Criminal Contact escrita por Escritor Anônimo


Capítulo 3
"Os Hipócritas Choram"




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/726972/chapter/3

Nós éramos tão jovens.

Amanhecera. O sol tentava brilhar ao leste mas seus raios pareciam inúteis contra as gigantescas nuvens escuras que cobriam o céu.

Eu não queria. Não queria ter feito aquilo.

Os comerciantes caminhavam pelas ruas da cidade. Todos carregando enormes bolsas geralmente de cor preta e longas alças. Ao passarem pela igreja de madeira esbranquiçada no centro da cidade, muitas vezes paravam para observar a arquitetura arcaica do local. A igreja estava fechada pois o velório de Hannah Johnson seria ali às três da tarde.

Eu a vi queimar.

EU A FIZ QUEIMAR.

Vanessa levantou de sua cama aos gritos. Ofegante. Assustada.

Acabara de sonhar com a noite que queimara Melanie. Faziam meses que esses pensamentos haviam parado de encher sua mente mas após a conversa com suas amigas, eles retornaram e pareciam mais fortes. A cada segundo ela incriminava a si mesma e sofria arrependida.

—Filha? - perguntou Ashley entrando no quarto. - Ouvi gritos. Aconteceu algo?

—Ãhn?! Não, não foi nada. - disse Vanessa.

—Então tá. - disse Ashley. - Se arrume e venha tomar o café.

Vanessa foi ao banheiro de sua suíte e olhou-se no espelho. Vira uma pele pálida, cabelos longos e bagunçados e grandes olheiras. Piscou. E por um segundo jurou ter visto sangue escorrendo de sua testa. Piscou novamente, dessa vez mais forte. As olheiras pareciam marcas de soco, haviam cortes pelo seu rosto. Vanessa assustou-se e virou-se para o chuveiro. Olhou de relance para o espelho e seu rosto parecia normal.

—Estou ficando louca. - sussurrou. E talvez estivesse mesmo.

Tomou um banho rápido e se arrumou. Vestiu uma calça jeans de cor preta e uma regata acinzentada com o desenho de uma caveira no torso. Por cima colocou um casaco preto de moletom. Vestiu suas botas de couro e desceu as escadas. Na sala encontrou Samuel, o homem com quem sua mãe estava saindo.

—E aí, Samuel. - disse Vanessa.

—Bom dia. - respondeu.

—Não sabia que ele tinha dormido aqui. - disse Vanessa para a mãe.

—Ele chegou faz uns cinco minutos e me trouxe flores. - disse Ashley ficando vermelha.

Vanessa sorriu. Era bom ver sua mãe feliz novamente. Depois que seus pais se separaram, Vanessa achou que sua mãe nunca mais fosse se apaixonar. Ela estava enganada.

A campainha tocou.

—Deixa que eu atendo. - disse Vanessa indo para a porta e a abrindo. 

—Olá Vanessa. - disse uma mulher com olheiras tão fortes que parecia ter chorado a noite inteira.

—Oi senhorita Johnson. - disse Vanessa. - Como está?

Antes que Mary respondesse, Vanessa reparou no que acabara de perguntar e reformulou sua pergunta.

—Err...me desculpe...eu quis dizer...sinto muito. Sinto muito mesmo.

—Todos sentem. - disse Mary.

Vanessa ficou calada.

—Eu soube que você fez um curso de floricultura à alguns meses. - disse Mary.

—Err...não foi bem um curso, era para um trabalho escolar na verdade. - respondeu envergonhada.

—Eu já procurei pela cidade inteira mas não tem ninguém que possa fazer isso por mim. - disse Mary. - Por favor, será que você pode fazer os arranjos para o enterro da minha filha?

Quando pronunciou a palavra enterro, Mary chorou.

Vanessa ficou sem reação.

—Vocês eram grandes amigas e Hannah iria adorar saber que você ajudou no velório dela. - disse Mary.

Amigas.

A palavra se fixou na mente de Vanessa. Ela era amiga de Hannah e não sabia? A garota ruiva já fizera Vanessa ser suspensa injustamente. Já a ofendera e até mesmo quebrara um vaso de plantas em sua cabeça. Vanessa ficou quieta. Não sabia o que responder. Elas não eram amigas, nem um pouco. Hannah devia mentir para sua mãe pois assim era mais fácil esconder as coisas horríveis que ela fazia.

