Kandor: as chamas da magia escrita por Sílvia Costa


Capítulo 4
Capítulo III - Testando os nervos


Notas iniciais do capítulo

Esse capítulo é para conhecer um pouco mais sobre o Conselho e a Guarda. Vou postar algumas "explicações" sobre a Joia mais para frente então aguardem.



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A tensão na sala só aumentava: Allef com as mãos levantadas agia como se o fim do mundo tivesse chegado; Magno há muito se exaltou com Sarah e também discutia com Daniel. Solano pedia por silêncio e Agenon parecia imerso em seus próprios pensamentos. Diana estava de frente para tudo isso olhando o Conselho discutir como se estivessem em um campo de batalha. E tudo por uma simples ideia: abrir um dos portões do muro que cerca o palácio.

As mãos apertavam os braços do assento do trono até os dedos ficarem brancos. Por fim Solano conseguiu acalmá-los.

— Conselho, é um absurdo o que estamos fazendo. Não vamos chegar a lugar nenhum com tanta discussão. Estamos aqui para resolver demandas e não para formar uma guerra.

— Absurdo é o que se propõe aqui! Os portões são uma segurança para todos no palácio, não podemos simplesmente abri-los.

— Não vamos abrir todos eles, Andreas. O portão leste ficará aberto em alguns dias da semana para quem desejar vir até mim.

— Para isso eles podem comunicar aos guardas e esperar serem chamados. Não vejo motivo para mudar o que está dando certo.

— Sarah, o povo não tem chegado ao palácio. Duas semanas se passaram desde a coroação e não vi mais que duas pessoas me procurarem. Onde estão todos? Acaso não tem problemas a resolver?

— Se eles não vem é porque estão satisfeitos. Ninguém reclama quando tem de tudo, não é mesmo Andreas?

— De fato. Está tudo muito bem e não devemos abrir mão de proteção. Imagina se alguém resolve atacar o Conselho? — Virou-se para ela e deu um passo a frente. — Deve zelar pelo bem de todos e nós não devemos ser esquecidos, Imperatriz.

Diana o observava no fundo dos olhos. Pensando somente em vocês mesmos? Que belo Conselho. E eu que achava que ajudavam o povo. Por que meu tio tinha tantas visitas? Andreas a fitava de cabeça erguida, seus cabelos brancos arrepiados como um gato esperando para atacar.

— Andreas, o meu dever eu o conheço bem. Não se esqueça que estou nessa sala desde os quatorze anos. O seu bem estar não será comprometido, zelarei por cada um desse reino. A agenda — usando as mãos, colocou a palavra entre aspas — da qual você fala Sarah está vazia e esperava que sendo tão bem vista por todos no reino, soubesse o motivo. Enquanto você discute sobre o que mudar ou não e discorre sobre meus vestidos, alguém está tratando de fazer com que as pessoas não sejam chamadas. Imagino que o Conselho, deva se preocupar para que o povo não seja prejudicado.

Ela fez uma pausa para observar rostos pensativos e olhares de reprovação. Sarah estava de pé e sua expressão era um misto de dúvida e raiva. Se a detestava antes, agora com certeza detestava ainda mais.

— Daniel, quero que a notícia de que o portão leste será aberto circule por todo o reino. De agora em diante ele ficará aberto 3 dias da semana para que os que se interessam venham. Sarah, você vai auxiliar Daniel e vocês três — Andreas, Allef e Magnos se sobressaltaram — vão me auxiliar aqui na sala, recebendo-os muito bem. — As últimas palavras foram frisadas. Todos ficaram em silêncio enquanto ela se levantava e seguia para fora da sala.

— Mais uma coisa: essa é última vez que vocês discutem como crianças pirracentas. Na próxima reunião espero que se comportem como o Conselho do palácio. — E abrindo a porta, saiu em direção ao quarto.

 

****************

      Não esperava que fosse fácil. Só porque sua mãe estava sempre sorridente não significa que ela nunca teve dificuldades à frente do reino. Definitivamente, Diana não acreditava que existiam pessoas tão implicantes como Andreas e Allef. Por que não abririam os portões? O Conselho parece tão dividido, pensava.

