Janta escrita por Dark_Hina


Capítulo 20
Nem deveríamos estar aqui




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Ela saiu do closet ainda terminando de abotoar os brincos, tinha seu olhar disperso repassando na cabeça as coisas que falaria no evento. Eu parei um pouco, impactada com a vista.  Ela estava em um vestido longo com uma espécie de fenda na frente que esvoaçava como uma calda deixando a vista suas pernas quando andava, o decote vinha em vê num tecido mais pesado que a saia e um tom mais claro, todo o corpete era liso, apenas decorado pelo colar que Bruce a havia lhe dado no dia anterior.

—Tá tudo bem? – Ela perguntou se aproximando, pegando a bolsa carteira que tinha deixado na mesa.  Eu balancei a cabeça dizendo “sim”, um pouco abobalhada. As coisas estavam amenas entre a gente.

Ela estava diferente de ontem, desde que acordou as coisas estavam suaves entre nós, o sorriso que ela me lançou foi mais agradecido que qualquer coisa, inclusive podia dizer que havia algo ligeiramente acanhado naquele curvar de lábios. Ela desviou seu olhar de mim e eu senti minhas bochechas corarem por ela perceber de maneira tão nítida como me afetava.

—Vamos? – Ela perguntou estendendo a mão.

—Vamos. -  Falei entrelaçando nossos dedos. Quando pensei em começar a andar ela me puxou de volta para seu braços, seus lábios cobertos de batom encostaram nos meus.

—Você vai borrar sua maquiagem. – Falei contra sua boca.

—Eu queria que você pudesse tirá-la, junto com o vestido. – Ela disse encostando nossas testas.

Eu não sei como ela fazia aquilo, mas era impossível resistir ao seu toque, era impossível negá-lo.

—Vamos nos atrasar. – Falei esperando controlar o sorriso que se alargava por meu rosto.

—Verdade. – Ela concordou a contragosto, voltando a melar meus lábios com os seus.

Ergui meu olhar em direção ao seu e percebi como o tom do brilho em seus olhos mudaram rapidamente, estavam ligeiramente sérios.

—É que... – Ela mordeu o lábios pensando em como falar, seus olhos reviraram fugindo dos meus. – Eu estava me lembrando... – Era engraçado a forma como ela não conseguia completar as frases. Lena era uma pessoa que dificilmente se constrangia mas eu podia jurar que por baixo da maquiagem suas bochechas estavam coradas. Seus lábios entreabriram incertos e um certo sorriso envergonhado estava se formando a medida que ela pensava em como terminar de falar. – E ontem de noite... – Respirou fundo para continuar. – Hm... Ontem foi a noite... – A frase morreu em sua boca mas o sorriso estava lá.

Eu concordei com cabeça, também sentindo meu rosto ferver.

—Ontem a noite... – Repeti também sentindo que aquilo não precisava de complemento.

Não havia mais nada a ser dito, nossos olhares estavam conversando sozinhos, indiferentes a nossa súbita timidez. Ela voltou a segurar minha mão e saímos pelo quarto indo em direção ao evento.

O plano de um jantar com os acionistas tinha sido mudado abruptamente pela manhã. Lena, inclusive, tinha ficado desesperada com a notícia que não seria apenas mais um jantar casual, mas sim um evento fechado com uma grande lista de representantes do governo. Confesso que não entendi o motivo da mudança, tinha algo a ver com um enxerto de capital bilionário para a L-Corp e algumas outras várias coisas que eu perdi enquanto estava dispersa diante de seu divago.

O jantar tinha sido alterado para uma área de festa fora da cidade, fomos com Freddy, que me olhou aliviado assim que nos viu de mãos dadas, ele esboçou um sorriso que não se conteve de satisfação.

Havia uma fileira de carros diante da entrada, um tapete vermelho exatamente aonde eles paravam e uma dúzia de colunistas tirando fotos como se fossem paparazzi ensandecidos.

—Eu deveria estar cobrindo esse evento. – Falei observando a loucura dos flashes.

—Já eu acho que a gente não tinha nem que estar aqui, deveríamos estar na minha casa, com um bom vinho e minha cama. – Ela falou com seu bafo quente banho minha nuca, me causando arrepios na espinha.

Eu me virei pra ela, rindo e dei de cara com seus lábios avançando pra mim. Era simplesmente impossível pará-la, era simplesmente impossível recuar. Sua língua brincou com a minha e quando menos esperando sentimos o carro parar lentamente. Ela se afastou num sobressaltado quando percebeu que Freddy descia do carro para abrir a porta. Ela foi a primeira a descer, sendo atingido por uma chuva de flashes, fiquei receosa ao descer, mas ela me esperou estendendo a mão para que eu a acompanhasse.

