Lucca escrita por littlefatpanda


Capítulo 9
VIII. Aan de gang


Notas iniciais do capítulo

Gente linda, gente boa, gente bela! *-*

'Aan de gang' significa 'em andamento' em holandês, referente à investigação.

Só vou avisar que a parte em itálico é lembrança do mês anterior (junho) e que o capítulo anterior também se passou em junho (eu não tinha avisado antes).

Boa leitura! *-*



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Julho

— Eu vou fazer eles entregarem os documentos nem que seja à força! — Hemming berrava assim que Lisa adentrou no cômodo, já não tão impressionada com o temperamento de seu mais novo colega de serviço.

— O que aconteceu?

A psicóloga passou os olhos de Hemming para seu assistente atrapalhado. Em seguida para Grace Collins e duas policiais que ajudavam ela com uma papelada, e por último em Gloria, sentada em uma das poltronas do local.

Gloria Jensen, os cabelos enrolados presos em um coque, tinha uma das mãos na boca, roendo as unhas com nervosismo. O corpo rechonchudo, bem como como os olhos escuros e o sorriso grande e amigável no rosto de pele negra – o que não acontecia no momento devido à situação de alerta, a tornavam praticamente perfeita para seu trabalho.

Gloria Jensen fora especialmente escolhida pela doutora Lisa Clark para ajudar Lucca. O motivo, além da competência e excepcionalidade da assistente social, fora a localidade da mesma. Lisa fora analítica o suficiente para escolher alguém proveniente da mesma cidade que a família Walker, com o objetivo de que isto facilitasse os planos que tinha para Lucca. Fizera uma ótima escolha, visto que o garoto passara a confiar em Gloria com uma facilidade que não ocorreu consigo.

Hemming, com o rosto vermelho de forma que destacava os olhos claros, postou as mãos da cintura. Lisa imaginou que fosse para não quebrar nada de seu escritório. Ou ninguém.

— Eles estão se recusando a nos entregar o resto dos documentos — resmungou com a voz grave, irritado. — A parte importante dos documentos — enfatizou. — Não precisamos saber a extensão de terra utilizada, nem quantos metros de plantação de couve haviam lá. Também estou pouco me fodendo para a idade de cada defunto encontrado no mato! — Gritou, bufando. — O que eu quero saber é o que diabos diziam nos arquivos que eles guardavam, nem que esteja em latim! Necessitamos saber a quantidade de armas que haviam lá, e a quantidade de metanfetamina que eles produziam, porque eu juro pelos meus ovos que ele produziam! Eu vi! — Luke chutou uma das cadeiras, levando os dedos aos cabelos em seguida, respirando fundo. Ergueu-os para Collins e Lisa em seguida. — Precisamos dos registros da quantidade de pessoas que lá haviam. Precisamos daqueles nomes, Clark.

Lisa inspirou fundo, dando razão a Hemming. Ele podia ser tempestuoso e usar de um palavreado nada adequado, mas tinha razão. Eles precisavam dos documentos e tinham de consegui-los, nem que tivessem que processar a delegacia de Amoran por obstrução de justiça e roubo de informação classificada.

Um mês antes, o xerife Gerard Henley havia feito uma ligação que mudara o rumo da investigação da I.E.C, subindo alto no conceito de Lisa. Havia tido alguns desentendimentos com o xerife de Cherub Field, mas não lhe restavam dúvidas de que era um policial e um ser humano íntegro.

Flashback 

Junho

 Não entendo por que ninguém mencionou isto antes  bufou Hemming, passando as mãos pelos cabelos escuros.  Já se passou um mês desde que Lucca apareceu. Como ninguém mencionou isto antes? Aconteceu na cidade ao lado!

Estavam no escritório de Hemming, no departamento da I.E.C de Doubleville.

Luke estava andando de um lado ao outro dentro de seu escritório, ao passo que sua parceira, Collins, fazia inúmeras ligações pelo telefone e seu assistente atrapalhado pesquisava à respeito no computador. Lisa, sentada no sofá para que não tonteasse com a velocidade de seus pensamentos, limitou-se a suspirar.

 Eles estavam muito atolados com o processo, os repórteres, as ligações e a mídia para se lembrarem de algo que ocorreu sete anos antes em uma cidade que nem é a deles, Hemming — murmurou Lisa ao perceber que o agente ainda murmurava palavras desconexas ao andar de um lado ao outro.

Hemming parou de andar, inspirando fundo. Mirou os olhos claros nos de Lisa antes de perguntar: — Acha possível? Acha possível que o garoto tenha alguma relação com Amoran?

Lisa levantou-se e caminhou até a janela do escritório, recordando dos momentos que tivera com Lucca e as poucas informações que ele deixara passar, assim como as informações médicas.

Sassenach, a palavra escocesa usada para representar os ingleses, não lhe saía da cabeça.