Inquieta, Diana andava pelo quarto com o olhar pensativo e a cabeça cheia de perguntas. Passaram-se duas semanas desde sua coroação e praticamente ninguém apareceu no palácio, já que pela receptividade que tivera, esperava que mais pessoas viessem até lá. Seu tio tivera tantas visitas e com certeza alguma coisa estava acontecendo. Nesse tempo em que passou organizando outras coisas não percebeu o quão estranha essa situação estava mas agora precisava resolver isso.

Saindo do seu quarto ela desceu apressada para o segundo andar, onde ficavam os aposentos dos integrantes do Conselho e de Ariana, e seguiu em direção a biblioteca principal. Antes de chegar à entrada Magno vinha no sentido contrário.

— Imperatriz — disse curvando ligeiramente a cabeça — perdoe pela intromissão. Estava procurando-a para dizer que pensei sobre o assunto e está certa em querer uma relação mais próxima com todos no reino.

— Você me pareceu dividido. — Diana caminhava lentamente, os olhos fixos nos dele, que não se desviaram um só segundo.

— É uma surpresa para nós sua decisão mas eu vou apoiá-la. Dê algum tempo ao Conselho e tenho certeza de que compreenderão que essa é uma decisão sábia.

— Está certo. Não esperava que gostassem disso de imediato mas é o que pretendo fazer.

— Tenho certeza de que é uma boa decisão. Não quero incomodar mais.

Ele se afastou para dar passagem a ela. Diana seguia em frente quando Magno comentou:

— Faz muito tempo que não temos uma Imperatriz. Tenho certeza que seus pais ficariam orgulhosos de vê-la agora.

Meus pais. Aquelas palavras mexeram tão fundo, tão diretamente em seu coração. A lembrança dos dias de infância eram tão vivas, mas ao mesmo tempo pareciam incrivelmente distantes. Naquele momento, de alguma forma elas estavam ali, a nostalgia pedindo passagem para invadir sua alma.

— Obrigada... Magno.

Seguindo rapidamente ela abriu a porta da grande biblioteca e entrou. A porta pesada, entalhada com folhas de videira e flores no centro, serviu de apoio para sua cabeça e agora, fechada com força, pelas mãos que apertavam firme as maçanetas, era a esperança de manter as lembranças lá fora; longe de alcançar seu coração. Por que ele tinha que mencionar meus pais?  A voz era tão carregada de sinceridade. Não era a primeira vez que ele tentava se aproximar mas nunca falou algo que fosse tão fundo como dessa vez.

Virando-se encarou a mesa principal de madeira, pesada e antiga mas em perfeito estado. De frente para ela havia um conjunto de cadeiras com o estofado na cor vinho formando um semicírculo. As cortinas estavam abertas e o sol iluminava o ambiente dando um aspecto acolhedor ao local. As várias estantes de livros exibiam títulos diversos, incluindo relatórios sobre Kandor. Poderia ser útil consultar alguns. Com certeza há algum que não li.

Caminhando pelas estantes Diana procurou algo para ler e costumava fazer isso para relaxar a mente e assim resolver os problemas. Numa delas um livro de capa azul chamou atenção. Levando ele para a mesa descobriu que falava sobre a Guarda: formada por homens de todo o reino, tinha a frente alguém da família mas também poderia ter um dos integrantes do povo que provasse ser merecedor.

Olhando pela janela ela avistou o gramado. Logo abaixo da janela alguns pequenos arbustos eram o início do jardim que se estendia por quase toda a extensão do pátio, e mais a frente homens finalizando um treinamento. Daquele andar a visão de quase toda a área aos fundos do palácio era perfeita, quase como se alguém tivesse criado a biblioteca com esse propósito. Os guardas traziam vários cavalos para os estábulos pois provavelmente saíram de madrugada para treinar.

Largando o livro Diana percorreu o caminho até o quarto, colocou uma roupa para montaria e seguiu para a ala que dá acesso aos jardins.