Assim que demos alguns passos nos encontramos no tapete com Bruce, que nos sorriu cordialmente, parou seu trajeto e veio nos cumprimentar. Estreitei os olhos para ele, desejando fulmina-lo com minha visão de calor lembrando de como aquele cretino mentia descaradamente. Ele estendeu a mão para mim, enquanto para Lena lhe envolveu num abraço pela cintura e lhe beijou o rosto. Só depois de alguns instantes percebi que ele não estava sozinho, Kate parecia desaparecer ao lado num justo vestido preto com os cabelos rubros presos em um coque alto, completamente deslumbrante.

—A foto dos dois, por favor. – Gritou um dos fotógrafos para Bruce e Lena.

Ele prontamente a puxou para longe, de frente ao flashes, Kate sorriu para mim se aproximando e entrelaçando seus dedos na minha mão e saiu me puxando para fora do tapete, para dentro do salão.

—O que você está fazendo?

—Não duas somos a atração da noite, você deveria saber disso, Reporte – Ela falou naquele tom de deboche. E a acompanhei vencida compreendendo que ela estava certa.

Olhei sobre o ombro pros dois que ficavam atrás, observando como Bruce envolvia a cintura de Lena e como ela, por um instante, me procurou ao seu lado, mas logo perdeu o foco quando o fotógrafo voltou a gritar pedindo para que ela olhasse pra câmera. Engoli a seco observando como de longe eles pareciam um grande casal ou algo do tipo.

—Nós não deveríamos ir pra longe deles. – Eu disse a Kate ela pareceu não se importar, ela só tinha aquele sorriso delicado nos lábios e um olhar complacente.

—Vocês não estão realmente juntas, não é mesmo?

Eu quase tropecei em meus próprios pés quando ela falou aquilo, ela estava me levando para uma área lateral no salão, completamente distante da multidão, bem depois das mesas. Era uma pequena entrada que dava para um outro salão, só depois que estávamos na metade do corredor percebi que íamos em direção a uma espécie de jardim inverno, com alguns bancos de uma estátua renascentista no meio.  O céu estava nu diante da claraboia estilo estufa, com as nuvens se curvando ao brilho da lua cheia e as estrelas, enciumadas, cintilando indiferentes, sabendo que jamais poderiam roubar a beleza daquela noite.

—O que nós estamos fazendo aqui?

 -Eu perguntei primeiro. – Ela disse altiva.

—O que?

Sua risada ecoou.

—Você é meio lenta, né?  - Kate avançou com sua mão ajeitando meu óculos. – Eu tinha perguntado se você e a Luthor realmente estão juntas. – Eu me afastei no reflexo, sem entender direito o que aquele sorriso sugestivo estava fazendo em seus lábios.

—Acho que isso não importa muito. Inclusive acho que nem deveríamos estar aqui, ou você pensa que eu me esqueci que seu chefe acha que é um bom plano deixar que capturem a Lena?

Ela continuava ostentando aquela curva que me causava um verdadeiro incomodo. Bem da verdade eu estava ficando desconcertada com a maneira que ela encarava meus lábios, a maneira que sua linguagem corporal me dava uns segundos sinais, coisa que não estava presente quando a conheci mais cedo.

—Fique tranquila menina de aço, Bruce pediu pra que eu olhasse o perímetro. – Ela levou a ponta dos dedos para o decote do vestido e retirou de lá o que parecia ser uma pequena lanterna em forma cilíndrica, uma luz vermelha piscava incansavelmente em sua lateral e quando ela apertou a parte de baixo com o polegar a pequena luz gerou um scanner laminar que girou em 360º por aquela sala, a luz se conteve e bipou duas vezes antes de ficar verde. – Tudo okay. – Ela disse voltando a guardar o pequeno instrumento no decote. – Viu? Não te ataquei nem nada.  

—Eu não achei que você estivesse me atacando.

—Não? – Ela perguntou com a sobrancelha alta.

—Não... – Disse num fio inseguro de voz.

—Então por que você me responde se você e a Luthor estão juntas?

—Por que eu não consigo entender como isso pode ser da sua conta.

—Não? – Ela causalmente deu um passo em minha direção. –É porque eu me sentiria muito mal fazendo isso em uma pessoa comprometida. – E seus braços rapidamente avançaram sobre as alças do meu vestido me puxando para si, seu lábios vieram rápidos e certeiros na direção dos meus e pousaram por lá apenas um segundo, que foi o tempo que eu levei para lhe empurrar tendo cuidado para não jogá-la do outro lado do jardim.

—Que porra! – Esbravejei lhe segurando firme pelos ombros, sua expressão visivelmente surpresa tanto pela recusa quanto pela força. -O que você pensa que está fazendo?

Sua cabeça pendeu para o lado.

—Qual o problema?

—O problema é que você não pode sair por aí beijando as pessoas sem primeiro perguntar se elas deixam.

O sorriso de Kate continuava lá, mas os contornos estavam diferentes.

—Por que você correndo atrás dela? Ela é uma Luthor, isso deve desafiar alguma lei da natureza. – Ela revirou os olhos. -Sabe, entre nós duas, ela estaria melhor com o Bruce, os dois são da mesma casta.