—Claro. - disse Vanessa se arrependendo segundos depois. - Eu faço os arranjos.

—Ai obrigada, Vanessa. - disse Mary a abraçando. - Você não sabe o quanto isso é difícil pra mim.

—É. 

—O velório é às três. Esteja lá com os arranjos. - disse Mary enxugando as lágrimas.

Mary virou-se e foi embora.

Vanessa se sentiu mal por ter aceitado o favor, mas com certeza se sentiria pior se tivesse recusado. Hannah podia ter sido a pior das vadias e com certeza merecia ter um castigo gigantesco. Vanessa já desejara milhares de vezes a morte da menina mas nunca imaginou que se sentiria tão culpada quando isso realmente aconteceu. Mary era mãe e estava sofrendo muito, não conseguia nem imaginar sua dor. Vanessa tinha que ajudá-la, ainda mais depois do que tinha feito naquela noite.

Algumas ruas abaixo passava o carro dos pais de Julie. Seu irmão, Michael o dirigia. Como ele não trabalhava e nem estudava, seus pais o obrigavam à levar Julie para a escola. Nenhum dos dois gostava disso. Julie esperava ansiosamente o dia em que completaria dezesseis anos e tiraria sua carteira de motorista. Seus pais temiam esse dia.

—Você tem o que?! Uns vinte e dois anos. - disse Julie. - E realmente planeja viver do dinheiro dos nossos pais pro resto da vida?

—Não acho que isso seja da sua conta. - disse Michael.

—Na verdade é sim. - disse Julie. - Papai vai pagar minha faculdade e se você não começar à se sustentar logo, a família vai passar por sérias dificuldades.

—Cara, cala a boca. - disse Michael.

—Olha só ele, todo irritadinho. - Julie riu.

—Se eu bater o carro a culpa é sua. 

—Você não iria querer. - disse Julie. - Seria mais um motivo para os nossos pais brigarem com você.

Michael ficou quieto e continuou acelerando o carro. Estacionou em frente à escola e esperou Julie sair.

—Vinte e dois anos. - disse Julie fechado a porta do carro.

Michael abaixou a janela.

—Vai se ferrar. - e acelerou o carro.

Julie riu.

Duas mãos tamparam os olhos de Julie.

—Henry. - disse Julie tocando seus dedos.

—E aí. - disse dando um beijo em Julie. - Está tudo bem?

—Uhum. 

—Fiquei preocupado com você ontem. - disse Henry. - Ficou estranha e do nada resolveu ir embora.

—Como eu disse, minha mãe está paranoica. - disse Julie.

—Eu diria que você também está. - disse Henry.

—Talvez. 

—Então vamos fazer o seguinte. - disse Henry colocando o braço nas costas de Julie como se a abraçasse. - Hoje às duas eu passo na sua casa e nós vamos ao cinema. Alguns especialistas dizem que ver filmes acalma a mente.

—Especialistas. - disse Julie rindo.

—O que me diz? - perguntou Henry.

—Os especialistas dizem que eu iria adorar. - Julie respondeu virando-se para o peito de Henry, fazendo seus braços a envolverem. 

—Eles sabem das coisas. - disse Henry.

Julie ficou na ponta dos pés. Suas bocas se tocaram, mas dessa vez não chegaram a se beijar. Apenas ficaram ali abraçados. Julie sentia-se segura.

Emilly e Catherine estavam na aula de química. Pareciam assustadas.

—Recebeu mais alguma mensagem? - Emilly cochichou.

—Nenhuma. - Catherine respondeu.

—Eu também não.

—Você vai ao enterro? - Catherine cochichou.

—Pra que? Derramar falsas lágrimas? - Emilly respondeu. - Ou quem sabe até mesmo jogar na cara da falecida que eu não a suporto.

—Hannah está morta. Nossas rixas não podem ser usadas como justificativa para ódio. - disse Catherine.

—Eu agradeceria se as duas parassem de conversar e me deixassem terminar minha aula. - disse a professora de química em frente ao quadro negro.

Vanessa acabou não indo à escola naquele dia, ficara em casa organizando arranjos com margaridas e rosas para um enterro na qual não queria ir. A menina estava em sua enorme varanda arrumando enormes vasos brancos repletos de flores.

