Forget About Me escrita por Lia Mayhew


Capítulo 4
Capítulo 3 – The Night We Met


Notas iniciais do capítulo

Prometi que voltava! Boa leitura!



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When you had not touched me yet

 

Antes de amanhecer, Katie encontrou Peter no jardim de inverno. Sabia que ia o achar lá, uma vez que, desde quando era pequeno, aquele sempre foi seu lugar preferido da casa.

— Já arrumei minhas coisas. Saio em cinco minutos.

— Eu te disse que você não precisa ir embora.

A aflição de Peter aumentou vendo a sua amiga mais próxima encolhida, com o capuz de moletom cobrindo seus cabelos castanhos. Ele era o maior idiota do planeta.

— Vai ser o melhor para todo mundo, Peter. Vocês precisam de tempo para se recuperar como uma família.

— Você é uma parte da família, Katie. Layla e Candice só estão magoadas.

— Não é apenas com elas que eu estou preocupada. Tem muito que você precisa digerir também.

— É, eu sei. E eu sinto muito por ter feito você fazer isso. Você não queria nada disso e acabou sendo a única que carregou esses segredos por anos.

As palavras fizeram Katie torcer os lábios. Ela era acostumada a sentir coisas que não deveria e, ainda sim, essa era a primeira vez que ficava preocupada por isso.  O tempo fez a fúria e o ressentimento que sentia por ter concordado em fazer algo que não queria darem lugar a inquietação.

Por anos, viu a família que amava muito viver através de uma narrativa que ela mesma tinha criado. Foi fácil ver as crianças crescerem por cima daquela versão açucarada da verdade. Fácil demais. Brendon e, especialmente, Layla não tinham um grande repertório de frustrações, dores ou fracassos. Como ela poderia esperar que reagissem depois de descobrir algo tão intragável?

— Você deveria usar essa situação como uma oportunidade de contar toda a verdade, Peter.

O rosto do homem endureceu.

— Não tem mais nada para ser contado.

 

 

 

A luz do sol entrava sorrateira no quarto, iluminando a cama e aquecendo os lençóis. Layla acordou com um gosto ruim na boca, dando a sensação de que não tinha escovado os dentes antes de ir dormir. Isso também parecia óbvio considerando o garoto com o qual ela estava até então dormindo agarrada, Fred.

Ele tinha braços e pernas compridas. Era todo colorido de cobre, por conta de seus cabelos e sardas naquele tom específico de vermelho alaranjado. Ou seria laranja avermelhado? De qualquer forma, era uma questão mais simples da que tinha deixado em casa. Todo aquele problema de família disfuncional e roubo de memórias. Pensar em Fred era  mais agradável.

— Ahn... Bom dia. – Fred foi acordado com feixe de luz na cara e parecia desorientado.

Layla estava sentindo vergonha e não queria que a situação ficasse mais desconfortável, por isso decidiu tomar as rédeas do momento. Ela se curvou por cima do tórax dele, apoiando a cabeça das mãos, de forma que olhava diretamente para o rosto do garoto.

— Bom dia. 

Ele arregalou os olhos, parecendo mais confuso.

— Nossa. Você é bonita mesmo. Eu achei que fosse coisa da minha cabeça.

 Ela riu.

 - Não é. Mas será que você pode me dizer onde a gente está?

Layla sabia que era um sótão. O ambiente tinha o teto baixo e era recoberto por madeira escura. Era espaçoso, ainda que não tivesse muitos móveis, exceto a modesta cama de casal que eles ocupavam e uma cômoda, com algumas roupas não guardadas em cima. Não existia decoração. A luz do sol vinha de uma claraboia no teto.

 - Na casa do meu amigo Lee. Estou passando o recesso com ele e seus pais.

— Fugindo da família no natal. Inteligente. Eu deveria ter feito o mesmo.

Ela quis apenas descontrair, porém o rosto dele confirmou o que ela tinha dito. Ele hesitou por um instante, antes de falar.

— Não da família toda. Apenas do meu irmão.

— Me desculpe. Eu não sabia.

— Tudo bem. - Layla não esperava que ele falasse mais nada sobre o assunto, contudo, pareceu que ele precisava desabafar. – Ele é meu irmão gêmeo. Nós sempre fomos grudados um com outro, nunca brigamos. Não achava que tínhamos segredos um do outro até eu o ver beijando a minha namorada. Bem, ex-namorada. E o timing é horrível, porque nosso pai acabou de sofrer um acidente e todo mundo está apavorado. Você não sabe o quão difícil foi convencer a minha mãe a me deixar vir ficar com o Lee. Só que eu não consigo nem olhar para o George. Desculpa, você nem perguntou nada.

— Não tem problema. – Qualquer coisa era melhor que pensar na família dela. – Sabe, se vocês são gêmeos, ela pode ter achado que ele era você.

