A verdade era que ele não entendia.

Não entendia por que havia feito aquela pergunta a ela, ou por que estava naquela maldita biblioteca que era quase o segundo quarto da deusa. Ele não conseguia encontrar respostas para suas perguntas, as quais brotavam em sua mente como ervas daninha.

Sabia que falar sobre aquilo era perda de tempo, ele sabia muito bem pelo que ela o odiava: Medusa. Seu maior erro, talvez.  Porém, ouvir aquilo dos lábios de Atena tinha um peso maior, fazendo com que ele se questionasse sobre tudo.

Talvez Zeus estivesse certo, ficar sozinho estava fazendo com que pensasse demais.

Semanas se passaram desde o divórcio com Anfitrite, tudo feito de forma amigável, tal como sempre fora sua relação: Uma amizade. Houve um tempo em que ele a amava, e que ela retribuía isso, mas não era suficiente para nenhum deles. Se de fato amasse a esposa jamais a trairia, sabia disso, apesar dos argumentos sobre a fraqueza masculina contra o desejo, ele tinha certa crença nesse pensamento.

E guardava só para si.

O senhor dos céus vinha insistindo que ele tinha de arrumar uma nova esposa, o que em parte Poseidon concordava: Sentia-se sozinho ali, com exceção dos servos e aqueles que frequentavam o palácio, não tinha companhia. Por isso passava tanto tempo entre os mortais, e ainda assim nenhuma a interessava, isso era preocupante.

Muitos anos tinham se passado desde seu último filho mortal: Percy, e de seu caso com Sally, que teve uma feliz vida mortal ao lado de outro homem. Ele invejava isso, Paul Blofis tivera a vida que Poseidon desejou, ao lado de Sally e com Percy, além da filha que eles tiveram, muito além do que ele pudera lhe oferecer. Sentia falta de Sally, se sentisse por Anfitrite um terço do que sentia pela mortal seu casamento estaria salvo.

Mas não, a relação deles afundou como o Titanic colidindo com um iceberg. Riu daquela comparação enquanto arrumava-se em sua cadeira e começava a ler os relatórios dos exércitos.

― Meu senhor? Hermes deixou  isso aqui.

Era um pequeno envelope, Sebastian colocou diante do deus e se retirou, sabendo que ele não gostava de ser interrompido enquanto cuidava do reino. Sete mares eram uma carga extremamente exaustiva, não que Poseidon reclamasse, só resmungava de vez em quando.

Sabia antes mesmo de ler o conteúdo do envelope que seu sossego tinha terminado, Zeus solicitava sua presença, e o senhor dos mares sabia que o irmão não o chamaria, tampouco com um pedido acompanhado de um “por favor”, a menos que o mundo estivesse para acaba.

Então ele foi.

[...]

― Espera, deixe-me ver se entendi, você está me entregando sua filha como esposa? ― a pergunta saiu num tom alarmado, e se não estivessem no escritório do senhor dos céus, inacessível a maioria, aquelas palavras percorreriam o olimpo mais rápido do que Hermes express.

― Sim, Poseidon.

― Certo, qual é a piada?

Tinha que ser uma piada, era tão impossível que o deus se perguntou se tinha caído numa realidade paralela. Só assim para que Zeus entregasse sua favorita como esposa dele, era uma piada. Tinha que ser ou Poseidon começaria a se preocupar com a sanidade do irmão mais novo.

― Não há piadas, Poseidon. As coisas apenas tomaram um rumo inesperado. ― Zeus respondeu, a tranquilidade em sua voz enganava, meus seus olhos azuis tomavam um tom escuro e profundo, um indicativo de o que fazia no momento não o agradava.

― Rumo inesperado? E o que te faz pensar que eu quero Atena como esposa?

Ele não queria, ao menos acreditava que não, a relação deles era conturbada demais para que tivessem qualquer coisa além da rivalidade e ódio mútuo. Porém, havia uma pequena parte que imaginava como aquilo seria, e não parecia assim tão ruim.

― Sei que a relação de vocês não é das melhores, Poseidon. E não é isso que eu queria para minha filha. ― o senhor dos céus ressaltou o “isso” indicando o irmão, que lhe deu um arquear de sobrancelha como resposta. ― No entanto, não tenho escolhas.

― Você não vai me explicar o que está acontecendo?

― Não, ao menos, não ainda. É mais seguro para Atena que ela permaneça a seu lado.

Então um silêncio tenso se instalou entre eles, enquanto Poseidon tentava entender o que o irmão de fato queria, Zeus buscava compreender qual seria o próximo passo do mais velho, o que era impossível.

― Mesmo que eu concordasse em receber sua irritante filha como esposa, Zeus, jamais poderia. Ela tem um juramento, e Hera jamais abençoaria isso. ― esperava, com aquilo, encerrar o assunto. Era de conhecimento geral que Hera não aprovara o divórcio do irmão, Poseidon não a imaginava abençoando uma união entre ele e sua maior inimiga.

― Ela já abençoou, e quanto ao juramento, falaremos disso na reunião dessa noite.

Aquilo caiu como uma bomba sobre o deus, destruindo todas as esperanças de escapar do plano de Zeus. Não conseguia imaginar o que dizer, ou o que fazer, e sabia que se aquilo era ruim naquele momento, ficaria ainda pior na reunião.

Quando ele estaria, novamente, cara a cara com Atena, sua nova esposa.

“Eu odeio as voltas que o mundo dá.” Foi seu pensamento antes de afundar na cadeira, e esperar.