Jacob andava a frente, me guiando por entre a mata. Meu corpo estava em alerta, então, conseguia captar tudo a minha volta. Era como se ele estivesse prevendo um ataque, que não viria. Pois, o perigo nesse momento era eu.

O irônico foi isso acontecer logo depois de eu pensar a respeito, na casa de Sam. Eu poderia ter atacado meu pai, por Deus. Poderia ter deixado ele com uma cicatriz horrível ou…

Balancei minha cabeça, sentindo-a pesar. Minhas patas grandes afundavam na terra molhada da floresta, o marrom-café se perdendo na areia de cor quase igual. Respirei fundo, lembrando-me das incessantes sessões com meu psicólogo.

Desde muito pequena eu tinha problemas com nervos. Ficava irritada muito fácil, perdia a noção de quem eu era. Com a adolescência, aprendi a transferir minhas frustrações para um saco de pancadas.

Lutava boxe desde meus nove anos, e, já fazia um tempo que não tinha um surto nessa escala.

Mexi os ombros, olhando para frente e vendo Jacob parado, me olhando. Estava ainda em sua forma de lobo, mas, mesmo sendo um animal enorme e peludo, eu conseguia o achar atraente.

Talvez eu seja uma zoofólica?

Jacob riu, na verdade fez um som estranho tentando rir.

Na verdade, o nome disso é imprinting, ele falou, ainda risonho. Mas logo ficou sério, olhando-me diretamente nos olhos. É assim que chamamos a conexão com as nossas almas gêmeas.

Quer que eu comece a acreditar em papai noel, também?

Me concentrei em ignorá-lo por um momento, apenas focando na minha transformação de loba para humana. Eu sei, quando voltava a ser humana estava sem nenhuma roupa, mas eu realmente queria conversar como pessoa normal.

Falando, e não por pensamento.

Logo minhas patas foram substituídas por mãos, e eu senti todo o meu corpo mudar. Na primeira vez fora um processo doloroso, até. Mas, agora, apenas causava um desconforto.

Estava garoando - o que, não era nenhuma novidade -, mas, as árvores impediam da chuva chegar ao solo. Levantei-me do chão, olhando ao redor.

— Tá esperando o que? — Arqueei uma sobrancelha em direção à Jacob, sarcástica. Mas, logo me arrependi.

Eu voltar a formar humana e ficar pelada? Tudo beleza. Mas Jacob voltar a forma humana e ficar como veio ao mundo na minha frente, já era covardia.

Virei o rosto para o lado, sentindo meu rosto corar. Fora tão rápida em me privar dessa visão, que a única coisa que pude ver, foi o relance de seu peito musculoso e barriga tanquinho.

Ficamos em um silêncio constrangedor por algum tempo, até que sua voz soou baixa e rouca.

— Serena?

— Uhn? — Falei olhando para uma árvore em minha frente, evitando o olhar.

Mariza costumava me chamar de falsa puta. Dizia que eu dava pinta de uma pessoa sem vergonha, mas, que no final corria. Eu sempre mandei ela ir se foder depois que dizia isso, mas agora não tinha como: eu estava me chamando de falsa puta.

— Precisamos conversar. Sobre o que temos. Sobre o seu ataque. Sobre você continuar em La Push. Por que você vai continuar.

— Ei ei, espera aí! — Me virei para ele, ignorando sua nudez e apontando um dedo em sua direção. — Quem te deu essa autoridade que você acha que tem? Você não manda em mim não, totó.

— Não estou mandando você ficar, Serena… Mas estou dizendo que preciso que fique.

Fiquei quieta. Jacob me encarava com os olhos intensos e escuros, quebrando todas as minhas barreiras. Era estranho, toda as defesas que construí durante anos iam por terra quando eu estava perto dele.

Respirei fundo. Ok, eu sei ser razoável.

— Me explica mais sobre esse negócio de imprinting. — Pedi.

— Bem… É como se estivéssemos ligados, como… Almas gêmeas. Nosso lobo interior reconhece aquele que foi feito para nós no instante que o olhamos nos olhos.

— Ok. Entendi. Almas gêmeas, lobos, vampiros… Eu devo ter morrido no avião e estou em coma. Você tem noção do quanto isso é surreal?

— Eu sei que parece surreal Serena, mas é a nossa realidade. Eu me transformei não faz muito tempo, também, e tudo isso é muito novo pra mim também. — Jacob deu um passo na minha direção, com uma mão estendida na minha direção.

Eu preciso pensar. Preciso de um tempo… Suspirei. Me virei e, concentrando-me me transformei. Dei uma última olhada na direção dele e me virei, correndo o mais rápido que conseguia.