— Lucca fala mais de um idioma. — Decidiu comentar Lisa ao invés de responder a pergunta. Talvez assim eles seguissem o raciocínio da psicóloga e chegassem em uma conclusão diferente da dela.

— O quê? — Deixou escapar Grace, com a voz alterada, assim que desligara mais uma vez o telefone. — Mas ele mal sabe falar inglês!

— O que ele não sabe falar em inglês, ele sabe em espanhol, hindi e japonês — contou Lisa, erguendo uma das sobrancelhas. — Ele sabe um pouco de cada, sendo em inglês seu vocabulário mais abundante. Demorei a perceber, porque pensei que as palavras soltas e ininteligíveis que ele solta de vez em quando fossem uma linguagem própria. Estava errada.

Luke Hemming podia ter motivos controversos para sua determinação em resolver o caso de Lucca, mas sempre deixava a equipe aliviada por tê-lo trabalhando com eles. Todos no escritório sabiam que ele se tornava cada vez mais competente à medida que a situação apertava. Era destemido, atrevido e centrado. E estas qualidades apenas se intensificavam à medida que se enfurecia.

Limitou-se a ficar calado, a mão em punho cobrindo a boca ao passo que pensava de forma rápida, antes de erguer os olhos claros em direção à sua equipe com determinação.

— Eles estão enrolando, Grace?

Sua companheira olhou para o telefone com cansaço antes de assentir com a cabeça.

— Pois muito bem — murmurou, o tom sombrio. — Não querem contar nada? Beleza. — Em seguida, sorriu com escárnio. — Partiremos rumo à Amoran em vinte e quatro horas com uma equipe.

O "Acampamento de Amoran", como fora chamado o incidente de sete anos antes, era exatamente o tipo de resposta que Lisa pedira aos deuses. Hemming e Collins também. Assim que ficaram a par de tudo o que as notícias deixaram passar sobre o ocorrido nas florestas de Amoran, passaram a comunicar-se com a delegacia de lá e iniciar uma investigação mais localizada. Uma equipe de I.E.C fora mandada para o acampamento, para uma inspeção mais detalhada.

Os escombros do que um dia fora uma espécie de vila ainda estavam lá, alguns dos pertences dos imigrantes junto. A horta ao lado do local ainda permanecia, já inadequado para plantações. Apesar de uma boa equipe ter sido mandada para fiscalizar o local e buscar todos os documentos acerca do caso, além da unidade do xerife Gerard, Hemming se recusou a ficar em Doubleville. Voltou para o sul do Estado em conjunto da unidade para liderá-los. Mal havia posto os pés nos escombros do acampamento para saber que a situação havia sido pior do que era indicada nas notícias.

Sua visão treinada não deixara passar nem um único detalhe em branco nos aproximados 2 hectares da pequena ocupação cercada da faixa amarela da polícia. Não ocupava quase nada da floresta, por isso era tão difícil encontrar o local. Precisaram de alguém do corpo policial para liderá-los até lá. O domínio de Amoran ia até dez quilômetros floresta adentro e o acampamento se localizava próximo às placas de limite, embora não as ultrapassasse. Exatamente o que causara tanto temor à unidade policial local.

Os olhos atentos de Luke passaram por tudo com a máxima atenção nos detalhes, o relatório sobre o ocorrido em mãos. Estava tão desconfiado da cidade e da sua relação com o acampamento, que obstinou-se em checar cada mínimo parágrafo de todos os documentos que a unidade do local mantinha. Era impressionante que, apesar de toda a suspeita em cima da cidade, eles não se deram ao trabalho de ao menos limpar o local.

O relatório policial de Amoran dizia que as drogas encontradas no acampamento, além da maconha, eram drogas lícitas. Dizia também que haviam cerca de trinta tendas, feitas de tecidos e sustentadas por canos de plástico, como em barracas. Luke checou ao passar por ali, torcendo o nariz pelo cheiro ainda impregnado no local. O incêndio começara nesta parte, dizia o relatório, devido a quantidade de conteúdo inflamável, o que o intensificou e espalhou para as pequenas casas de madeira improvisadas. Estas instalações eram maiores, intituladas de "cabanas", e havia cerca de dez unidades. Não sobrara nada mais do que destroços, no entanto, dificultando o trabalho de Luke em contá-las para ver se os documentos estavam corretos.

Nada mais era habitável, mas para um garoto perdido era muito fácil esconder-se em alguma parte daquela extensão por algum tempo. Hemming passou os olhos por alguns pontos estratégicos, parando em uma parte de madeira de uma das cabanas que continuava em pé. Não era necessário muito raciocínio para deduzir que o lugar era perfeito para uma criança se esconder da chuva e do frio. Estalou a língua, observando as pegadas de pés descalços ao longo de todo o acampamento. Hemming podia apostar um braço que pertenciam ao garoto.