Eu parei por um instante atônita.

—Como é? “A mesma casta?” Você consegue se escutar? – Kate me olhava vagamente, sem entender o que eu estava dizendo. Respirei fundo.

Por um instante fiquei encarando seus olhos verdes esperando que eles entendessem algo que lhes parecia intangível. Eles eram muito bonitos e brilhantes, mas um tanto quanto vazios.

Eu tentei remotamente me lembrar de quantas vezes Lena me atacou, de quantas vezes ela seguiu aquela impulsividade me furtando beijos e carícias e como em nenhuma das vezes fui capaz de resistir, fui capaz de contestar. Lena me domava pelo toque, ao passado que o som de sua risada se projetava dentro de mim me rendendo. Era um pouco doloroso perceber o quanto ela me tinha fácil.

Voltei a encarar Kate, permitindo que meu olhos contornassem mais uma vez seus lábios e me dando de conta que se eu quisesse eu poderia facilmente beijá-la, mas eu simplesmente não queria, eu não conseguia nutrir dentro de mim essa vontade.

Sacudi a cabeça desistindo de esperar que ela entendesse o que eu estava falando.

—Deixa, vamos voltar e, por favor, não comente nada com ninguém, tudo que eu não preciso é do Bruce dizendo pra Lena que você me beijou.

Larguei Kate e ela rapidamente deu ombros.

—É uma pena, sempre tive curiosidade de estar com uma alien, Mag sempre falou como é interessante ficar com vocês.

Eu pisquei meus olhos atônita.

—Eu não sou um projeto de ciência pra você experimentar coisas novas.

Kate exalou

—Você nem quer tentar imaginar como seria divertido se fosse?

Dei de costas e saí na frente, me negando a passar mais um segundo sequer ao lado dela. Por que todos os morcego de Gotham era completos babacas?

Ela seguiu atrás de mim de volta para o salão, direto para a mesa que Bruce estava sentado ao lado de três cadeiras vazias.

—Aonde vocês estavam? – Ele perguntou em seu tom elegante chamando um garçom.

—Nós estávamos... hm... Aonde nós estávamos, Kara?

Estreitei os olhos para ela que acabava de pegar uma taça de champanhe e bebida com um sorrisinho cínico.

—Nós estávamos no banheiro. – Falei entre os dentes.

—Viram a Lena? Ela tinha dito que ia para lá e depois ia te procurar. – Ele comentou casualmente, tomando um gole de seu copo de uísque.

—Acho que a gente se desencontrou. – Disse dispensando a taça que ele ia me entregar.

O ambiente estava lotando vagarosamente e o silêncio tenso da nossa mesa era preenchido pelo som do piano que tocava ao longe. Um rapaz engravatado se aproximou da mesa com um pasta, se dirigindo a Bruce.

—Senhor Wayne? – Chamou educadamente. – O senhor viu a Senhorita Luthor? Nós estamos esperando ela para começar a cerimonia.

O cenho de Bruce franziu.

—Essa ida ao banheiro está demorando. – Ela falou olhando para mim e Kate.

Me levantei em um pulo.

—Vou até lá.

Cruzei as mesas caminhando entre as poucas pessoas em pé. Apesar de ser um evento fechado tinha muita gente e todo mundo que andava entre as mesas eram alvos de flashes a distância. Cheguei ao banheiro com certa pressa e quando procurei nas cabines todas estavam abertas, Lena não estava lá.

Num primeiro instante acreditei realmente que havíamos nos desencontrados, mas como eu tinha percebido no caminho eram pouquíssimas pessoas em pé para que eu não a tivesse visto, principalmente do jeito que ela estava deslumbrante.

Saí em passos rápidos do banheiro e dei de cara com olhar de Bruce do outro lado do salão, eu balancei negativamente a cabeça começando a ficar aflita. Ele cochichou algo no ouvido do rapaz com a pasta e ele o rapaz no mesmo instante saiu em direção ao parlatório. Toquei no ouvido ativando meu comunicador intra auricular.

—Alex? – Chamei baixo na linha ativa.

—Supergirl? O que aconteceu?

—A Lena, ela não está aqui.

—A equipe tática está em todas as saídas e entradas, não tem como ela ter saído daí.

—Alex, eu estou olhando com minha visão de raio-x, eu não estou vendo ela em canto nenhum nem do prédio nem do salão.

As caixas de som vibraram quando o microfone do parlatório ligou, era o mesmo engravatado que acabara de falar com Bruce.

—Senhorita Lena Luthor, por favor, poderia se dirigir ao palco?

Todos ao redor olharam atentos a sua volta esperando que Lena se erguesse no meio de qualquer uma das mesas, entretanto depois de alguns instantes de silêncio todos começaram a parecer tão apreensivos como eu, sem saber exatamente aonde ela estava.


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