Kandor: as chamas da magia escrita por Sílvia Costa


Capítulo 17
Capítulo XVI - Ameaças


Notas iniciais do capítulo

Olá queridos (as) leitores(as)!!
Passei muito tempo longe, é verdade, mas trouxe um novo capítulo para vocês.



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POV Nãna

As tarefas do palácio sempre me mantiveram muito ocupada. Como me tornei viúva muito cedo, fui designada para cuidar de tudo o que a mãe de Diana precisasse. Com o tempo, eu acabei tomando frente das serviçais do palácio, sendo responsável por delegar as atividades de cada uma e cuidar para que tudo estivesse em ordem.  No início não foi muito fácil e quando estava me acostumando, Diana nasceu. Logo me tornei sua babá e quando ela começou a falar eu passei de Anne Hudson para Nãna, que acabou se tornando uma forma carinhosa de se referir a mim, que as outras serviçais e a Imperatriz Frida usavam. Nós éramos mais do que senhora e súdita: Frida era minha amiga e eu sua conselheira em toda hora.

Agora que Diana cresceu, eu ainda tenho muitas tarefas. A diferença é que estou mais velha, mas mesmo assim não consigo ficar sem trabalhar e acabei nunca me afastando daqui. Elisabete e alguns dos guardas dizem que devo me casar de novo, já que não tive filhos do primeiro casamento, e para ter outro lugar para ir além do palácio, porém a verdade é que eu não sei viver longe dele. E depois, que homem poderia me interessar? Mal tenho tempo para pensar nisso, pois meus dias giram em torno do palácio e ainda mais depois dos últimos acontecimentos.

É cedo e quase ninguém da família se levantou mas a cozinha já está a todo vapor, e Elizabete e eu separamos as frutas para colocar na mesa; enquanto as demais preparam pão. A cozinha do palácio é grande o suficiente para que várias de nós trabalhem ao mesmo tempo e tem tudo o que precisamos para servir a família ou convidados em grandes banquetes.

O palácio está muito agitado nos últimos dias devido ao que aconteceu com a Imperatriz, a Guarda ainda mais atenta e John bem apreensivo, para não dizer paranóico , porém o que mais me impressiona é o comportamento de Ariana. Dois dias depois da queda, ela partiu para a casa dos pais e pensei que voltaria melhor, com a cabeça no lugar. É bem provável que eu tenha me enganado, levando em consideração suas primeiras palavras ao retornar. Eu estava no corredor de acesso à sala de jantar e vi Diana surgir no alto da escada, enquanto Ariana entrava pela porta principal do palácio.

— Você voltou! Eu queria muito te ver. — Ela se surpreendeu com a presença da amiga que corria em sua direção. Ariana parou e fixou seu olhar nela.

— Pensei que soubesse que fui passar alguns dias com meus pais. — Ela respondeu, fria.

— Como você está? — Diana conseguiu dizer depois de um tempo. Eu sabia que ela sentia imensa tristeza, como se algo lhe faltasse, mas também estava intrigada com esse afastamento repentino.

— Estou muito melhor. Um tempo fora me fez bem.

— Isso é tão bom. O palácio ficou muito triste sem você. – Diana estendeu a mão para tocar a dela, contudo Ariana recuou e virou o rosto de lado. – Por que está tão estranha comigo? Eu sinto muito pelo que aconteceu e sei que foi minha culpa, mas o que quer que eu faça para me desculpar com você?

— Não quero que faça nada. Sua decisão insensata já me custou o suficiente.

— Ariana...

— Escute, Diana. — Ela fez uma pausa e moveu o corpo para frente, com expressão séria e a outra lhe deu atenção. — Vamos nos ater somente as nossas funções dentro do reino.

— Do que está falando? — Eu levei a mão à boca para conter meu espanto enquanto observava e compreendia que nada seria como antes.

— Eu vou continuar te auxiliando nos assuntos do reino e é só isso. Serei somente sua súdita e conselheira. Não me considere mais sua amiga.

— Você não pode estar falando sério … ou você … ou essa é uma desculpa para abrir mão do seu dever para que outra pessoa assuma? É isso? — Diana soava incrédula e ofendida.

— Não. Eu vou continuar cumprindo meu dever para com o reino, como sempre foi. Não pretendo deixar de lado a responsabilidade que me confiou, porém as coisas não serão como antes.

