Kandor: as chamas da magia escrita por Sílvia Costa


Capítulo 15
Capítulo XIV - Medo e escuridão


Notas iniciais do capítulo

Oi pessoal, como estão? Eu sei que lancei um capítulo ontem mas esse estava quase pronto e resolvi publicar também. Isso significa que eu vou ficar um tempo sem postar, umas 3, 4 semanas. O próximo precisa de muito cuidado rs

Vejam esse como um bônus de fim de ano. A primeira parte desse capítulo se passa ao mesmo tempo em que Diana e Ariana estão na Floresta Negra. A segunda parte é a noite, quando elas já estão no palácio. Espero que gostem.



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— Conselho, estamos a poucos dias da escolha do novo general e vamos apoiar a Imperatriz nessa nova resolução. Imagino que estejam surpresos com a forma como vamos escolhê-lo, mas merecimentos e habilidades se juntarão dessa vez.

Estavam todos reunidos no segundo andar onde além da biblioteca e dos quartos, havia uma sala para eles. Solano cuidava dos últimos preparativos que Diana determinou e aproveitou para falar com todos. Nas últimas semanas, eles demonstraram boa vontade em atendê-la em tudo e ele pensava que finalmente conseguiu aprovação deles em relação a nova governante. Claro que ele e Agenon tinham suas suspeitas de que alguém estava conspirando contra ela, mas não adiantava acusar ninguém por enquanto.

— Eu ainda acredito que estamos a beira de uma tragédia. Quem vai comandar a Guarda agora? Eles estão sob o comando de John, que é um homem de pulso firme, mas quem garante que o próximo estará a altura?

— Allef tem razão. Clermon deveria assumir mas é um homem sem fibra. Por mim Marcon assumiria e não precisaríamos de nada disso.

— Vocês dois deveriam se candidatar. Afinal, tem muita experiência. — Sarah falava com pura ironia e um sorriso de desdém para Allef e Andreas.

— Eu te disse que não deveríamos ter uma mulher no Conselho. Já nos basta uma sobre as nossas cabeças. — Allef cochichava para o amigo já que um era o ponto de apoio do outro.

— O que foi decidido por ela está decidido. — Daniel se pronunciava pela primeira vez no dia. A barba estava por fazer e as olheiras indicavam que dormia pouco. —  Temos que escolher alguém que saiba o que está prestes a assumir e realmente queira.

— Por falar nisso, temos algumas coisas para acertar Daniel. — E virando-se para os outros. — Conselho, estão dispensados.

Um por um se retirou e Solano seguiu em direção ao quarto de Daniel. Ele estava encarregado de fazer a lista de convidados para assistirem ao torneio, já que conseguia dialogar muito bem, quando queria. De resto, passava a maior parte do tempo imerso em pesquisas e nas suas próprias ideias. Era muito bom em fazer mapas, tinha bom gosto para se vestir e embora não exibisse seu status no reino, como Magno, sempre estava elegante.

O quarto dele foi mobiliado de forma simples com peças de madeira e havia também duas lanças cruzadas em uma da paredes. Fazia alguns anos que tinha deixado a Guarda para fazer parte do Conselho, uma troca no mínimo mal vista pelos outros guardas que acreditavam serem indispensáveis para o reino. O quarto não era o maior de todos mas com certeza era bem confortável. Além da escrivaninha, abarrotada de papéis soltos e livros, havia um divã onde costumava se deitar para esquecer os problemas. Como estudava muito, ficava horas e mais horas às voltas com alguma nova informação.

— Entre Solano, mas não se assuste com a bagunça.

— Você não toma mesmo jeito. Olha em que estado deixou esse lugar!

— São os estudos. Você sabe que eu não fico sem livros.

— Sim, eu sei. — Passando pela escrivaninha, Solano se pôs a organizar eles em uma pilha para abrir espaço. — E também sei que se esquece de devolvê-los. Sua estante não cabe mais nada. — E realmente não cabia. Na parede, atrás do divã, havia uma estante com tantos livros que não era possível colocar mais nada, nem uma pena sequer.

