Janta escrita por Dark_Hina


Capítulo 24
Quem não quer um gato empalhado na estante?




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/728266/chapter/24

Eu não aguentava mais vê-los naquele silêncio. Passei quase uma hora os observando. Percebi um pouco assustada como eu tinha certa fixação por seus olhos, o jeito que eles pareciam conversar naquele encarar mútuo, naquele silêncio funesto.

Abruptamente Batman exalou e bateu na mesa se levantando, até eu tive um sobressalto com o gesto, não entendi de maneira algum ao se referia. Ele se debruçou na mesa se aproximando do rosto da gata, que instantaneamente esboçou um largo sorriso para ele, ambos rosnaram a sua maneira.

A Gata tinha uma sinistra semelhança com a Kate, era o tom cínico de encarar a todos, era o jeito dissimulado de nos desconcertar, e aquilo afetava nitidamente o Bruce. Eu exalei e saí da sala de observação. Alex continuava parada ao lado do bebedouro com os braços cruzados e o olhar perdido do mundo. Kate tinha simplesmente desaparecido e, bem no fundo, eu desejava que continuasse assim.

Olhei de relance para Alex, sem saber se eu deveria ou não chamá-la, desisti do impasse e entrei na sala do interrogatório. Os dois se voltaram para mim, como se eu fosse uma intrusa, como se eu não precisasse estar ali ou como se eu não devesse estar ali. O peso daquele encarar fez com que eu estreitasse os olhos, com o desejo interno de fulminar ambos. Dei dois passos largos naquele ambiente extremamente carregado de tensão e, sem a menor paciência, peguei a gata pelo pescoço e a ergui no ar, colocando-a contra a parede, do mesmo jeito que eu tinha feito com Bruce horas atrás. Mas não foi tão dramático como da última vez, inclusive nem sequer trinquei a parede com o impacto. Ela estava suspensa no ar e seus pés se debatiam, com a mão livre arranquei sua máscara, o barulho do couro se rasgando colocou Batman em pé.

—O que vocês está fazendo? – Ele perguntou rapidamente.

—Taxidermia, já ouviu falar? - Disse ríspida, nitidamente um pergunta retórica - Quem não quer um gato empalhado na estante? –  Continuei no meu tom indiferente. Era a primeira vez que eu olhava diretamente o rosto da gata. Eu confesso intimamente que fiquei extremamente chocada com sua beleza. A Gata não era simplesmente bonita, ela era estonteante, os traços de seu rosto eram delicados, e a pele extremamente pálida com as bochechas rosadas davam um ar angelical e inocente a ela, um ar que podia ser interpretado como ligeiramente assustado. Por baixo da máscara seus olhos tinham uma cor amarelada, e por mais que sua íris fosse num formato que eu nunca encontrei em nenhum humano, o brilho continuava a ser extraordinariamente expressivo.

Eu parei por uma fração de segundos antes de engoli a seco de e ativar minha visão de calor,  eu projetei os raios fazendo um buraco na parede muito próximo a seu rosto. A fumaça se misturou com a poeira da e os dois gritaram para que eu parasse.

—Vamos esclarecer uma coisa aqui, - disse alto, encarando diretamente os olhos amarelados - eu estou cansada de tudo. – Falei definitiva. - Conhece o Superman? Bom, eu não sou como ele, eu não sou paciente, eu não sou calma, ou você começa a dizer agora mesmo como contatou a gangue ou o próximo buraco vai ser na sua cabeça. E eu juro que eu não tenho nenhum problema com sete anos de azar por matar um gato.

—Supergirl, pare com isso. – Batman falou contornando a mesa.

—Se você der mais um passo definitivamente o próximo buraco vai ser na sua cara. – Eu falei ainda encarando a Gata, e assim como fiz com ele, apertei um pouco sua garganta fazendo ela tossir a seco com falta de ar. Suas mãos algemadas envolveram meu braço, ela ainda estava de luvas mas suas garras nem sequer conseguiram rasgar a manga da minha roupa, parecia alguém tentando fazer cócegas.

