio do elevador, encoberto de pensamentos, e sigo até onde o Batcomputador está, eu o vejo de costas, apoiado na bancada. Está usando a roupa, como fez ontem, mas sem vestir a máscara. Provavelmente, estava prestes a sair. Nas telas menores que formam uma enorme, eu vejo algumas imagens desconexas. Reconheço o Beco do Crime, uma foto 3x4 de um menino vestido casaco vermelho e de rosto fechado, o Batmóvel sem as rodas. O Batmóvel sem rodas...?

— Ei. Barbara disse que precisava dormir cedo por causa da escola amanhã, então eu resolvi vir logo – minto, dando de ombros. Felizmente parece convincente e acho que Bruce acredita. Assim que ouve minha voz ele se endireita, costas retas, e desliga as telas do Batcomputador com um dedo. O monitor assume a forma de espera: o grande símbolo do morcego sobre um fundo cinza claro, quase branco.  – Como foi seu dia nas Empresas Wayne? – pergunto, genuinamente curioso. Ele se vira e seu rosto está tão calmo que me acalma também. Tem um sorriso no canto dos lábios.

— Foi... chato, na verdade – confessa, coçando a nuca. Eu rio do seu jeito. – Talvez eu devesse ter mantido Lucius no controle.

— É, Al me contou que você resolveu dar uma de CEO – Bruce está realmente sorrindo e é bom vê-lo assim tão leve. Pergunto-me se é por minha causa. Sinceramente, me faz bem pensar que sim.

— Não foi minha decisão mais esperta – termina, se aproximando de mim. – E você? Como foi seu dia?

Olhando nos seus olhos, claros como os meus, um tom de azul totalmente diferente do de Barbs, eu não minto. Só omito.

— Eu e Barbara pegamos o metrô, visitamos um bairro, tomamos café. O de sempre. – Dou de ombros, como se não fosse muito importante. – Ela me contou que Jim tentou parar de fumar – digo, sem conseguir esconder o tom de humor. Bruce ri pelo nariz.

— É, não foi a decisão mais esperta dele. – O silêncio toma conta da caverna, nunca silenciosa. Sempre há o som dos morcegos. E da água pingando em algum lugar. O zumbido da tecnologia que contagia esse espaço tão absurdamente grande. O sorriso de Bruce some. Ele já não parece Wayne, parece Batman. O símbolo no seu peito cresce quando ele fica tão sério assim; quando me encara como se eu fosse correr a qualquer momento. Como se eu fosse... Como se eu fosse embora de novo. O que ele vai me falar... O que ele vai me falar que lhe dá medo que eu vá embora? O que ele vai me falar que faz com que segure meu ombro direito e aperte com força? – Eu te disse, Dick... Filho. Sem esconder as coisas de você. – A mão que estava no meu ombro desliza para meu peito, onde o símbolo estaria se eu estivesse com o uniforme. Bruce encara como se pudesse vê-lo ali.

— Eu trouxe você comigo. Eu te adotei e te treinei com o propósito de que você nunca fosse como eu. Mas você nunca poderia ser como eu, Richard. Nós somos muito diferentes para isso. Talvez você seja exatamente o que eu deveria ser – um sorriso sem humor cobre seus lábios. Logo desaparece. – E Robin nasceu sob as asas de um morcego. Sob minha asa. Sob Batman. Até que você me provou que não só pode voar sozinho, como faz isso muito bem. E eu sei o quanto esse título significa para você, mas eu preciso te dizer isso – E então suas íris estão sobre as minhas de novo. – Dick, você não pode mais ser o Robin.

Eu pisco sob as palavras. Acho que não entendi muito bem. Eu sou o Robin. Eu criei o Robin. Minha mãe me deu esse nome. Por um instante, todas as batidas desesperadas do meu coração parecem cessar. Eu não ouço os morcegos, a maldita gotejada ou a tecnologia que se espalha como veias num corpo. Não tenho forças para interrompê-lo. Ainda estou em choque pelo que ouvi. Como Bruce ousa se apropriar de algo que nem sequer é dele? Algo que nunca foi dele.

Tudo fica claro como água. Barbara com medo que eu ficasse bravo com ela. Alfred me impedindo de entrar na caverna. Ele me dizendo que teria que me pedir desculpas. Bruce me trouxe para essa maldita cidade para me dizer que não vai mais permitir que eu seja Robin. Como se ele pudesse fazer isso. Como se ele tivesse qualquer direito.  

— É por isso, também, que há alguém para quem eu quero apresentá-lo – Bruce continua, a voz um pouco menos firme quando vê minha expressão. Ninguém perceberia, mas eu percebo. Porra, eu percebo. Por que eu sou filho desse filho da puta. – Richard, esse é Jason Todd.

E, Deus, eu não sei de onde, ele aparece. Um garoto de olhos azuis como os meus, mas com um olhar que não me lembra em nada. Apesar de altura, a mesma que a minha, ele parece ser mais novo que Mutano. Contudo, seus ombros definidos na camiseta negra me mostram que ele deve estar morando aqui por algum tempo. Um arrepio corre pela minha espinha. Eu já o conheço de algum lugar.  

— Vem cá, legal te conhecer, sabe, oficialmente, mas se eu virar Robin, eu ganho a Torre a namorada no kit também? Não, espera ai, pode ficar com a Torre. Eu estou bem com a princesa ruiva.

 


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Notas finais do capítulo

Desculpem qualquer erro, como sempre, eu não reviso :/

*A Flor-morcego na verdade cresce em lugares frios e úmidos, pelo que eu pesquisei, mas eu alterei para fins próprios hahaha

*Gente, eu não sou mt fã das histórias do Batman, li mt poucas, prefiro os Novos Titãs mesmo, então me esforcei para fazer essas cenas ;[ espero que não esteja um lixo kkk

*Esses dois personagens são meus, mas não se preocupem, eu só criei pela situação mesmo, nenhum personagem criado por mim vai ser importante ;]

*Não achei necessário explicar pq o Bruce não escolheu chamar o Dick nesse caso das Sereias. Mt coisa acontece com a Liga e eles não chamam os Titãs, assim como mt coisa acontece com os Titãs e eles n chamam o Batman, né haha

*Resolvi abordar a transição para Asa Noturna de uma forma diferente. O Robin do desenho me parece apegado à roupa e à história. Ele não mudaria assim, num clique, acho kk

PS: Eu amei a escolha da Estelar para a série! ♥ espero que o cabelo fique bonito kkk

Por favor, me deixem saber oq vcs acham. O capítulo sai mais rápido quando estou feliz pelos comentários! ♥ um beijo, obrigada todo mundo que leu.



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