Feche a porta quando sair escrita por Duda Cartman


Capítulo 31
Como se o mundo desaparecesse




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Doze de Outubro, mais conhecido como o meu aniversário.

A música ainda não tocava tão alta ao ponto de explodir os meus tímpanos e mesmo sendo a minha festa de aniversário, nunca me senti tão deslocado.

Minha roupa era bem extravagante, daquelas que a um quilometro de distancia dava para notar que eu era um príncipe. Eu usava um traje que príncipes da Disney usariam, branca com duas fileiras de botões dourados, duas correntes ligando dois botões a um negócio esquisito no meu ombro, que também fazia parte da roupa exagerada.

Parecia que eu ia a uma festa a fantasia ou a um baile de debutantes. A única coisa familiar para mim era a minha coroa que permanecia intacta no alto da minha cabeça provocando inveja e cobiça em quem parasse para olhar.

Por isso eu adorava o meu aniversário, era engraçado ver as pessoas me cortejando e desejando por dentro terem a mesma vida que a minha achando que era fácil, que era legal.

A festa graças a Deus não era no salão, mas sim do lado de fora sobre a grama, — que finalmente se deram ao trabalho de aparar — onde haviam mesas e cadeiras forradas de vermelho e dourado cujos convidados se acomodavam depois de virem me cumprimentar.

Falei com todos mecanicamente, sem dar muita atenção. Eu sabia que a única pessoa que eu queria ver não estaria lá e isso fez as minhas esperanças de ter um aniversário perfeito murcharem na mesma hora.

Meus pensamentos foram afastados pela interrupção brusca da música e o palco de ferro dourado — que foi montado dias antes — se iluminando com flashes de luz revelando nada mais nada menos do que Ícaro Tramontini.

Cheguei mais perto do palco, ignorando as pessoas que vinham me cumprimentar. Ele movia a sua cadeira de rodas motorizada apertando uma espécie de botão e com a outra mão segurava o microfone.

Engraçado que quando ele cantava não olhava para ninguém no palco, era como se todo mundo desaparecesse e só existisse ele e a música. Não pude deixar de notar uma coisa que ele segurava, parecia um colar porque a mesma era uma corrente em seu pescoço, mas naquela distancia eu não conseguia ver o pingente.

A voz dele tinha o poder de me acolher, de me mostrar que eu não estava sozinho. Esse era o poder que a música tinha, de te abraçar nos momentos mais difíceis e conversar com você como se fossem grandes amigos.

O show foi rápido, mas eu aproveitei cada detalhe. Chorei com algumas músicas, principalmente aquelas que eu cantava mentalmente no quarto tentando ignorar os toques da minha mãe.

Eu só queria que o Ian estivesse ali também, que pudéssemos ouvir aquilo juntos e ele finalmente compreendesse o porquê de Ícaro Tramontini ser tão importante para mim.

Um menino um tanto gorducho, que estava ao meu lado no qual eu nem tinha notado, correu até o lado oposto do palco assim que o show acabou e todos aplaudiram. Ícaro tinha falado meu nome antes de acabar, e por mais que eu tentasse, jamais esqueceria o som delicioso da sua voz me reconfortando.

Aquele mesmo menino retornou com Ícaro ao seu lado e logo ambos ficaram rodeados de pessoas o parabenizando pelo show maravilhoso.

Quando se viravam para sentar, as pessoas me olhavam de forma estranha, uma espécie de repulsa e só quando espiei pelo canto do olho o meu lado direito foi que vi mais um menino que nunca vi na vida me encarando descaradamente.

— Eu posso te ajudar? — indaguei, fitando aquele menino estranho que segurava uma taça de vinho de uma forma que nem mesmo as pessoas mais finas do mundo fariam.

Esse era sem dúvida o garoto mais estranho que eu já tinha visto na minha vida, tanto que fiquei um pouco confuso se ele de fato era um garoto.

Além de ser extremamente magro, — ainda mais do que eu já fui — ele usava uma echarpe parecida com a do Ian, mas era de um tom de rosa bem berrante, tão berrante quanto às botas de salto da mesma cor. Eu nunca tinha visto um menino usando salto alto, ainda mais um maior do que eu.