Meus olhos, que ainda brilhavam ,voltaram a projetar os raios na parede e seguiram lentamente uma linha reta até milímetros de distância de seu rosto, a pele brilhava com a luz do fogo, ela sentia tanto o calor que o suor brotou de suas têmporas, os cabelos negros soltos e desgrenhados pela parede começaram a ser atingidos pelo raio, fio a fio um mecha foi ao chão, com o raio já próximo a sua orelha e quando a pele ia sendo tocada pelo laser ela finalmente desistiu de se debater.

—EU CONTO! – Ela falou tossindo com os olhos arregalados. Eu parei instantaneamente com os raios, mas meus olhos ainda brilhavam. A larguei no chão e o baque do sua queda sem jeito não me intimidou a querer saber se ela estava bem. Respirei fundo sustentando o calor na face e virei para Batman que me encarava com o queixo caído, completamente atordoado, como se não acreditasse que eu realmente fui capaz de fazer aquilo. Acho que ele não entendeu que eu estava falando sério, e para mim, naquele preciso momento, eu tinha certeza que era a única saída, eu nem sequer estava hesitando em nenhum dos meus pensamentos, em nenhuma das minhas atitudes, era muito nítido na minha cabeça que eu estava fazendo o certo, tomando conta daquele carro desgovernado que se dirigia assustadoramente rápido para a beira do precipício.

Eu me virei para encará-lo e exalei profundamente, logo em seguida disparei um raio em seu braço. Seu grito foi estrondoso, eu lhe peguei completamente de surpresa. Ele caiu de joelhos com o impacto, segurando com a mão o braço ensanguentado. No chão, uma pintura vermelha se fazia com seu sangue, no ar, seu grito gutural e sua respiração descompassada dando um toque grotesco ao que estava acontecendo. Chegava a ser uma cena dramática: os dois no chão, completamente rendidos.

—Você enlouqueceu?! – Ele esbravejou a plenos pulmões.  Eu sacudi a cabeça finalmente recolhendo o brilho dos olhos, eu sentia os vincos na minha testa, eu sentia a raiva estampada em meu semblante, eu sentia o ar de confiança envolvendo todo o meu corpo.

Dei dois passos para perto dele, que tentava abafar o gemido de dor, o braço estava na carne viva e pelo calor do golpe alguma parte de sua roupa acabou se fundido com pele no ferimento, não demoraria muito para infecionar ou o tecido necrosar.

Eu engoli a seco ainda com os olhos estreitos sobre ele.

—Você não manda aqui, entendeu? Você não tem voz aqui. O braço é pra você não me atrapalhar quando acordar.– Eu disse lhe atingindo no mesmo instante, um milésimo de segundos depois seu corpo se chocou com a parede e dessa vez o impacto a trincou. A Gata, que acompanhava tudo aterrorizada, quando piscou os olhos já o viu jogado no chão, desacordado. Me virei novamente para ela, que encolheu o corpo contra a parede.

—Levante-se. – Eu falei baixo, caminhando até o Bruce e o erguendo sobre o ombro. Ela tinha os joelhos bambos, mas fez-se em pé. – Venha comigo, você vai contar tudo ao Winn. – Eu abri a porta segurando o corpo de Batman e esperei para que ela caminhasse para fora da sala comigo, quando ela estava perto de cruzar a entrada eu a parei numa voz baixa e grave, que nem eu sabia que possuía. – Meu objetivo era arrancar o braço dele fora, mas acho que não sou boa de mira, então sem gracinha porque eu realmente estou procurando o alvo móvel para praticar. – Todo o seu corpo estremeceu e assim que ela cruzou a entrada eu sorri para mim mesma de satisfação. Na realidade, eu estava só um pouco assustada com meu comportamento, entretanto era tão tranquilizante saber que aquela confusão toda estava perto de terminar que qualquer culpa que eu pudesse sentir estava sendo anulada pela esperança do novo dia chegar.

Eu pesei algumas coisas na minha consciência, o que a Gata fez com a Lena e a forma que o Bruce brincou e mentiu para mim, o jeito que ele colocou a Lena em risco... Sim, concordo que nessa história de olho por olho todo mundo fica cego, mas antes dos meus olhos cegarem, eles ainda iam queimar muitas coisas.