Fred deu um risada seca, sem graça.

 - Acho difícil ela ter trocado o meu nome também. - Ela fez um biquinho, sem saber mais o que falar. – E você? Deveria ter fugido da sua família por quê?

 - É complicado.

 - A gente tem tempo.

 Contar a história dela era uma cilada, como abrir uma porta sem fim. Ela não tinha a menor intenção de sair por aí falando sobre isso com as pessoas. Ainda assim, Layla ficou com vontade de dizer tudo para Fred. Aquela manhã de sol na cama não parecia real e não sentia que suas ações teriam consequências. Ele mesmo tinha se aberto para ela sem ressalvas.

 - Basicamente, meu pai mentiu para mim sobre a minha mãe e como ela morreu.  Ele me enganou e até mexeu em algumas das minhas memórias.

 - O quê? Layla, isso é muito sério.

 - Eu sei. Só que ele não fez por mal. Tudo foi muito triste e eu era nova. 

  Fred colocou os braços ao redor dela. Layla era bonita, simpática e bem vestida. Não achava que ela poderia estar lidando com esse tipo de problema. Beijou a cascata de cachos negros que era a cabeça da garota.

 - Sinto muito. Tudo que eu te falei sobre o George parece besteira agora.  

 - Não é, Fred. Não é errado você ficar magoado com ele, desde que vocês se resolvam no final. Família é importante. 

  Ele não resistiu e colou os lábios deles em um beijo rápido.

  - Então, você é escocesa, certo? O seu sotaque te entrega.

  - Eu nasci aqui sim. Só que moro na Inglaterra há mais de dez anos.

  - Jura? Eu também sou inglês. Moro em Ottery St. Catchpole, perto de Devon.

  - Claramente. E, deixa eu adivinhar, você estuda em Hogwarts?

 Fred abriu um sorriso genuíno. Seus olhos castanhos claros a olhavam de modo suave, com carinho. Layla precisava tomar cuidado. 

  - Sim, eu estudo. E eu sei que você não, eu iria lembrar de você.

  Ela ia responder, quando o sino de uma igreja perto, talvez a Catedral St. Giles, ecoou. Eram nove horas. Ela precisava ir embora. Levantou-se da cama e começou a procurar as roupas, todas jogadas no chão.  Fred fez a mesma coisa.  Já vestida, Layla pegou uma varinha de madeira marrom. Não era a sua, imponente, de nogueira, e sim uma, com aspecto gasto, feita de carvalho.

  - Acho que isso é seu. – Fred estendia a sua varinha com o seu maço de cigarros que devia ter caído da bolsa. Os dois trocaram. - Você não deveria fumar.  

 Sóbria, ela aproveitou para analisar ele melhor. Estava com as roupas simples, porém Fred mantinha um aspecto gracioso, devido a sua altura. Tinha algo nele que irradiava nobreza, apesar de não ser necessariamente material.

— Eu não deveria fazer muitas coisas. – Layla olhou ao redor, verificando se estava com todas as suas coisas. – Inclusive, acho que eu vou indo.

O garoto assentiu.

— Posso te escrever?

— Você não tem o meu endereço. - Fred conjurou um pergaminho e uma pena em uma velocidade impressionante. Sem saber ou querer negar, ela escreveu o seu endereço em Berwick-upon-Tweed. – Aí está. Vou esperar suas cartas, então. - Ele sorriu e ela ficou em dúvida em como se despedir e acabou lhe dando um selinho. - Até logo, Fred.

Ela aparatou de volta para o casarão Harrison, sem perder nenhuma parte do corpo. Era um feito impressionante, considerando que a sua cabeça dilatava. Seu quarto estava da maneira como tinha deixado. Era deprimente lembrar que as coisas continuavam do jeito como estavam no dia anterior. Fugir não tinha sido muito eficaz.

Layla estava fedendo cigarro e suor. Precisava de um banho antes de enfrentar a sua família. Abusou da água quente da casa e trocou de roupa, vestindo uma calça e uma blusa sóbria. Ela tinha que falar com Brendon, sabia que tinha sido egoísta da sua parte não ter o procurado ainda. Não deu trabalho, encontrou com ele no caminho da cozinha. Só de olhar para ele, Layla viu que seu pai também tinha devolvido as memórias dele.

— Layla.

— Brendon.

O irmão a puxou para um abraço. Ela sempre associou o cheiro de Brendon, uma mistura de amaciante e limão, com lar. Ainda bem que ela tinha tomado banho.

— Eu sinto muito, Brendon.

— Por quê? Nada disso é sua culpa. Mamãe estava doente.  

— Eu sei, é que dói tanto. Do que você se lembra?

Ele a apertou mais. Os papéis pareciam ter se invertido com Brendon consolando-a pela morte da mãe deles.