Ele era loiro e ficava toda hora sacudindo a cabeça para tirar a franja dos olhos e sem dúvida usava maquiagem e batom, tanto que havia uma mancha vermelha do mesmo na taça comprovando a minha teoria.

— Você é o príncipe? — Ele bateu os dentes na taça, tentando parecer sensual, mas só ficando ridículo mesmo.

— Sim — Foi nessa hora que ele se aproximou, como se eu fosse uma espécie de caça. Não pude negar que fiquei com medo.

— Vem sempre aqui? — Tive que me controlar para não rir, essa foi a cantada mais péssima que já recebi.

— Meu Deus, Lipe, que decadência! — Reconheci a voz maravilhosa e aveludada de Ícaro atrás de mim e pela sua comodidade, parecia que já estava ali há um tempo. — Ele mora aqui, idiota.

— Melhor ainda — sussurrou, sem se deixar abalar.

Lipe, o garoto que Ian tinha comentado uma semana antes, aquele que dava em cima de todo mundo.

Com um pigarro, me afastei dele com um sorriso sem graça brotando nos lábios logo em seguida e fui falar com Ícaro que me fitava com curiosidade.

— É um prazer finalmente conhecê-lo — murmurei, encantado demais para falar qualquer outra coisa.

Seu cabelo era raspado nas laterais, porém ele tinha cachos grossos caindo na testa e emoldurando aquele rosto perfeito e contrastando com aqueles olhos cinzentos que me deixavam incapaz de piscar.

— Digo o mesmo de você, príncipe — Seu sorriso foi de tirar o fôlego e senti meu rosto corar gradativamente e ele pareceu satisfeito quando notou isso, como se já esperasse que isso acontecesse, como se soubesse do efeito que tinha sobre as pessoas e só gostei ainda mais dele, embora corar na sua presença fosse bem desagradável. — Ian não parava de falar de você. Conseguiu mesmo laçar o meu priminho, não é?

Eu ri, uma risada envergonhada.

— Esse daí também é seu primo? — perguntei, apontando para o garoto que se vestia daquela forma esquisita.

— É sim — Ícaro revirou os olhos e o menino deu língua em resposta. Pareciam duas crianças implicando uma com a outra. — É praticamente uma vadia maquiada. Falei para ele não usar tanto pó na cara, mas meu primo tem o dom de não me ouvir.

— O mais estranho são essas botas — Senti meu rosto ficar ainda mais vermelho quando falei isso para ele. — São botas de menina e chama muita atenção.

Lipe pareceu incomodado com a minha afirmação, tanto que tomou o vinho em um só gole antes de falar com a voz carregada de petulância.

— Querido, para usar salto tem que ter confiança, e não uma vagina.

Achando estranho o modo com o qual ele usava palavras chulas de forma natural, decidi dar de ombros e me virar para Ícaro.

— Espero que esteja se divertindo.

Mal olhei para o lado por alguns segundos para ouvir Lipe, e Ícaro já estava com uma bandeja de docinhos no colo comendo sem pudor.

— É claro que estou — afirmou entre uma mastigada e outra. — Tem comida por todo canto.

Não pude deixar de rir da cara que ele fez, como se estivesse no paraíso.

— Ele adora comida — O mesmo menino que correu até ele minutos atrás falou. Engraçado que eu não tinha notado a sua presença, ele ficava quieto demais fazendo com que se ofuscasse diante do bom humor e tagarelice de Ícaro.

— E quem não gosta? — questionou Ícaro parecendo um esquilo com varias nozes na boca.

— Ian disse que você planeja se casar — falei, puxando assunto. — Devia ter trago a sua noiva.

Não sei por que, mas ele começou a rir antes de sacudir a cabeça e comer mais uma remessa de doces. Pela coroa, como esse garoto comia! E olha que ele era bem mais magro do que eu.

— E eu trouxe — disse após engolir aquela mistura toda que ele colocou na boca. Fiquei me perguntando para onde ia aquilo tudo. — Leo, esse é o Noah, príncipe da Ilha das Flores. Noah, esse é o Leo, meu noivo.

Eu nem estava comendo, mas mesmo assim me engasguei.


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