Dearly Beloved escrita por lolitah


Capítulo 1
Capítulo 1




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Palavras são erros.

 

“Eu te amo, Any.”

 

Não me lembro da última vez que a vi e isso me surpreende.

 

Porque eu costumava lembrar minúcias a seu respeito. Não creio que ainda me recorde da data do seu aniversário, não acho que ainda faça alguma diferença eu lembrar ou não. Também não sei ao certo em que caixa de sapatos ficaram perdidas suas fotografias, mas gosto de pensar que estão na caixa azul na parte superior do armário, porque é onde guardo as lembranças mais preciosas. Nunca fui verificar, no entanto, porque gosto de saber que já não me lembro tão bem de suas feições.

 

Não me lembro, também, da última vez em que chorei por ela, mas já faz algum tempo.

 

Embora eu me lembre bem de que não tinha ninguém me amparando além do meu travesseiro molhado. E lembro que a dor que eu sentia parecia irreparável; incurável. Mas acho que quando o tempo passa, as feridas tornam-se menos doloridas. Não que elas nunca se curem, mas é um processo tão lento que chega a ser desprezível.

 

Não me lembro da última vez que disse seu nome em voz alta, mas tenho certeza de que saiu no meio de um soluço.

 

Porque quando ela foi embora, tudo em relação a ela me levava às lágrimas. Não mais, apesar de incomodar um pouco ainda. Às vezes eu até ouço sussurros durante a noite e posso jurar que dizem seu nome. No começo achei que enlouqueceria, mas parece que minha sanidade não está tão abalada quanto eu acreditava.

 

Mas me surpreende saber que, embora tão esquecido em minha memória, o sentimento ainda é tão evidente. Não é mais aquela paixão avassaladora, desesperada e devota, sei que não. Mas é um amor sutil, calmo e conformado, que fica feliz em apenas saber da sua existência.

 

Às vezes me acho tão patética.

 

Mas isso já se tornou notícia velha, levando em conta que sou eu a boba a remoer os acontecimentos passados enquanto finjo ver TV, não ela. Não... Ela não. Duvido que ainda saiba o meu nome - sei que é exagero -, duvido que lembre-se de como era me ter nos braços ou estar nos meus. Duvido que olhe para trás, como faço, ou que sinta essa coisa estúpida que sinto. Duvido muito.

 

“Eu te amo”

 

Em pensar que essa foi a frase que almejei ouvir por meses a fio, sempre me dedicando, tentando demonstrar meus sentimentos para ela.

 

Logo eu. Famosa entre os conhecidos por ser gélida e fechada, me abri para ela e me joguei de cabeça - sem material de segurança - no que achei ser o relacionamento mais firme no qual me envolveria. Ledo engano, como não podia deixar de ser.

 

E os erros são seus.

 

Deixei que o ar saísse pesadamente pelos meus lábios entreabertos, observando a chuva cair na janela do outro lado da sala. A TV ligada, desculpa minha para mim mesma para pensar nela. Embora suas feições já não sejam mais tão nítidas depois de anos sem vê-la, continua a ser reconfortante imaginá-la na minha cozinha, se queimando ao tentar fazer chocolate quente.

 

Desviei minha atenção dos pensamentos nostálgicos ao ouvir um som diferente na sala, o do telefone, que agora raramente tocava. Me movi com lentidão até lá e atendi sem animação alguma, o que contrastou bastante com a voz divertida que soou do outro lado.

 

“Anahí, ainda vive?”, me surpreendi ao perceber, sem nenhum risco de dúvida, que era Maite, não nos falávamos havia meses, mas admito que era puro desinteresse de ambas as partes.

 

“Mai?”, ergui uma sobrancelha, expressando a pergunta para mim mesmo, ouvindo uma risada gostosa do outro lado da linha.

 

“Eu mesma, amiga!”, respondeu, brincalhona, trocando palavras com alguém que parecia estar ao seu lado. “Como some assim, sem deixar rastros?”

 

“Não sumi, Maite, estive sempre a duas ruas de você”, respondi, mordendo os lábios ao notar que o desinteresse chegou a tal ponto que, a alguns passos de distância, não nos falávamos há tanto tempo.

 

“Pois é, a duas ruas e parece que estamos em planetas diferentes...” Apesar do tom ainda meio risonha, percebia-se a tristeza em sua voz, como se constatasse algo que já vinha remoendo há tempos. “Eu estava falando com os garotos sobre isso há algumas semanas e-“

 

“Não me ligou.”, completei, quase acusatória, embora soubesse que não tinha direito nenhum.

