Até As Últimas Consequências - Rota Reversa escrita por Juliana Rizzutinho


Capítulo 4
A Senhora da Noite


Notas iniciais do capítulo

Aí está o 4º capítulo de Até As Últimas Consequências – Rota Reversa. No mínimo, tenso. Enjoy!



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Freya os encaminhou até sua carruagem. Definitivamente, não era como as que Edgar e Raven estavam acostumados. Toda branca, apresentava adornos em dourado e prateado. Ali, cabiam com tranquilidade até quatro pessoas. No entanto, o que mais chamava a atenção de ambos era ela ser conduzida por dois grandes gatos selvagens.

Assim que viram Freya, os felinos agiam como filhotinhos comuns. Ora mostravam a barriga ou miavam até que ela os acariciasse.

― Oh, meus queridinhos! Demorei? Logo mais vou alimentá-los, viu?

Tanto o conde e o mordomo olhavam ressabiados e esse detalhe não escaparia da atenta mulher.

― Pois bem, senhores! Estes são meus fiéis escudeiros: Bygul, o mais acinzentado e Triegul, o louro. – quando apresentou o segundo gato, Freya falou de forma tão jocosa e focada em Edgar. Ele não sabia se isso era uma cantada ou um deboche.

― Por favor, não façam cerimônia. Subam! – ordenou.

Um entreolhou o outro, como quem dissessem: “Isso é mesmo uma carruagem?”,

― Não me digam são alérgicos?

― Não! É tão incomum... – Edgar tentou amenizar.

― Oras! Acham que vivemos de acordo com os códigos dos humanos? – repreendeu a mulher com as mãos na cintura. – Vamos, subam! Vocês não têm tempo para tirar no palitinho quem será o primeiro.

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Edgar foi o primeiro, seguido por Raven, a subir no carro.

― Ótimo! Bons meninos! – debochou Freya e fez o mesmo.

― Para onde vamos? – o jovem conde indagou com curiosidade.

― Logo, você saberá...

E assim partiram. Andaram por algumas léguas, enquanto isso, determinadas Valkyrias os acompanharam para dar retaguarda.

Enquanto se dirigiam ao destino, Edgar juntou coragem para perguntar:

― Perdoe-me ser intrometido, mas...

― Pode falar. – disse Freya convicta qual seria a pergunta.

― Como vou recuperar Lydia?

Ela deu um leve sorriso, e respondeu:

― Tudo vai depender de você. Haverá um caminho para trilhar. Não garanto que sairá vitorioso ou mesmo que a sua derrota é certa. Contudo, acredito esta é sua oportunidade, Edgar, agarre-a. Não é qualquer um que tem essa chance.

O campo aberto, o céu entre nublado com alguns raios de Sol que se atreviam a aparecer o deixavam tonto. Sentia-se vazio, sem ser bem-vindo e, profundamente, solitário. Há quanto tempo não se sentia assim? “Isso foi há tanto tempo...”, pensou consigo.  E lembrou-se de um passado remoto, em que esteve no porão de um navio, sujo, com frio e fome, vendido como escravo, sem destino e sem saber o que seria do seu futuro. Tudo sob a supervisão daquele homem que usurpou a sua vida, o Príncipe da Calamidade. Escapou para América com um bando de garotos que também estavam sob a mira do seu algoz. Entre eles, Raven e Ermine.

Teve que roubar, praticar estelionato, mentir. Alguns dos seus companheiros até vendiam seus corpos para poder comer. Mesmo assim, foram aniquilados um a um. Sobrando apenas ele e Raven. A única saída que encontrou foi justamente assumir o posto de Conde Cavaleiro Azul e se tornar o dono das terras de Ibrazel. Território tão ambicionado pelo Príncipe, e... Ulysses, o filho bastardo de Julius Ashenbert.

Mas, Edgar foi mais rápido. Conseguiu reunir o maior número de informação até chegar à Lydia. E só ela era capaz de desvendar a charada sobre a Espada Merrow, instrumento indispensável para receber o título de Conde Cavaleiro Azul. Para ele, no início, ela era um mero peão no jogo. No entanto, foi traído pelo coração e se apaixonou perdidamente por ela.

E aí voltamos onde ele está agora. Viúvo, sozinho e desesperado à procura de um caminho para trazê-la de volta. “E farei qualquer coisa”, prometeu a si mesmo.

E assim, em meio aos seus pensamentos, Edgar avistou um castelo. Parecia de vidro ou de gelo. Não soube muito bem distinguir. Era tão adornado, mas ao mesmo tempo tinha um aspecto sombrio. Estava ao longe, mas o suficientemente perto para ver alguma movimentação. E, então, ele a viu...

Uma mulher de compleição pequena, ruiva e com os olhos verdes perdidos no horizonte. As mãos postas no vidro como estivesse presa em uma gaiola. Era ela... Sem sombra de dúvida!

Sugestão de trilha: Hakushaku to Yousei OST - Edgar no Theme

― Pare a carruagem! – ele gritou.

Freya não compreendeu o que ele queria.

― Vamos, pare a carruagem!