— Tem alguma coisa que você não está me contando. — Ariana tentou argumentar mas ela foi mais rápida. — O que está por trás da sua decisão?

— Não há nada. Só é o melhor a fazer.

Diana se calou por um tempo e se afastou, observando atentamente Ariana de cima a baixo. Seu rosto aparentava desgosto e tristeza e eu encarava as duas, incrédula, pensando o quão curiosa era por estar alí escutando a conversa dos outros. Balançando a cabeça Diana começou a falar.

— Você não parece ser a mesma.

— Apenas respeite a minha decisão. — E logo a resposta veio como uma adaga.

— Como quiser. Faremos como você quer, senhorita Walker. — E virando-se, começou a caminhar para a sala do trono. — Se precisar tratar de algum assunto, peça a alguma das criadas para te anunciar na sala do trono.

No mesmo dia presenciei outros ânimos agitados. Antes da família descer, passei pelo terceiro andar e ouvi gritos vindo do quarto de Ailla. Parecia uma briga e eu me aproximei para identificar quem estava envolvido e, para minha surpresa, percebi que estava discutindo com Eliza, uma das criadas que tinha o costume de mantê-la informada sobre tudo, assim como suas irmãs, Merlinda e Zânia.

— Como assim não pode me contar?

— A Imperatriz nos proibiu. Disse que aquela que lhe contar seja lá o que for, não ficará mais no palácio.

— E o que isso importa? Já não me contaram tantas coisas que ouviram por aí? — Ela começou a falar mais baixo, como se estivesse muito próxima da outra. — Se não for me ser útil, não precisa mesmo ficar aqui. Tornarei sua vida um verdadeiro... inferno.

— Sinto muito, senhorita — a voz estava falhando — mas vou obedecer a Imperatriz.

Dito isso, ouvi o barulho de um vaso se quebrando e abri a porta. Eliza estava encolhida próxima a porta e do outro lado do quarto havia estilhaços de um dos vasos de cerâmica mais bonitos do palácio, espalhados pelo chão. Ailla, com sua pele alva, estava claramente repleta de raiva, a julgar pelo rubro de suas bochechas.

— O que se passa aqui?

— Céus! Ailla o que está acontecendo? Dá para ouvir seus gritos do nosso quarto.

— Estavam discutindo. — Eu respondi para Aurora, que surgiu logo atrás de mim, acompanhada do marido. Eu me virei para Eliza que começou a chorar e a dispensei.

— Minha filha, que absurdo é esse?

— Não aconteceu nada demais. Só o vaso que caiu.

— E por que ele foi cair tão longe do lugar dele? — O tom irônico foi facilmente percebido e só contribuiu para deixar o clima pesado. Um silêncio se fez enquanto elas se olhavam. Eu me adiantei e comecei a juntar os pedaços do vaso.

— Você vai se desculpar com a jovem. Precisa aprender a respeitar as pessoas.

— Eu não vou fazer isso, pai.

— Pois irá sim.

— Quem vai me obrigar? — Clermon fez um leve movimento na direção dela e Aurora se colocou entre os dois.

— Vamos deixar isso de lado e descer para a primeira refeição. Depois trataremos desse assunto.

— Podem ir sem mim. Perdi a fome.

— Faça um esforço. Você quase não tocou na comida nessa última semana.

— Não estou interessada em comer. Aliás, vou deixar que meu futuro marido decida o que devo comer, assim que escolherem um entre os tantos pretendentes no reino. — Ela finalizou a frase com voz sarcástica e calma. Eu tratei de terminar logo e sair. Detesto presenciar discussões da família.

— Não teríamos tomado essa decisão se você mesma não tivesse levado a isso.

— Mas o que eu fiz para merecer um casamento arranjado?

— Quer mesmo que eu lhe conte? Não basta seu comportamento infantil, as criadas reclamando de suas exigências e agressões, que por sinal acabamos de presenciar.

— Como se não bastasse agora temos as suas saídas noturnas. E olha que ainda não nos disse para onde foi. — Aurora cruzou os braços e continuou. — Por que não nos conta agora?

— Eu já disse que  apenas desci as escadas e, se me casarem, seja lá com quem for, vou tornar a vida dele impossível!

— Continua agindo como uma criança! Não se lembra de nada do que conversamos? — Clermon esperou por uma resposta com o olhar fixo na filha. — Não vou tolerar seus destemperos e já está decidido. Precisa tomar atitudes e começar a pensar como uma mulher.