— Um dia eu os arrumo mas agora me deixe achar a lista. Tem que estar aqui em algum lugar.

Ele começou a procurar rapidamente por entre a papelada na escrivaninha, enquanto o outro observava. Daniel aparentava uma agitação nada comum enquanto Solano franzia a testa para as diversas anotações que o amigo tinha feito, reparando também suas mãos sujas de tinta e uma marca no sapato. Uma parte da lateral estava desgastada tal como um arranhado feito por pedras ou um objeto afiado. Mas onde ele conseguiria essa marca? Está certo que cada conselheiro possuía, além do palácio, sua própria casa para onde poderia ir quando quisesse, mas uma marca como aquela poderia ser obtida nas pedras que calçavam as ruas?

— Você tem trabalhado muito nos últimos dias, não é mesmo?

— Um pouco. Nada tão além do normal. — Ele continuava a procura, sem resultados, ao mesmo tempo em que Solano seguia na direção da estante. Ele observava os livros e a disposição deles, curioso para saber que tipo de informações eram guardadas ali. Seriam úteis? Cautelosamente passou pelo divã e estendeu a mão para um deles.

— Encontrei! Eu sabia que estava aqui. — Ele vibrava com a lista mas mãos e se voltou para Solano, que se virou a tempo de perceber uma caixa na ponta da escrivaninha prestes a cair da pilha de papel.

— A caixa! — Daniel tentou segura-la mas não conseguiu impedir que caísse e batesse contra o chão com força suficiente para abrir a tampa. Era uma caixa de tamanho médio, de formato hexagonal e altura de um palmo, toda em madeira e com desenhos entalhados em suas faces. 

— Eu te ajudo a recolher essas coisas. — Só mesmo Daniel para fazer uma bagunça como essas, pensava.

Mais papéis se espalharam pelo chão junto com um pedaço de tecido e uma pedra negra. O tecido era familiar, de um azul claro e parte de um bordado em linha dourada. Ele tinha certeza de ter visto algo assim em algum lugar.

Com quase todas as coisas recolhidas, Solano ia se levantar quando algo lhe chamou atenção bem próximo ao pé da cama. Ele estendeu a mão para pegá-lo e seus dedos sentiram o frio do recipiente de vidro, um frasco pequeno, que com certeza saiu da caixa também. Daniel falava a lista em voz alta, de costas para o chefe do Conselho e próximo a janela. Ele se levantou devagar, os olhos fixos no seu achado incomum já que não era um recipiente qualquer. Era fechado por uma rolha, marcada na parte de cima com a imagem de uma folha feita a tinta vermelha. Seu conteúdo era um líquido verde escuro, tal qual uma mistura concentrada de ervas. Sua mente trabalhava frenética e um quebra-cabeça começou a se formar nela. 

— E temos também os Malteses na lista, e os parentes de Sarah… — Ele não queria ouvir nada. Seu rosto passou da curiosidade sobre o conteúdo da estante para a incredulidade e indignação. Sua mão esquerda estava fechada e os dedos bem apertados, lutando contra a vontade de avançar contra o homem à sua frente.

— Daniel, o que significa isso?

*************************** 

 

Um rato seguia pelos cantos da rua farejando para todos os lados em busca do seu jantar. Àquela hora todos os habitantes do reino estavam em suas casas e a maioria provavelmente já adormeceu, mas o solitário roedor perambulava sem outra opção. Algumas poucas janelas no reino deixavam escapar o brilho das velas cuja luz bruxuleante pouco iluminava lá fora.