 

“Eu ia ligar!”, retrucou de imediato, antes de fazer silêncio por um tempo. “Mas recebi uma ligação uns dias depois... da Dulce.” Mal terminei de ouvir o nome e paralisei, meus sentidos aguçados, meus dedos trêmulos. “Disse que está vindo para a cidade e que gostaria de nos encontrar. Todos nós, frisou que faz questão da sua presença. Ela vem essa semana.”

 

“E você só me avisa hoje?”, questionei, indignada, olhos arregalados, o corpo todo em chamas. “Como você quer que eu prepare o meu psicológico?”, meio dramática, admito.

 

“Não era nada certo, eu não queria te aborrecer com incertezas e nem te lembrar o passado desnecessariamente. Mas ela me confirmou ontem, ligou para o Chris também. Disse que quer ver todos.”, confirmou a história e eu me vi sem ar novamente.

 

Fiquei calada por longos segundos, sem saber o que dizer, o que pensar, o que sentir. Pensar em Dul era um coisa, tê-la novamente por perto era outra absurdamente diferente, absurdamente. Depois de tantos anos, depois de tanto tempo que levei para me reerguer, ‘esquecê-la’, ela agora volta, jogando uma bomba no meu colo, como sempre fez.

 
*flashback*

”Eu não te amo, Anahí”, tão simples que chegou a soar meio cômico e se não fosse pela sua expressão extremamente séria eu riria. Muito. “Eu te avisei desde o começo que não queria me apaixonar, te avisei que não deveria se apaixonar por mim também. Eu avisei, não foi?”

 

“Mas, Dul, eu pensei que...”, abaixei a cabeça, confusa pela sua reação às minhas palavras, não é bem a resposta que se planeja ouvir quando se faz uma declaração. “Pensei que depois de tanto tempo juntas, talvez alguma coisa tivesse mudado.”

 

“Não mudou, Any, eu não quero me apaixonar, nem me prender, eu quero ser livre.”, embora de seus lábios saíssem palavras tão duras, ao meu ver, seus gestos eram gentis, seus dedos macios ainda sobre o meu rosto, e em momento algum ela fez menção de se afastar de mim no sofá da sua casa. “Você me entende, não é?”

 

“Juro que não.” Sorri, meio surpresa comigo mesmo ao notar que a dor era tanta que nem vontade de chorar me parecia consolo o suficiente. “Juro que não...”

 

“Anahí...”, ela murmurou, mas não formulou frase alguma, apenas continuou a me encarar, os dedos delicados jamais deixando meu rosto, agora ornamentado com um sorriso triste.

 *flashback off*



Mas já fazia tanto tempo. Quatro anos, e não tive uma única notícia sua desde que saí pela porta, nem um telefonema desesperado de quem acabou de descobrir uma paixão avassaladora com a menção de perder quem ama - por uns dias, realmente acreditei nessa possibilidade -, nenhum buquê de rosas com um pedido de desculpas.

 

Nem mesmo um bilhete, meses mais tarde, avisando que partiria.

 

Quatro anos. Malditos quatro anos!

 

Fui saber por Maite que ela já estava de malas prontas, indo trabalhar em outra cidade. E quando achei que ela não iria sem se despedir, ela já tinha pego o avião, sem remorso algum, apenas com um recado de que era melhor assim, dizendo que eu a esqueceria mais fácil.

 

A questão era: mais fácil para quem? Para mim, que teria de ficar longe dela, mesmo se aceitasse me conformar em viver ao seu lado, lhe dando tudo sem nada em troca; ou para ela, a covarde que estava fugindo sem me dizer uma palavra?

 

“Any...?”, ouvi a voz de Maite e me surpreendi ao notar que ainda estava no telefone.

 

“Mai... Sinto muito sua falta, nós podemos marcar algo, mas eu não vou nesse encontro.” Disse, conclusiva, ouvindo um suspiro. “Você sabe a história melhor do que ninguém... Molhei muito seus joelhos anos atrás.”

 

“Anahí...”, ela insistiria se tivesse argumentos, eu sei bem disso. Mas ela também sabia que não havia nenhum.



Não quero lembrar...

 

--X---

 

“Não vai perguntar como foi o encontro com a Dul?” Maite perguntou, me fitando com intensidade, enquanto se servia de um pedaço de bolo. “Estamos a tarde toda jogando conversa fora e você não me pareceu curiosa sobre como foi.”