NARRADO POR JACOB

Eu observei Serena desatar a correr e respirei fundo. Toda aquela situação também estava sendo complicada para mim, antes de me encontrar com ela eu era caidinho por Bells e do nada, meus sentimentos mudaram de forma brusca.

Era até melhor assim. Serena é como eu, não tinha nenhum namorado vampiro. Suspirei, socando uma árvore e fazendo um buraco.

Fechei os olhos, apoiando minha testa na árvore e respirando fundo, lembrando de quando meus olhos cruzaram com os seus, de como eu me apaixonara instantaneamente pelos olhos claros dela.

Ouvi passos por perto e logo senti a mão de Sam em meu ombro, apertando-o levemente.

— Serena é um tanto complicada. Dê um tempo para ela assimilar tudo o que está acontecendo.

Assenti, desencostando minha testa da árvore e o olhando.

— Acha que ela vai querer ir embora?

— Will me disse que Serena tem problemas para se controlar. Que ela é instável desde criança, se descontrola muito rápido… Fica brava com facilidade. Não acho que ela vá querer ir embora, isso é tudo muito recente para ela digerir.

Respirei fundo e assenti.

NARRADO POR SERENA

Derrapei com minhas patas no chão, parando a beira de um penhasco. Não me transformei novamente em humana, preferindo ficar na minha forma animal por um tempo. Sentei, olhando o mar e a praia logo abaixo. Era irônico ter uma praia numa zona tão fria.

Minhas orelhas viravam de acordo com os sons, sempre atenta a qualquer movimento. Então, por isso captei os passos de Will chegando, do mesmo jeito que consegui indentifica-lo pelo seu cheiro.

Ele sentou ao meu lado, mas no mesmo momento levantei e fui para uma parte mais segura da beirada do penhasco. Eu acho que sobreviveria a uma queda daqui de cima, mas com toda certeza Will não.

Ele riu baixo, se levantando da onde sentou e foi para o meu lado.

— Você não vai voltar a forma humana?

Fiz que não com a cabeça, bufando. Will não me veria pelada nem fodendo.

Will ficou em silêncio por um tempo, apenas observando a paisagem que se estendia a nossa frente. Fiz um movimento com a cabeça, dizendo para ele falar o que tinha que falar. Não gostava de enrolações.

— Sua mãe ligou. Ficou preocupada com a sua ligação, quer que volte para Londres. Você entende que não pode voltar agora, não é? Seria um risco pra você, sua mãe, seu irmão e John.

Bufei. Seria tão melhor se Will tivesse trazido uma muda de roupa para eu colocar. Devidamente vestida, eu iria retrucar com um “eu não quero ficar aqui, também. Londres é minha casa”.

Mas, pensando melhor, eu agradeci não poder responder. Will ficaria magoado, nós começaríamos a brigar, eu ficaria com raiva e lá se ia mais umas peças de roupas.

Não que eu eu me importasse com isso, qualquer coisa era só dar um pulo em Port Angeles e comprar mais roupas.

Me importava com Will. Eu tinha a irritante mania de falar bosta, agir de maneira momentânea e acabar magoando alguém. Eu já estava acostumada em magoar Mariza, mas Will era outra coisa.

Baixei a cabeça, deitando-me no chão e assentindo.

— Se com o tempo… Você pegar o jeito da coisa, conseguir controlar as transformações e seus nervos, bem, eu vou aceitar que volte para Londres. Mas entenda, estar na matilha é uma coisa grande… É um dever. Cuidar dos humanos, proteger eles dos vampiros. Sei que pode parecer um peso enorme nas tuas costas, sei também que está com raiva de mim por ter insistido tanto que viesse morar comigo agora. Eu quero te ter por perto. Mas eu também estava preocupado que sua transformação ocorresse lá em Londres… Imagine o que sua mãe faria, se visse um lobo enorme no meio da sala dela? — Will soltou um riso debochado.

Soltei um riso, ou tentei. O barulho saiu meio ridículo, parecendo uma foca engasgada. Mas, não pude contê-lo. A imagem de Mariza dando um ataque, gritando, desmaiando, quando visse um grande lobo na sala dela.

Grande mesmo.

Eu não era a menor do bando, não. Esse era o cargo do Seth. Mas, eu era consideravelmente grande. Um pouco menor que Paul, talvez. Mas Jacob conseguia ser maior que eu - na forma humana e na forma lupina.

Balancei os ombros, numa forma discreta de dizer que, bem, eu estava constrangida com o ataque de hoje cedo. Olhei para meu pai, encarando-o bem nos olhos. Queria que ele visse que eu estava arrependida - em partes.

Ele deu de ombros, colocando a mão no alto de minha cabeça e acariciando os pelos marrom-café.

— Está tudo bem, princesa. Eu entendo.