—Vanessa? - alguém perguntou surgindo na rua. A voz parecia familiar.

A reputação de menina má dela acabara de se quebrar. Vanessa parecia uma menininha apaixonada mexendo naquelas flores. Odiava-se por ter feito aquele curso idiota de floricultura mas se não o tivesse feito, teria reprovado em ciências. Vanessa olhou para a rua e viu Alex entrando em seu jardim.

—Não sabia que você mexia com flores. - disse ele. - É realmente surpreendente.

—O que está fazendo aqui? - perguntou Vanessa limpando as mãos com terra numa toalha branca pendurada na sacada de sua varanda. - Não deveria estar na escola?

—Sabe que eu ia te perguntar o mesmo. - disse Alex. Sua longa franja caiu sobre os olhos e ele a ajeitou com as mãos. - Mas vejo que está organizando alguma convenção bizarra de arranjos florais. Contratada para algum casamento?

—Um enterro. - disse Vanessa rindo.

—Que horrível você rir disso. - disse Alex soltando uma risada.

Vanessa resmungou.

—Você entrou no meu jardim. E não respondeu a minha pergunta.

—Ei, calma. - disse Alex. - Só quis vim te ver.

—Por que não está na escola? - perguntou.

—Meus pais deviam ter voltado de viagem ontem. - disse Alex. - Já liguei milhares de vezes para eles mas não tive um retorno. Depois do que aconteceu com Hannah, estou preocupado. 

—Eu posso ir na delegacia com você. - disse Vanessa. - Se quiser.

—Não vou te pedir para fazer isso.

—Vai ser mais divertido do que mexer com flores. - disse Vanessa.

Alex entrara no Instituto East Lake à dois anos. Assim que entrou foi bem recebido pela turma por conta de sua tamanha inteligência e beleza, mas após recusar um pedido de namoro de Hannah Johnson, a menina obrigou todos à rejeitarem Alex. O plano dela não funcionou muito bem já que Vanessa tornou-se amiga dele para confrontar Hannah.

Os dois caminharam até à delegacia mas antes que pudessem entrar deram de cara com Mary Johnson. Ela saía de uma floricultura carregando um enorme buquê de rosas vermelhas.

—Vanessa, querida. Eu realmente queria falar com você. - disse Mary aproximando-se. - Passei pela sua casa agora à pouco e vi que você só tinha montado uns oito arranjos.

—Sim.

—Eu espero ter pelo menos vinte iguais àquele na hora do enterro. - disse Mary.

—O que?! - exclamou Vanessa. - A senhora está ficando louca. Faltam duas horas para o enterro. Não posso montar tudo isso até lá.

—Quando te pedi esse favor achei que se comprometeria. - disse Mary.

—A senhora disse certo. Favor. Eu fiz o que eu pude. - disse Vanessa.

—Calma. - disse Alex passando a mão nos braços de Vanessa.

Mary olhou tristonha para Vanessa. Parecia decepcionada.

—Obrigada. - disse antes de virar-se.

—Estou fazendo os arranjos. - disse Vanessa. - Pra que comprou mais buquês?

—Algum amigo da Hannah deixou na floricultura para que eu pegasse. - disse Mary. - Existem pessoas que realmente se importavam com minha filha. Agora se me der licença, preciso ir à igreja.

Vanessa observou Mary se afastando tristonha.

—Você acredita nisso? - perguntou à Alex indignada.

—Ela está mal, não pode julgá-la por ser ignorante nessas horas. - disse Alex.

Vanessa olhou para o buquê nas mãos de Mary. Primeiramente notou um envelope branco amarrado com uma fita alaranjada. Com letras grandes estava escrito "—Fox". Logo em seguida observou o quão vermelhas eram aquelas flores. Seus pensamentos se voltaram para o oitavo ano, mais precisamente o terceiro dia de aula. Hannah comprara corantes de cor vermelha. Ela e suas duas amigas, Maya e Shenna encurralaram Vanessa antes de entrar na aula de história americana e a bombardearam com balões cheios de tinta vermelha. Vanessa entrou na sala com toda a cor escorrendo pelo seu corpo e rosto como se fosse sangue. Mas naquela época ela era frágil demais e não conseguia ser forte o bastante para vingar-se de Hannah, não do jeito que ela merecia.