Juntou do chão e analisou diversos objetos que ali ficaram esquecidos pelo tempo, levando-os ao nariz toda vez que encontrava algo que não havia sido consumido pelo fogo. Balas provindas do tiroteio, cacos de vidro, pedaços de panos, de cadeiras e de calçados simples, tigelas, escova de cabelo. Os restos de boneca que enxergara o fez paralisar por um momento, dando-se conta de que não havia pensado em outras crianças vivendo ali. Balançou a cabeça antes de continuar, a atenção sendo chamada por um pedaço de vidro grosso em forma da letra V.

Levou o objeto ao rosto, o cenho franzido ao observar a cor amarelada no mesmo. Torceu o nariz ao reconhecer o cheiro, mesmo que distante. Ergueu a cabeça com brusquidão, os olhos varrendo o local mais uma vez. A parte da horta, das tendas e das cabanas. Reconheceu alguns frascos atirados um pouco mais distante dos escombros, balançando a cabeça com indignação. Afastou-se o suficiente para observar de uma perspectiva diferente, seguindo com os olhos os rastros de fogo e cinzas que ali haviam.

O relatório estava errado e seu intuito estivera certo, afinal. O cheiro, os frascos, o incêndio.

O incêndio não originara das tendas feitas de tecido. Originara no laboratório improvisado de produção de metanfetamina em uma das cabanas. O incêndio começara ali antes de se propagar para as tendas, assim como checara ao ver os traços do fogo nas árvores e no chão de terra. As balas trocadas ali podem haver tido ou não alguma ligação com a explosão do laboratório, mas não foram elas que começaram o incêndio.

 Maconha e cigarro — debochou em um murmúrio. — Um caralho!

A descoberta fizera Luke separar uma parte da equipe para se instalar na pequena cidade, investigando o que pudesse sem a interferência da delegacia de Amoran. Em seguida, voltou para Doubleville, obstinado em desvendar o mistério de uma vez. Se perguntara, pelo resto do caminho até sua casa, sobre o que mais Amoran havia mentido.

Agosto

Algumas poucas palavras eram trocadas entre a unidade de I.E.C ao passo que eles esperavam ansiosos pela ligação. O processo contra a Delegacia de Amoran levaria meses e nenhuma das duas delegacias gostariam de passar por isto. O delegado Bridget, em junção de seu advogado, os havia informado horas antes a respeito da proposta acerca de Amoran. A ligação determinaria se eles colaborariam ou não.

Grace Collins roía o que lhe restava das unhas, já nervosa por todo o estresse que envolvia o caso de Lucca. Hemming havia se retirado, cansado de esperar. Lisa passara algumas horas com Lucca, percebendo com orgulho o progresso que estavam tendo, antes de voltar à sala, sentando ao lado de Gloria Jensen. A assistente social, apesar de não fazer parte da unidade, estava tão ansiosa quanto com relação ao destino da investigação e, consequentemente, o destino de Lucca.

A porta do escritório fora aberta de forma abrupta, revelando Hemming e as olheiras profundas de seu rosto rígido. Antes que ele pudesse fechar a porta novamente, uma mão interveio entre a mesma e o batente, impedindo que fosse fechada. Luke a puxou de forma nada sutil, dando de cara com seu assistente e um belo sorriso no rosto franzino do rapaz.

Lisa levantou do sofá rapidamente ao perceber que o sorriso imenso no rosto do assistente significava que eles conseguiram algo melhor do uma ligação. Uma enorme caixa era segurada com dificuldade pelo jovem, escrito em letras negras: Arquivo Classificado.

O rapaz de cabelos loiros deu uma risada sufocada antes de pronunciar-se: — Conseguimos, senhor.

Mal puderam comemorar antes que a caixa fosse aberta com violência, revelando tudo o que eles precisavam durante semanas. Divididos entre as mãos dos dois agentes, do rapaz franzino, da assistente social e psicóloga, os papéis foram revirados e estudados com atenção.

No meio dos documentos escritos pela delegacia de Amoran, havia um plástico de amostras com folhas envelhecidas, amassadas e sujas resguardadas dentro do mesmo. Assim que colocaram os olhos nelas, todos tiveram a certeza de se tratar da lista de identificação dos imigrantes. A busca assídua pelo nome específico acabou assim que Collins soltou um gritinho abafado, sacudindo a folha de número 5 com entusiasmo antes de apontá-la para o restante dos presentes.

Em letra rabiscada sem qualquer cuidado e de difícil leitura, entre o nome de Quotar e Edek, havia o nome que eles tanto esperavam. Mesmo com a letra c rabiscada por cima de um k e praticamente ilegível, o nome parecia gritar por atenção:

Lu̶k̶ca


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Notas finais do capítulo

Amem, odeiem, mas me digam o que acharam! *O*



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