 

“É porque não estou.” Rodei os olhos, olhando vagamente para o lado. O café estava vazio naquele finzinho de tarde, prestes a fechar. A senhora simpática do outro lado do balcão o limpava bela milionésima vez só na última meia hora, cantarolando o que me parecia ser a única música que sabia. Ri baixinho para mim mesma e voltei a fitar meus amigos, logo a minha frente, Mai com cara de preocupada e Chris e Poncho me parecendo muito concentrados na comida.

 

“Simples assim?” Ergueu uma sobrancelha, abismada. “Anahí, não se esqueça que antes de tudo, vocês eram amigas! Você não pode simplesmente jogar anos de amizade no lixo por causa de um relacionamento que não deu certo. É isso mesmo, não deu certo, a fila anda, há muitos peixes no mar.” Ela disse, gesticulando de forma exagerada, e eu apenas a observei com diversão.

 

“O que me magoou não foi o fato de ela não me amar de volta, eu poderia conviver com isso depois de uns meses de fossa. O único problema foi que ela sumiu depois que eu saí do apartamento, você sabe! Eu liguei, deixei recado, e-mail, mensagem, fiz de tudo e ela ignorou minha existência. Acho que o primeiro a esquecer a amizade foi ela, não eu.” Respondi, fitando meu café, tentando não permitir que Maite me olhasse nos olhos - ela parecia ter um tradutor para eles.

 

“Mas...” Ela estava prestes a retrucar, mas recebeu uma interrupção inesperada.

 

“Ela está certa, Maite.” Chris interveio, e me pareceu irritado. “Pare de defender Dulce só por causa daquela conversinha mole de ontem.”

 

“Christopher!” Maite o encarou com severidade, recebendo em troca um dar de ombros.

 

“Que conversinha?” Perguntei, surpreso, e Mai sacudiu a cabeça.

 

“Invenção do Chris.” Respondeu, lhe lançando um olhar mortal, que foi devidamente correspondido. “Mas voltando ao assunto.” Disse, voltando a me encarar, ignorando os resmungos de Chris. “Você não aceitaria nem vê-la? A Dul perguntou tanto por você ontem, disse sentir sua falta.”

 

“Quanto mais distante ela estiver de mim, melhor.” Bebi um longo gole do meu café e, antes que Maite pudesse retrucar, encerrei o assunto. “Poncho, eu achei o seu casaco, estava mesmo lá em casa...”

 

---X---

 

Dias depois, sentada no sofá com a mesma desculpa de sempre, fazendo o que já era tão rotineiro quanto piscar os olhos, ouvi a campainha tocar, som ainda mais raro que o do telefone. E, ao levantar e abrir a porta, com surpresa, eu a vi. De olhos baixos, de volta à sala em que nos encontrávamos com tanta freqüência, onde comemoramos nossos três, cinco e seis meses juntas, nosso último aniversário de namoro.

 

E o que mais doeu não foi ter que sentir seu cheiro doce novamente, mesmo estando a metros de distância; não foi ter de vê-la novamente, mesmo que não nitidamente por causa dos olhos nervosos; não foi ter que estar na sua presença, mesmo que ela não estivesse dizendo nada.

 

O que mais doeu, de verdade, foi perceber que seu perfume jamais havia saído da minha mente, que suas feições jamais tinham sido esquecidas e que sua presença já não era sinônimo de satisfação.

 

Parada ali, pensamentos, dúvidas e anseios indo e vindo e esbarrando no meu cérebro quase morto e inerte, a uma distância segura do meu ópio, eu pude analisá-la e perceber que em nada havia mudado, a não ser pela diferença quase insignificante no corte dos cabelos ainda ruivos.

 

E quando o notei voltar os olhos para mim, foi quando cheguei a ouvir o tilintar dos pedacinhos de vidro em que meu coração se partiu e meus músculos travaram, descartando a idéia absurda que me surgiu de correr desesperadamente na direção oposta, gritando e sacudindo os braços.

 

Sem nenhuma expressão naquele rosto tão belo, se aproximou, lentamente, como se me desse a opção de escapar, como eu queria insanamente, mas meu corpo descordava com veemência. Ao perceber que eu não daria um passo para trás, ela abriu um sorriso tímido com aquela boca sempre tão vermelha, e parou a alguns passos, meio indeciso de como começar uma conversa.

 

Que palavras escolher depois de quatro anos?

 

“Você não apareceu no encontro...”, murmurou, coçando a nuca, dispensando um cumprimento - o que eu agradeci profundamente a qualquer força superior, uma vez que encontrar alguma voz para responder a um oi casual seria um martírio. “Christopher, Poncho, Christian e Maite foram, nos divertimos muito lembrando os velhos tempos...”, comentou.

