Pottertale - O Encontro de Dois Mundos escrita por FireboltVioleta


Capítulo 15
O Traço




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O som de adagas perfurando o reboco ecoava dentro do banheiro feminino.

— Idiotas… - sibilou Chara, conjurando mais uma adaga de energia, acertando-a acima dos azulejos – eu não preciso deles… - sua voz perdeu a acidez macabra, tornando-se um choramingo sufocado – eu… sei que sou uma aberração…

Nascida invulgar, a única de sangue mágico em uma extensa família de humanos comuns, Chara havia tido de lidar com muito sofrimento desde cedo.

Nunca havia tido oportunidade de entender por que se sentia e agia tão diferente das outras crianças. Receber a visita de um guardião e entrar em Underground havia sido a melhor coisa que lhe acontecera na vida.

A hostilização e humilhação que havia tido de suportar na mão dos demais - cujo medo do desconhecido fazia com que a maltratassem – haviam sido o bastante para torná-la uma criança secretamente amargurada e triste.

Sua ambição em se provar, e sua personalidade supostamente sarcástica e irritante, eram apenas uma fachada – o seu mecanismo de defesa, que havia forjado lentamente com o passar dos anos, na tentativa de evitar mais sofrimento.

E tudo aquilo escondia uma garota frágil e carinhosa, que agora encontrava-se magoada, parecendo ter fracassado outra vez em manter as pessoas ao seu lado.

— Eu só queria… que fossem meus amigos…

Uma lágrima de cor escura escorreu pelos olhos da menina. Chara passou os dedos pela trilha úmida, constatando o pranto negro - que tendia a escapar quando estava especialmente abalada.

Violentamente, voltou a atirar, como se o tinir das armas pudesse distraí-la de sua decepção angustiada.

Outro som chamou sua atenção. Chara virou a cabeça, espreitando por cima do ombro.

— Quem está aí? - exclamou, forçando-se a disfarçar o tom choroso em sua voz.

Não houve resposta. Chara desceu da pia, erguendo a varinha na direção da penumbra.

— Apareça! - bradou, ignorando o tremor em sua mão.

Ofegante, abaixou-se a tempo de não ser atingida por um raio alaranjado, que explodiu contra a parede, abrindo um rombo no concreto.

Atônita, ergueu o olhar, vislumbrando uma luz pulsante e flutuante diante de si. Várias ramificações ao redor da pequena esfera ondulavam no ar, como tentáculos hostis e imateriais.

Embora nunca tivesse visto uma pessoalmente, Chara sabia o que era.

— Um traço – arquejou.

Corrompido e parasitário, só poderia ser isolado após possuir um corpo humano ou monstro.
E Chara estava completamente sozinha.

O traço rutilou, lançando outra vez seus raios contra a menina. Embora tivesse conseguido desviar alguns deles sem problemas, Chara foi atingida pelo último raio, desabando de volta ao chão.

Antes que o traço atacasse novamente, porém, um feitiço brilhante e claro causou um clarão, impedindo que os golpes da alma corrompida terminassem de subjugar Chara.

— O quê..?

Asriel estava resfolegante, agora retraído de choque ao chamar a atenção do traço. Frisk não estava menos perplexa, brandindo sua varinha a esmo, tentando mirar na esfera esquiva que flutuava diante deles.

— O que fazemos? O que fazemos? - ofegou Asriel.

— Lembra do que eu te disse! - Chara rolou pelo chão, fugindo de outro raio – girar e sacudir!

Asriel obedeceu, gesticulando sua varinha. Finalmente, emergindo do canalizador, uma espada brilhante surgiu, escudando habilmente os golpes do traço.

— Boa, Asriel! - exclamou Frisk e agora?

— Precisamos deixar que ele possua um de nós – frente aos guinchos de medo de Asriel e Frisk, Chara acrescentou – é só por alguns segundos! Eu sei como extrai-lo!

Frisk prontificou-se, antes mesmo que Asriel pudesse reagir.

— Tudo bem! - acenou – mande-o para cá!

Acuando o traço, Chara conjurou mais de suas adagas, confundindo-o e fazendo-o recuar. Sem ter para onde flutuar, mergulhou em espiral, entrando dentro do corpo de Frisk.

A garota ofegou baixinho, sentindo uma quentura desproporcional tomar conta dela, resvalando-se em ondas até a ponta de seus dedos.

Accio! — bradou Chara, apontando sua varinha para Frisk.