—Você está bem? - Alex perguntou.

Diversos flashbacks de Hannah ensanguentada pendurada por uma corda no telhado da casa vieram à mente de Vanessa. Ela tentou não se sentir culpada pelo que fizera naquela noite.

—Estou ótima. - disse.

Quando o relógio bateu duas horas da tarde, Catherine ligou para sua amiga Julie. As duas discutiam se deviam ir ao enterro ou não.

Emilly dissera para não irmos.

Ela podia ser uma vadia mas ainda é um ser humano, merece luto.

Devíamos ir.

Seria falsidade.

As falas e pensamentos foram rodeados por uma pequena culpa e ódio.

O celular de Julie apitou.

Catherine ficou em silêncio.

—É só a Vanessa. - disse Julie. - Está implorando para nós irmos. Disse que —Fox enviou uma carta à senhorita Mary.

—O que? - perguntou Catherine. - Como ela sabe disso?

Seu celular apitou fazendo-a tomar um susto.

Em: Recebeu a mensagem da Van? . Ela acha que -Fox estará no enterro, precisamos ir e pegar uma carta que foi enviada á mãe da Hannah.

—Acho que vamos ao enterro. - disse Catherine. - Te vejo lá.

—Você desligou na minha cara. - disse Julie indignada.

A menina colocou um vestido preto e um sapato alto brilhante. Desceu suas escadas avisando aos pais que iria ao velório. Eles estranharam mas permitiram. Sentiram-se felizes pela bondade de sua filha. Ao abrir a porta, Julie deu de cara com Henry que segurava um pequeno urso marrom.

—Ah, Henry. - disse. Olhou o menino de cima à baixo e notou que ele estava bem arrumado. - Me desculpe. Eu esqueci totalmente.

—O que foi? - ele perguntou.

—Estou indo no velório. - Julie respondeu.

Henry deu um passo para trás e respirou mais forte.

—Achei que não quisesse ir. 

—Acho que mudei de ideia.

—Velórios não são como festas em que você escolhe ou não ir, você vai porque está de luto. - ele disse.

—Me desculpa. - disse Julie.

—De boa. - disse Henry. - Mas dessa vez não vou poder te acompanhar. Não estou de luto e não quero ser mais um dos hipócritas que estarão lá.

Antes de se virar para ir embora, ele entregou o ursinho para Julie.

—Isso é pra você. Sempre adorou essas pelúcias.

—Henry...

Ele se foi e deixou Julie com sua maquiagem borrada por lágrimas e um ursinho nas mãos. Ela o jogou em seu sofá e caminhou até à igreja. Logo viu suas amigas. Catherine e Emilly estavam sentadas em um banco de madeira em frente ao local e Vanessa organizava alguns arranjos ao redor da igreja. O relógio bateu três horas e todos entraram e sentaram-se nos enormes bancos da igreja. O caixão de madeira brilhava no altar. Ele estava aberto e Julie viu de relance o corpo de Hannah, mas ele estava levemente deformado na área do rosto. Havia uma enorme foto da menina ao lado do caixão. Hannah estava sorridente e parecia feliz. Vanessa tentava não encarar diretamente o corpo. Catherine e Emilly observavam ao redor.

—As gêmeas Hopper estão aqui. - disse Emilly. - Hannah as trancou no banheiro uma vez. E sempre as ofendia.

—Lucy também veio. - disse Julie apontando para uma menina de cabelos castanhos com muitas sardas espalhadas pelo rosto e usando um óculos fundo de garrafa.  - Hannah a chamava de quatro-olhos.

—Que horas essa merda começa? - perguntou Vanessa. - Precisamos pegar o envelope.

—Meninas. - disse Catherine virando-se para trás e olhando a enorme porta de madeira da igreja. - Aquela é quem eu tô pensando?

As outras três olharam. Era uma menina de pele clara e longos fios castanhos. Olhos verdes e bochechas rosadas.

—Eu não a vejo desde... - disse Emilly.

—É a Chelsea? - Vanessa perguntou.

—Desde o acampamento. - Julie terminou.

O celular das quatro apitou fazendo-as se assustar. Viraram-se para frente e pegaram seus telefones, leram a mensagem quase que ao mesmo tempo.

Observo daqui e as vejo assustadas. Estão com medo de Chelsea ou da vadia morta na sua frente? Beijos -Fox.

