Natalie

Eu estava condenada. Depois desses raios saltando para todos os lados, azuis tão claros,  iluminando o céu cinzento, as gotas de chuva pareciam cair em câmera lenta, a chegada dos deuses no Acampamento me paralisou de pânico,  mas o que me deixou com a sensação de que eu estava ferrada foi a voz de Zeus gritando como um alto falante “Tragam-me Natalie!”.

Eu não conseguia mais correr, minha pernas fraquejaram. Eu não queria morrer, não com quatorze anos, não sem viver o que eu tinha que viver. Eu nunca senti tanto medo quanto sinto agora.

— Você tem que se esconder. - disse Dimitry.

Eu estava com medo, mas eu não poderia deixar que se arrisquem por mim.

Narrador

Os semideuses em posição tremiam, não se sabia se era de medo ou o frio da chuva que caía ou os dois.

— Você não encostará um dedo na minha filha. - disse Érika apontando um arco e flecha em direção aos deuses.

Zeus estava posicionado ao centro,  entre Deméter, Ártemis, Hefesto e Hermes. Os deuses estavam majestosos como sempre, mas estavam em sua forma humana.

— Não é nada pessoal, não com você ou com sua filha, mas é  que eu preciso fazer isso. - disse Zeus. - Às vezes temos que fazer coisas que não gostamos.

— Como atacar crianças inocentes? - disse Quíron. - Você nunca foi assim, tão horrível e sem compaixão.

Zeus suspirou.

—  O que eu posso fazer, Quíron?  As pessoas me deixam cada vez mais assim. Bom, chega de enrolação, onde está a garota?

Uma estranha e familiar maresia tomou conta dos campos, como se de uma hora para a outra todos fossem transportados diretamente para o fundo do mar. Então fumaças das cores rosa, vermelho, amarela e branca começaram a surgir e no fim uma fumaça negra e o cheiro do submundo começou a ficar aparente,a pele queimada e os gritos de tortura ecoando. Hera e os seus apoiadores finalmente chegaram ao acampamento.

— Por que você não briga com alguém da sua idade? - disse Poseidon.

Os semideuses presentes estavam impressionados. A maioria nunca sequer tinha visto o seus pais olimpianos, quanto mais todos os deuses juntos.

— Tá bom, lembre-se que foi você quem pediu, irmão.  - Zeus estendeu os braços. - Vão!

Nionx e os espíritos da natureza surgiram correndo e gritando, e outros espíritos, convocados por Zeus confrontavam-se contra os semideus e a equipe de Nionx.

Os deuses se enfrentam, Ártemis e Apolo,  Deméter e Afrodite, Hermes e Poseidon, Ares e Hefesto e Hades e Zeus.

Atena ataca alguns espíritos da natureza e vez ou outra dava suporte aos semideuses.

— Você sempre escolhe o lado errado, irmão. -disse Zeus para Hades.

— Você me obriga a discordar, irmão. Eu escolho o lado justo e racional e você não está dentro de nenhuma dessas opções.

Hades desferiu um soco em Zeus, um soco que ele desejou acertar naquele rosto arrogante por milênios. Foi como se tirasse um peso das costas, até receber outro soco do irmão.

Os semideuses tentavam impedir que os espíritos da natureza de Zeus chegasse até Natalie.

— Não fico muito feliz com isso. - disse um filho de Deméter atingindo um deles.

Do outro lado dos limites do Acampamento Meio-Sangue, Natalie e Dimitry ainda discutiam.

— Eu não posso ficar aqui. Não quando há pessoas inocentes no meio disso.

— Você também é inocente. Não pediu por nada  disso.

— Não,  mas isso é sobre mim. Não há nada que você possa falar ou fazer que me faça continuar aqui.

— Nat, eu gosto de você.

Natalie tremeu por dentro, ela também gostava dele e sabia que estava prestes a morrer pelas mãos do pai dele. Então lágrimas começaram a cair de seus olhos.

— Eu também gosto de você, Dimy.

Natalie o beijou, a despedida.  Eles se abraçaram em seguida.

— Não quero que acabe, esse exato momento em que te abraço poderia ser eterno. - disse Dimitry.

— Eu nunca vou me esquecer, isso o fará eterno.

Dimitry a beijou.

— Eu juro pelo Estige. - Natalie disse.

— Eu juro pelo Estige.

Os dois deram as mãos e correram em direção a batalha.

Hera

O que eu fiz? Eu fui tão insana quanto Zeus está sendo agora? Tão manipuladora e suja como ele? Eu fui hipócrita,  e agora percebo que essa vingança foi o pior erro que eu cometi em toda minha imortal vida.