O resto de uma fruta, um legume podre, algum produto que caiu na rua durante o transporte; qualquer coisa lhe serviria. Estava entretido em sua tarefa quando um pequeno ruído tomou sua inteira atenção. Seria um gato que se aproximava sorrateiramente? Ele levantou a cabeça e observou. Na esquina, surgiu a ponta negra de algum objeto, e poucos segundos depois todo o restante de um sapato. Era um homem de baixa estatura que vestia roupas escuras cobertas por uma capa preta e caminhava pelas áreas sombrias como se quisesse se esconder de alguém. Estava nervoso e agitado, as mãos trêmulas e suadas, suor que também escorria pelo rosto.

O medo tomava conta de sua mente desde que recebeu a visita da Imperatriz e algumas outras pessoas. Foi um almoço agradável que ele ofereceu com boa vontade; sua esposa, Mérida, cuidou da comida deliciosa como sempre fazia e tiveram uma agradável refeição conversando sobre o reino. Ele pensou que Diana estava à vontade e apesar da pouca idade era segura de si, e ele começou a acreditar que poderia cuidar muito bem de todos. Estava acompanhada de uma mulher de cabelos castanhos e jovem, que julgava ser alguém de sua confiança, portando alguns papéis e tinta. Reparando bem na jovem e depois de ouvir seu nome, ele descobriu que conhecia seus pais pois sempre compravam alimentos com ele. Também as acompanhava um dos guardas, do qual não recordava o nome mas que esteve alerta o tempo todo, e acabou finalizando o dia com a suspeita que ele e a jovem Walker não se davam muito bem. Em certo momento, quando estavam quase saindo e a Imperatriz veio lhe perguntar sobre as frutas, ele recebeu uma missão nada simples e foi aí que seus problemas começaram.

Primeiro ela queria saber sobre certo senhor que anos atrás cuidou de sua mãe. Não compreendia o motivo dela não envolver o pessoal do palácio nessa história. Será que havia alguma coisa acontecendo dentro dos muros que ele deveria saber? Ele não tinha conhecimento sobre esse senhor, apesar de receber muitas pessoas e estar atento a tudo. Manter-se informado era o mínimo que alguém poderia fazer, usando como vantagem suas informações. Fora um homem astuto durante um tempo e conseguiu até mesmo se estabelecer e ter uma vida tranquila em Kandor. Mas para todo esperto havia alguém ainda mais esperto que ele; provavelmente estava perdendo o jeito.

Decidiu entrar no jogo da jovem soberana e além dessa preciosa informação, lhe oferecer o endereço de alguém que ele tinha certeza de que fazia algo muito errado em casa. Animais estranhos rondavam as ruas à noite, corvos para ser exato, alojando-se em determinado local. Imaginava que as pessoas comentariam, mas ou ninguém reparou ou não queriam se envolver. Ela saberia sobre isso e deveria por fim a essas aves tão repugnantes que rondavam as noites e seus sonhos. Agora ele tinha a própria Imperatriz em seu encalço, alguns arranhões e um braço machucado, além de se preocupar com o que vinha do céu.

O súdito desejava chegar aos portões do palácio mas o medo o paralisava, prendia seus pés ao chão e por mais que tentasse sair de seu posto, as pernas não respondiam. Olhava para o céu, para as aves de penas escuras e brilhantes, seus olhos vazios mas atentos, vigiando o movimento pelas ruas. Só a presença deles já dava medo e mais ainda seus bicos pontiagudos. Não conseguia parar de tremer e o suor das mãos era como o fluir das águas de um rio. Começou a pensar o que sua esposa faria se ele não voltasse, já que o caminho até o palácio era longo e parte dele não oferecia nenhum esconderijo. Como haveria de se proteger? Isso tudo valeria a pena?  Recuou um passo com certa relutância, depois dois e logo já tinha feito metade do caminho de volta.

— Me perdoe, Imperatriz.


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Notas finais do capítulo

Sem palavras. Como assim Daniel? O que você aprontou? Dos sete conselheiros, quem vocês gostam menos agora?

Que cara medroso!! Eu enfrentaria a noite e os corvos... sqn