— Como pode esperar que eu aceite essa situação? Quer me amarrar a um homem que provavelmente nunca vi.

— Ailla, fará o que seu pai decidir e isto não tem volta. — Ela deu um suspiro como quem se dá por vencida e está muito cansada para lutar. — Fique no quarto se quiser e nós vamos cuidar de nossos afazeres.

Seu pai se despediu da esposa dizendo ter perdido o apetite também e que tinha assuntos a tratar. Aurora e eu descemos lentamente as escadas até o primeiro andar.

— Nossa filha está cada vez mais rebelde, Nãna. O que podemos fazer?

— Você se esforçou para ensinar a ela tudo o que sabia. Pintar, bordar, como se portar… até música... Tudo o que precisava.

— Eu sei e não foi o suficiente. Ela não parece interessada em colaborar com nada no reino. Só pensa em se divertir, mente para nós…

— Eu sei que não é da minha conta, mas como você e seu marido chegaram a essa decisão?

— Clermon acha que com a ideia do casamento, como ela terá de tomar várias decisões devido às novas responsabilidades, ela começará a pensar como uma mulher e não como uma criança. E também não queremos ter a surpresa de descobrir nossa filha andando com quem não deve ou coisa pior.

— Mas casar assim, tão de repente?

— Não será na próxima semana ou no mês que vem mas a convivência com alguém diferente pode ajudar. Alguém com ideais e sonhos que a contagiem. Me compreende?

— Sim. — Eu assenti, meio confusa, imaginando quem suportaria tal pessoa. — Tem alguém em mente?

— Não, porém preciso descobrir se há alguém que a interessa primeiro. Clermon é bem desajeitado com essas coisas. — Ela se calou observando a toalha de mesa ao chegarmos, os bordados feitos com elegância e cores vivas. — Nãna, você conhece Ailla desde que nasceu. Imagina ela junto de alguém?

— Talvez.

— Me diga quem é. O que me importa é que faça minha filha feliz.

E eu me arrependi de estar alí de imediato.

 

 

POV Diana

O clima estava tenso na biblioteca com Sarah e Solano sentados a minha frente. Estavam incomodados em suas cadeiras mas não era a minha presença o problema pois poderia jurar que eles tiveram alguma discussão que não terminou muito bem. Conversávamos sobre a mais recente notícia de todo o reino e a discordância sobre o destino de Daniel era visível. De repente Nãna bateu a porta, abriu uma fresta e espiou, cessando nossos comentários.

— Me desculpe, não queria incomodar. Eu volto outra hora.

— Entre Nãna. — Eu pedi fazendo um sinal com a mão. — Estávamos conversando sobre Daniel.

— Diga a elas o que aconteceu ao cão que bebeu a água do quarto de Diana. — Solano pediu com calma na voz apesar da sua expressão.

Ainda discutíamos sobre acusar ou não Daniel publicamente. Depois que ele foi levado à masmorra, resolveram verificar tudo no palácio: comida, água, seus aposentos e armas, se desfizeram de tudo o que já estava pronto, agitados e impelidos por Allef, Andreas e Magno. Sarah, para minha surpresa, se manteve calada e apenas observava o alvoroço. Para aumentar minha preocupação, decidiram fazer um teste com a água de um jarro do meu quarto, dando-a a um cão do palácio, um dos mais velhos que já não saía nas caçadas. Em poucas horas ele estava morto. Meu mal-estar passou graças a essa descoberta mas a tristeza se tornou minha única companhia.

— Todos nós sabemos o que houve com ele. — Ela respondeu seca, se aborrecendo internamente com aquele assunto.

— Isto mesmo. E há pessoas que ainda insistem em não acusar Daniel.

Ele olhou para Sarah e ambos ficaram calados enquanto nós duas mirávamos a discussão que acontecia silenciosa, nos olhares que trocavam. Aqueles dois sempre foram uma incógnita para mim e isso não mudou muito nos últimos meses. A verdade é que Solano detesta ser contestado, como o líder do Conselho, principalmente na minha frente.

— É certo que estamos a poucos dias da escolha do novo general. Fazer isso agora só geraria divisão no reino e tumulto porque as pessoas focariam mais nisso do que no novo líder e adiaríamos muito o torneio. — Ele se concentrou no que dizia, olhando fixamente para mim. — Ele é membro do Conselho e merece um julgamento correto e a chance de se defender, embora eu esteja profundamente decepcionado. — A amargura foi sua porta voz e logo depois olhou para Sarah de soslaio.