********

Henry estava a dezenove horas no palácio e já tinha recebido a ordem do general John para ir descansar, já que passou a noite em ronda. Mas o treinamento daquela manhã era com os cavalos e ele não queria perder mesmo tendo de sair antes do sol nascer. No lugar de ir para casa na troca de guarda, colocou a capa e levantou o capuz, pegou um dos cavalos no estábulo e saiu com os outros. John os levou além da floresta, até uma clareira para treinarem um pouco com as lanças e espadas, tendo de se manter firme sobre os cavalos. Nos últimos anos ele parecia interessado em montar uma guerra e nem todos os guardas entendiam o motivo. Com o tempo, de tanto ele prever que ainda havia algo por vir, os guardas se tornaram mais duros, mais desconfiados. Seguiriam John mesmo se ele dissesse que iria para as Montanhas do Desespero, porém falar desse assunto era proibido e nenhum guarda que quisesse manter seu posto o lembraria de ter perdido seu único filho naquele lugar. Agora que o sol quase atingia o topo do céu, Henry guardaria os cavalos e iria para casa.

— Você e suas longas jornadas. Vai acabar se tornando o próximo líder.

Ryan se aproximara com os cabelos negros e lisos soltos do rabo de cavalo. Era o caçula da Guarda parecendo de rosto ser ainda mais novo; determinado e muito interessado mas precisava de treinamento se quisesse se livrar do castigo de não cortar os cabelos, que já durava seis meses. Quando passou nos testes, Henry foi escalado para orientá-lo na primeira semana e desde então se tornaram amigos. Além dele havia Alexandre, Leon e Robert e ele se orgulhava do grupo de amigos que formou com o qual poderia contar em qualquer situação.

— Você também não deixa por menos. Há quanto tempo está em serviço?

— Já não importa. Com o tempo a gente não percebe.

— John pode te deixar mais tempo com esse cabelo. — Uma risada seguiu o comentário e Ryan ficou sério.

— Queria ver se fosse você, engraçadinho.

****** 

Pelo corredor do segundo andar Sarah andava apressada, os punhos cerrados e cara de poucos amigos. Os pés pareciam devorar o piso. Se fossem uma brasa, marcariam com violência o local onde pisava. Quem aquela garotinha acha que é para me tratar daquela forma na reunião do Conselho? De repente alguém lhe arranca dos pensamentos, puxando-a pelo braço.

— Onde você está com a cabeça Sarah?

Solano a segurava fortemente e tinha os olhos cravados nos dela com ar intimidador. Sarah podia sentir o calor de sua mão por sobre a manga fina do vestido, incendiando ainda mais seu temperamento explosivo.

— Faço o que acho conveniente!

— Você está se opondo a Imperatriz, parece empenhada em tornar tudo mais difícil.

Com um puxão forte ela se libertou de Solano e o encarou mais de perto.

— Essa sua protegida não chega nem aos pés da mãe dela!

— Ela está começando, dê tempo a ela. — Com as mãos para o alto ele se afastou, respirando fundo para se acalmar. Por que Sarah se tornou tão dura e implicante? — Seja razoável. Quando Frida subiu ao trono vocês não eram grandes amigas e mesmo assim se tornaram inseparáveis.

— Não as compare. Frida foi muito mais esperta e sensata, fazia o que era correto e útil para o reino e não agia como uma menina mimada cheia de vontades.

— Você deveria..

— Não me fale o que eu deveria fazer, Solano Brantes.

— Você já foi mais aberta ao diálogo e menos rancorosa, Sarah.

Solano tinha os olhos cheios de nostalgia e a encarava fixamente. Sentia o nervosismo dela pulsar em cada uma de suas veias, o tórax se movendo rapidamente como se tivesse corrido uma maratona. Aproximou-se um pouco mais e viu suas bochechas coradas, a raiva estampada em cada centímetro de sua pele. Sarah não se afastou, tampouco deu resposta imediata. Esperava por outra atitude dele, mas qual se podia esperar vindo do protetor de Diana? Estava claro que ele nunca iria contra ela, nunca iria contrariá-la; todas as suas ordens estavam certas. Para onde foi o Solano que ela conheceu? Fazia tanto tempo...

— O tempo dessa Sarah já passou.

E saindo com passos firmes, seguiu pelo corredor.


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Notas finais do capítulo

Que acharam de Sarah?
Aliás, alguém já tem alguma teoria? Amo ler teorias rs
Esse Conselho é encrenqueiro ou é só impressão minha?