 

“Não acho que seria muito divertido para mim lembrar do passado.” Sorri, arrumando o cabelo atrás da orelha, evitando ao máximo encarar ela nos olhos.

 

“Uhn...” Ela corou, voltando a olhar para o chão. “Maite disse que não te vê há alguns meses.” Comentou, aleatória, como se quisesse desviar do assunto iminente.

 

“É, mas já nos vimos ontem, não se preocupe com isso.” Respondi, meio irônica, vendo-o morder os lábios.

 

“Ah... Uh...”, alguns segundos de silêncio e eu suspirei, mascarando com impaciência o meu nervosismo insano. “Bom, eu posso entrar?”, perguntou timidamente, voltando a fitar os pés que brincavam com o assoalho.

 

“Achei que estivesse indo embora.”, ergui uma sobranclha, rude, e ela assentiu afirmativamente, logo se justificando.

 

“Sim, mas achei que poderíamos conversar um pouco talvez...?” Soou mais como uma pergunta, que, sinceramente, me deu vontade de rir.

 

“Depois de quatro anos, Dulce? Acho que já não teríamos assunto.” Sacudi a cabeça, fazendo um gesto qualquer com as mãos.

 

“Agora é que temos mais assunto do que nunca.” Sorriu-me quase tristemente, e quando achei que sucumbiria, prendi-me a uma força que nem sabia que tinha e me mantive firme.

 

“Ótimo, então, daqui a mais quatro teremos o dobro, que tal adiar?” O sarcasmo escorria pelos cantos da minha boca, enquanto eu me afastava sem deixá-lo responder. “Até mais ver”

 

“Anahí, por favor!”, segurou-me pelo braço, e o ato desesperado me fez arregalar os olhos, encarando os dele pela primeira vez naquela tarde fria, tão densos, tão tensos, tão mortos. “Eu só quero conversar, não fuja de mim como-“

 

“Como você fez?”, questionei, puxando meu braço de volta com rudeza, seus olhos arregalados pelo meu ato de grosseria. “Você foi uma covarde, Dulce Maria, correndo de mim, ignorando meus telefonemas, meus recados insistentes na sua secretária, nem mesmo se despedir você pôde!”, bradei, tendo certeza, pelo calor em meu rosto, que eu já estava vermelha e soube naquele momento que, pela primeira vez em quatro miseráveis anos, eu choraria de novo por ela. “Depois de tudo que passamos você teve coragem de me olhar nos olhos e dizer que não sentia nada, quando eu disse que te amava; de correr de mim, enquanto corria atrás de você; de me deixar, quando eu te prometi que jamais o faria. Você é uma covarde, Dulce, que nem mesmo olhou para trás quando eu te implorei quase me arrastando para que me ouvisse, agora quer que eu fique e te ouça? Não te parece filme velho?”

 

Pelo olhar em sua face e seus lábios entreabertos, ela estava atônita e eu não esperava outra reação. Para quem estava acostumado a Anahí conformada, delicada, sempre sorridente e feliz com qualquer coisa imposta, aquilo era um surto.

 

E era mesmo! Me mandem para um manicômio se frustração for loucura.

 

“Eu estava com medo.” Disse, como se aquilo solucionasse os problemas de fome e miséria do mundo. “Era novo para mim, Any, eu nunca estive apaixonada, nunca... Nunca tive alguém que me dedicasse o que você me dedicou. Tive medo de me perder em sentimentos muito fortes, de perder o controle da situação de...”

 

“Você acha que eu também não tive medo?” Perguntei, a voz bem mais baixa, quase sussurrada, minhas bochechas já úmidas. “Eu tive muito medo, eu estava completamente entregue a você e você não tem a menor idéia do quão... Novo, isso era para mim. Mas isso não me impediu de te amar, de me entregar a você, de trair meus preceitos.” Olhei ao redor, notando que ainda estávamos na porta da minha casa e que a qualquer momento um vizinho poderia aparecer e me ver fazendo aquela cena ridícula, chorando como uma tola, então logo enxuguei o rosto e me recompus, sem dar atenção a ruiva à minha frente. “Vá embora” Murmurei, andando a passos apressados para trás, pronta para bater a porta.

 

Nem três passos distante, senti seus dedos em meus pulsos de novo, me puxando com força absurda contra o seu peito, enquanto eu me debatia sem vontade nenhuma, tentando me soltar. A resistência não durou um minuto e eu logo estava abraçado com ela, apertada, desesperada, saudosa, chorando tudo que reprimi por quatro anos.