As meninas olharam ao redor procurando alguém que as observasse mas todos olhavam fixamente para o caixão. 

—Eu não sabia que ela era amiga da Hannah. - disse Catherine.

—Vadias devem ter alguma espécie de imã que as une. - disse Julie.

—Estamos todos aqui reunidos nesse rápido momento para entregar a jovem Hannah Johnson à Deus. E pedir para que Ele console sua família. - disse um pastor aproximando-se do caixão.

Um grupo de no máximo dez pessoas cantou em uma espécie de coro. E o velório foi finalizado com Mary Johnson dando um beijo na testa de sua filha e fechando o caixão. Realizou o ato banhada em lágrimas. Todos levantaram-se e foram para fora da igreja, à espera de um carro que levaria o caixão para o cemitério da cidade onde seria o enterro em si.

As quatro meninas esperavam sentadas na praça em frente à igreja. Vanessa observava o buquê misterioso que Mary carregara mais cedo. Ela o colocara ao lado de um dos arranjos de rosas. Vanessa levantou-se e foi em direção ao buquê. Precisava pegar o envelope. Respirou fundo e correu até o arranjo. Procurou por entre as rosas mas o envelope havia sumido. Mary passou por ela chorando e entrou em um carro preto. 

—Pegou o envelope? - Emilly perguntou indo até Vanessa.

—Ele sumiu. - Vanessa respondeu.

O telefone dela apitou.

Fox? - Emilly perguntou.

Vanessa abriu a mensagem e havia uma foto anexada. Era o envelope aberto. As letras grandes formando -Fox se sobressaíam. A carta em si era apenas um pequeno bilhete. 

Sei quem matou sua filha. Me encontre no túmulo de número 101.

Vanessa ficou assustada.

—Receberam a mensagem? - perguntou Julie correndo até suas amigas. Catherine a seguia. 

—Precisamos chegar no túmulo antes de Mary. - disse Emilly.

As quatro correram até um táxi que estava estacionado na rua ao lado e ele as levou ao cemitério. Rapidamente viram o enorme portão de ferro com lanças no topo. Haviam estátuas de gesso - que na opinião de Julie eram assustadoras - em cima de alguns túmulos na entrada. O fundador de East Lake possuía uma enorme estátua de bronze em cima de seu túmulo. 

As meninas seguiram a multidão que caminhava pela grama úmida atrás de dois homens que carregavam o caixão de Hannah. Mary Johnson ajudava a segurar. Alguns minutos depois, pararam em frente à um buraco cavado na areia. Um homem de cabelo grisalho segurava uma pá e retirava algumas pedras da cova. Os dois homens colocaram o caixão no buraco e pegaram pás para cobri-lo com terra. Mary chorou e jogou-se no chão. Algumas pessoas choraram juntos. Familiares, amigos e até mesmo os que a menina humilhava. Vanessa negou-se a derramar lágrimas.

—O túmulo de Hannah é o duzentos e vinte e um. - disse Julie. 

—Vamos ao cento e um, então. - disse Julie limpando uma lágrima que derramara.

—É muita hipocrisia. - gritou uma garota encostada em uma árvore. Seus olhos se encheram de lágrimas. - A maioria dos que estão aqui a odiavam.

Catherine olhou para a garota. O cabelo ruivo era acima dos ombros de forma bem curta. Os olhos castanhos eram grandes e expressivos. A pele clara brilhava sobre à luz do sol se pondo. 

—Olá. - disse a menina ruiva secando as lágrimas com a manga de seu casaco cinza.

Catherine hesitou em responder.

—Oi...

A garota aproximou-se das quatro amigas. Antes de parar firme, deu uma cambaleada.

—Sou Judith. - disse. - Judith Johnson, ou mais conhecida como a prima louca da Hannah.

Vanessa olhou para Catherine. Precisamos ir— disse com o olhar.

—Eu sinto muito. - disse ignorando Vanessa. - Ela não merecia isso.

—Não, você não sente. - disse Judith. - Nem metade dessas pessoas sentem um pingo de tristeza pela morte dela.

—Não fala assim. - disse Catherine.

—Vem. - Vanessa cochichou.

Emilly e Julie começaram a correr atrás do túmulo cento e um. Vanessa franzia as sobrancelhas para que Catherine a seguisse.