— Eu não duvido disso e tampouco quero que receba uma pena sem um julgamento. Eu não creio que ele seja culpado. É só isso.

— Eu também quero resolver isso o quanto antes porém não é o momento. Sarah, Solano está certo e essa já era minha decisão. É o melhor a fazer. — Ela se calou e assentiu de uma forma que pensei que nunca faria diante de mim, e um tempo depois eles se retiraram.

— Está claro que Sarah está do lado de Daniel. Mas e você Diana?

— Ele nunca deu motivos para desconfiarmos dele, entretanto isso não significa que não tenha algo a ver com o veneno. Farei um julgamento depois que o novo general assumir mas temos que ficar atentas Nãna. Ele pode não ser o único. — Eu enrolei um pergaminho que estava aberto sobre a mesa e deixei de lado.

— Vai sair?

— Com metade da Guarda a tiracolo? Não. — Minha voz me pareceu desanimada e me deixei ficar a janela observando o jardim.

— Eles finalmente descobriram sua porta de saída.

— Sim. Erick foi obrigado a contar.

— Não se zangue com ele. — Me pediu com uma voz que me saiu mais como a voz de mãe do que qualquer outra coisa.

— Não estou com raiva, Nãna. Ele deve ter pensado que era arriscado continuar saindo sozinha e por fim contou.

— A sua segurança é o dever deles.

— Mas não é justo ser prisioneira em meu próprio palácio. — Eu levantei levemente a voz, irritada com tudo o que acontecia. Estava chateada por não ter conseguido resposta alguma na Floresta e com o comportamento de Ariana. — Não vamos discutir isso. — Eu dei um suspiro e ela se aproximou e me abraçou. — Esses dias foram tão estranhos.

— Eu sei que sim, querida, mas tudo vai se resolver.

— Eu sinto que ainda está longe disso acontecer.

 

 

********************

— Eu quero esse lugar limpo e rápido, Lucius.

Marcon se mantinha com os braços cruzados, o queixo erguido e o olhar soberbo sobre o jovem a limpar o estábulo, aproveitando que não havia muitos por perto para ver que, no lugar dele, outro guarda cuidava do serviço. Estavam com ele Augustos, Marcel e Fernando, igualmente zombando do novato, riam e espalhavam feno pelo chão para atrapalhar o trabalho.

— Se eu me lembro bem, era a sua vez de limpar o estábulo, já que perdeu no treino com o general.

— O que você tem a ver com isso, Zumach? Ninguém te chamou aqui. — Com raiva ele se virou para fitar Henry parado na entrada.

— Não vou permitir que abuse dos outros guardas.

— Quem você pensa que é para falar comigo assim? — Aproximando-se de Henry lentamente com o semblante fechado e intimidador, fez uma pequena pausa, escolhendo as palavras. — Eu sou integrante da família que ocupa o trono ao qual você deve lealdade.

— Um trono que não é seu e nunca será e não se esqueça que na Guarda Real nós somos todos iguais, independente de sermos ou não parentes da Imperatriz. — Ele também estreitou a distância entre eles, falando pausadamente e com convicção.

— Muito bem. Você se acha o melhor e mais correto de nós. Vamos ver quando sua máscara cair e revelar seu verdadeiro eu.

— Do que está falando? — Henry se mostrou confuso mas sabia que o outro estava tentando intimidá-lo.

— Você vai participar do torneio, com certeza. Pois escute uma coisa — dizia a poucos centímetros do outro — eu vou vencer você. Vou derrotá-lo na frente de todos os seus amigos. — E fingindo tirar poeira dos ombros de Henry, completou. — Na frente da Imperatriz.

— Isso só saberemos no dia. Não cante vitória antes da hora porque eu não pretendo perder para você.

Seus olhares se cruzaram cheios de fúria e o desejo de acertar um ao outro com um murro era evidente. Os demais se calaram com a discussão, focados no que, com certeza, seriam os oponentes com lutas mais aguardadas do torneio.


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Notas finais do capítulo

E então, gostaram de conhecer um pouco mais sobre Nãna? Ela é muito importante para Diana, pois é sua segunda mãe.

Bem,Ariana continua impossível...

E estamos quase chegando no torneio. Façam suas apostas!