Raven ficou completamente sem ação. E as garotas que os acompanhavam tiveram que remeter força nos cavalos que ficaram ouriçados.

― Ficou louco, Edgar? – Freya indagou brava.

E mal ela pode esperar por uma resposta, o viu pular da carruagem e correr em direção ao castelo.

Ela freou a carruagem com impaciência e pediu para as meninas ficarem a postos.

― E você, venha comigo! Faça seu mestre parar! – ordenou ela para Raven.

Correram para alcançar Edgar, que estava em franca vantagem.

O jovem conde se viu diante do castelo. Voltou a olhar para janela onde viu a sombra de Lydia. Bateu na porta com violência. Ninguém atendeu. Bateu de novo. E mais uma vez, o silêncio.

Tentou mexer a maçaneta. Fechada. Com impaciência, ele tentou destrancá-la à força. Com duas tentativas conseguiu e entrou sem ser convidado. O lugar era imenso, silencioso e com uma penumbra que contaminava o ar. Havia vários andares que mais pareciam com uma arena grega e em cada um deles, portas. Portas e mais portas a perder de vista. Olhou ao redor e ninguém. “Vou inspecionar uma por uma! Ela está aqui!!!”, pensou. “Mas, por onde começar?” Olhou para as que estavam no andar térreo, o que ele se encontrava, e as que se localizavam nos andares superiores.

Começou pela primeira que estava à sua frente. Abriu-a. Nada! Apenas um beco sem saída e mal iluminado. A segunda. Viu uma garota dormindo em um sono profundo, abraçada a um coelho. Mesmo que ela tenha despertado a sua curiosidade, fechou a porta. Foi para a terceira. Encontrou um senhor em uma cadeira de balanço. Também estava adormecido, mas virado para uma janela que tinha como paisagem a noite. “Mas ainda não anoiteceu!”, pensou. E, então, lembrou-se o que Lugh disse: “O tempo corre diferente do nosso. Por favor, fique atento a isso”. Respirou fundo, impaciente e cerrou a porta.

Vieram a quarta, quinta e a sexta. Sempre com pessoas diferentes, em situações diversas, todas adormecidas. Caminhou para a sétima. Descerrou a porta e deu de cara com um muro. Achou uma piada de mau gosto e a cerrou contrariado. Assim que a trancou, encontrou uma mulher que o observava.

Sugestão de trilha: Rozen Maiden Traumed OST - Suishou no Field

Alta, magra, de cabelos negros. Seus olhos eram indecifráveis. Seu corpo era envolto de um vestido negro esvoaçante. A sua cabeça estava adornada com uma coroa com dois longos chifres e no meio uma Lua cheia negra.

― O que você está fazendo aqui? Quem o convidou?

Nesse momento, Edgar congelou. Seu corpo ficou imóvel, e seu coração veio à boca. Não sabia distinguir se era medo, surpresa ou susto.

― Eu vim...

― Te convidei para adentrar assim?

― Ela está aqui, não está? – indagou inquieto, sem se apresentar e nem sabendo com quem travava a conversa.

― Vou ser paciente e te perguntar mais uma vez... O que você está fazendo aqui?

― Edgar!!!  - Freya o chamou, chegando junto com Raven. Estava quase sem fôlego, e com bochechas rosadas pelo calor, e uma raiva que lhe fervia o sangue.

― Então, me diga onde está ela? – perguntou ele.

― Garoto... – a mulher de negro se aproximou ainda mais com o ar ameaçador. – Que tipo de gente é você que entra na casa de alguém sem ser convidado e ainda exigindo que respondam o que você quer, como bem entender?

― Eu a vi aqui! Lydia! A minha esposa! – disse também se aproximando da mulher como estivesse em um duelo.

Isso não vai acabar bem!”, pensou Freya e tentou intervir.

― Edgar, vamos!

― Não vou! – replicou em um tom acima da média. – Não saio daqui sem ela!

― Ela não está aqui! Deixe de ser como um moleque mimado, senhor Ashenbert! – recriminou a mulher de negro.

Edgar se assustou com a reprimenda da senhora e o fato dela saber seu sobrenome. Ela mantinha seu olhar sobre ele, firme.

― Pois bem... Então, como a senhora me explica que vi uma mulher exatamente como a Lydia olhando por uma dessas janelas como estivesse perdida ou sonhando?

― Porque você projetou isso! – respondeu segura. – Você quer isso! E lhe digo mais uma vez, ela não está aqui. Mesmo se estivesse, a forma que invadiu a minha casa já seria razão suficiente para que o não deixe levá-la! Entendeu agora? Ou preciso ser mais clara!?

Edgar suspirou impaciente, mexeu a cabeça em negativa. Encostou à parede e se segurou para não cair no choro. E falou como fosse consigo mesmo:

Sugestão de trilha: Rozen Maiden (2013) OST – N no Field

― O que faço agora?

― Siga Freya. – respondeu a mulher de negro.

Ele a encarou com os olhos marejados.

― Siga-a. Entendo a sua dor, mas... Se você tem um caminho a trilhar, definitivamente, aqui não é o ponto de partida. – informou.