 

“Eu senti sua falta, Any. Meu Deus, como eu senti!” ela sussurrou perto do meu ouvido, a voz gaguejada. “Eu te amei... Eu te amei cada segundo em que respirei nesse tempo longe, lembrei de você a cada minuto vivo, desejei desesperadamente ter calado a boca quando você disse me amar, desejei desesperadamente não ter dito uma palavra, ter me afogado sozinha em meus medos. Ter atendidos aos telefonemas, ter me declarado. Queria não ter errado com você, não ter fugido... Desejei tanto que as palavras que saíram da minha boca fossem outras.”

 

“Eu odeio você.” Foi tudo que consegui murmurar entre os soluços, sabendo que ele facilmente perceberia que não era verdade, e me apertou mais, quase me tirando o ar que eu já não tinha.

 

“Me perdoe, eu imploro, eu rastejo se você quiser, eu te beijo os pés.” Disse, num desespero genuíno, segurando meu rosto entre as mãos, encarando-me diretamente nos olhos. “Eu faço você se apaixonar tudo de novo, se você deixar, eu juro que eu faço, eu movo céus, terras e infernos, se preciso for, só me dê mais essa chance, por favor...”

 

Olhei ela, silenciosa, soluçando, mal podia respirar. Ela me olhava com expectativa e minha cabeça latejava absurdamente com o peso da decisão. Aquela decisão, ali, repentina, uma palavra apenas podia me livrar dela para sempre, levar-me ao arrependimento, à felicidade, quem sabe, tantas coisas estavam em jogo, tantas coisas...

 

Me afastei com lentidão, me reprimindo mentalmente por isso, e seus olhos me seguiram inconscientemente, mas não permiti contato visual. De mãos trêmulas, me fitou, expectante, enquanto eu enxugava o rosto.

 

“Eu não acredito em uma palavra.” Resmunguei, enfim, vendo seu rosto cair de uma forma que chegava a dar dó. “Não acredito que foi tão burra e covarde durante tanto tempo e que agora veio se redimir. É muito fantasioso para mim.”

 

“O que posso fazer se sou uma idiota?”, questionou, largando os braços pesadamente ao lado do corpo, as sobrancelhas juntas em sinal de desespero. “O que eu faço, Anahí, o que eu faço pra você acreditar em mim? Você quer que eu grite para o mundo inteiro ouvir, quer? Sabe que posso gritar bem alto.”

 

“Dulce...” Olhei-a, sentindo uma dorzinha no peito com suas palavras. Tanto tempo esperando ouvi-las que agora se tornava difícil de acreditar.

 

“Eu te amo, Anahí Portillo!” Ela disse, alto demais para ser só para mim, e eu arregalei os olhos, surpresa. “Eu amo ela, ouviu, mundo?” Disse ainda mais alto, virado em direção à porta aberta, antes de me encarar mais uma vez, surrando, agora: “Amo tanto que não consigo me imaginar mais quatro anos sem ela, nem mais um, nem mais nada. Amo tanto que... Que me desespera a idéia de não ter ela pra mim.” E embora seus olhos estivessem vidrados em mim, não era comigo que ela falava.

 

Pro inferno com todo meu bom senso, amor próprio, orgulho e qualquer coisa que me impedisse de tê-la. Meus lábios ávidos pelos seus não pareciam dispostos a esperar que meu cérebro processasse a gravidade da situação e eu me entreguei num beijo quase violento, cheio de sentimentos misturados, com um gosto salgado de lágrimas e distância.

 

“Eu odeio... Odeio... Não conseguir te dizer não.” Sussurrei contra seus lábios vermelhos e inchados, sentindo seus dedos leves sobre meu rosto como há anos atrás, enxugando as mesmas lágrimas. “Me odeio por te amar tanto.”



“Por que sussurra, enquanto eu grito pro mundo?” Perguntou, levemente magoado, muito levemente, ela sabia que não tinha motivos.



Porque você sempre foi o mundo pra mim.

 

Seus dedos em minhas costas, os meus em seu cabelo, seus os olhos nos meus, aquele sorriso radiante brincando em seus lábios. E tudo parecia tão certo daquele jeito, que qualquer erro do passado parecia ter ficado para trás, qualquer erro do presente parecia insignificante, qualquer lugar que não fosse seus braços parecia longe demais.


E qualquer palavra que não fosse sim parecia errada demais.

 

...Que eu erro também.


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