— Não de muito. O que eu mais lembro é a da mamãe, rindo, cantando, lendo para a gente. Não sei como as coisas acabaram daquele jeito. – Ele olhou bem para ela. -  Eu tenho sorte por ter você, Layla.

— Está bem. Agora, me largue antes que eu chore.

— Você já comeu? Deve estar com fome.

Layla estava morrendo de fome. Mal tinha comido desde o dia anterior e tinha gastado bastante energia. Desceram as escadas. Na cozinha, tia Candy usava magia para terminar de preparar a comida. Ela parecia cansada. Foi nesse momento que percebeu que a tia tinha sido enfeitiçada junto dela e de seu irmão. Existam bons motivos para ela não gostar de Katie, afinal de contas.

— Layla, querida. – A tia voltou-se para ela. O seu olhar continha carinho e tristeza. – É bom ver você de pé. Fico feliz por você estar usando o colar.

As mãos da garota foram ao pescoço, de forma imediata. Era um colar grande, pesado, e tinha se esquecido que estava usando. Na hora, se lembrou de ter jogado o pingente para as suas costas, enquanto as coisas estavam agitadas com Fred.

— Eu te falei que gostei.

— Quando foi que você ganhou uma joia? – Perguntou Brendon, indignado.

— No meu aniversário.

— Eu ganhei uma vassoura no meu aniversário.

Layla colocou as mãos nas bochechas do irmão, adotando uma entonação infantil: - Talvez tia Candy esteja esperando você virar um menino grande!

Candice revirou os olhos e saiu da cozinha, sem encorajar os dois. Peter apareceu de onde ela tinha saído. Era isso, não tinha mais como Layla evitar o pai. Ela não estava mais consumida de raiva, como ontem, e conseguiu mascarar tudo com frieza. Sequer olhou para o pai até o meio da refeição.

— Onde está Elsie? – Notou a falta da amiga. Tinha muitas informações que queria dividir.  

— Ela e Katie voltaram para Berwick-upon-Tweed de manhã. – Respondeu Brendon.

— Ah.

Ela sempre amou a madrinha com todo o seu coração. Katie tinha um papel importante na sua vida e aliviava a falta da mãe. Não era a mesma coisa, claro, mas era o que Layla tinha. Não ia conseguir ficar brigada com ela. No instante em que todos terminaram de comer, Peter quis falar.

— Eu sei que eu fiz coisas que não deveria. Sinto muito por ter alterado a memória de vocês, eu não tinha direito de fazer isso. Pensei que era a melhor decisão, na época. Eu amo muito vocês e tudo que queria era proteger todo mundo. – Peter parecia machucado, seja pela situação ou pelas suas próprias palavras. – Eu sei que estão confusos. Tem alguma coisa que querem perguntar?

— Foi suicídio? – Quis saber Brendon.

—  Bonnie tomou muitos remédios. Eram calmantes, antigripais e até antidepressivos. Ela sofreu taquicardia. A polícia achou improvável ter sido um acidente.

Layla conseguiu imaginar o coração da sua mãe batendo cada vez mais rápido, chegando ao ponto de ter que parar. Desejou que não conseguisse.

— Ela não gostava de mim.

— Não, isso não é verdade, Layla. – Prontamente, acrescentou Peter.

— Não era uma pergunta. Eu lembro dela brava. - Todos na mesa a olhavam. Brendon não parecia se lembrar disso. E ela não precisava da piedade de seu pai ou da tia.  – Eu não quero ficar brigada com você, pai. Só que isso é uma merda e eu continuo chateada.

— Eu concordo com ela. Você não precisava ter feito essas coisas, pai.

Peter olhou para os filhos, parecia aliviado que as circunstâncias não tinham sido piores.

 - Eu estou muito velha para passar por esse tipo de coisa. – Suspirou Candice. - E você me decepcionou, Peter.  

 Isso pareceu encerrar o assunto. Os irmãos foram para a sala jogar xadrez bruxo. Peter lia um jornal, fazendo pausas para olhar para eles. Candice se distraia escolhendo a estação adequada de rádio. De fora, pareciam iguais a como estavam dias antes. Contudo, não eram mais as mesmas pessoas. As mentiras tinham mudado como viam uns os outros e, pior, como viam a si mesmos.

 A cabeça de Layla corria a mil. Se estava errada sobre a sua família, do que poderia estar certa? Sentiu vontade de esquecer tudo o que achava que sabia. Esse raciocínio a fez se lembrar do garoto com que tinha acordado mais cedo. Fred era gentil e simples. Ela costumava não dar a mínima para qualquer rapaz com quem se envolvia. Deveria ser diferente com ele? Ou estava somente procurando desculpas para justificar a vontade ridícula de vê-lo outra vez?  


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Notas finais do capítulo

Façam suas apostas sobre o próximo capítulo...



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