Ele se deu por vencido e disse:

― Mil perdões, senhora!

A mulher ainda o fitava quase com indiferença. Edgar inclinou-se em sinal de respeito e caminhou em direção à porta principal. Acompanhado por Freya e Raven.

*****

Seguiram em um silêncio constrangedor de volta à carruagem. No meio do percurso, Freya parou e fitou Edgar.

― Você ao menos sabe quem afrontou?

Ele a olhou com culpa, quase envergonhado de todos os atos praticados até ali.

― Pois bem, não sabe! Então, vou te contar! Você simplesmente desacatou a Rainha da Noite, Nut!

Tudo que ele pôde fazer foi arregalar os olhos assombrado.

― Nut? – repetiu como que uma criança morta de remorso pelas suas travessuras.

― Sim, senhor! Você só bateu boca com a senhora dos mistérios, da magia, da noite e dos sonhos. E agora, me diga, o que faremos se precisarmos dela?

― Me desculpe. – a sua voz era quase inaudível.

― Te desculpar? – ironizou Freya. – A mim, só me deixou possessa, pois desacatou a minha autoridade. Mas, com Nut? Rá, meu amigo, não se brinca. Sou descarada o suficiente de te largar aqui e deixá-lo por sua conta e risco. Mas, Nut? Ela é silenciosa, e nunca revela alguma coisa. E quando o faz, sempre vem acompanhada de charadas e entrelinhas. Pois bem, lord Edgar, espero que até lá, se necessitarmos de sua ajuda, você tenha uma boa desculpa, uma ótima lorota e uma lábia perfeita. Sem isso, estamos perdidos! Parabéns! – e bateu palmas, irônica.

Sem querer, Raven deu um riso envergonhado e muito rápido, que logo parou com o olhar agressivo do conde.

Bom, até porque o clima não estava para brincadeiras. E, assim, seguiram de volta à carruagem sob o olhar das Valkyrias.

*****

Assim que os “visitantes” foram-se, Nut suspirou profundamente. Mirou o sétimo quarto do quinto andar. Subiu as numerosas escadas com passos delicados, confiantes. Abriu a porta e encontrou uma de suas serviçais a velar a moça que dormia profundamente.

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― Senhora, agora a pouco ela ficou tão agitada. Pensei por um minuto que iria despertar.

Nut a mirou com ternura. Não havia nenhum traço de inquietação naquele semblante. E assim, ela disse à criada:

― É evidente que ela sentiu a presença dele...

― Ele esteve aqui? – indagou.

― Sim! E parecia que não arredaria o pé sem que a levasse.

As duas olharam para Lydia. Seus cabelos caramelo estavam espalhados pelo travesseiro, com as mãos postas no peito, uma sobre a outra. Parecia relativamente tranquila para Nut. Contudo, a Senhora da Noite não pôde deixar escapar um detalhe... Uma lágrima furtiva escorria pelo rosto da fairy doctor.

Nut abaixou a cabeça cansada. Fosse como fosse, uma de suas missões era guardar os mortos e em coma por um tempo. Mas, para ela, Lydia se apresentava como um espírito inquieto que fugia um pouco do seu controle. Algo que Nut não compreendia muito bem.

― Senhora, quer que faça algo? – indagou a criada.

Ela encarou a criada e respondeu:

― Por enquanto, só a vigie. Não podemos ter mais surpresas por aqui.

A garota não entendeu a sua fala. E aí, a Senhora da Noite explicou:

― Os dois praticam magia. Sem contar que Lydia é meio-fada, assim como a mãe. É evidente que um pressente e sente o que acontece com outro. Não podemos nos esquecer de que Edgar, de certa forma, sem querer até, movimentou o equilíbrio do castelo. Por isso mesmo, vou ter que reforçar a segurança aqui.

Deu meia-volta e andou em direção à porta. Antes de sair, informou:

― Logo mais, vou pedir para alguém a substitua para fazer sua refeição.

A criada apenas concordou com a cabeça e a viu partir.


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Notas finais do capítulo

Aqui começamos a adentrar mais e mais ao submundo, e à rota que Edgar terá que fazer, junto com Raven. Também tivemos a presença de Nut, pertence ao panteão egípcio, e é representada assim com chifres e uma Lua negra e cheia no alto de sua cabeça. Na mitologia egípcia, ela cuida da noite, dos sonhos e, inclusive, dos mortos e que estão em coma.
Vale fazer um adendo aqui. Talvez você tenha estranhado que, em algumas vezes, Edgar é chamado de Duque de Sylvanford. Pois bem, não sei se você sabe o pai de Edgar era o Duque de Sylvanford. E em determinado trecho do light novel (spoiler) a Rainha Vitória toma conhecimento que Edgar não tem nada de Ashenbert. Em um acordo feito pelos dois, Edgar acaba criando uma ponte fake para que as duas famílias se ajuntem.
No próximo capítulo, vamos encontrar uma Deusa celta. Ela exige respeito e... Falar mais é entregar a cereja do bolo! Espero você então para o próximo capítulo. Até lá!



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