Frisk tossiu, sentindo que algo sólido e quente se retirava de seu corpo. Atônita, assistiu uma pequena e dócil esfera emergir para fora dela, flutuando calmamente na direção de um frasco que Chara havia conjurado.

Asriel, ensandecido, tratou de fechar pessoalmente o frasco, arrancando a rolha da mão de Chara e tampando-o.

— Cara… mas que diabos…

Uma comoção alta emergiu repentinamente na entrada do banheiro. Para choque do trio, Undyne, acompanhada de Burguerpants e Riverman, adentraram afobadamente, parecendo decididamente atônitos.

— Minha nossa… - ofegou Undyne, a mão abarcando a maior parte da testa – será que os três podem me explicar o que estão fazendo aqui?

— Olhe – Burguerpants disse – eles conseguiram recolher o traço!

Riverman estava sem seu capuz, e parecia decididamente perplexo com o cenário que via à sua frente.

Frisk baixou a cabeça de modo tenso. Sabia que, embora as motivações deles tivessem sido as melhores, nada justificava terem ido sozinhos até a Ala Leste, ainda mais diante do toque de recolher. Ela e Asriel poderiam se considerar nada menos do que encrencados.

— A culpa foi minha, professora Undyne.

— Chara!

Frisk arregalou os olhos para Chara, cujo braço ainda sangrava, cortado por um dos raios do traço. Asriel também titubeou, perplexo.

Chara havia, desde o início, feito de tudo para ser uma aluna exemplar. Assumir a culpa por algo que não havia feito, apenas para proteger os dois…

Inevitável, o carinho fraternal que Frisk já andava nutrindo por Chara finalmente transbordou.

— É isso mesmo, professora – ela guinchou – ouvi sobre o traço e quis ver de perto. Eles só vieram me ajudar… e conseguiram. Frisk até se dispôs a ser receptáculo… se não fosse por eles, eu provavelmente estaria morta agora.

Os três professores se entreolharam. Undyne resfolegou, sacudindo a cabeça, erguendo a mão para Chara.

— Me dê isso aqui, garota – recolheu o frasco com o traço neutralizado, ocultando-o sobre as vestes – não esperava algo tão irresponsável de uma das alunas mais inteligentes da Sonserina, Chara, Tirarei cinco pontos de sua Casa pela sua grande insensatez!

Chara baixou a cabeça, envergonhada. Frisk sentiu-se mal por ficar quieta, deixando que a encenação continuasse.

Undyne virou-se para ela e Asriel, estreitando o olhar.

— No entanto… nenhum monstro ou invulgar do primeiro ano conseguiria lidar tão bem com um traço corrompido – suspirou, erguendo uma sobrancelha – dez pontos para Grifinória e Lufa-Lufa… pela pura sorte de estarem vivos – virou-se para Riverman – vou comunicar Gerson, e ver o que faremos com este traço. Podem voltar para a sala… retornarei assim que puder – disse aos dois professores – e é melhor ir até a Ala de Cura cuidar desses ferimentos, Chara.

Dizendo isso, Undyne retirou-se com Riverman e Burgerpants, deixando os garotos finalmente sozinhos outra vez.

Os três olharam-se por um momento, hesitantes.

Foi Chara que se pronunciou primeiro.

— Obrigada – sussurrou – vocês salvaram minha vida – olhou para Frisk – foi muito corajosa… se oferecendo como hospedeira do traço.

Frisk deu de ombros.

— Não foi nada – disse – precisávamos parar aquela coisa.

Asriel encarou a invulgar, o focinho tremendo ligeiramente.

— Ahn… valeu por não nos entregar para Undyne, Chara.

— Era o mínimo que eu podia fazer – a menina deu uma risada vacilante – afinal, eu podia ter morrido. Vocês… podiam ter morrido.

— Não, é sério – o monstrinho insistiu – obrigado. De verdade.

Tudo que Chara fez foi revirar os olhos e bufar.

— Ah, cala a boca. Ainda estou com raiva de você – proferiu, finalmente se encaminhando para fora do banheiro.

Humorada, Frisk observou Asriel sacudir a cabeça.

— Essa garota é maluca, Frisk – comentou, enquanto deixavam o recinto – e acho que vamos ser o pior tipo de influência pra ela, se você quer saber.

Mas, no fundo, Frisk sabia que Asriel sentia o mesmo que ela.

Á partir daquele dia, Chara se tornou melhor amiga dos dois. |Afinal, algumas coisas jamais podiam ser realizadas sem que todos os envolvidos virassem melhores amigos. E, decididamente, lutar contra um ser assustador, derrotando-o com a força da união, era uma dessas coisas.






























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