 

Alex correu até a sala quando viu a Mulher-Gato saindo.

—Ei! – Ela gritou e chegou já com a arma apontada, foi quando me viu segurando o Bruce desacordado e o medo latente na face da Gata. – O que diabos aconteceu? – Ela perguntou atônita.

—Cooperação. – Falei rápido fechando a porta atrás de mim. Alex olhou desconfiada para Bruce desacordado e viu o sangue correndo por seu braço. Ela entreabriu os lábios sem saber o que falar. – Alex, vamos colocá-lo na enfermaria. – Eu disse calmamente.  A Gata estava sem esboçar nenhuma reação, não havia mais o sorriso debochado nem cínico em sua face, e de alguma maneira aquilo era reconfortante. – Nossa amiga aqui resolveu cooperar e vai contar tudo para o Winn, vamos rastrear a gangue e vai dar tudo certo. – Eu forcei um sorriso amarelo que só fez o cara de Alex ficar ainda mais esquisita.

—Depois eu quero saber exatamente o que está acontecendo. – Ela disse séria, segurando a Gata pelo braço e levando ela pelo corredor. Eu dei de ombros sendo atrapalhada pelo corpo de Bruce e saí levitando até a enfermaria colocando ele na primeira maca desocupada. Observei o corte que precisaria de alguns pontos, a pele chamuscada e ligeiramente necrosada, uma parte do ferimento já foi cauterizado no ataque, o que resultaria numa horrenda cicatriz... Algo dentro de mim se sentia muito mal por eu me sentir tão bem com aquela atitude.

Deixei o herói caído na enfermaria e pedi a um dos agentes que estavam passando na entrada para tomar conta dele. Voei em direção a sala de controle, Winn e Alex concentrados nas telas com a Mulher-Gato presa a uma das cadeiras do centro.

—Então, o que temos aqui?

 -Ela já estabeleceu contato com eles, - Winn falou animado – vocês vão pra lá pelo teletransportador, acabam com os bandidos e com as plantas, me dão o sinal e eu puxo vocês de volta.

—“Vocês” quem? – Falei indiferente olhando para Alex e balançando a cabeça. – Não se lembra que o ambiente da Terra é tóxico para eles? Sem dúvidas o ambiente na nave também deve ser tóxico pra você.

—Nós temos roupas especiais para isso.

—Sim, e nós tem uma alien que é invulnerável e indestrutível, que está louca para quebrar umas caras... Você fica. – Falei séria voltando a levitar.

—Supergirl! – Alex exclamou, mas eu fingi que não ouvi.

Ainda no ar fui até a gaveta em baixo dos painéis de controle e retirei dela duas caixinhas. A primeira com um comunicador intra-auricular e a outra com uma espécie de bombinha de asma.

—Eu vou ficar bem. – Disse olhando para a feição preocupada de Alex.

—Mas você pode usar uma roupa de proteção, por via das dúvidas. – Winn falou compenetrado nas telas.

—Ele tem razão. – Alex insistiu se aproximando de mim. –Só pra me tranquilizar, você veste, vai e volta. Por favor. – Ela pediu com olhos suplicantes. Eu concordei com um aceno de cabeça, bom, o seguro morreu de velho, não é mesmo?

 

Ela me levou até arsenal de armas, os cilindros de contenção armazenavam grandes manequins sem face com roupas pretas, ela fez descer a proteção de vidro e começou a mexer no braço do boneco, percebi que ela estava desativando uma espécie de pulseira. A roupa preta simplesmente desapareceu.

—Aqui. – Ela disse estendendo a pulseira.

—O que é isso?

—A roupa é como um campo de força, se ativa com esses braceletes. – Ela colou simultaneamente no meu braço direito e depois no esquerdo, juntou minhas mãos e passou o dedo pelas pulseiras, deu um pequeno choque e uma película preta cobriu a minha roupa, me deixando em um traje colante negro.

—Eu prefiro minha capa.

—Eu prefiro você viva. – Ela falou séria encarando meus olhos. – Não se atreva a morrer, entendeu? Lembre-se que se alguma coisa acontecer a você eu não vou tomar conta da sua Luthor. - Eu só consegui sorrir como resposta para Alex.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!