—Os hipócritas choram. - disse Judith. - E suas lágrimas são falsas.

—Ei. - disse Catherine colocando a mão nos ombros de Judith.

—CATH. - gritou Vanessa.

—Eu acho que só preciso de um abraço. - disse Judith abraçando Catherine. Os lábios de Judith passaram perto de seu rosto, fazendo-a sentir cheiro de cerveja. A menina provavelmente afogara suas mágoas em álcool. Catherine olhou por trás de Judith e viu Vanessa irritando-se e correndo até Julie e Emilly.

Seu celular apitou fazendo-a soltar-se do abraço. Desculpou-se e o pegou para ler a mensagem que chegara.

Sempre bancando a boazinha. Uma pena que para ajudar a prima bêbada, você precisou atrasar Vanessa. Agora Mary já sabe a verdade. Beijos -Fox.

Catherine procurou por entre a multidão  e não encontrou Mary. Um sentimento de culpa tomou a mente da menina. Se odiou por não ter ido com Vanessa, talvez —Fox já tivera se encontrado com Mary. Ela olhou para Judith e desculpou-se mais uma vez, então correu atrás de Vanessa mas as perdera de vista. Desesperadamente começou a seguir o padrão de numeração dos túmulos... duzentos e vinte um, duzentos e vinte, duzentos e dezenove, duzentos e dezoito, duzentos e dezessete...

Julie e Emilly encontraram um jazigo de tamanho médio com duas estátuas na entrada. Anjos trajando poucas vestes apontando lanças para a pequena porta de ferro que havia tido o cadeado arrombado, deixando-a entreaberta. O número 101 estava pintado com tinta branca na porta. As duas olharam-se com medo, abriram-na e entraram.

—JULIE. - Vanessa gritava perdida entre as centenas de túmulos.

Catherine ainda passava pelo túmulo cento e oitenta.

O interior do jazigo era úmido e abafado. E tão escuro que nada se via, mas era possível se escutar as gotas de água caindo sobre o chão. Emilly andou até um ponto em que acertara sua cabeça em algo pendurado no teto. Pegou seu celular e ligou a lanterna.

—AAAAAH! - gritou jogando-se para trás.

Julie pegou o aparelho e apontou para o que Emilly acertara. A cena quase a fizera vomitar. Havia uma cabeça enrolada em cordas presas ao teto por pregos. Pelo estado de decomposição parecia estar morta à anos. Parecia apenas um crânio de cor preta - provavelmente queimado. Os dentes estavam apodrecidos e haviam pedaços de pele humana pelo rosto decomposto.

—Que merda é essa? - Emilly perguntou ofegante.

Julie apontou a lanterna para o chão, onde havia um túmulo encravado entre o piso de granito. 

Descanse em paz, filha.

Melanie Roberts. 

Morta no verão do ano de 2014.

—Por favor me diz que não é o que estou pensando. - disse Emilly.

Não obteve resposta.

—Vamos sair daqui, Julie. - disse Emilly.

Julie abaixou-se e pegou uma fotografia que estava colada na cruz em cima do túmulo. A foto mostrava Vanessa no corredor da casa de Alex. Ela carregava uma faca e ia em direção à Hannah, que aparecia caída e encostada na parede.

—O que é isso? - Emilly perguntou aproximando-se. Ao ver, ficou sem reação.

—Vamos sair daqui. - disse Julie dobrando a foto.

Antes de chegaram à porta, ouviram um barulho e a porta se fechou.

—O que foi isso? - perguntou Julie.

Emilly girou a maçaneta da porta mas a mesma não abriu.

—EI. - gritou.

Julie apontou a lanterna para Emilly.

—Está trancada. - disse.

—O QUE?! - Julie entregou o celular à sua amiga e jogou o corpo contra a porta.

—SOCORRO. - gritaram.

—ESTAMOS PRESAS.

—ALGUÉM.

—POR FAVOR.

Os gritos pareciam abafados pelas paredes do jazigo.

Seus celulares tremeram e apitaram. Antes de lerem a mensagem se olharam nervosas.

Vanessa será a primeira. Mas vocês vêm em seguida. Já podem formar uma gangue para quando estiverem todas atrás das grades. "Van e as vadias assassinas". Beijos -Fox.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Criminal Contact" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.