Coloquei os mortais em perigo, os semideuses em risco, eu dividi o Olimpo em um momento em que o mal pode se aproveitar disso. Tudo isso para dar uma lição no meu marido adúltero e idiota?

Eu não quero ser mais assim e eu não serei. Está na hora de arrumar essa bagunça que eu fiz.

— Escutem- me agora! - eu gritei. - Tenho uma revelação a fazer. Natalie não é minha filha!

Quando eu disse isso todos pararam e o silêncio foi total por alguns segundos.

— O quê? - disse Natalie chegando com Dimitry.

— Isso é papo furado para eu não matar a garota! - gritou Zeus.

— Hera tem razão, Natalie é minha filha. - disse Érika.

— Eu me apaixonei por Victor, o pai da Natalie, mas eu não tive coragem de lhe trair, eu sou a deusa do Casamento, não podia fazer isso.

Érika não podia ter filhos,  então nós fizemos um acordo. Eu lhe concederia a fertilidade se seu primogênito fosse entregue a mim, com a ajuda de Hécate eu consegui abençoar Natalie com grande parte dos meus poderes e como ela tem o sangue de Érika,  ela conseguiu ultrapassar a barreira do Acampamento, mesmo sendo uma mortal. Eu lamento, por tudo.

Houve uma indignação geral, eu não os julgo. Eu fui péssima.

— Lamenta! Você lamenta! - os olhos de Zeus ficaram brancos cintilantes, pequenos raios saíam de seu corpo.

— Acalme-se, irmão.  - disse Poseidon.

— Não me peça calma! - vociferou Zeus.

Um raio enorme começou a descer do céu mais rápido do que eu havia percebido, na direção de Natalie, eu tentei me teletransportar até ela, mas não fui tão rápida como Dimitry, que deve ter pressentindo o raio. Ele empurrou Natalie para longe com toda sua força. O raio o atingiu em cheio,  e o filho de Zeus, se foi, restando apenas suas cinzas.

Eu caí de joelhos, não conseguia me mover, os outros deuses estavam em choque, mas tentavam acalmar os semideuses, Poseidon segurava o filho, Perseu.

— Eu vou matá-lo! Vou matá-lo! Olhe o que ele fez!

Zeus percebendo  que sua fúria descabida findou a vida de seu filho mais novo, voltou ao normal, teve o baque.

— Meu filho! O que eu fiz com meu filho? Meu Dimitry!

Zeus se abaixou sob as cinzas do filho e chorou, como eu nunca havia visto antes. Eu o abracei. Natalie correu até onde nós estávamos,  ela havia machucado o braço.

— Dimitry!  Dimitry! Dimitry! - chorando alto. - Por que você fez isso!  Era para ser eu! Era eu!

Sua mãe a segurou, ela estava desmaiando.

— Meu filho!  - Zeus repetia sem acreditar.

— Eu sinto muito!  Sinto muito! - eu chorava.

— Perdoe-me Hera, por tudo. Eu estava louco! Não acredito no que eu ia fazer, matar uma garotinha e meu filho foi mais sábio e corajoso do que eu.  Me perdoe!

— Eu também te peço perdão.

— Desculpa atrapalhar o momento. - disse Hades. - Mas não podemos deixar isso dessa forma.

— Eu sugiro uma névoa de esquecimento em todos.

Era horrível fazer com que eles esquecessem de Dimitry,  mas pior ainda era se lembrar de seu sacrifício.

— Eu te amo, Nat. Mesmo não sendo sua mãe. Eu não sei se ela me ouviu, mas eu precisa dizer antes que ela também me esquecesse.

— É melhor vocês saírem do acampamento,  vai ser estranho explicar como vocês vieram parar aqui.

— Vocês não podem apagar a existência de Dimitry.

— E não vamos. - disse Zeus. - Ele será lembrado.

— Tudo bem. Esperem eu entrar no carro.

— Apagaremos só as lembranças desses últimos meses. - disse Atena.

Érika havia saído do acampamento,  todos nós, os deuses, nos unimos para invocar a névoa.  Annabeth estava com Percy.

— Perseu, você ainda será convocado por mim.

— O quê?

A névoa começou a se espalhar aos poucos, atingindo todos que conheceram Dimitry e sabiam sobre a história da vingança. Os espíritos da natureza voltaram para onde pertenciam, os semideuses pensariam que estavam em treinamento e os dias com Natalie e Dimitry foram substituídos por memórias de dias comuns. Natalie e sua família não se lembrariam desses fatos. E a mãe de Dimitry teve a memória substituída de que o filho morreu em paz.